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Multiculturalismo no Bom Retiro

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Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia São Paulo – IFSP
O Multiculturalismo do Bom Retiro 
Douglas da Mata Ramos 
· Sumário
1. Introdução.............................................................................04
2. Objetivo Geral.......................................................................05
3. História do Bom Retiro........................................................06
4. Bom Retiro Latino................................................................07
5. Bom Retiro Oriental.............................................................08
6. Bom Retiro dos Judeus e Italianos....................................09
7. O Bairro Multicultural – Trocas Culturais..........................10
8. Procedimentos metodológicos..........................................13
9. Referências...........................................................................14
· Introdução
O projeto em questão tem como objetivo analisar as trocas culturais existentes em uma região especifica de São Paulo. Região essa, o Bairro do Bom Retiro, localizado na zona central de São Paulo. Ele possui como limites geográficos – Norte: Rio Tietê e Ponte Governador Orestes Quércia; Leste: Avenida Cruzeiro do Sul e Avenida do Estado; Sul: Rua Mauá/Via Férrea CPTM (Linhas 7-Rubi e 11-Coral); Oeste: Via Férrea da CPTM (Linha 8-Diamante), Viaduto Engenheiro Orlando Murgel, Avenida Rudge e Ponte da Casa Verde (início). 
Além de tudo, é analisado as principais culturas imigratória presentes do bairro, subdivido em Bom Retiro Latino, Bom Retiro Ocidental e Bom Retiro Judaico e Italiano. São usados autores como Paul Claval – com seu aclamado livro A geografia cultural – Febrot, entre outros. Com uma hipótese, que é trabalhada durante o desenvolvimento do projeto, de como foram as primeiras trocas culturais através das crianças e do comércio dessa região por meio das fábricas que atraiam mão de obra e futuramente a área têxtil.
Tal tema – Multiculturalismo – acaba por ser importante no âmbito da geografia humana para estudar toda intersecção histórica, financeira, cultural e humana de uma região que nos últimos anos está ganhando visibilidade da população de São Paulo.
· Objetivo Geral 
 A pesquisa tem como objetivo analisar as trocas culturais existentes no século atual. Como formar de análise, foi usado o bairro do Bom Retiro, localizado no Centro de São de Paulo. A pesquisa, consequentemente, visa abordar trocas culturais históricas que acarretaram até os dias atuais – tal analogia tem afins de mostrar se tais trocas do passado persistem nos dias de hoje e se houve uma transformação e o quão ela se diferencia de acontecimentos históricos. O viés de trocas culturais histórico/dias atuais, é ressaltado por Gilberto Freyre (1947) “(...)quase nenhum sócio - seja qual for o sistema cultural a que ele pertença está inteiramente dentro de uma época ou de um momento cultural. ”, afirmando que toda cultura passa por transformações e mudanças.
· História do Bom Retiro
Documentos datam o nascimento do bairro no século XIX. Uma ampla área destinada para retiros e sítios da elite paulistana era uma área privilegiada por se localizar entre os Rios Tietê e Tamanduateí, proporcionando um grande número de lotes. 
“Desde 1828 a 1872 aquela zona foi procurada por pessoas que ali instalavam chácaras para seu ‘retiro’ de fim-de-semana. A origem da denominação Bom Retiro deve-se a ter ali existido uma chácara com essa denominação[...]” (DERTÔNIO, 1971)
Outro momento histórico que fez o bairro entrar no radar da população paulistana, foi o surgimento, por sua vez, de grandes fábricas e olarias. A maior olaria da cidade, a Manfred, foi instalada no fim do século XIX, juntamente com fábricas, Fábrica da Anhaia, a primeira fábrica de montagem de linha de automóveis da Ford na Rua Sólon em 1921, e a Cervejaria Germânica, que futuramente viria a ser adquirida pela Companhia Antártica. 
Em 1910 na Rua José Paulino, rua que hodiernamente é conhecida por ser uma área têxtil, foi fundada a primeira cede do clube de futebol Sport Clube Corinthians Paulista, por operários das fábricas localizadas na região. 
“Às 20h30 do dia 1º de setembro, à luz de um lampião, na esquina das ruas José Paulino e Cônego Martins, no bairro do Bom Retiro, o grupo de operários [...] fundaram o Sport Club Corinthians Paulista. Com mais oito rapazes, foi formada a reunião dos primeiros integrantes e sócio fundadores do Timão, que teve seu nome inspirado na equipe inglesa Corinthian-Casuals Football Club, que fazia excursão pelo Brasil. [...] Um terreno alugado na Rua José Paulino foi aplainado, virou campo [...]”
Vale ressaltar, que nos limites do bairro temos a presença da São Paulo Railway, mais conhecida como Estrada de Ferro Inglesa. Foi a primeira ferrovia do Estado de São Paulo, que ligava o Planalto Paulistano ao Litoral, proporcionando o surgimento de armazéns no bairro.
· Bom Retiro Latino
No início dos anos 2000, o Brasil teve um grande fluxo imigratório de Latino-americanos, essencialmente, no Estado de São Paulo. O Brasil sempre foi visto como um refúgio por esses povos, principalmente, pelo fato do país ser considerado com uma economia melhor que seus países vizinhos. Em busca de um refúgio e de condições melhores de vida, hoje o país recebe como habitantes mais de 300 mil latinos.
No Bom retiro, esses povos latinos, especialmente os bolivianos, visam habitar essa região pela facilidade de se encontrar empregos relacionados a área têxtil. Portanto, o bairro acabou por ser uma área de concentração de Bolivianos, Paraguaios e Peruanos.
Segundo relatos dos próprios, eles acabam por viver em uma situação de extremo. Em uma casa que viveria uma família de cinco pessoas, acaba-se por viver mais de 20 moradores na residência. Em 2013 uma agência de reportagem e jornalismo – Pública – produziu um documentário que mostra como é a vida desses latinos. Em certo momento do documentário é contada a história e vivência de Choco e conta como ele vive “moram e trabalham, no mesmo quarto do antigo sobrado que dividem com outras famílias bolivianas. Na sala da casa funciona uma oficina de costura, onde os adultos trabalham extensas jornadas diárias. ” 
Há relatos de próprios bolivianos que acabam por escravizar outros bolivianos ou paraguaios. Esses que escravizam, por possuírem visto para viverem no país, acabam por ameaçar os que não possuem caso não trabalharem segundo suas ordens, por medo muitos não questionam e aceitam o que lhe é proposto. Em 2011, o jornal Folha de São Paulo relatou que os bolivianos, por estarem mais tempo no país e no ramo da confecção, acabam por empregar os paraguaios que chegaram depois que os bolivianos.
“Muitos paraguaios chegam e vão trabalhar para os bolivianos, ainda maioria como donos das confecções. Mas, quando a situação melhora um pouco, eles abrem seu próprio negócio. Todos que resolvem emigrar para o Brasil fazem isso por motivos econômicos. 
‘Estou em São Paulo há dez anos. Comecei trabalhando para os bolivianos. Depois, abri a minha confecção. Há dois anos trouxe a família’, diz Esteban Rojas”
Mas essa interação cultural entre os latinos não é apenas uma interação de abuso e proveitos, muitos vivem em comunhão e costumam confraternizar entre si. É comum encontrar no bairro feiras culturais, um local onde eles se reúnem para comer comidas típicas, ouvir músicas e cortar o cabelo da mesma forma que faziam em seus países, essas feiras acabam por preservar hábitos da cultura latina. (FERNANDES)
· O Bom Retiro Oriental
A partir dos anos 90, houve um grande fluxo migratório de Coreanos para o bairro. Eles começaram a investir em lojas em um momento que o bairro passava por certa crise e muitas lojas estavam fechadas. Hoje, 70% do comércio do Bom Retiro está nas mãos dos coreanos. Com a chegada dos coreanos, houve um crescimento econômico dos negócios de confecção, a prosperidade das confecções e consequente enriquecimento de alguns. (YUN. 2016, p.91) 
“Osimigrantes coreanos possuem uma instituição chamada kye, que capitaliza somas em dinheiro na comunidade coreana para que um dos membros possa iniciar um empreendimento. Esse tipo de recurso foi muito comum para a instalação das inúmeras confecções dirigidas por coreanos. ” (TOJI)
Há um grande estereótipo desse povo, já que muitas vezes, são vistos como fechados e reservados. Acredita-se que tal postura assumida é para tentar preservar a segurança física dos próprios. Dados levantados pela Secretaria de segurança apontam que de 50 assaltos a casa de Coreanos, 25 dos assaltos acontecem no bairro. Sendo esse o motivo pelo qual os coreanos são conhecidos por guardarem dinheiro em casa e não em bancos. Em uma reportagem para o site de notícias G1, o cônsul da Coréia, Young Jong Hong, afirmou “A comunidade coreana tem sido alertada, mas tem havido muitos crimes contra a comunidade coreana, mas o número de casos solucionados fica aquém do desejável. ” 
· O Bom Retiro dos Judeus e Italianos
No final do século XIX, intensificou-se um grande fluxo imigratório de europeus, principalmente pelos italianos, atraídos pela grande concentração de fábricas presente nos bairros. Os italianos em questão, por estarem habituados com o trabalho fabril - considerados respeitosos e bons trabalhadores pelos donos das fábricas – viam o bairro como uma área para habitarem e se desenvolverem no país. Até os anos 90, o número de italianos era considerado 70% dos imigrantes residindo no bairro. A rua onde a maior parte dessa população residia, foi de nomeada de Rua dos Italianos, uma das ruas mais longas e tradicionais do bairro. Na rua em questão, ainda é possível encontrar vestígios desses povos, com restaurantes típicos, bares, uma escola – que a princípio era para atender jovens italianos – e galpões de mecânicos, considerados como uma tradição dos italianos. (DERTÔNIO. 1971, p. 54)
A partir dos anos 20, a imigração de judeus para o bairro teve grande influência da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), muitos viam da Rússia, Polônia e Lituânia. No final dos anos 30, o fluxo aumentou devido a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), refugiados da perseguição que ocorria na Europa. 
“Os judeus que vieram para o Brasil (São Paulo e Rio) eram, em sua quase maioria absoluta, vindos do Shtetl, pequenas cidades ou aldeias da Europa Oriental e Central -Polônia, Bessarábia, Galícia, Lituânia -e pouquíssimos eram os judeus das grandes cidades, Varsóvia, Moscou, Paris, Vilna, Riga. ” (FEBROT, 1990)
Os judeus que chegaram ao bairro no final dos anos 30, viam seus conterrâneos que aqui já viviam como forma de auxílio e aproximação com as suas origens. Sem contar que os terrenos do bairro eram baratos e o centro era uma ótima região para a profissão de mascate ou para pequenos comércios. Hoje, na estrutura do bairro vemos a presença de sinagogas e escolas judaicas. Atualmente, os judeus não residem em grande número no bairro, mas ainda possuem grande parte do comércio.
· O bairro multicultural – Trocas Culturais
Em São Paulo, não há uma região com tanta diversidade de etnia e nacionalidades como no Bom Retiro. Portanto, trocas culturais entre as nacionalidades presente acaba por ser algo natural. Temos como exemplo, citado anteriormente, povos de países de cultura sul-americana que acabam até mesmo por residir na mesma casa. Um ponto que aproxima essas culturas no bairro é questão econômica inserida na região. David Harvey em “A produção capitalista do espaço”, alega que “a consciência dos moradores urbanos se influencia pelo ambiente da experiência, do qual nascem as percepções, as leituras, as trocas simbólicas e as aspirações” (HARVEY. 2005, p. 170) 
“Era comum também que os italianos ajudassem os judeus mascates, que costumavam frequentar suas casas para vender mercadorias. A colônia judaica também se abastecia de bebidas e alimentos nas vendas, armazéns, pastifícios e padarias do bairro, em boa parte de propriedade de italianos. No comércio, é notória a complementaridade dos negócios entre as duas etnias. A análise de levantamentos das firmas existentes no bairro em 1933 e 1945 mostra que enquanto os judeus concentravam cada vez mais seus negócios no ramo de confecções, os italianos distribuíam-se entre as fábricas e lojas de alimentos (sobretudo macarrão, pão, biscoitos, doces e bebidas) e as oficinas (de móveis, serralherias, fundições, marcenarias, sapatarias, tipografias etc.). Assim sendo, cada colônia, ao mesmo tempo que consumia produtos fabricados pela outra, também a tinha como cliente. ” (TRUZZI. 2001, p.156)
As primeiras trocas acontecem na infância. Acredita-se que no bairro, as crianças foram as primeiras a vivenciarem e transmitirem novas culturas pelo convívio nas ruas, parques e escolas da região. Paul Claval afirmava “A transmissão é feita em diversas etapas no decorrer da infância e da adolescência. A família tem um papel essencial durante a primeira infância. ” (CLAVAL. 2007, p.64)
O indivíduo, por sua vez, vai acumulando durante sua vida comportamentos que ele adquire, sendo assim, os filhos da primeira geração de imigrantes, que desembarcam no bairro, adquiriram esse multiculturalismo e foi passado para seus filhos, surgindo assim, uma nova geração de moradores, portando uma cultura híbrida e miscigenada.
“A cultura é a soma dos comportamentos, dos saberes, das técnicas, dos conhecimentos e dos valores acumulados pelos indivíduos durante suas vidas e, em uma outra escala, pelo conjunto dos grupos de que fazem parte. A cultura é uma herança transmitida de uma geração para outra. ” (CLAVAL. 2007, p.63)
Vemos que em uma trajetória do tempo, processos imigratórios de várias áreas do mundo fundaram a região mais cosmopolita do mundo. Culturas totalmente diferentes, hodiernamente, vivem em plena harmonia e cooperação entre si. Frequentam as mesmas escolas, mercados, lojas de roupa, bares e feiras, essa última é um ponto fundamental nas trocas culturais, pois em feiras culturais é aonde acontece o contato direto com a outra cultura, como exemplo, uma feira boliviana localizada na Rua Anhaia	 que ocorre aos sábados, onde sempre é possível ver a participação de outras nacionalidades. Outra feira também muito popular é a feira Coreana que acontece próxima ao metrô Tiradentes. Segundo Paul Claval “As culturas transformam-se, assim, segundo dois modos de evolução e de mudanças bruscas – da mutação ou da revolução. ”
· 
Procedimento metodológico
Para dar continuação a pesquisa e ir mais a fundo para entender as trocas culturais presentes no bairro, o melhor procedimento seria com a participação nas feiras culturais presentes no bairro e com um formulário de perguntas entrevistar os participantes tanto os que representam a cultura ali presente quanto os de outras culturas que estão ali para conhecer e desfrutar de coisas que não são tão presentes em suas próprias culturas. Outro procedimento primordial para completar o estudo é o uso da observação, pois assim é possível analisar como essas culturas interagem de um ponto de vista de fora dos participantes.
· Referências 
CHI, Jung Yun. O bom retiro dos coreanos: descrição de um enclave étnico. 245 f. Tese (Mestrado) - Faculdade de arquitetura e urbanismo da Universidade de São Paulo, 2016
CLAVAL, Paul. A geografia cultural. São Paulo: Editora da UFSC, 2007
CORINTHIANS. História do Corinthians. Disponível em: <http://www.corinthians.com.br/clube/historia>. Acesso: maio de 2017
DERTÔNIO, Hilário. Histórias dos bairros de São Paulo: O bairro do bom retiro. São Paulo: Prefeitura Municipal de São Paulo, 1971.
Fernandes, Sarah. Imigrantes tem pontos de encontro marcados em São Paulo. Disponível em: <boliviacultural.com.br/ver_noticias.php?id=286>. Acesso em: junho de 2017
G1 SÃO PAULO. Pelo menos 50 apartamentos de coreanos foram alvos de ladrões. Disponível em: http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2015/01/pelo-menos-50-apartamentos-de-coreanos-foram-alvo-de-ladroes.html. Acesso em junho de 2017
GERAQUE, Eduardo. Paraguaios disputam lugar de bolivianos no BomRetiro. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0708201112.htm>. Acesso em: maio de 2017
INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL (IPHAN). Inventário de Referências Culturais do Bom Retiro: “Multiculturalismo em Situação Urbana”. São Paulo, 2012
OLIVEIRA, Abrahão. O bairro multicultural de São Paulo – A história do Bom Retiro. Disponível em: <saopauloinfoco.com.br/o-bom-retiro/>. Acesso em: maio de 2017
TRUZZI, Oswaldo. Etnias em convívio: o Bairro do Bom Retiro em São Paulo. In: Estudos Históricos, nº 28, Rio de Janeiro.
ÚLTIMO SEGUNDO. Documentário mostra como vive a segunda geração de bolivianos em São Paulo. Disponível em: <ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/2013-09-27/documentario-mostra-como-vive-a-segunda-geracao-de-bolivianos-em-sao-paulo.html>. Acesso em maio de 2017
VIGGIANI, Edson. Bom Retiro: Imagens, culturas e identidades. São Paulo: Prolam, 2011
SÃO PAULO
IFSP
2017

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