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116 DESIGUALDADE DE RENDA NO BRASIL

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DESIGUALDADE DE RENDA NO BRASIL 
Uma das mais importantes mudanças pelas quais o Brasil vem passando nos 
últimos anos é o processo de queda contínua e significativa da concentração de renda. 
De fato, as medidas de desigualdade de renda familiar per capita confirmam que a 
trajetória de queda, iniciada em meados da década de 1990, assume uma intensidade 
inequivocamente mais acentuada a partir de 2001, assim permanecendo durante os 
anos subseqüentes, até 2005. Um dos resultados desse processo é que, nesse ano, 
a desigualdade alcançou seu menor nível nas últimas três décadas. 
 No entanto, apesar dos avanços, a concentração de renda brasileira ainda é 
extremamente alta, encontrando-se o Brasil entre os países com mais elevados níveis 
de desigualdade. A fim de melhor conhecer e compreender esse processo, o Ipea, por 
iniciativa de meu antecessor, Glauco Arbix, elaborou um estudo discutido por vários 
especialistas nacionais e internacionais, os quais integraram um Comitê de Alto Nível, 
reunido em meados de 2006 no Rio de Janeiro e coordenado pela professora Manuela 
Carneiro da Cunha – “Sobre a Recente Queda da Desigualdade de Renda no Brasil”, 
nota técnica acessível na página do Ipea desde agosto de 2006, e que também abre 
a presente coletânea. 
Ao longo da elaboração do estudo, procurou-se aferir de modo rigoroso as 
dimensões daquele movimento, bem como estabelecer e mensurar vínculos de 
causalidade com os seus determinantes, com o intuito de colaborar efetivamente para 
o aprimoramento das políticas públicas que possam estimular ainda mais a queda na 
concentração de renda no país. 
Em linhas gerais, conclui-se que os fatores responsáveis por tal redução 
acentuada na desigualdade são múltiplos, o que deve favorecer sua continuidade. 
Essa questão é absolutamente fundamental, pois, apesar dos avanços, o Brasil ainda 
se encontra entre os países mais desiguais do mundo. Segundo dados do último 
Relatório de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o 
Desenvolvimento (Pnud), ocupamos hoje uma perturbadora oitava pior colocação 
entre os 124 países para os quais há informações. Não por acaso nossa tradição de 
pesquisa no tema é vasta e antiga, com os primeiros estudos empíricos remontando 
ao princípio da década de 1970. 
 
 
A partir de 2001, qualquer que seja a medida de desigualdade considerada se 
observará sempre um declínio contínuo e acentuado. O coeficiente de Gini, por 
exemplo, indica uma queda de quase 5% no período. Dos 74 países para os quais se 
têm informações sobre a evolução do coeficiente de Gini ao longo da última década, 
menos de um quarto teve desempenho superior ao do Brasil no quadriênio 
mencionado. Nessa primeira parte, demonstram-se também a significância estatística 
da queda na desigualdade, bem como a fidedignidade das informações comumente 
utilizadas no País para medi-la. 
Como no caso de qualquer política pública, a efetividade do salário mínimo não 
depende apenas de seu impacto. Depende também da relação entre seu custo e sua 
eficácia para reduzir a desigualdade de renda. Mesmo que aumentos no salário 
mínimo levem a reduções no grau de desigualdade, é possível que existam outros 
instrumentos que, com o mesmo volume de recursos, permitam alcançar reduções 
ainda mais significativas na desigualdade. Nessa última parte, demonstra-se que, no 
combate à desigualdade e à pobreza, programas de transferência bem focalizados – 
como o Bolsa Família – constituem instrumentos muito mais efetivos que o salário 
mínimo. 
Ressaltamos, por fim, que com esta coletânea acreditamos estar cumprindo 
uma das principais missões do Ipea: criar redes de discussão, com forte conteúdo 
analítico, sobre temas fundamentais para a sociedade brasileira. Esperamos que os 
resultados aqui apresentados possam contribuir para o aprimoramento das políticas 
públicas e, dessa forma, acelerar o processo de redução da extrema desigualdade de 
renda que ainda prevalece no País. 
Pesquisas domiciliares com cobertura nacional representam a melhor fonte de 
informação para medir o grau de desigualdade de um país. No caso do Brasil, a Pnad 
constitui a principal fonte de in - formação sobre desigualdade disponível, sendo 
internacionalmente reconhecida como uma fonte de dados de excelente qualidade. 
Não obstante, assim como ocorre em todas as pesquisas domiciliares, a Pnad 
apresenta limitações. Este capítulo teve por objetivo avaliar em que medida essas limi 
- tações implicam uma significativa subestimação do grau de desigual - dade de renda 
existente no País. Em particular, procuramos investigar se essas limitações poderiam 
 
 
ter levado a uma superestimação da que - da recente na desigualdade de renda 
estimada com base nos dados da Pnad. 
Para tanto, comparamos os dados dessa pesquisa com duas fon - tes de dados 
mais abragentes e de natureza completamente distinta: a POF e o SCN. Enquanto a 
primeira é uma pesquisa domiciliar, cujo principal objetivo é colher informações 
detalhadas relativas ao padrão de consumo, ao dispêndio e à renda das famílias 
brasileiras, a segunda constitui uma sistematização e uma consolidação dos 
agregados macroeconômicos em um dado ano (com informações sobre o produto, a 
renda e a despesa). 
Os resultados da comparação entre Pnad e POF revelam que, de fato, esta 
segunda tem uma maior capacidade de captar a renda das famílias, apresentando 
uma renda total 26% maior do que aquela obtida pela Pnad. Esse resultado, contudo, 
é decorrência da subesti - mação da renda tanto de pobres quanto de ricos, em que o 
efeito mais forte incide sobre o décimo mais pobre. 
Como resultado, ao com - pararmos o grau de desigualdade de renda obtido 
pela POF e pela Pnad, temos que o grau de desigualdade (medido pelo coeficiente 
de Gini) é virtualmente idêntico. Mais ainda, quando consideramos medidas que 
conferem grande peso às informações na cauda inferior da distribuição, os resultados 
indicam que o grau de desigualdade de renda na Pnad está sobrestimado.

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