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CURSO DE EXTENSÃO Módulo i - Unidade i Introdução SAFs em Regiões Semiáridas SAFs como estratégia de adaptação às mudanças climáticas Organização: Financiamento: Organização: Financiamento: Sistemas Agroflorestais em Regiões Semiáridas Dênis Antônio da Cunha 2 CURSO DE EXTENSÃO – SISTEMAS AGROFLORESTAIS EM REGIÕES SEMIÁRIDAS FICHA TÉCNICA Realização: Projeto AKSAAM – Adaptando Conhecimento para a Agricultura Sustentável e o Acesso a Mercados, Instituto de Políticas Públicas e Desenvol- vimento Sustentável - IPPDS/UFV, Fundação Arthur Bernardes - FUNARBE e Universidade Federal de Viçosa - UFV. Financiamento: Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola - FIDA Coordenador projeto AKSAAM: Marcelo José Braga Coordenadores curso: Ricardo Henrique Silva Santos e Alex Carlos Silva Pi- mentel Autor: Dênis Antônio da Cunha Layout: Adriana Helena de Almeida Freitas Diagramação: Bárbara Elen Sampaio Revisão linguística: Cinthia Maritz dos Santos Ferraz Machado Organização: Financiamento: Organização: Financiamento: Sistemas Agroflorestais em Regiões Semiáridas CURSO DE EXTENSÃO 3 Principais efeitos esperados da mudança climática no Semiárido brasileiro Aula IV SAFs como estratégia de adaptação às mudanças climáticas Atualmente, os diferentes meios de comunicação têm falado cada vez mais sobre mudança climática e seus impactos, em geral negativos, sobre a saúde das pessoas, agricultura e pecuária, elevação do nível do mar etc. De fato, esse é um fenômeno que tem causado uma série de dificuldades em todo o planeta, e seus efeitos tendem a se agravar, sobretudo, nas áreas semiáridas. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), o termo “mudança climática” indica as “transformações a longo prazo nos padrões de temperatura e clima” do planeta Terra. É importante esclarecer que: (i) “longo prazo” corresponde a décadas ou séculos; e (ii) “clima” se refere ao padrão de longo prazo do tempo. O tempo, por sua vez, é representado por realizações diárias/mensais de temperatura, chuva, velocidade do vento, umidade do ar etc. Diariamente os telejornais mostram as condições do tempo de diversas cidades ou regiões. Nossos smartphones também nos fornecem facilmente essas informações por meio de aplicativos específicos. Entretanto, para saber se uma localidade está sofrendo mudança climática, é preciso analisar uma série histórica de suas condições meteorológicas, como será demonstrado a seguir. Dom Seg Ter Qua Qui Sex Sab 4 Uma das principais manifestações da mudança do clima é a elevação da temperatura terrestre, o que os cientistas chamam de aquecimento global. Embora dias e períodos muito frios continuem acontecendo, quando se analisa a tendência da temperatura ao longo do tempo, é perceptível seu aumento gradual. Observe a Figura 1. Ela mostra a evolução da temperatura média anual no Brasil e em algumas cidades de diferentes regiões do país nos últimos 40 anos. É fácil perceber que a cada ano o valor médio da temperatura está maior, até mesmo em cidades que são conhecidas por seus invernos rigorosos. Figura 1. Temperatura média anual em municípios brasileiros selecionados, de 1980 a 2020 Campos do Jordão - SP 0,36°C por década Juazeiro - BA 0,18°C por década Santarém – PA 0,24°C por década Gramado – RS 0,25°C por década Urupema – SC 0,30°C por década Rondonópolis – MT 0,31°C por década Mossoró - RN 0,17°C por década Rio de Janeiro - RJ 0,33°C por década 5 Fonte: ClimateCHIP (2022) Para compreender as causas do aquecimento global e das mudanças climáticas, podemos novamente recorrer às explicações da ONU: Essas mudanças podem ser naturais, como por meio de variações no ciclo solar. Mas, desde 1800, as atividades humanas têm sido o principal impulsionador das mudanças climáticas, principalmente devido à queima de combustíveis fósseis como carvão, petróleo e gás. A queima de combustíveis fósseis gera emissões de gases de efeito estufa que agem como um grande cobertor em torno da Terra, retendo o calor do sol e aumentando as temperaturas. Exemplos de Campos do Jordão - SP 0,36°C por década Juazeiro - BA 0,18°C por década Santarém – PA 0,24°C por década Gramado – RS 0,25°C por década Urupema – SC 0,30°C por década Rondonópolis – MT 0,31°C por década Mossoró - RN 0,17°C por década Rio de Janeiro - RJ 0,33°C por década 6 emissões de gases de efeito estufa que estão causando mudanças climáticas incluem dióxido de carbono e metano. Isso vem do uso de gasolina para dirigir um carro (...), por exemplo. O desmatamento de terras e florestas também pode liberar dióxido de carbono. (...) Energia, indústria, transporte, edificações, agricultura e uso da terra estão entre os principais emissores (ONU, 2022, s.p.). Os cientistas são unânimes em afirmar que a mudança climática afeta mais negativamente os países em desenvolvimento e as regiões pobres em geral. Entre as explicações para esse fato está sua localização geográfica em áreas onde as condições do clima já são naturalmente adversas, como as regiões semiáridas. Além disso, a maior parte dos países nessas regiões depende muito das atividades agrícolas para a geração de emprego e renda. A agricultura, por depender diretamente de boas condições ambientais (em especial chuva, temperatura e solos férteis), tende a ser bastante prejudicada pelas mudanças do clima, piorando a situação econômica dos países pobres (TOL, 2018). O Semiárido brasileiro está bastante exposto à mudança climática. Nos últimos anos, a região tem enfrentado longos períodos de seca e aumento constante de sua temperatura média anual. Resultados de pesquisa sintetizados por Da Cunha (2022) indicam, por exemplo, que o número de dias secos consecutivos aumentou aproximadamente 15% entre o fim da década de 1990 e meados dos anos 2010. Ademais, o número de dias muito quentes, em que a temperatura média ultrapassa certo limite máximo histórico, vem aumentando continuamente desde a década de 1980, ao passo que o número de dias e noites frias tem diminuído. Os cientistas também estimam que a mudança climática irá se agravar no futuro. As Figuras 2, 3, 4, 5 e 6 apresentam algumas simulações divulgadas pelo Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC, na sigla em inglês) sobre o comportamento de variáveis climáticas na região semiárida do Brasil. 7 O Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) é um órgão da ONU que tem como objetivo analisar e divulgar a produção científica global sobre mudança climática. A entidade foi criada em 1988 e conta com o apoio de 195 países membros da ONU. Milhares de cientistas de todo o mundo contribuem voluntariamente para o trabalho do IPCC, revisando pesquisas e sistematizando o conhecimento sobre as causas das mudanças do clima, seus impactos, riscos futuros e como os efeitos negativos podem ser minimizados. Em função de sua natureza intergovernamental, o IPCC fornece informações científicas rigorosas que podem contribuir para a formulação de políticas pelos governantes ao redor do planeta (IPCC, 2021). Figura 2. Evolução da precipitação anual acumulada no Semiárido brasileiro em cenários futuros de mudança climática, 2025 a 2065 Figura 3. Número anual de dias secos consecutivos no Semiárido brasileiro em cenários futuros de mudança climática, 2025 a 2065 Fonte: Cunha (2022). Fonte: Cunha (2022). 8 Figura 4. Número anual de dias secos consecutivos no Semiárido brasileiro em cenários futuros de mudança climática, médias decenais de 2025 a 2064 Figura 5. Evolução da temperatura média anual no Semiárido brasileiro em cenários futuros de mudança climática, 2025 a 2065 Figura 6. Número anual de dias quentes (temperatura média acima do máximo histórico) no Semiárido brasileiro em cenários futuros de mudança climática, 2025 a 2065 Fonte: Cunha (2022). Fonte: Cunha (2022). Fonte: Cunha (2022). 9 Independentemente de se considerar uma previsão mais ou menos pessimista, pode-se afirmarque há expectativa de elevação da temperatura média, aumento do número de dias muito quentes, mais ondas de calor, redução e maior variabilidade anual das chuvas e mais dias secos consecutivos. Se essas previsões se confirmarem, pode haver “empobrecimento dos solos, perda de biodiversidade, redução na recarga de aquíferos, além da queda na produção das culturas agrícolas”, ou seja, muitos prejuízos à segurança hídrica e alimentar e ao desenvolvimento socioeconômico regional (MANCAL et al., 2016, p. 258). SAFs para adaptação e resiliência à mudança climática O aquecimento global e os longos períodos de seca, fenômenos cada vez mais observados no Semiárido, diminuem a produtividade agrícola e a renda dos agricultores e agricultoras. Com maior variabilidade climática e mais eventos extremos, a capacidade de planejamento das atividades agrícolas fica comprometida, o que causa perdas econômicas adicionais. Esses impactos tendem a diminuir a oferta de alimentos, o que pode levar ao aumento de seus preços e, assim, prejudicar a segurança alimentar da população, sobretudo das famílias mais pobres (CUNHA, 2022). Para minimizar os efeitos negativos da mudança climática na agricultura do Semiárido brasileiro é preciso investir em estratégias adaptativas. Adaptação corresponde às “iniciativas e medidas para reduzir a vulnerabilidade dos sistemas naturais e humanos frente aos efeitos atuais e esperados da mudança do clima” (BRASIL, 2009). Em outras palavras, para se adaptar, os indivíduos precisam identificar e realizar estratégias que possam diminuir os impactos negativos associados à mudança climática (atuais ou previstos para o futuro) e, ao mesmo tempo, explorar possíveis oportunidades benéficas de convivência com o fenômeno. Atividades adaptativas exitosas podem dinamizar a economia regional e melhorar a qualidade de vida da população (IPCC, 2014). Agricultoras e agricultores do Semiárido já realizam diversas atividades de adaptação que podem ser consideradas espontâneas, ou seja, aquelas que dizem respeito à convivência com as condições naturais da região (CUNHA, 2022). 10 Alguns exemplos são: • Ajustamento da época das atividades agrícolas; • Aumento da diversificação produtiva; • Utilização de variedades de sementes e animais mais resistentes às condições locais; • Estocagem de sementes crioulas para manter a riqueza genética regional; • Investimento em práticas de conservação do solo; • Utilização de fertilizantes e defensivos agrícolas naturais; • Coleta e armazenamento de água da chuva para irrigação; • Reuso de água; • Organização e fortalecimentos de associações e cooperativas de agricultores para compra de insumos e comercialização de produtos; • Beneficiamento e agregação de valor a produtos locais. • Ajustamento da época das atividades agrícolas • Utilização de fertilizantes e defen- sivos agrícolas naturais • Reuso de água; • Organização e fortalecimentos de associações e cooperativas de agri- cultores para compra de insumos e comercialização de produtos • Estocagem de sementes crioulas para manter a riqueza genética regional • Aumento da diversificação pro- dutiva • Utilização variedades de se- mentes e animais mais resistentes às condições locais • Investimento em práticas de conservação do solo • Coleta e armazenamento de água da chuva para irrigação • Beneficiamento e agregação de valor a produtos locais. . 11 Tratando especificamente da estratégia de diversificação produtiva, pode-se afirmar que os sistemas agroflorestais (SAFs) possuem grande potencial para minimizar os efeitos negativos da mudança climática no Semiárido brasileiro, pois associam ganhos de produtividade e diversidade agrossistêmica. De modo geral, os SAFs garantem benefícios ambientais, econômicos e sociais. Ademais, os SAFs são considerados uma técnica agrícola de baixa emissão de carbono, pois aumentam a remoção atmosférica de dióxido de carbono (CO2) pela vegetação e pelo solo (SCHEMBERGUE et al., 2017; MAIA et al., 2021). Portanto, além de medida de adaptação, também contribuem para as estratégias de mitigação das mudanças climáticas, tornando o setor agrícola mais sustentável (Figura 7). Figura 7. Sinergias entre Sistemas Agroflorestais e Sustentabilidade Sistemas Agroflorestais Adaptação Mitigação Prosperidade econômica Conversação ambiental Desenvolvimento humano SUSTENTABILIDADE Considerando a multidimensionalidade do conceito de sustentabilidade (melhoria das condições econômicas associada à proteção social e ambiental), podemos listar os principais benefícios dos SAFs. 12 BENEFÍCIOS AMBIENTAIS: Recuperação de terra degradadas; Reflorestamento e manutenção das florestas existentes; Restauração ecológica da Caatinga; Ampliação da Biodiversidade; Preservação de espécies ameaçadas; Conservação da água e do solo; Fixação biológica de carbono e nitrogênio; Reciclagem de nutrientes e biorremediação do solo; Preservação e ampliação da oferta de serviços ecossistêmicos. BENEFÍCIOS ECONÔMICOS E SOCIAIS: Aumento da produtividade e da lucratividade por unidade de área; Diversificação e aumento da renda agrícola; Criação de mais empregos no meio rural; Mais oportunidades para a juventude do campo; Redução dos riscos de perdas de renda por eventos climáticos extremos; Minimização de perdas por variações no mercado de produtos agrícolas; Agregação de valor aos produtos; Empoderamento feminino; Alinhamento entre as práticas produtivas e as exigências da legislação ambiental. 13 Ao conciliar recuperação e conservação do bioma Caatinga com diversificação produtiva, aumento da oferta de serviços ecossistêmicos, estoque de carbono e melhoria das condições de vida da população, os SAFs podem ser considerados como uma estratégia integral de adaptação (PBMC/BPBES, 2018). Ademais, os SAFs representam um “mecanismo de inclusão social para pequenos produtores de baixa renda por meio da valoração de produtos ‘naturais’, associada à conservação da biodiversidade e de serviços ambientais” (CUADRA et al., 2018, p. 39). Por todas essas características positivas, e diante das expectativas de agravamento dos cenários futuros de mudança climática, desenvolver políticas públicas que aumentem a adoção de SAFs no Semiárido é fundamental para o desenvolvimento sustentável da região. Quer saber mais sobre mudança climática, adaptação, mitigação e sustentabilidade? A seguir estão listados alguns portais com muitas informações interessantes: • Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais – Rede Clima: http://redeclima.ccst.inpe.br/ • Plataforma AdaptaCLIMA: http://adaptaclima.mma.gov.br/ • Objetivos de Desenvolvimento Sustentável no Brasil (ONU): https://brasil.un.org/pt-br/sdgs SAIBA MAIS: 14 Referências AZEVEDO, J. O que é biorremediação e quais seus princípios? 2022. Disponível em: https://www.ecycle.com.br/biorremediacao/. Acesso em: 16 mar. 2022. BRASIL. Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC. Lei nº 12.187, de 29 de dezembro de 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ ato2007-2010/2009/lei/l12187.htm. Acesso em: 14 mar. 2022. CLIMATECHIP. Your Area: Today. 2022. Disponível em: https://www.climatechip. org/your-area. Acesso em: 17 mar. 2022. CUADRA, S. V.; HEINEMANN, A. B.; BARIONI, L. G.; MOZZER, G. B.; BERGIER, I. (Ed.). Ação contra a mudança global do clima: contribuições da Embrapa. Brasília, DF: Embrapa, 2018. CUNHA, D. A. da. Mudanças climáticas e convivência com o Semiárido brasileiro. Viçosa, MG: IPPDS, UFV, 2022. IPCC - Intergovernmental Panel on Climate Change. What is the IPCC? 2021. Dis- ponível em: https://www.ipcc.ch/site/assets/uploads/2021/07/AR6_FS_What_is_ IPCC.pdf. Acesso em 14 mar. 2022. MAIA, A. G.; EUSEBIO, G. S.; FASIABEN, M. C. R.; MORAES, A. S.; ASSAD, E. D.; PUG- LIERO, V. S. The economic impacts of the diffusion of agroforestry in Brazil. Land Use Policy, v. 108, e- 105489, 2021. MANCAL,A.; LIMA, P. V. P. S.; KHAN, A. S.; MAYORGA, M. I.de O. À espera da seca que vem: capacidade adaptativa em comunidades rurais do semiárido. Revista Brasileira De Estudos De População, v. 33, n. 2, p. 257-281, 2016. ONU - Organização das Nações Unidas. O que são as mudanças climáticas? 2022. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/150491-o-que-sao-mudancas-climati- cas. Acesso em 17 mar. 2022. PBMC/BPBES - Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas; Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos. Potência Ambiental da Biodiversi- dade: um caminho inovador para o Brasil. Rio de Janeiro, RJ: COPPE, UFRJ, 2018. SCHEMBERGUE, A.; CUNHA, D. A. da; CARLOS, S. M.; PIRES, M. V.; FARIA, R. M. Sis- temas Agroflorestais como Estratégia de Adaptação aos Desafios das Mudanças Climáticas no Brasil. 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