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Teorias Literárias Brasileiras

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► Resenha dos textos Literatura como sistema (Antônio Cândido) e Formação da literatura brasileira (Afrânio Coutinho).
Tomando como referência os autores Antônio Cândido e Afrânio Coutinho, traçarei um perfil das duas principais teorias a respeito da formação da literatura brasileira, concluindo com uma breve análise sobre seus pontos divergentes e relevantes sob o meu ponto de vista. 
Tendo sido o texto Formação da literatura brasileira, de Coutinho, uma resposta ao Literatura como sistema, de Cândido, começarei minha digressão por este. O cerne da sua concepção é a literatura como sistema – constituído por autor, obra e público leitor –, perpassado pela consciência de grupo, pela idéia de nação. Esse sistema a que ele se refere é simbólico, é guiado por elementos sócio-históricos, pelos efeitos da experimentação de uma realidade em comum sobre uma comunidade. Dessa forma, Antônio Cândido vê a literatura como resultado de um processo de civilização, no qual a população cria uma associação cultural e uma identidade nacional. Isto é refletido na sua produção literária, na qual se verifica a consciência dos autores de pertencerem a um grupo e o compromisso de escreverem para esse grupo específico, buscando a construção e transmissão de uma corrente contínua de obras, formando uma tradição, ancorada na própria cultura vivenciada pelos membros do sistema.
Aplicando essateoria à realidade brasileira, Cândido entende que só teremos a literatura propriamente dita a partir dos românticos. Antes deles, o que ocorre são apenas manifestações literárias, ou seja, obras isoladas, sem embutir em seu conteúdo o senso de missão, sem retratar uma identidade compartilhada por autor e público. Sem, por fim, compreenderem um sistema.
Afrânio Coutinho rebate a visão de Antônio Cândido defendendo o conceito de transmigração / transfiguração. De acordo com essa percepção do processo de formação da literatura, a escrita sofre influência direta e inevitável do ambiente, do clima, da paisagem, dos contatos interpessoais, etc.. Sendo assim, a primeira “manifestação literária” em solo brasileiro deve ser considerada sim parte da literatura que aqui se desenvolveu, pois já teria adquirido características próprias. “A literatura brasileira não começou no momento arcádico-romântico. Vem de antes, partiu do instante em que o primeiro homem europeu aqui pôs o pé, aqui se instalou, iniciando uma nova realidade histórica, criando novas vivências, que traduziu em cantos e contos populares, germinando uma nova literatura.”
Coutinho aponta ainda um traço preconceituoso na tese de Cândido: incapaz de se desprender de uma perspectiva colonizadora sobre o que é a literatura brasileira, não admitindo que as produções coloniais são fruto de um homem novo, o homem brasileiro, concebido nomomento em que aqui se instalou. Sua escrita, portanto, descaracteriza-se como literatura estrangeira / portuguesa.
Com base nessa curta explanação acima, podemos indicar o caráter humano usado como critério para definir a formação da literatura brasileira em ambas teorias. Tanto Cândido quanto Coutinho entendem que as obras contam com a interferência do que é vivido e sentido pelos autores em terras brasileiras e retratam as experiências da (nova) realidade. Todavia, Afrânio Coutinho não se atém à racionalidade do processo tal como Antônio Cândido. Este considera o início de formação de uma tradição literária nacional a partir da consciência de haver uma nação em si. Não nega o valor de certas “manifestações literárias”, apenas estas não podem ser integradas à definição de literatura brasileira, pois isto abarca imbuir-se efetivamente de seu valor cultural e responsabilizar-se por ele. É isto que atribui identidade, o que singulariza as literaturas nacionais.
Afrânio Coutinho, a meu ver, peca por uma simplificação ao juntar todas as obras em um mesmo nicho. As intenções e características das escritas coloniais não encontram continuidade nas produções genuinamente brasileiras, estão claramente servindo à metrópole portuguesa, voltadas para outro público. Portanto, enquadrá-las em uma mesma significação compromete o entendimento do que é a literatura desenvolvida no Brasil para brasileiros.

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