Prévia do material em texto
Autoria: Dr. Maicon Costa Borba Macedo Revisão técnica: Dr. Marcelo Flório DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS QUAIS OS DESAFIOS DA SOCIEDADE MODERNA? Introdução O século XXI trouxe imensos desa�os para as sociedades. A maioria, entretanto, é consequência de acontecimentos históricos vivenciados ao longo do século XX e que continuam a in�uenciar os dias atuais. A Guerra Fria é um bom exemplo. Com o �m da Segunda Guerra Mundial, iniciou-se um período de tensão, que dividiu o cenário internacional em dois blocos: um liderado pelos Estados Unidos, e outro pela União Soviética. Esse con�ito reestruturou a geopolítica mundial, tendo como vencedor os Estados Unidos e seu modelo econômico. Além da vitória americana, ao longo da segunda metade do século XX, tem início uma nova forma de integração mundial, chamada de globalização, que vem recon�gurando o capitalismo internacional. Outra característica marcante do �m do século passado e início do XXI são as novas ondas migratórias, que desa�am, sobretudo, os países de destino dos migrantes. Completando o panorama, veri�camos o risco do terrorismo em diversos países. A verdade é que o cenário atual é marcado por grandes incertezas. Por isso se faz necessário identi�car as principais características deste momento, buscando compreendê-lo dentro de um contexto histórico, construído desde a Segunda Guerra Mundial e intensi�cado durante e após a Guerra Fria. Nesse sentido, são pertinentes as seguintes indagações: quais as consequências do �m do mundo socialista para a economia mundial? Como a globalização está interferindo na sociedade, principalmente sobre o Estado e a política? E qual o per�l das migrações e do terrorismo nesse início de século? Com isso, poderíamos re�etir, ainda, quais seriam os desa�os para a construção de sociedades mais justas. Deveriam as sociedades e suas organizações adotar medidas de responsabilidade social? Ao estudar essas questões, aprendemos um pouco mais sobre os contornos que a sociedade moderna vem tomando e podemos nos preparar melhor para as transformações que ainda virão. Bons estudos! Tempo estimado de leitura: 52 minutos. 4.1 As tendências sociopolíticas do mundo global Para compreender as tendências atuais do mundo globalizado, é necessário fazer um recuo histórico até a Guerra Fria, pois foi neste período, nas décadas de 1950 a 1980, que se intensi�cou as disputas ideológicas permitindo o rearranjo do capitalismo veri�cado no presente. Mas o que foi a Guerra Fria? Quais suas principais características? E, �nalmente, quais fatores contribuíram para o seu �m? Com o �m da Segunda Guerra, duas potências mundiais emergiram: os Estados Unidos da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). De acordo com Miranda e Faria (2003), países como Alemanha, França, Inglaterra e Japão, que eram as potências tradicionais, ao �m da guerra encontravam-se com grandes di�culdades econômicas devido às perdas materiais e humanas durante os confrontos. Esse fato, dentre outros, abriu caminho para que os Estados Unidos e a União Soviética passassem a desempenhar o papel de líderes, disputando assim a hegemonia mundial. Aliados durante a Segunda Guerra, a incompatibilidade de seus interesses logo �cou evidente e os dois países travaram uma batalha ideológica, sempre na iminência de uma guerra. Devido ao fato de a guerra militar nunca ter ocorrido entre os dois países, recebeu o nome de Guerra Fria (BIAGI, 2001; MIRANDA; FARIA, 2003). 4.1.1 Guerra Fria: capitalismo X comunismo Figura 1 - Ao longo da Guerra Fria, a tensão devido ao desencadeamento de uma guerra “quente”, ou seja, com conflito bélico, esteve sempre presente Fonte: Scanrail1, Shutterstock, 2021. #PraCegoVer Na figura, temos a fotografia de diversos mísseis à esquerda, lançados à céu aberto. Durante a Guerra Fria, os Estados Unidos e a União Soviética estenderam suas in�uências a diversos países, muitas vezes de forma violenta. Além disso, os dois países patrocinaram uma série de episódios que viriam a intensi�car as tensões mundiais, com a constante iminência de con�itos militares. Como pano de fundo dessa disputa de poder, estava a ideologia comunista ou socialista, por parte da União Soviética, e a ideologia capitalista, pelo lado dos Estados Unidos. O modelo comunista caracterizava-se pela economia fortemente controlada pelo Estado e fechada ao livre comércio global, ao passo que a ideologia capitalista apregoava o livre comércio, sem intervenção estatal (MIRANDA; FARIA, 2003). Um dos acontecimentos mais marcantes do período foi a construção de um muro dividindo a cidade de Berlim, capital da Alemanha, representando a separação do mundo em dois blocos, o comunista e o capitalista. O muro de Berlim passou a ser o símbolo da Guerra Fria (MIRANDA; FARIA, 2003). Com o passar do tempo, entretanto, a União Soviética foi perdendo forças. Com a economia estagnada e o desenvolvimento comprometido, era evidente que os comunistas estavam perdendo a corrida do desenvolvimento econômico e tecnológico. São apontadas como causas do �m da União Soviética, dentre vários fatores, a sua defasagem tecnológica, os custos para manter sua defesa, a falta de democracia e liberdade, e o isolamento dos países comunistas, além das grandes transformações tecnológicas e sociais que estavam ocorrendo no ocidente (RODRIGUES, 2006). Figura 2 - A queda do muro de Berlim, em 1989, representou o fim da Guerra Fria travada entre Estados Unidos e União Soviética desde o final da Segunda Guerra Mundial Fonte: ne�ali, Shutterstock, 2021. #PraCegoVer Na figura, temos um selo que retrata a queda do muro de Berlim. Há um indivíduo em cima de uma escada quebrando o muro. Neste, encontramos dizeres e grafites, assim como ferros expostos nos locais em que o concreto foi derrubado. A queda do muro de Berlim, que reuni�cou a Alemanha em 1989, simbolizou o �m da Guerra Fria. A União Soviética desapareceu logo depois, em 1991. O �m da Guerra Fria e a dissolução da União Soviética representaram a ascensão do sistema capitalista mundial, que a partir de então prevalece sem que nenhum modelo econômico alternativo o ameace. O �m da Guerra Fria prenunciou um novo modelo de organização social. Contribuíram signi�cativamente para isso os avanços tecnológicos que começaram a ser desenvolvidos a partir da segunda metade do século XX. As novas tecnologias de informação e comunicação, as TICs, aproximaram o mundo, intensi�cando o chamado processo de globalização (CASTELLS, 1999). Com o �m da União Soviética e a ascensão da ideologia capitalista, o �uxo de capitais entre os países passou a ser cada vez mais intenso (OLIVEIRA; COSTA, 2016). O fenômeno da globalização atinge, desde então, todos os países, mas em graus diferentes, variando de acordo com sua abertura comercial. Uma das principais características do modelo de globalização é o seu caráter liberal, ou seja, a liberalização econômica extrema. Consequentemente, instituições �nanceiras internacionais passaram a exercer in�uência crescente na política econômica dos países, sobretudo, nos subdesenvolvidos. Exemplos destas instituições são o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização Mundial do Comércio (OMC) e o Banco Mundial (BIRD). As orientações das instituições aos países podem ser resumidas nos seguintes pontos principais: redução da interferência do Estado na economia; privatização de empresas Estatais; e livre comércio, sem barreiras alfandegárias e sem proteção às empresas nacionais (OLIVEIRA; COSTA, 2016). 4.1.2 Mundo globalizado Joseph Stiglitz (2002) argumenta que a globalização possui muitos aspectos positivos, uma vez que reduziu o isolamento de alguns países, propiciando seu desenvolvimento econômico e também colaborou em campanhas globais, como as de combate a AIDS. Entretanto, o autor também salienta que para muitos países a globalização foi um desastre, porque as políticas de cunho neoliberal geraram desemprego e pobreza. Uma das causas foi que os países ricos não seguiram as orientações que eles próprios recomendavamaos países pobres, ou seja, enquanto orientavam maior abertura econômica aos países periféricos, eles protegiam setores da sua própria economia. Dessa forma, os países subdesenvolvidos tiveram suas economias enfraquecidas (STIGLITZ, 2002). A globalização tem implicações nas mais diversas esferas da vida social como, por exemplo, na questão da imigração e as consequências que esse fenômeno traz, tema do nosso próximo tópico de estudo. Impulsionada pela revolução nas tecnologias da comunicação nas últimas décadas, especialmente a partir da década de 1980, a globalização impacta a economia, a política, a cultura, a organização social e a questão ambiental. Suas 4.2 Terrorismo e deslocamentos populacionais O livro A Globalização e seus malefícios (STIGLITZ, 2002) do economista estadunidense e vencedor do Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz é um relato provocativo e contundente do cenário da política econômica mundial. O autor demonstra como a expectativa das nações mais pobres por maior participação na riqueza global não é satisfeita pela globalização, mas que observa o efeito contrário: países ricos tornam-se cada vez mais ricos, enquanto países pobres toram-se cada vez mais pobres. VOCÊ QUER LER? consequências se fazem sentir também nos movimentos da população em torno do globo: com as possibilidades em termos de comunicação e transporte oferecidas pelo mundo globalizado, ao mesmo tempo em que se observa o aprofundamento das desigualdades sociais e a eclosão de guerras, uma grande massa populacional vislumbra na imigração uma nova oportunidade de vida. Tais projetos de vida, não raro, esbarram no protecionismo e nas barreiras impostas pelos países desenvolvidos para a imigração, barreiras estas que, cada vez mais, encontram no medo do terrorismo o argumento para promoção de políticas racistas e xenófobas. Mas antes de entrar na questão da relação imigração e terrorismo, é preciso abordar as características da globalização, o que vamos fazer a seguir. Desde a queda do Muro de Berlim e o avanço da liberalização econômica e da livre iniciativa de mercado, as consequências da globalização na economia se fazem sentir em todos os países do globo, o que re�ete na organização política. O �lósofo e sociólogo Jürgen Habermas (2002) tem chamado atenção para duas consequências políticas: O processo de acumulação econômica do capitalismo globalizado é avesso ao controle político das nações e, neste sentido, as funções regulatórias de promoção de parâmetros equitativos e de justiça social, derivados de diretivas políticas, seriam di�cultadas (DANNER, 2014). Assim, uma das principais características da dimensão política da globalização é a crise do Estado Nacional e a perda da soberania diante de grandes conglomerados econômicos globais. O Estado, portanto, tem perdido a autonomia para gerir a economia por suas próprias determinações políticas. 4.2.1 As características políticas da globalização Por um lado, a desestruturação do Estado de bem-estar social (Welfare State), pois a globalização acarretaria uma diminuição da autonomia política dos países (DANNER, 2014). Por outro lado, o estabelecimento e a consolidação de blocos de países com enorme poder político e econômico ao mesmo tempo em que as desigualdades entre as nações se aprofundam (DANNER, 2014). Figura 3 - O mercado econômico e a especulação financeira governam a economia mundial e impactam todos os países do globo Fonte: JMiks, Shutterstock, 2021. #PraCegoVer Na figura, temos um painel com diversas combinações numerais. Há, também, uma seta indicando queda. Se por um lado a expansão global de grandes empresas para países periféricos re�ete em investimentos, circulação da economia e geração de empregos, é inevitável observar que – em sua saga expansionista – as grandes empresas buscam a maximização de seus lucros por meio de um rol de concessões que garantam mão de obra e matéria-prima mais baratas, menor carga tributária e menor regulação estatal sobre a força de trabalho. Bauman (2012) observa que a fragmentação das demandas sociais, a limitação da ação política tradicional e a desilusão com as alternativas ao capitalismo, após a queda do muro de Berlim, contribuem para a fragilização do poder político nos dias de hoje. O esvaziamento do Estado como espaço de ação coletiva de construção de um projeto de sociedade abre espaço para o crescimento do poder da economia globalizada e para a ideologia de mercado, que é por si mesma individualista e sem preocupações éticas. Sendo assim, quais as consequências dessa ideologia para a sociedade? 4.2.2 As consequências sociais da globalização Para Bauman (2012), as grandes corporações são, em termos econômicos, os maiores bene�ciários da globalização. O que caracteriza as grandes corporações nesse período de mercado global é a sua não localidade, ou seja, estão presentes no mundo inteiro, mas os donos das empresas, os investidores, são estrangeiros. Sendo estrangeiros, eles visam, via de regra, o lucro de seus empreendimentos e não partilham do conhecimento da realidade e das condições de vida dos trabalhadores de suas empresas localizadas em outros países. Além disso, enquanto a empresa é global, isto é, pode se movimentar pelo globo de acordo com seus interesses e oportunidades, os trabalhadores são locais, estão presos ao seu espaço geográ�co – cidade, país – e sofrem as consequências das decisões tomadas pelas grandes corporações (BAUMAN, 2012). Ao se sujeitar às regras do mercado global, os Estados-Nação – especialmente os países periféricos – �cam à mercê dos interesses da especulação �nanceira e da barganha de vantagens promovidas pelas empresas em troca de alguns poucos empregos e investimentos no país. Além disso, �cam obrigados a seguir regras que mantenham a estabilidade �nanceira e econômica mesmo que seja em detrimento de investimentos sociais. Bauman (2012) denuncia que a propalada igualdade social advinda do desenvolvimento econômico e do livre comércio tem se mostrado uma falácia. O que se veri�ca na realidade é um aumento do acumulo da riqueza entre os mais ricos e uma queda vertiginosa das condições de vida dos mais pobres. Ao contrário das maravilhas sonhadas pelos crentes no poder da ciência e da tecnologia em tornar o mundo menos injusto, a distribuição real das riquezas na era da globalização tem se mostrado extremamente desigual (BAUMAN, 2012). Figura 4 - No mundo globalizado, a desigualdade social, especialmente em países periféricos, tem se aprofundado cada vez mais Fonte: Fred Cardoso, Shutterstock, 2021. #PraCegoVer Na figura, temos a fotografia de uma região urbana. Pode-se observar, em primeiro plano, diversas casas construídas em meio ao morro. Há vegetação ao redor. Já em segundo plano temos diversos edifícios, demonstrando a desigualdade social. Se a lógica da globalização amplia os processos de pobreza e desigualdade social, especialmente nos países periféricos, é necessário pensar em formas de subordinar a economia global a valores éticos e humanos. Em 1999, a Organização das Nações Unidas (ONU) publica o relatório “Globalização com uma face humana”, que denunciava a sobreposição de interesses �nanceiros e materiais aos interesses da nação e de seu povo. No relatório, a ONU a�rma que “o objetivo do desenvolvimento é a criação de um ambiente que permita às pessoas desfrutarem de uma vida longa, saudável e criativa” (PNUD, 1999, p. 4 apud RAMOS, 2002). Portanto, para uma versão mais humana do processo de globalização é necessário o estabelecimento de parâmetros éticos para o livre mercado e sua atuação local. Ramos (2002) sugere tratar a globalização em termos de política internacional de modo que haja uma ética nas comunicações, na economia, na política e na cultura, ética esta presidida pelas noções de justiça e solidariedade, valores universalmente presentes. A partir desse panorama sobre os impactos da globalização na economia e política, vamos agora para a questão dos deslocamentos populacionais e as novas con�gurações que o processotraz para as sociedades. As migrações internacionais no século XXI são profundamente marcadas pela globalização. A diminuição de distâncias e o amplo acesso à informação colocam no horizonte do aspirante à migração não apenas o espaço geográ�co mais próximo – outra cidade, outro estado – mas o mundo inteiro. Por outro lado, as possibilidades migratórias se apresentam de formas distintas em função do per�l do migrante. Enquanto o capital �nanceiro �ui livremente à revelia das fronteiras entre os países, a mobilidade dos trabalhadores é fortemente controlada por barreiras impostas pelos países desenvolvidos. O aumento do �uxo de informações acerca das oportunidades em países mais desenvolvidos seduz uma grande massa de trabalhadores de países periféricos, que partem em busca de melhores condições de vida. Mas se o acesso a informações e a facilidade de deslocamento, representada atualmente pelos meios de transportes globais e baratos, estimula o desejo de migração, as oportunidades para os migrantes ainda são muito restritas. Países desenvolvidos tendem a fechar suas fronteiras devido ao temor de receber enormes massas de migrantes sem estrutura e reais oportunidades para �xá- los. Porém, estudiosos do tema têm apontado uma série de possíveis vantagens 4.2.3 A migração na era da globalização e os impactos do terrorismo internacional O livro Americanah (ADICHIE, 2014) da escritora nigeriana Chimamanda Ngozie Adichie conta a história de dois nigerianos que precisam fugir do Regime Militar de seu país e descobrem-se exilados nos Estados Unidos e na Inglaterra. As trajetórias dos protagonistas são marcadas, a partir de então, por questões culturais e raciais, pois são vistos sempre como “o outro”, o não branco, o não europeu, o não americano. VOCÊ QUER LER? da migração, considerando os ganhos dos lugares de destino: barateamento dos custos e da qualidade de vida da população, uma vez que migrantes realizam trabalhos que os nativos não têm interesse em fazer, e por custos mais baixos; a revitalização de sociedades envelhecidas, a partir da migração de pessoas jovens; o acesso a recursos humanos quali�cados, cujos custos de quali�cação foram assumidos por outros países; o aumento da produtividade; e o aumento de consumidores e contribuintes (MARTINE, 2005). A apreciação das vantagens da imigração esbarra, porém, em movimentos sociais cada vez mais numerosos no mundo e caracterizados por seu viés antimigrantes, racistas e xenófobos. Após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, tais movimentos ganharam força e a identi�cação do outro – especialmente se o “outro” for de uma etnia, religião, idioma ou aparência diferente dos nativos locais – com o “inimigo” ou com o “terrorismo” vem aumentando a rejeição aos migrantes por parte das populações de países desenvolvidos (MARTINE, 2005). A tendência da grande maioria dos países desenvolvidos atualmente é de fechar suas fronteiras para a imigração, tanto em decorrência da crise econômica que o mundo vem enfrentando, quanto pela pressão de grupos de extrema direita que alegam o receio de ações terroristas em seu território. Na contramão dessa tendência, países como o Canadá têm facilitado e incentivado o �uxo de imigrantes ao seu território, acolhendo, inclusive, refugiados de guerras como as que acontecem no Oriente Médio. Quais as razões que levam o Canadá a adotar essa postura diante do atual �uxo migratório global? Além das causas humanitárias em relação a refugiados de guerra e a postura enfática contra os crescentes movimentos xenófobos e racistas que eclodem no mundo, o governo canadense tem apostado nos fatores positivos da imigração: com uma população envelhecida, necessita de pessoas jovens para movimentar a economia e suprir o setor de serviços. Mas como colocar em prática essa postura? O sucesso do empreendimento repousa no planejamento e na criação de políticas que visem auxiliar e acompanhar a adaptação e inserção dos migrantes na sociedade canadense. ESTUDO DE CASO A eclosão de guerras em vários locais do globo, especialmente no Oriente Médio, tem deslocado um grande volume de pessoas que precisam fugir por questões de sobrevivência. A resistência dos países desenvolvidos em recebê-las encontra argumento nas precauções contra o terrorismo. Martine (2005) ressalta, porém, que a relação entre migração e terrorismo é complexa, mas o que desencadeia ações terroristas não é a imigração, mas a crescente desigualdade entre os países. Uma maior abertura poderia, inclusive, reduzir o terrorismo, na medida em que reduz a desinformação e descon�ança entre os povos. Figura 5 - Dados da ONU apontam que, atualmente, 65,3 milhões de pessoas estão na condição de refugiadas de seus países Fonte: Sadik Gulec, Shutterstock, 2021. #PraCegoVer Na figura, temos adultos e crianças negros vestidos com turbantes e lenços, utilizando um sistema improvisado de água. Há um cano enterrado e ligado a outro que transporta o elemento. As pessoas carregam galões para serem enchidos, os quais estão ao redor do sistema. Ao fundo, pode-se observar uma cerca alta e, atrás desta, mais pessoas e uma vegetação seca. As grandes ondas migratórias que assistimos atualmente são re�exo da condição de mundo globalizado: por um lado, a facilidade tecnológica em acessar informações e deslocar-se pelo globo; de outro, o protecionismo de países desenvolvidos e as barreiras à livre circulação dos trabalhadores, fenômeno que se retroalimenta do medo xenofóbico ao imigrante, identi�cado como inimigo da pátria e potencial terrorista. A livre circulação do capital e o liberalismo econômico acarretam consequências drásticas à autonomia dos Estados-Nação: em nome da economia global, impõe-se a economias periféricas uma série de obrigações que as obrigam a deixar em segundo plano as políticas de desenvolvimento social e distribuição de renda. Como consequência, observamos um aprofundamento das desigualdades sociais e aumento da pobreza, enquanto poucos conglomerados econômicos acentuam sua acumulação econômica. Vamos continuar nosso estudo sobre os desa�os da sociedade moderna com o tema da responsabilidade social. Atualmente, tanto a atuação das empresas quanto a dos indivíduos tem se pautado cada vez mais por um viés sustentável, ético, e que considere a responsabilidade social junto à sociedade e ao meio ambiente. Quando pensamos em desenvolvimento sustentável, nos remetemos a um equilíbrio entre os objetivos de desenvolvimento econômico, desenvolvimento social e conservação ambiental. A responsabilidade social corporativa vem atraindo olhares da sociedade e de estudiosos sobre o tema, especialmente em uma época de acentuamento das desigualdades sociais e do aprofundamento da degradação do meio ambiente. Mas quais são os fundamentos da responsabilidade social? E como ela se aplica na atuação das empresas e corporações? O conceito de responsabilidade social tornou-se central a partir da emergência da discussão sobre a necessidade de um desenvolvimento sustentável, que leve em consideração a preservação do meio ambiente e a utilização consciente de recursos naturais. Mas a ideia de não é recente. Iniciativas empresariais que visam à atuação das corporações na sociedade de modo mais amplo, 4.3 Responsabilidade Social 4.3.1 Os fundamentos da responsabilidade social extrapolando seu objetivo imediato, que é a obtenção de lucro, existem desde o �nal do século XIX e início do século XX. Porém, nesse período, as ações das empresas orientavam-se por um viés mais �lantrópico e assistencialista na sua atuação junto à sociedade. Atualmente, a utilização do termo “�lantropia”, quando se trata de ações de responsabilidade social, é visto de forma pejorativa, pois remete a ações que não buscam a transformação da sociedade. Figura 6 - Diante dos desafios sociais e ambientais de nossa época, o conceito de responsabilidade social está cada vez mais presente na atuação empresarial Fonte: wk1003mike, Shutterstock, 2021. #PraCegoVer Na figura, temos uma fotografia editadadigitalmente. Há três torres de moedas empilhadas, uma pequena, outra média e a última mais alta. Elas trazem terra por cima e uma mudinha de planta. Atrás dessas torres de moeda, encontramos um espécie de gráfico indicando crescimento conforme as torres aumentam de tamanho. A noção de responsabilidade social só ganhou forma a partir das décadas de 1960 e 1970, coincidindo com grandes transformações sociais, políticas e culturais do mundo, especialmente a crescente crítica às guerras e ao uso de armas químicas e nocivas à sociedade e ao meio ambiente. Já a partir da década de 1980 e a crise no Estado de bem-estar social nos países centrais do capitalismo, como Estados Unidos e da Europa, a participação das empresas e das corporações na manutenção dos níveis de emprego foi sendo cada vez mais valorizada (ALENCASTRO, 2012). No Brasil, a consolidação do termo “responsabilidade social” se deu a partir dos anos 1990, principalmente em função do crescimento de movimentos sociais que pressionavam setores da sociedade – como governo e iniciativa privada – pela diminuição da pobreza e da fome, bem como da desigualdade social. A criação do Instituto Ethos, em 1998, e a atuação do sociólogo Herbert de Souza na campanha contra a fome, foram grandes molas propulsoras da discussão sobre responsabilidade social nas empresas (ALENCASTRO, 2012). É do Instituto Ethos, que tem como objetivo orientar e incentivar empresas acerca de sua responsabilidade socioambiental, umas das de�nições mais corrente para o conceito de responsabilidade social: Herbert de Souza, o Betinho, foi sociólogo mineiro que se notabilizou pela criação da Campanha contra a Fome, a Miséria e Pela Vida e notabilizou a discussão sobre a miséria e a desigualdade no país. Sua atuação em prol da dignidade humana lhe rendeu uma indicação ao prêmio Nobel da Paz em 1993. Hemofílico e soropositivo, Betinho faleceu em 1997, vítima de Hepatite B. VOCÊ O CONHECE? O sociólogo John Elkington formulou o conceito de triple bottom line, ou tripé da sustentabilidade, isto é, para o autor, uma empresa é sustentável quando respeita três princípios básicos: ser �nanceiramente viável, ser socialmente justo e ser ambientalmente responsável (ALENCASTRO, 2012). Mas como podemos pensar a atuação da empresa dentro do paradigma da responsabilidade social e do tripé da sustentabilidade? Dentro das empresas, o conceito de responsabilidade social refere-se, segundo Alencastro (2012), ao oferecimento de produtos socialmente corretos, ao estabelecimento de um relacionamento ético com clientes, fornecedores e funcionários, bem como a preocupação com o passivo ambiental gerado pela atividade da empresa. A prática da responsabilidade social deve alcançar tanto o público interno, tais como os funcionários e seus familiares, quanto o público externo, a comunidade na qual se insere o meio ambiente. Na prática, a responsabilidade social refere-se a liderar e apoiar, dentro dos limites de recursos da corporação, ações de interesse social. 4.3.2 A responsabilidade social na atuação empresarial Responsabilidade social empresarial é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais que impulsionem o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais. (INSTITUTO ETHOS, apud ALENCASTRO, 2012, p. 134) No Brasil, o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA) realizou, em 2006, a pesquisa “Ação Social das Empresas”, que demonstrou as principais áreas e ações de responsabilidade social no país, bem como os públicos-alvo. Ações relativas à segurança alimentar, assistência social, saúde, educação e lazer e recreação formam os principais focos da responsabilidade social (IPEA, 2006). Empresas podem se guiar também por normas e indicadores de responsabilidade social, que estão na pauta da discussão pelo estabelecimento de referências e parâmetros para este tema. A ONG internacional Social Accountability International (SAI) propôs nove itens de veri�cação no que se refere ao público endógeno da empresa (ALENCASTRO, 2012): Não emprego de trabalho infantil. Não emprego de trabalho forçado. Garantia de saúde e segurança no local de trabalho. Item 1 Item 2 Item 3 O documentário Uma Empresa Decente, a Decent Factory em inglês, (BALMÈS, 2004) apresenta o dilema de uma grande empresa de telecomunicações entre guiar-se pelo lucro ou obedecer a princípios morais. A re�exão do �lme centra-se na questão sobre o que signi�ca ser uma empresa correta em uma época que se valoriza a responsabilidade social. VOCÊ QUER VER? Aliar a responsabilidade social aos objetivos de produtividade e competitividade das corporações não é uma tarefa simples. Para obter maiores chances de êxito, é necessário que o compromisso com a responsabilidade socioambiental esteja presente já no planejamento estratégico das empresas, de modo a ser fator constitutivo de sua atuação desde a concepção do negócio. Garantia de liberdade de associação e negociação coletiva aos funcionários. Não discriminação de qualquer natureza. Proibição de práticas disciplinares. Respeito à lei quanto à jornada de trabalho. Remuneração digna. Garantia de que todos os requisitos da norma sejam aplicados corretamente. Item 4 Item 5 Item 6 Item 7 Item 8 Item 9 Antes de ser um entrave para os objetivos �nanceiros - que são legítimos em qualquer empresa privada - a responsabilidade social pode ser uma aliada e deve ser encarada como um investimento em médio e longo prazo. Os ganhos para a imagem da empresa, a identi�cação com setores progressistas da sociedade, cada vez mais preocupados com o impacto socioambiental das corporações, bem como o reconhecimento social e estatal, que pode reverter-se em futuros incentivos �scais, são algumas das vantagens para enquadrar-se no paradigma cada vez mais presente no mundo corporativo: de atuação responsável e ética junto à sociedade e o meio ambiente. Em nosso próximo item, vamos abordar quais são os desa�os para se chegar a uma sociedade justa e igualitária. Diante do cenário globalizado e regido pela lógica mercantil que caracteriza nosso tempo, as sociedades e nações, especialmente das economias periféricas, enfrentam grandes desa�os para alcançar níveis de desenvolvimento 4.4 Os desafios para a construção de uma sociedade justa A Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgou dados que mostram que mais de 40 milhões de pessoas em todo o mundo foram vítimas de trabalho escravo em 2016. Estimativas apontam que as mulheres são as mais afetadas pelas modalidades modernas de escravidão, representando quase 29 milhões de meninas e mulheres, inclusive vítimas de trabalho forçado na indústria do sexo (CAZARRÉ, 2017). Leia mais em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos- humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit- pede-mais-empenho-dos (http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos- humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit- pede-mais-empenho-dos). VOCÊ SABIA? http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit-pede-mais-empenho-dos social e econômico satisfatório em termos de igualdade, equidade e justiça social para sua população. Mas o que signi�ca justiça social? Qual a sua relação com os desa�os que marcam nossa época? Como dar materialidade à justiça social? Com o advento da globalização e o agravamento das desigualdades sociais em grande parte dos países do mundo, a discussão acerca do que é uma sociedade justa e de como alcançá-la tornou-se uma questão de grande relevância. Nesse contexto, o conceito de justiça social é central e refere-se, de forma sucinta, ao problema de como uma sociedade deve, eticamente, distribuir os bens por ela produzida (SANTA HELENA, 2008). A construção de uma sociedadeque se pretende justa não pode prescindir de dois princípios fundamentais: a igualdade e a equidade. A necessidade da construção de políticas públicas que leve em conta tais princípios é especialmente forte nas sociedades expostas ao sabor do livre mercado. Como vimos ao longo deste capítulo, o liberalismo econômico vem aprofundando as diferenças sociais, especialmente nos países periféricos, o que deve ser contrabalançado com políticas sociais que tenham como foco a redistribuição dos bens. 4.4.1 O conceito de justiça social Figura 7 - Em contextos de grande desigualdade, cabe ao Estado a aplicação de políticas e programas que zelem pela igualdade e equidade social Fonte: maxim ibragimov, Shutterstock, 2021. #PraCegoVer Na figura, temos a fotografia de uma criança em meio ao lixo. Ela está ajoelhada e carrega um saco. Ao fundo, pode-se observar caixas, sacolas e pedras. Dessa forma, é na justiça distributiva que se ancora atualmente a discussão sobre justiça social. O conceito moderno de justiça distributiva, de acordo com Fleischacker (2006), tem no Estado o agente garantidor de que os bens sejam distribuídos na sociedade de modo a suprir necessidades e direitos básicos para a condição da cidadania. Já o �lósofo John Rawls, em sua obra “Uma teoria da Justiça”, expõe as bases da teoria de justiça como equidade. Para o autor (2002), alcançar a equidade, condição da justiça social, são necessários três pontos fundamentais: A garantia de liberdades fundamentais: refere-se ao direito de cada pessoa a um conjunto de liberdades básicas, que seja compatível com o conjunto de liberdades de toda a população, tais como a liberdade política, de associação, de palavra, de consciência e de direito à propriedade. A ênfase do conceito de justiça social no acesso aos direitos básicos da cidadania a toda população, o que demanda esforços distributivos por parte do Estado, é especialmente importante em países periféricos do capitalismo, nos quais a globalização impacta mais fortemente em suas características negativas. Políticas de compensação e distribuição de renda para pessoas em desvantagem social são fundamentais para que se alcance uma condição mínima de justiça social. E o que vem a ser justiça social? Aliás, justiça e direito tem o mesmo signi�cado? Estes serão alguns dos assuntos tratados no tópico a seguir. Embora as noções de Direito e Justiça pareçam sinônimos, é possível observar, ao longo da história, períodos de maior ou menor afastamento entre os dois conceitos. Na consciência coletiva, porém, essas noções se entrelaçam a ponto de ser considerada uma coisa só. Mas na prática, é possível a�rmar que nem tudo o que direito é justo, do mesmo modo que nem tudo o que é justo, é direito (CAVALIERI FILHO, 2002). Enquanto a noção de justiça se refere a valores que são inerentes ao ser humano, como a liberdade e a igualdade, dignidade, equidade etc., que se relacionam com valores morais da sociedade, a noção de direito refere-se a um instrumento criado para a realização da justiça. Conforme Cavalieri Filho (2002), como a justiça é um sistema de valores em constante transformação, nem sempre o Direito é capaz de satisfazer as necessidades da Justiça. Isso pode se dar por diversos motivos: di�culdade do direito em acompanhar as mudanças sociais, di�culdades na própria concepção das regras do direito, falta de disposição política para implementá-lo, dentre outros. A igualdade de oportunidades. A garantia de que as pessoas menos favorecidas na sociedade recebam benefícios que os alcem a condição de cidadania. 4.4.2 As interfaces da Justiça O direito, assim, torna-se um direito injusto. Para o autor, a �nalidade do direito é a realização da justiça. Já a �nalidade da justiça, é a transformação social, ou seja, a condução de uma sociedade à justiça social. Se o direito deve ser um instrumento para alcançar a justiça, o alcance da verdade é �nalidade do direto para obter uma decisão justa (LUNARDI; DIMOULIS, 2007). A discussão sobre a realização da justiça por meio da aplicação do direito evoca também outra faceta: a distinção entre justiça universal e justiça particular. Esta questão vem de Aristóteles e está intrinsecamente ligada ao debate sobre justiça como equidade (RAWLS, 2002). A justiça universal relaciona-se à legalidade, ou seja, remete ao todo da sociedade. A lei e a justiça aplicam-se a todos e a todas as situações, de forma abstrata, genérica e universal. Porém, existem casos particulares e especí�cos cuja justiça universal pode não alcançar critérios de justiça, mas ao contrário, provocar injustiça. Nestes casos, entra em cena a justiça particular. Essa segunda forma de justiça relaciona-se à igualdade (ARISTÓTELES, 1979). Isso quer dizer que, casos em que a justiça universal não satisfaça os critérios de equidade de um indivíduo ou um grupo em particular, devendo então a justiça guiar-se, não pela lei genérica, aplicável a todos, mas por critérios particulares que atendam a uma decisão justa e equitativa. A seguir, vamos tratar dos desa�os enfrentados pela justiça social. O desenvolvimento econômico sem preocupação com o bem-estar coletivo favorece a concentração de renda nas mãos de poucas pessoas e, por consequência, a desigualdade social. O resultado disso são países que, mesmo com índices econômicos em ascensão, não conseguem traduzir esse crescimento em melhoria na condição de vida da população. O fato é que o 4.4.3 Os desafios da Justiça Social O documentário Justiça (RAMOS, 2004) retrata a rotina do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, expondo a necessidade de mudanças drásticas no sistema judicial do país. A justiça é retratada em toda sua burocracia, desigualdade e injustiça, na qual setores marginalizados da sociedade são duplamente culpabilizados: por seus supostos delitos e pelo lugar que ocupam na escala social. VOCÊ QUER VER? mercado não é capaz de gerar justiça social e acesso à cidadania. É necessário que ações partam do Estado, tanto em termos de regulação da economia, quanto em termos de programas e ações que visem garantir a toda população diretos básicos e condições de vida dignas. No Brasil, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 3º, contempla aspectos referentes à diminuição da desigualdade social e promoção de uma sociedade justa: A aplicação dos desígnios da Constituição na prática, porém, é tarefa árdua e complexa. Ao longo de sua história, o Brasil sempre se estruturou como uma sociedade desigual, cujos interesses de uma parcela pequena da população prevaleciam sobre os interesses – e direitos – da grande maioria. Desde os primeiros anos do século XXI, observamos alguns avanços no sentido de universalizar o acesso a direitos básicos da população: programas de distribuição de renda, aumento do acesso de pessoas de baixa renda à educação superior, programas de segurança alimentar, regulamentação de pro�ssões historicamente marginalizadas, como o caso do emprego doméstico, dentre outros. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: i) construir uma sociedade livre, justa e solidária; ii) garantir o desenvolvimento nacional; iii) erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e iv) promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (BRASIL, 2002, p. 13) Os esforços, porém, são frágeis diante do abismo social vivenciado no país: segundo ranking de desigualdade social da ONU, o Brasil é o décimo país mais desigual do mundo (PNUD, 2016). John Rawls (2002), a partir de sua teoria da justiça como equidade, busca estabelecer princípios e instituições necessários para que se alcance a justiça social. Em primeiro lugar, aponta que o sistema educacional deva ser subsidiado pelo governo, de modo a garantir liberdade de consciência e igual acesso à educação para todos os cidadãos. Em segundo lugar, o governo deve garantir uma renda mínima a todas as famílias, de modo que os direitos básicos sejam garantidos.Rawls (2002) defende também que as instituições governamentais devam comportar programas de apoio para, por um lado, garantir a e�ciência da economia do mercado, mantendo o sistema de preços em patamar competitivo e garantindo níveis de emprego; e por outro, garantir a equidade social por meio de impostos sobre herança e consumo e por políticas de transferência de renda para os setores mais fragilizados da população. Como vimos, os desa�os da justiça social em tempos de globalização e livre circulação do capital econômico são imensos. Para que os países logrem sucesso, é necessário atentar para o fortalecimento de políticas do Estado frente às demandas e exigências do mercado. Além disso, ações de inclusão social e diminuição da desigualdade - em curto, médio e longo prazo - devem ser pensadas envolvendo todos os setores – sociedade civil, mercado e Governo. O Programa Bolsa Família, criado em 2003 pelo Governo Federal, tornou- se um programa de referencia mundial em distribuição de renda. Estudos sobre o impacto do programa mostram que, com um baixo custo aos cofres públicos, o Bolsa Família contribui para o aquecimento da economia; superação da extrema pobreza; melhorias na saúde e na educação da população de baixa renda; redução do trabalho infantil; e empoderamento das mulheres (CAMPELO; NERI, 2013). VOCÊ SABIA? Chegamos ao �nal do capítulo e pudemos re�etir sobre as principais tendências sociopolíticas do mundo pós-socialista, ou seja, do mundo globalizado. Estudamos os problemas contemporâneos relacionados às migrações, à responsabilidade social e à noção de justiça social. Nesta unidade, você teve a oportunidade de: CONCLUSÃO estudar a Guerra Fria e suas consequências para as sociedades contemporâneas, bem como identi�car as características e tendências da globalização; conhecer os dilemas ensejados pelos deslocamentos populacionais, seus motivos e consequências, e desa�os frente à globalização e à reestruturação econômica das últimas décadas; compreender a responsabilidade social como questão importante da sociedade contemporânea, sobretudo, quando se trata da atuação das empresas; entender o conceito de justiça social e pensar sobre os desa�os para a construção de uma sociedade com mais igualdade social. Clique para baixar conteúdo deste tema. ADICHIE, C. N. Americanah. São Paulo: Companhia das Letras, 2014. ALENCASTRO, M. S. C. Ética empresarial na prática: liderança, gestão e responsabilidade corporativa. São Paulo: Intersaberes, 2012. ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. In: Os Pensadores. Seleção de textos por José Américo Motta Peçanha, São Paulo: Abril Cultural, 1979. BALMÈS, T. Uma empresa decente. [documentário] Direção: Thomas Balmès. Produção: Kaarle Aho, Thomas Balmès, Olivier Mille. Making Movies, Margot Films. Finlândia, França, 2004. BAUMAN, Z. Globalização: as consequências humanas. Rio de Janeiro: Zahar, 2012. BIAGI, O. L. O imaginário da Guerra Fria. Revista de História Regional, v. 6, p. 61 – 112, 2001. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Subsecretaria de Edições Técnicas, 2002. 415 p. CAMPELLO, T.; NERI, M. (Orgs.). Programa Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. IPEA, Brasília, 2013. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/livr o_bolsafamilia_10anos.pdf (http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/livro_b olsafamilia_10anos.pdf). Acesso em: 26 jun. 2021. CASTELLS, M. A sociedade em Rede. 6. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999. CAVALIERI FILHO, S. Direito, justiça e sociedade. Revista da EMERJ, Rio de Janeiro, v. 5, n. 18, p. 58-65, 2002. Disponível em: http://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista18/re vista18_58.pdf (http://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista18/revist a18_58.pdf). Acesso em: 26 jun. 2021. Referências http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/livro_bolsafamilia_10anos.pdf http://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista18/revista18_58.pdf CAZARRÉ, M. Com 40 milhões de escravos no mundo, OIT pede mais empenho dos países. Agência Brasil, Lisboa, 20 set. 2017, Direitos Humanos. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos- humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit- pede-mais-empenho-dos (http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos- humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit- pede-mais-empenho-dos). Acesso em: 26 jun. 2021. DANNER, L. F. Habermas: da globalização da economia à globalização da política. Cad. CRH. Salvador, v. 27, n.72, p. 629-642, dez. 2014. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-49792014000300012 (http://dx.doi.org/10.1590/S0103-49792014000300012). Acesso em: 26 jun. 2021. FLEISCHACKER, S. Uma breve história da justiça distributiva. São Paulo: Martins Fontes, 2006. GUIMARAES, H. W. M. Responsabilidade social da empresa: uma visão histórica de sua problemática. Rev. adm. empres. São Paulo, v. 24, n.4, p. 211-219, dez.1984. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php? script=sci_arttext&pid=S0034-75901984000400031 (http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034- 75901984000400031). Acesso em: 26 jun. 2021. HABERMAS, J. A inclusão do outro: estudos de teoria política. São Paulo: Edições Loyola, 2002. IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. A Iniciativa Privada e o Espírito Público. A evolução da ação social das empresas privadas no Brasil. Brasília, 2006. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/acaosocial/IMG/pdf/doc-28.pdf (http://www.ipea.gov.br/acaosocial/IMG/pdf/doc-28.pdf). Acesso em: 26 jun. 2021. RAMOS, M. A. Justiça. [documentário] Direção: Maria Augusta Ramos. Produção: Limite Produções, Selfmade Films e NPS. Brasil, 2004. LUNARDI, S. G.; DIMOULIS, D.. A verdade e a justiça constituem �nalidades do processo judicial?. Sequência: Estudos Jurídicos e Políticos, Florianópolis, p. 175-194, jan. 2007. Disponível http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit-pede-mais-empenho-dos http://dx.doi.org/10.1590/S0103-49792014000300012 http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-75901984000400031 http://www.ipea.gov.br/acaosocial/IMG/pdf/doc-28.pdf em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/sequencia/article/view/15052 (https://periodicos.ufsc.br/index.php/sequencia/article/view/15052). Acesso em: 26 jun. 2021. MARTINE, G. A globalização inacabada: migrações internacionais e pobreza no século 21. São Paulo Perspec. São Paulo, v. 19, n. 3, p. 3-22, set. 2005. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0102- 88392005000300001 (http://dx.doi.org/10.1590/S0102- 88392005000300001). Acesso em: 26 jun. 2021. MIRANDA, M. L.; FARIA, R. de M. (Org.). Da Guerra Fria à Nova Ordem Mundial. São Paulo: Contexto, 2003. OLIVEIRA, L. F. de; COSTA, R. C. R. da. Sociologia para jovens do século XXI: manual do professor. 4. ed. Rio de Janeiro: Imperial Novo Milênio, 2016. PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH): Desenvolvimento humano para todos. Organização das Nações Unidas, Washington DC, EUA, 2016. Disponível em: http://www.br.undp.org/content/dam/brazil/docs/RelatoriosDesenvo lvimento/undp-br-2016-human-development-report-2017.pdf (http://www.br.undp.org/content/dam/brazil/docs/RelatoriosDesenvolvi mento/undp-br-2016-human-development-report-2017.pdf). Acesso em: 26 jun. 2021. RAMOS, J. M. R. Dimensões da Globalização: comunicações, economia, política e ética. Revista de Economia & Relações Internacionais, v.1, n. 1. p. 97-112, jul. 2002. Disponível em: http://www.faap.br/revista_faap/rel_internacionais/pdf/revista_econ omia_01.pdf (http://www.faap.br/revista_faap/rel_internacionais/pdf/revista_economi a_01.pdf). Acesso em: 26 jun. 2021. RAWLS, J. Uma Teoria da Justiça. São Paulo: Martins Fontes, 2002. RODRIGUES, R. P. O colapso da URSS: um estudo das causas. São Paulo, 2006,310f. Tese (Doutorado em História Econômica) - Faculdade de Filoso�a, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006. https://periodicos.ufsc.br/index.php/sequencia/article/view/15052 http://dx.doi.org/10.1590/S0102-88392005000300001 http://www.br.undp.org/content/dam/brazil/docs/RelatoriosDesenvolvimento/undp-br-2016-human-development-report-2017.pdf http://www.faap.br/revista_faap/rel_internacionais/pdf/revista_economia_01.pdf SANTA HELENA, E. Z. Justiça distributiva na Teoria da Justiça como equidade de John Rawls. Revista de informação legislativa, v. 45, n. 178, p. 337- 346, abr-jun,2008. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/176536 (http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/176536). Acesso em: 26 jun. 2021. STIGLITZ, J. A Globalização e seus malefícios: a promessa não-cumprida de benefícios globais. São Paulo: Futura, 2002. http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/176536