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IMUNOLOGIA AULA 5 Profª Stephanie Von Stein Cubas Warnavin 2 CONVERSA INICIAL Nesta aula, abordaremos uma parte do sistema imunológico que é crucial para mediar processos inflamatórios e combater antígenos patogênicos: o sistema complemento. Aqui, veremos o que é esse sistema, como funciona e quais são seus mecanismos de ação. Além disso, abordaremos o complexo de histocompatibilidade e qual a sua importância na prática. Para isso, dividiremos esta aula em: • Sistema complemento: conceito e funções; • Sistema complemento: vias de ativação; • Mecanismos efetores mediados pelo sistema complemento; • Sistema complemento: destruição de agentes infecciosos; • Complexo de histocompatibilidade. TEMA 1 – SISTEMA COMPLEMENTO: CONCEITO E FUNÇÕES O sistema complemento é o principal mediador do processo inflamatório junto aos anticorpos. É um importante componente efetor da imunidade inata e um modulador vital da resposta imune adaptativa. Tem a capacidade de reconhecer e eliminar microrganismos, imunocomplexos e também células apoptóticas. Considerando que este fornece uma primeira linha de defesa contra antígenos, a deficiência de uma de suas proteínas, como imunodeficiências primárias ou genéticas, pode levar a quadros infecciosos graves. É formado por um conjunto de mais de 30 proteínas séricas que são sintetizadas principalmente no fígado e que, ao serem ativadas, interagem entre si de forma sequencial, originando uma série de reações em cascata com produção de diferentes fragmentos proteicos que são capazes de provocar diferentes efeitos biológicos, entre os quais podemos destacar a destruição de membranas celulares de microrganismos, como bactérias, por exemplo; o aumento da atividade fagocitária celular e a indução de reações inflamatórias. As proteínas do sistema complemento se encontram no plasma sanguíneo, em outros líquidos corporais, na superfície celular e em tecidos. Esse sistema pode agir sozinho ou com anticorpos. Apresenta três vias que são responsáveis por suas atividades: via clássica, via alternativa e a via das lectinas. A via clássica é ativada por complexos imunes, principalmente por complexos 3 antígeno-anticorpo e imunoglobulinas agregadas, enquanto as vias alternativa e lectinas são ativadas por microrganismos. A outra via, chamada de via do ataque à membrana (via lítica), que faz parte da cascata final, será abordada em outro momento. Todas essas vias de ativação convergem para esta etapa final de reação em cadeia denominada sequência comum, com a formação do complexo de ataque à membrana (MAC). Grande parte dos componentes do sistema complemento é designada pela letra C, seguida por números – C1, C2, C3, C4, C5, C6, C7, C8 e C9. Os componentes são clivados em frações, as quais são designadas pelas letras iniciais do alfabeto, como C3a e C3b. Há a presença de fatores B e D, que são a properdina e a lectina ligante da manose, respectivamente. Há também os zimógenos, que consistem em várias proteínas do complemento que são proteases capazes de se autoativarem. As proteínas do Sistema Complemento, bem como suas vias e funções, estão descritas no esquema a seguir (figura 1). Figura 1 – Proteínas do sistema complemento e suas respectivas funções 4 Crédito: Stephanie Von Stein Cubas Warnavin. As propriedades do sistema complemento consistem em: • Amplificação das respostas por meio de uma cascata enzimática; • Utilização de vias diferentes de ativação; • Limitação do início da cascata a certos sítios localizados onde poderão ser mais úteis; • Regulação da resposta ao invasor a partir de suas funções biológicas; • Regulação de sua resposta por proteínas solúveis e associadas à membrana celular. Compreender o sistema complemento é de grande importância para compreender de forma mais clara a patogênese de doenças autoimunes, em que qualquer anormalidade nas concentrações plasmáticas ou no funcionamento das proteínas componentes do sistema complemento já é suficiente para provocar danos em tecidos próprios. Esse conhecimento se faz importante também no desenvolvimento de terapias que interfiram na cascata do sistema complemento e forneçam maior controle de doenças. 5 TEMA 2 – SISTEMA COMPLEMENTO: VIAS DE ATIVAÇÃO O complemento faz parte da resposta imunológica inata, porque seus componentes já estão presentes desde o nascimento e a cascata de ativação ocorre sempre da mesma forma. A ativação da cascata do sistema complemento pode ser iniciada através da via clássica (dependente de anticorpo), via alternativa (espontânea) ou via da lectina (mediada pela ligação da lectina- manose) (Figura 2). Figura 2 – Vias de ativação Crédito: Stephanie Von Stein Cubas Warnavin. As três vias finalizam com o componente C9, resultando no ataque à membrana do antígeno. A via clássica é o ponto de união entre as repostas inatas e adaptativas, pelo fato de necessitar de imunoglobulinas para sua ativação. 2.1 Via clássica do sistema complemento A via clássica inicia-se pelo componente C1 (C1q) e termina no C9. É desencadeada por meio do reconhecimento de complexos formados por 6 antígenos e anticorpos. O reconhecimento é feito pela proteína C1, que se liga à porção constante (Fc) das imunoglobulinas IgG e IgM. A porção variável da Ig (Fab) se une ao antígeno. Várias outras substâncias, como os complexos da Proteína C-Reativa (PCR), determinados vírus e bactérias gram-negativas, também podem ativar essa via, independentemente da presença das Igs. O C1 consiste em um complexo molecular dependente de íons de cálcio (Ca+2) que se forma quando duas moléculas de C1r e duas moléculas de C1s se ligam à proteína C1q. Quando o C1q (proteína reconhecedora) liga-se a uma substância ativadora da via clássica, ocorre uma mudança conformacional nessa molécula, permitindo que o C1r se torne ativo e hidrolise a proenzima C1s que possui atividade de serino-protease após ser clivada. O C1s ativado hidrolisa então o componente solúvel C4, formando o fragmento C4b que irá se ligar, de um modo inespecífico, próximo ao local de ativação. O componente C2 irá se ligar ao C4b depositado e então também será clivado por C1s, o que ocasionará a formação de C4bC2a, a C3-convertase da via clássica. Essa convertase possui atividade de serino-protease, uma vez que o fator C2a presente é capaz de clivar e ativar o C3 solúvel na presença de íons magnésio (Mg+2). A hidrólise de C3 gera o fragmento C3a, que é liberado de forma solúvel, e o fragmento C3b, que, de um modo semelhante ao C4b, liga-se próximo à superfície de ativação. O complexo C4bC2a pode gerar inúmeras moléculas de C3b que irão se depositar na superfície do agente patogênico, opsonizando esse microrganismo e favorecendo a sua ingestão por fagócitos. Quando uma molécula de C3b se liga próximo ao C4b presente no complexo, forma-se então a C5-convertase da via clássica (C4bC2aC3b). O C4b e o C3b desse novo complexo se ligam ao C5 solúvel no plasma e orientam esse componente para ser clivado por C2a e posterior deposição do C5b e liberação do C5a (Figuras 3, 4 e 5). 7 Figura 3 – Representação do início da ativação da via clássica Crédito: Stephanie Von Stein Cubas Warnavin. Figura 4 – Sequência da via clássica Crédito: Stephanie Von Stein Cubas Warnavin. 8 Figura 5 – Sequência da via clássica Crédito: Stephanie Von Stein Cubas Warnavin. Com a dissociação de C5, inicia-se uma etapa comum a todas as vias de ativação do complemento, na qual a fração C5b interage com C6, abrindo um sítio de ligação para C7. Por sua vez, o complexo C5bC6C7 deposita-se na superfície da membrana e abre o sítio de ligação para C8, que penetra na membrana da célula. O C8, então, abre um sítio para C9, que, após a ligação devários C9, forma um canal transmembrânico ou poro hidrofílico, chamado de complexo de ataque à membrana (MAC), ocasionando lise celular e desequilíbrio osmótico. É importante ressaltar que, no curso da cascata do sistema complemento, os fragmentos menores C4a, C2a, C3a e C5a liberados no interstício são potentes mediadores inflamatórios. 2.2 Via alternativa do sistema complemento A via alternativa é ativada independentemente de anticorpos, mesmo que também possa ser ativada por complexos imunes contendo IgG, IgA e IgE, quando estes estão relacionados com inúmeras substâncias presentes na superfície de bactérias, vírus, protozoários, fungos e outros parasitas. 9 A via alternativa é constantemente ativada, sendo descrita como a mais antiga evolutivamente e a mais utilizada no combate aos patógenos. É ativada pela ligação hidrólise espontânea da ligação tiól-éster, gerando como produto o C3(H2O). O C3(H2O), junto a mudanças conformacionais, é capaz de ligar-se ao Fator B, que consiste em uma proteína plasmática, uma pró-enzima que interage com superfície do C3(H2O), resultado na formação do C3(H2O)B, que é clivado pelo Fator D, outra enzima que está situado no plasma, formando fragmentos Ba e Bb. O fragmento Bb permanece ligado ao C3(H2O), formando o C3(H2O)Bb, chamado de C3-convertase, que na presença de íons de Magnésio, atua como serino – protease, clivando C3 em C3a C3b. O fragmento C3b pode, ainda, interagir com o Fator B, formando o C3bBb, uma vez que isso ocorra, poderá ser clivado também pelo Fator D em fragmentos Bb e Ba, resultando em C3bBb que atua como uma C3-convertase, clivando mais moléculas C3 e ampliando assim a via de ativação. É importante ressaltar que a C3-convertase da via alternativa é extremamente instável e, por esse motivo, costuma sofrer rápida dissociação. No entanto, uma proteína plasmática chamada de properdina se liga a essa convertase e a estabiliza, diminuindo sua degradação e permitindo a continuação da cascata. Nessa via, alguns C3b se ligam ao C3bBb e formam a C5-convertase (C3bBbC3b). Esse complexo cliva C5 em C5a e C5b, dando início à sequência comum, onde C5b inicia o complexo de ataque à membrana, ligando-se à C6, C7, C8 e C9, seguindo a via comum do complemento (Figura 6). 10 Figura 6 – Sequência via alternativa Crédito: Stephanie Von Stein Cubas Warnavin. Estima-se que a via alternativa seja responsável por cerca de 80% dos produtos gerados pela ativação do complemento, sendo também um dos principais ativadores da inflamação. 2.3 Via das lectinas A via das lectinas é ativada em resposta ao reconhecimento da lectina ligante de manose (MBL) de polissacarídeos microbianos presentes em vários patógenos, como bactérias, leveduras, protozoários e vírus. A MBL é uma proteína que pertence à família das colectinas e, quando está na presença de íons cálcio, é capaz de se ligar a N-acetilglicosamina, frutose e resíduos de manose de polissacarídeos. A MBL possui uma estrutura semelhante à de C1q. Essa proteína está associada a serino-proteases (MBL-associated serine protease) conhecidas como MASP-1, MASP-2 e MASP-3, sendo que MASP-1 e MASP-2 têm papel 11 mais destacado nessa via. A MASP-1 é uma molécula composta por uma cadeia pesada e uma leve, sendo responsável pela atividade proteolítica. A MASP-2 é formada por duas cadeias (cadeia A e a cadeia B). A MASP-1 e a MASP-2 possuem estruturas e funções semelhantes àquelas encontradas em C1r e C1s. A MBL, ao se ligar ao açúcar presente na parede celular do patógeno, sofre uma mudança conformacional, e sua proteína associada MASP-2 é alterada estruturalmente, tornando-se ativa. Dessa forma, a MASP-2 será responsável por clivar o componente C4 em C4a e C4b. O fragmento C4b irá se depositar covalentemente no local da sua ativação, seguido pela ligação de C2. É essa ligação que permite que a MASP-2 atue também sobre a cadeia α polipeptídica única de C2, clivando essa proteína em C2a e C2b. O fragmento C2a permanece associado ao fragmento C4b, resultando em C4b2a, que atua como uma C3-convertase clivando a cadeia α de C3 em C3a e C3b. O fragmento C3b se liga à C4b2a formando C4b2a3b, que por sua vez atua como uma C5-convertase clivando o componente C5 em C5a e C5b. Novamente o fragmento C5b irá se ligar à C6 e C7, C7 se liga à C8 que se liga sequencialmente a várias proteínas C9, formando assim o MAC (Figura 7). Assim como MBL, as ficolinas também pertencem à família das colectinas, compartilhando com elas a presença de uma região estruturalmente semelhante ao colágeno e um domínio globular com afinidade a determinados carboidratos presentes em abundância em certos patógenos. Quando ocorre a ligação desse domínio globular ao patógeno, ocorre também a ativação da MASP-2 desencadeando uma atividade proteolítica contra os componentes C2, C4 e C3, iniciando a ativação da via das lectinas e a resposta imune contra o patógeno. 12 Figura 7 – Sequência via das lectinas Crédito: Stephanie Von Stein Cubas Warnavin. 2.4 Formação do MAC Todas as vias do sistema complemento culminam em uma via terminal comum e na formação do MAC. A C5-convertase gerada pelas vias clássica, alternativa e das lectinas cliva a proteína C5 em C5a e C5b. O componente C5 não apresenta ligação tiól-éster. O peptídeo C5a é um dos principais fatores quimiotáticos (processo de migração das células em direção a um gradiente químico) de células inflamatórias, participando ativamente do processo inflamatório. O fragmento C5b se associa a C6 (C5b6) onde o C7 será acoplado. Em seguida, a molécula de C8 será incorporada ao complexo formando C5b678. A ligação de C8 ao complexo C5b-7 aumenta drasticamente a interação hidrofóbica entre essas moléculas acentuando a ligação de várias unidades da proteína C9, que possui alta afinidade pela membrana celular, facilitando sua inserção na bicamada lipídica. 13 Durante a associação de várias proteínas C9, ocorre a polimerização fundamental para a formação do MAC. O MAC permitirá a entrada descontrolada de água, o extravasamento de material intracelular de baixo peso molecular e a saída de sais e íons que levam a célula ao desequilíbrio osmótico, ruptura da membrana celular e morte do patógeno. A perforina, encontrada em linfócitos TCD8+ e células natural killer (NK), e a proteína C9 possuem muitas semelhanças tanto estruturalmente quanto funcionalmente. Ambas possuem um importante domínio altamente conservado que lhes permite a inserção na membrana celular, formando um canal responsável pelo seu papel lítico. Ambas também apresentam uma considerável homologia na sequência de aminoácidos (aa) dispostos na região N-terminal. O complexo C5b-9(n) também pode ser formado em fase fluída como, por exemplo, no soro humano. Isso ocorre com a formação de um complexo C5b-9 hidrofílico que não exerce mais atividade lítica. Esse complexo pode se associar à S-proteína que se liga a superfícies nascentes de moléculas C5b-7, alterando estruturalmente este complexo e o seu potencial de ligação à membrana celular permanecendo na fase fluída. TEMA 3 – MECANISMOS EFETORES MEDIADOS PELO SISTEMA COMPLEMENTO A ativação do sistema complemento gera diferentes atividades biológicas: a opsonização, lise, promoção da quimiotaxia e a degranulação de mastócito por anafilatoxinas (tabelas 1 e 2). 3.1 Lise A função biológica final das três vias de ativação do sistema complemento é a lise, que é determinada pelos componentes terminais que formam o MAC (C5b6789). A formação do MAC resulta de uma alteração funcional dos fosfolipídios da membrana celular a ser destruída com formação de um canal internamente hidrofílico. É através desse canal que há entrada de água, gerando intumescimento celular e a ruptura da célula (lise). É dessa forma que são destruídas células que sãoinfectadas por antígenos patógenos. 14 3.2 Opsonização Os componentes C3b, iC3b (forma inativada) e C4b são opsoninas, ou seja, revestem microrganismos facilitando a fagocitose. O processo de fagocitose facilitada é denominado de opsonização. A fagocitose é um mecanismo importante para a remoção de células apoptóticas, necessário para restaurar a homeostase e resolução do processo inflamatório. 3.3 Anafilotoxinas Os fragmentos C4a, C3a e C5a (em ordem crescente de atividade) são anafilotoxinas, ou seja, são capazes de se ligar a mastócitos e basófilos, desencadeando a liberação de mediadores pró-inflamatórios (histamina e hepariana, por exemplo), aumentando a síntese de moléculas de adesão pelas células endoteliais, recrutando leucócitos circulantes para o foco inflamatório. 3.4 Quimiotaxia O fragmento C5a é o mais importante do sistema completo para o processo quimiotático. Esse fragmento aumenta a síntese de moléculas de adesão por células endoteliais vasculares, por ser um potente ativador de neutrófilos, basófilos e macrófagos; aumenta a atração de leucócitos circulantes para o sítio inflamatório, aumentando a capacidade de eliminação do patógeno, além de aumentar a síntese e liberação de citocinas por diferentes tipos celulares. Em suma, atrai células inflamatórias para a localização necessária. Quadro 1 – Funções principais do sistema complemento Função Proteínas Responsáveis Proteção – Infecções Opsonização C3 e C4 Lise MAC Quimiotaxia e ativação de leucócitos Anafilatoxina (C5a, C3a e C4a) Receptores de anafilatoxina em leucócitos 15 Interface – Imunidade inata e adaptativa Intensificação da memória imunológica C3b e C4b; Receptores de C3 nas células dendríticas Aumento da resposta humoral C3b e C4b; Receptores de C3 nas células B e apresentadoras de antígenos Depuração Depuração de imunocomplexos dos tecidos C1q Depuração de células apoptóticas C1q Crédito: Stephanie Von Stein Cubas Warnavin. Quadro 2 – Atividades dos produtos de ativação do complemento Fragmento Atividade Efeito C2a Procinina, acúmulo de fluidos Edema (intumescimento de tecidos moles decorrente do aumento de líquido intersticial – aumento de volume). C3a Degranulação de basófilos e mastócitos; aumento da permeabilidade vascular, contração da musculatura lisa Anafilaxia (reação de hipersensibilidade). C3b Opsonização, ativação de célula fagocitária Fagocitose (processo em que as células do sistema imunológico englobam partículas grandes por meio da emissão de pseudópodes, que são estruturas que surgem como expansão da sua membrana plasmática, com o objetivo de combater e prevenir infecções). C4a Degranulação de basófilo e mastócito; aumento da permeabilidade vascular, contração da musculatura lisa Anafilaxia (reação de hipersensibilidade). C4b Opsonização Fagocitose (processo em que as células do sistema imunológico englobam 16 partículas grandes por meio da emissão de pseudópodes, que são estruturas que surgem como expansão da sua membrana plasmática, com o objetivo de combater e prevenir infecções). C5a Degranulação de basófilo e mastócito; aumento da permeabilidade vascular, contração da musculatura lisa Quimiotaxia, estimulação da queima respiratória, ativação de células fagocitárias, estimulação de citocinas inflamatórias Anafilaxia (reação de hipersensibilidade). Inflamação (resposta à infecção ou lesão tecidual que ocorre para erradicar antígeno e para potenciar a reparação tecidual. C5bC6C7 Quimiotaxia Liga-se a outras membranas Inflamação (resposta à infecção ou lesão tecidual que ocorre para erradicar antígeno e para potenciar a reparação tecidual). Danos teciduais Crédito: Stephanie Von Stein Cubas Warnavin. TEMA 4 – SISTEMA COMPLEMENTO: DESTRUIÇÃO DE AGENTES INFECCIOSOS O sistema complemento é formado por um grupo de proteínas plasmáticas que possuem um importante papel no sistema imunológico inato e adquirido. Essas proteínas são responsáveis pela destruição de patógenos invasores e pela remoção de complexos imunes. Pode atuar também na resposta imune específica. É considerado um dos mecanismos mais importantes da reação inflamatória e da destruição de agentes infecciosos (Figura 8). Em relação às respostas inata e adquirida, a imunidade humoral é o principal mecanismo para eliminação de patógenos extracelulares, bem como para neutralização de toxinas. 17 Os agentes infecciosos ativam linfócitos B e, dessa forma, há a produção de anticorpos específicos que poderão exercer as seguintes funções: • Neutralização do agente infeccioso e/ou toxina; • Opsonização do patógeno e fagocitose; • Ativação da via clássica do sistema complemento (opsonização, fagocitose, lise celular e amplificação da inflamação). Quando um microrganismo penetra no organismo, provoca ativação do complemento. Como resultado de sua ativação e amplificação, alguns componentes do complemento se depositam sobre a superfície do patógeno responsável pela ativação, o que determina sua destruição (lise) e/ou sua eliminação por células do sistema fagocítico. Para que o sistema complemento expresse sua atividade, é necessária sua ativação prévia. As atividades mais importantes de defesa do hospedeiro são efetuadas por C3 e C5 (proteínas), estruturalmente semelhantes. O principal mecanismo da imunidade inata contra os patógenos extracelulares é a fagocitose. No entanto, organismos como os helmintos são muito grandes para serem fagocitados, sendo a exocitose (liberação do conteúdo dos grânulos para o exterior) realizada pelos fagócitos. A via alternativa do sistema complemento pode ser ativada, levando à opsonização, fagocitose, lise celular do patógeno e amplificação da inflamação. O interferon do tipo I é produzido por células infectadas e impede a infecção de outras células via produção de proteínas antivirais. A imunidade humoral é a resposta imune adaptativa predominante contra patógenos extracelulares. Os anticorpos produzidos podem neutralizar o agente/toxina, promover opsonização, fagocitose, ativação complemento e atuar na citotoxicidade celular mediada por anticorpos. 18 Figura 8 – Atuação do sistema complemento na defesa a patógenos Crédito: Stephanie Von Stein Cubas Warnavin. TEMA 5 – COMPLEXO DE HISTOCOMPATIBILIDADE O MHC (Major Histocompatibility Complex) é um conjunto complexo de genes presentes no ácido desoxirribonucleico (DNA), uma região de genes altamente polimórficos, cujos produtos são expressos na superfície de várias células. As moléculas codificadas pelos genes que compõem o MHC pertencem às superfamílias das imunoglobulinas e incluem os anticorpos, o receptor de linfócito T (TCR) e algumas moléculas de adesão. A região cromossômica, que codifica as moléculas do MHC, compreende um conjunto de genes interligados e interdependentes, localizados nos cromossomos 6 e 17 de humanos e de camundongos e denominado HLA e H-2, respectivamente. O sistema imune adquirido dirige-se principalmente contra antígenos peptídicos que formam complexos com proteínas do MHC. Isso porque não reconhece antígenos livres, mas porções proteicas não covalentemente ligadas a produtos dos referidos genes. Desempenha um papel no reconhecimento intercelular e na discriminação do que é próprio (self) e não próprio (non self), ativando as respostas imunológicas humoral e celular. Desses genes, distinguem- se duas classes principais, estrutural e funcionalmente distintas: MHCI e MHCII. O MHC é, então, um lócus amplo com genes altamente polimórficos que codifica as moléculas classes I e II, assim como outras proteínas. Essas moléculas 19 têm a função de se ligar a peptídeos antigênicos e apresentá-losaos linfócitos T específicos. As moléculas MHC foram originariamente reconhecidas pelo seu papel no desencadeamento de resposta das células T que causavam a rejeição de transplantes. As duas classes de MHC apresentam características estruturais semelhantes, entretanto, diferem quanto à apresentação dos antígenos a determinado tipo de linfócito. As moléculas do MHC de classe I, que estão presentes na maioria das células nucleadas, são reconhecidas principalmente pelo TCR de linfócitos T CD8, ao passo que as moléculas de classe II, presentes na superfície das células apresentadoras de antígenos, são reconhecidas pelo TCR dos linfócitos T CD4. O MHC de classe I é uma molécula composta por duas cadeias polipeptídicas distintas ligadas: a cadeia pesada (cadeia α) e um polipeptideo não polimórfico (β2-microglobulina) que não é codificado pelo MHC. Em contrapartida, nas moléculas de classe II do MHC, as duas cadeias polipeptídicas (α e β) são codificadas por genes do MHC polimórficos. Ambas as classes apresentam uma fenda extracelular de ligação de antígenos, uma região não polimórfica semelhante à imunoglobulina, uma região transmembrana e uma região citoplasmática. A fenda é constituída por α hélices nas laterais e uma base de oito lâminas β-pregueadas antiparalelas. A fenda das moléculas de classe I é formada pelos domínios α1 e α2 da cadeia α, enquanto a da classe II é formada pelos domínios α1 e β1 das duas cadeias. O MHC de classe I é um receptor para antígenos endógenos (intracelulares) e está presente na maior parte das células nucleadas. O MHC de classe II é um receptor para antígenos exógenos (extracelulares) e é encontrado nas principais células apresentadoras de antígenos (células dendríticas, macrófagos e linfócitos B). É importante ressaltar que ambas as classes são receptoras de antígenos proteicos. NA PRÁTICA No Brasil, o câncer é uma doença responsável por grande parte do índice de mortalidade. Entre os diversos tipos de câncer, a leucemia tem sido cada vez mais estudada. Trata-se uma doença maligna dos glóbulos brancos, geralmente de origem desconhecida, que acontece quando uma célula sanguínea que ainda não atingiu a maturidade sofre uma mutação genética que a transforma em uma célula cancerosa. Essa célula anormal não funciona adequadamente, 20 multiplicando-se rápido. Existem mais de 12 tipos de leucemia, sendo as mais conhecidas e prevalentes a leucemia mieloide aguda (LMA), a leucemia mieloide crônica (LMC), a leucemia linfocítica aguda (LLA) e a leucemia linfocítica crônica (LLC). O Transplante de Medula Óssea (TMO) é indicado principalmente para o tratamento de doenças que alteram o funcionamento da medula óssea: • Doenças hematológicas; • Doenças onco-hematológicas; • Imunodeficiências; • Doenças genéticas hereditárias; • Alguns tumores sólidos; • Algumas doenças autoimunes. O TMO é considerado uma forma de terapia bem-sucedida para determinadas doenças habitualmente fatais, como o caso da leucemia. O TMO é diferente da maioria dos transplantes, pois trata-se de uma terapia celular, na qual o órgão transplantado não é sólido. O receptor recebe a medula óssea por meio de uma transfusão, onde as células progenitoras coletadas do sangue do doador são armazenadas em uma bolsa de sangue e transfundidas para o paciente. As células transfundidas circulam pelo sangue do receptor, instalam-se no interior dos ossos, dentro da medula óssea do paciente e, após um período variável de tempo, ocorre a “pega” da medula, quando as células do doador começam a se multiplicar, produzindo as células do sangue O transplante de medula óssea do tipo alogênico, ou seja, entre indivíduos diferentes da mesma espécie, apresentam grande avanço com a descoberta do principal sistema de histocompatibilidade humano, composto de antígenos HLA (human leukocyte antigens). O sistema HLA contém aproximadamente quatro milhões de base e seus genes encontram-se fisicamente agrupados dentro de três regiões distintas, denominadas de classe I, II e III. Compreende uma região de genes altamente polimórficos localizados no braço curto do cromossomo 6, na porção da região 6p21.3, cada lócus pode conter um entre diferentes genes para determinada glicoproteína, ao que chamamos de polimorfismo, que permite, assim, grande variação na expressão dessas glicoproteínas. 21 O lócus do HLA compreende seis genes principais que codificam moléculas proteicas homólogas, sendo classificadas em classe I, classe II, em função de sua estrutura, distribuição tecidual e características na apresentação de antígenos aos linfócitos T e a região classe III que é telomérica à região classe II, contém genes que codificam as moléculas do sistema complemento (C2, C4 e fator B), 21- hidroxilase e fator de necrose tumoral. As moléculas de classe I são expressas praticamente em todas as células nucleadas, enquanto as de classe II, apenas nas células dendriticas, linfócitos B, macrófagos e alguns outros tipos celulares. A região HLA classe I contém dez genes com nomenclatura oficializada (HLA-A, B, C, D, E, F, J, H, K, L), porém, apenas os genes HLA-A, B e C são bem definidos e de importância conhecida para os transplantes de órgãos e codificam os antígenos HLA A, B e C. A região HLA classe II contém 23 genes, dos quais 9 são funcionais (HLADRA, DRB1, DRB3, DRB4, DRB5, DQB1, DPA1, DPB1), todos relevantes para os transplantes de órgãos. A combinação do gene DRA com DRB1 determina os antígenos HLA-DR; DRA com DRB3 determina HLA-DR52; DRA com DRB4 determina HLA-DR53; DRA com DRB5 determina DR51; DQA1 com DQB1 determina HLA-DQ; e DPA1 com DPB1 determina HLA-DP. Situados nessa região ainda estão os genes que codificam para proteínas transportadoras de peptídeos (TAP1, TAP2). A região HLA classe III compreende um grande número de genes, dentre os quais destacam-se os genes do sistema complemento (C4, C4B, BF C2), sendo que próximo ao C4B existem dois genes que codificam para a enzima 21 hidroxilase (21OH). Ainda nessa região encontram-se três genes que codificam para HSP70 (Heat Schock Protein) e dois genes para os fatores de necrose tumoral. Antes desse sistema, o TMO só poderia ser realizado em parentes HLA idênticos, restringindo de 35 a 40% o número de transplante de indivíduos elegíveis. Contudo, aumentou o número de transplantes realizados, utilizando-se membros da família ou doadores que são completa ou parcialmente HLA cruzados com o receptor, quando não existem parentes HLA-idênticos disponível. 22 FINALIZANDO O sistema complemento é o principal mediador do processo inflamatório junto aos anticorpos. É um importante componente efetor da imunidade inata e um modulador vital da resposta imune adaptativa. Tem a capacidade de reconhecer e eliminar microrganismos, imunocomplexos e também células apoptóticas. O complemento possui um sistema de cascata de ativação, que ocorre sempre da mesma forma. A ativação da cascata do sistema complemento pode ser iniciada através da via clássica (dependente de anticorpo), via alternativa (espontânea) ou via da lectina (mediada pela ligação da lectina-manose). As três vias finalizam com o componente C9. A via clássica é o ponto de união entre as repostas inatas e adaptativas, pelo fato de necessitar de imunoglobulinas para sua ativação. A ativação do sistema complemento gera diferentes atividades biológicas: a opsonização (facilitação da fagocitose), lise (ruptura da célula patogênica), promoção da quimiotaxia (atração de células inflamatórias para a região necessária) e a degranulação de mastócito por anafilatoxinas (ligação a mastócitos e basófilos para desencadear a liberação de mediadores pró- inflamatórios). O sistema imune adquirido atua contra antígenos, principalmente por meio do MHC. Desempenha um papel no reconhecimento intercelular ena discriminação do que é self e non self, ativando as respostas imunológicas humoral e celular. Desses genes, distinguem-se duas classes principais, estrutural e funcionalmente distintas: MHCI e MHCII. 23 REFERÊNCIAS ABBAS, A. K.; LICHTMAN, A. H; POBER, J. S; FARIAS, A. dos S. (Trad.). Imunologia celular e molecular. 7. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. ELLA, C. C. S. et al. Imunologia da mucosa intestinal da bancada ao leito. São Paulo: Editora Atheneu, 2010. BVP FORTE, W. C. N. Imunologia: do básico ao aplicado. 3. ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2015. BVP LEVINSON, W. Microbiologia Médica e Imunologia. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. SEHNEM, N. T. (Org.). Microbiologia e Imunologia. São Paulo. Editora Pearson Education do Brasil, 2015. BVP SCUTTI, J. Fundamentos da Imunologia. São Paulo: Rideel, 2016. BVP TORTORA, G. J.; FUNKE, B. R. CASE, C. 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