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Desafios Contemporâneos - Unidade 4

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Autoria: Dr. Maicon Costa Borba Macedo
Revisão técnica: Dr. Marcelo Flório
DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS
QUAIS OS DESAFIOS
DA SOCIEDADE
MODERNA?
Introdução
O século XXI trouxe imensos desa�os para as sociedades. A maioria, entretanto,
é consequência de acontecimentos históricos vivenciados ao longo do século
XX e que continuam a in�uenciar os dias atuais. A Guerra Fria é um bom
exemplo. Com o �m da Segunda Guerra Mundial, iniciou-se um período de
tensão, que dividiu o cenário internacional em dois blocos: um liderado pelos
Estados Unidos, e outro pela União Soviética. Esse con�ito reestruturou a
geopolítica mundial, tendo como vencedor os Estados Unidos e seu modelo
econômico. Além da vitória americana, ao longo da segunda metade do século
XX, tem início uma nova forma de integração mundial, chamada de globalização,
que vem recon�gurando o capitalismo internacional. Outra característica
marcante do �m do século passado e início do XXI são as novas ondas
migratórias, que desa�am, sobretudo, os países de destino dos migrantes.
Completando o panorama, veri�camos o risco do terrorismo em diversos países.
A verdade é que o cenário atual é marcado por grandes incertezas. Por isso se
faz necessário identi�car as principais características deste momento, buscando
compreendê-lo dentro de um contexto histórico, construído desde a Segunda
Guerra Mundial e intensi�cado durante e após a Guerra Fria. Nesse sentido, são
pertinentes as seguintes indagações: quais as consequências do �m do mundo
socialista para a economia mundial? Como a globalização está interferindo na
sociedade, principalmente sobre o Estado e a política? E qual o per�l das
migrações e do terrorismo nesse início de século? Com isso, poderíamos re�etir,
ainda, quais seriam os desa�os para a construção de sociedades mais justas.
Deveriam as sociedades e suas organizações adotar medidas de
responsabilidade social? Ao estudar essas questões, aprendemos um pouco
mais sobre os contornos que a sociedade moderna vem tomando e podemos
nos preparar melhor para as transformações que ainda virão.
Bons estudos!
Tempo estimado de leitura: 52 minutos.
4.1 As tendências sociopolíticas do mundo
global
Para compreender as tendências atuais do mundo globalizado, é necessário
fazer um recuo histórico até a Guerra Fria, pois foi neste período, nas décadas de
1950 a 1980, que se intensi�cou as disputas ideológicas permitindo o rearranjo
do capitalismo veri�cado no presente. Mas o que foi a Guerra Fria? Quais suas
principais características? E, �nalmente, quais fatores contribuíram para o seu
�m?
Com o �m da Segunda Guerra, duas potências mundiais emergiram: os Estados
Unidos da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
(URSS). De acordo com Miranda e Faria (2003), países como Alemanha, França,
Inglaterra e Japão, que eram as potências tradicionais, ao �m da guerra
encontravam-se com grandes di�culdades econômicas devido às perdas
materiais e humanas durante os confrontos. Esse fato, dentre outros, abriu
caminho para que os Estados Unidos e a União Soviética passassem a
desempenhar o papel de líderes, disputando assim a hegemonia mundial.
Aliados durante a Segunda Guerra, a incompatibilidade de seus interesses logo
�cou evidente e os dois países travaram uma batalha ideológica, sempre na
iminência de uma guerra. Devido ao fato de a guerra militar nunca ter ocorrido
entre os dois países, recebeu o nome de Guerra Fria (BIAGI, 2001; MIRANDA;
FARIA, 2003).
4.1.1 Guerra Fria: capitalismo X comunismo 
Figura 1 - Ao longo da Guerra Fria, a tensão devido ao desencadeamento de uma guerra “quente”, ou seja,
com conflito bélico, esteve sempre presente
Fonte: Scanrail1, Shutterstock, 2021.
#PraCegoVer
Na figura, temos a fotografia de diversos mísseis
à esquerda, lançados à céu aberto.
Durante a Guerra Fria, os Estados Unidos e a União Soviética estenderam suas
in�uências a diversos países, muitas vezes de forma violenta. Além disso, os
dois países patrocinaram uma série de episódios que viriam a intensi�car as
tensões mundiais, com a constante iminência de con�itos militares. Como pano
de fundo dessa disputa de poder, estava a ideologia comunista ou socialista, por
parte da União Soviética, e a ideologia capitalista, pelo lado dos Estados Unidos.
O modelo comunista caracterizava-se pela economia fortemente controlada pelo
Estado e fechada ao livre comércio global, ao passo que a ideologia capitalista
apregoava o livre comércio, sem intervenção estatal (MIRANDA; FARIA, 2003).
Um dos acontecimentos mais marcantes do período foi a construção de um
muro dividindo a cidade de Berlim, capital da Alemanha, representando a
separação do mundo em dois blocos, o comunista e o capitalista. O muro de
Berlim passou a ser o símbolo da Guerra Fria (MIRANDA; FARIA, 2003). Com o
passar do tempo, entretanto, a União Soviética foi perdendo forças. Com a
economia estagnada e o desenvolvimento comprometido, era evidente que os
comunistas estavam perdendo a corrida do desenvolvimento econômico e
tecnológico. São apontadas como causas do �m da União Soviética, dentre
vários fatores, a sua defasagem tecnológica, os custos para manter sua defesa,
a falta de democracia e liberdade, e o isolamento dos países comunistas, além
das grandes transformações tecnológicas e sociais que estavam ocorrendo no
ocidente (RODRIGUES, 2006).
Figura 2 - A queda do muro de Berlim, em 1989, representou o fim da Guerra Fria travada entre Estados
Unidos e União Soviética desde o final da Segunda Guerra Mundial
Fonte: ne�ali, Shutterstock, 2021.
#PraCegoVer
Na figura, temos um selo que retrata a queda do
muro de Berlim. Há um indivíduo em cima de
uma escada quebrando o muro. Neste,
encontramos dizeres e grafites, assim como
ferros expostos nos locais em que o concreto foi
derrubado.
A queda do muro de Berlim, que reuni�cou a Alemanha em 1989, simbolizou o
�m da Guerra Fria. A União Soviética desapareceu logo depois, em 1991. O �m
da Guerra Fria e a dissolução da União Soviética representaram a ascensão do
sistema capitalista mundial, que a partir de então prevalece sem que nenhum
modelo econômico alternativo o ameace.
O �m da Guerra Fria prenunciou um novo modelo de organização social.
Contribuíram signi�cativamente para isso os avanços tecnológicos que
começaram a ser desenvolvidos a partir da segunda metade do século XX. As
novas tecnologias de informação e comunicação, as TICs, aproximaram o
mundo, intensi�cando o chamado processo de globalização (CASTELLS, 1999).
Com o �m da União Soviética e a ascensão da ideologia capitalista, o �uxo de
capitais entre os países passou a ser cada vez mais intenso (OLIVEIRA; COSTA,
2016).
O fenômeno da globalização atinge, desde então, todos os países, mas em graus
diferentes, variando de acordo com sua abertura comercial. Uma das principais
características do modelo de globalização é o seu caráter liberal, ou seja, a
liberalização econômica extrema. Consequentemente, instituições �nanceiras
internacionais passaram a exercer in�uência crescente na política econômica
dos países, sobretudo, nos subdesenvolvidos. Exemplos destas instituições são
o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização Mundial do Comércio
(OMC) e o Banco Mundial (BIRD). As orientações das instituições aos países
podem ser resumidas nos seguintes pontos principais: redução da interferência
do Estado na economia; privatização de empresas Estatais; e livre comércio,
sem barreiras alfandegárias e sem proteção às empresas nacionais (OLIVEIRA;
COSTA, 2016).
4.1.2 Mundo globalizado
Joseph Stiglitz (2002) argumenta que a globalização possui muitos aspectos
positivos, uma vez que reduziu o isolamento de alguns países, propiciando seu
desenvolvimento econômico e também colaborou em campanhas globais, como
as de combate a AIDS. Entretanto, o autor também salienta que para muitos
países a globalização foi um desastre, porque as políticas de cunho neoliberal
geraram desemprego e pobreza. Uma das causas foi que os países ricos não
seguiram as orientações que eles próprios recomendavamaos países pobres, ou
seja, enquanto orientavam maior abertura econômica aos países periféricos, eles
protegiam setores da sua própria economia. Dessa forma, os países
subdesenvolvidos tiveram suas economias enfraquecidas (STIGLITZ, 2002). A
globalização tem implicações nas mais diversas esferas da vida social como,
por exemplo, na questão da imigração e as consequências que esse fenômeno
traz, tema do nosso próximo tópico de estudo.  
Impulsionada pela revolução nas tecnologias da comunicação nas últimas
décadas, especialmente a partir da década de 1980, a globalização impacta a
economia, a política, a cultura, a organização social e a questão ambiental. Suas
4.2 Terrorismo e deslocamentos populacionais
O livro A Globalização e seus malefícios (STIGLITZ, 2002) do economista
estadunidense e vencedor do Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz é
um relato provocativo e contundente do cenário da política econômica
mundial. O autor demonstra como a expectativa das nações mais pobres
por maior participação na riqueza global não é satisfeita pela
globalização, mas que observa o efeito contrário: países ricos tornam-se
cada vez mais ricos, enquanto países pobres toram-se cada vez mais
pobres.
VOCÊ QUER LER?
consequências se fazem sentir também nos movimentos da população em torno
do globo: com as possibilidades em termos de comunicação e transporte
oferecidas pelo mundo globalizado, ao mesmo tempo em que se observa o
aprofundamento das desigualdades sociais e a eclosão de guerras, uma grande
massa populacional vislumbra na imigração uma nova oportunidade de vida.
Tais projetos de vida, não raro, esbarram no protecionismo e nas barreiras
impostas pelos países desenvolvidos para a imigração, barreiras estas que, cada
vez mais, encontram no medo do terrorismo o argumento para promoção de
políticas racistas e xenófobas. Mas antes de entrar na questão da relação
imigração e terrorismo, é preciso abordar as características da globalização, o
que vamos fazer a seguir. 
Desde a queda do Muro de Berlim e o avanço da liberalização econômica e da
livre iniciativa de mercado, as consequências da globalização na economia se
fazem sentir em todos os países do globo, o que re�ete na organização política.
O �lósofo e sociólogo Jürgen Habermas (2002) tem chamado atenção para duas
consequências políticas:
O processo de acumulação econômica do capitalismo globalizado é avesso ao
controle político das nações e, neste sentido, as funções regulatórias de
promoção de parâmetros equitativos e de justiça social, derivados de diretivas
políticas, seriam di�cultadas (DANNER, 2014). Assim, uma das principais
características da dimensão política da globalização é a crise do Estado
Nacional e a perda da soberania diante de grandes conglomerados econômicos
globais. O Estado, portanto, tem perdido a autonomia para gerir a economia por
suas próprias determinações políticas. 
4.2.1 As características políticas da globalização
Por um lado, a desestruturação do Estado de bem-estar
social (Welfare State), pois a globalização acarretaria uma
diminuição da autonomia política dos países (DANNER,
2014).
Por outro lado, o estabelecimento e a consolidação de
blocos de países com enorme poder político e econômico
ao mesmo tempo em que as desigualdades entre as
nações se aprofundam (DANNER, 2014).
Figura 3 - O mercado econômico e a especulação financeira governam a economia mundial e impactam
todos os países do globo
Fonte: JMiks, Shutterstock, 2021.
#PraCegoVer
Na figura, temos um painel com diversas
combinações numerais. Há, também, uma seta
indicando queda.
Se por um lado a expansão global de grandes empresas para países periféricos
re�ete em investimentos, circulação da economia e geração de empregos, é
inevitável observar que – em sua saga expansionista – as grandes empresas
buscam a maximização de seus lucros por meio de um rol de concessões que
garantam mão de obra e matéria-prima mais baratas, menor carga tributária e
menor regulação estatal sobre a força de trabalho. Bauman (2012) observa que
a fragmentação das demandas sociais, a limitação da ação política tradicional e
a desilusão com as alternativas ao capitalismo, após a queda do muro de Berlim,
contribuem para a fragilização do poder político nos dias de hoje. O
esvaziamento do Estado como espaço de ação coletiva de construção de um
projeto de sociedade abre espaço para o crescimento do poder da economia
globalizada e para a ideologia de mercado, que é por si mesma individualista e
sem preocupações éticas. Sendo assim, quais as consequências dessa
ideologia para a sociedade?   
4.2.2 As consequências sociais da globalização
Para Bauman (2012), as grandes corporações são, em termos econômicos, os
maiores bene�ciários da globalização. O que caracteriza as grandes
corporações nesse período de mercado global é a sua não localidade, ou seja,
estão presentes no mundo inteiro, mas os donos das empresas, os investidores,
são estrangeiros. Sendo estrangeiros, eles visam, via de regra, o lucro de seus
empreendimentos e não partilham do conhecimento da realidade e das
condições de vida dos trabalhadores de suas empresas localizadas em outros
países. Além disso, enquanto a empresa é global, isto é, pode se movimentar
pelo globo de acordo com seus interesses e oportunidades, os trabalhadores
são locais, estão presos ao seu espaço geográ�co – cidade, país – e sofrem as
consequências das decisões tomadas pelas grandes corporações (BAUMAN,
2012).
Ao se sujeitar às regras do mercado global, os Estados-Nação – especialmente
os países periféricos – �cam à mercê dos interesses da especulação �nanceira
e da barganha de vantagens promovidas pelas empresas em troca de alguns
poucos empregos e investimentos no país. Além disso, �cam obrigados a seguir
regras que mantenham a estabilidade �nanceira e econômica mesmo que seja
em detrimento de investimentos sociais. Bauman (2012) denuncia que a
propalada igualdade social advinda do desenvolvimento econômico e do livre
comércio tem se mostrado uma falácia. O que se veri�ca na realidade é um
aumento do acumulo da riqueza entre os mais ricos e uma queda vertiginosa
das condições de vida dos mais pobres. Ao contrário das maravilhas sonhadas
pelos crentes no poder da ciência e da tecnologia em tornar o mundo menos
injusto, a distribuição real das riquezas na era da globalização tem se mostrado
extremamente desigual (BAUMAN, 2012).
Figura 4 - No mundo globalizado, a desigualdade social, especialmente em países periféricos, tem se
aprofundado cada vez mais
Fonte: Fred Cardoso, Shutterstock, 2021.
#PraCegoVer
Na figura, temos a fotografia de uma região
urbana. Pode-se observar, em primeiro plano,
diversas casas construídas em meio ao morro.
Há vegetação ao redor. Já em segundo plano
temos diversos edifícios, demonstrando a
desigualdade social.
Se a lógica da globalização amplia os processos de pobreza e desigualdade
social, especialmente nos países periféricos, é necessário pensar em formas de
subordinar a economia global a valores éticos e humanos. Em 1999, a
Organização das Nações Unidas (ONU) publica o relatório “Globalização com
uma face humana”, que denunciava a sobreposição de interesses �nanceiros e
materiais aos interesses da nação e de seu povo. No relatório, a ONU a�rma que
“o objetivo do desenvolvimento é a criação de um ambiente que permita às
pessoas desfrutarem de uma vida longa, saudável e criativa” (PNUD, 1999, p.
4 apud RAMOS, 2002).
Portanto, para uma versão mais humana do processo de globalização é
necessário o estabelecimento de parâmetros éticos para o livre mercado e sua
atuação local. Ramos (2002) sugere tratar a globalização em termos de política
internacional de modo que haja uma ética nas comunicações, na economia, na
política e na cultura, ética esta presidida pelas noções de justiça e solidariedade,
valores universalmente presentes. A partir desse panorama sobre os impactos
da globalização na economia e política, vamos agora para a questão dos
deslocamentos populacionais e as novas con�gurações que o processotraz
para as sociedades. 
As migrações internacionais no século XXI são profundamente marcadas pela
globalização. A diminuição de distâncias e o amplo acesso à informação
colocam no horizonte do aspirante à migração não apenas o espaço geográ�co
mais próximo – outra cidade, outro estado – mas o mundo inteiro. Por outro
lado, as possibilidades migratórias se apresentam de formas distintas em
função do per�l do migrante. Enquanto o capital �nanceiro �ui livremente à
revelia das fronteiras entre os países, a mobilidade dos trabalhadores é
fortemente controlada por barreiras impostas pelos países desenvolvidos.  
O aumento do �uxo de informações acerca das oportunidades em países mais
desenvolvidos seduz uma grande massa de trabalhadores de países periféricos,
que partem em busca de melhores condições de vida. Mas se o acesso a
informações e a facilidade de deslocamento, representada atualmente pelos
meios de transportes globais e baratos, estimula o desejo de migração, as
oportunidades para os migrantes ainda são muito restritas.  Países
desenvolvidos tendem a fechar suas fronteiras devido ao temor de receber
enormes massas de migrantes sem estrutura e reais oportunidades para �xá-
los. Porém, estudiosos do tema têm apontado uma série de possíveis vantagens
4.2.3 A migração na era da globalização e os impactos do
terrorismo internacional
O livro Americanah (ADICHIE, 2014) da escritora nigeriana Chimamanda
Ngozie Adichie conta a história de dois nigerianos que precisam fugir do
Regime Militar de seu país e descobrem-se exilados nos Estados Unidos e
na Inglaterra. As trajetórias dos protagonistas são marcadas, a partir de
então, por questões culturais e raciais, pois são vistos sempre como “o
outro”, o não branco, o não europeu, o não americano.
VOCÊ QUER LER?
da migração, considerando os ganhos dos lugares de destino: barateamento dos
custos e da qualidade de vida da população, uma vez que migrantes realizam
trabalhos que os nativos não têm interesse em fazer, e por custos mais baixos; a
revitalização de sociedades envelhecidas, a partir da migração de pessoas
jovens; o acesso a recursos humanos quali�cados, cujos custos de quali�cação
foram assumidos por outros países; o aumento da produtividade; e o aumento
de consumidores e contribuintes (MARTINE, 2005).
A apreciação das vantagens da imigração esbarra, porém, em movimentos
sociais cada vez mais numerosos no mundo e caracterizados por seu viés
antimigrantes, racistas e xenófobos. Após os atentados terroristas de 11 de
setembro de 2001, tais movimentos ganharam força e a identi�cação do outro –
especialmente se o “outro” for de uma etnia, religião, idioma ou aparência
diferente dos nativos locais – com o “inimigo” ou com o “terrorismo” vem
aumentando a rejeição aos migrantes por parte das populações de países
desenvolvidos (MARTINE, 2005).
A tendência da grande maioria dos países desenvolvidos atualmente é de
fechar suas fronteiras para a imigração, tanto em decorrência da crise
econômica que o mundo vem enfrentando, quanto pela pressão de
grupos de extrema direita que alegam o receio de ações terroristas em
seu território. Na contramão dessa tendência, países como o Canadá têm
facilitado e incentivado o �uxo de imigrantes ao seu território, acolhendo,
inclusive, refugiados de guerras como as que acontecem no Oriente
Médio. Quais as razões que levam o Canadá a adotar essa postura diante
do atual �uxo migratório global? Além das causas humanitárias em
relação a refugiados de guerra e a postura enfática contra os crescentes
movimentos xenófobos e racistas que eclodem no mundo, o governo
canadense tem apostado nos fatores positivos da imigração: com uma
população envelhecida, necessita de pessoas jovens para movimentar a
economia e suprir o setor de serviços. Mas como colocar em prática essa
postura? O sucesso do empreendimento repousa no planejamento e na
criação de políticas que visem auxiliar e acompanhar a adaptação e 
inserção dos migrantes na sociedade canadense.
ESTUDO DE CASO
A eclosão de guerras em vários locais do globo, especialmente no Oriente Médio,
tem deslocado um grande volume de pessoas que precisam fugir por questões
de sobrevivência. A resistência dos países desenvolvidos em recebê-las
encontra argumento nas precauções contra o terrorismo. Martine (2005)
ressalta, porém, que a relação entre migração e terrorismo é complexa, mas o
que desencadeia ações terroristas não é a imigração, mas a crescente
desigualdade entre os países. Uma maior abertura poderia, inclusive, reduzir o
terrorismo, na medida em que reduz a desinformação e descon�ança entre os
povos. 
Figura 5 - Dados da ONU apontam que, atualmente, 65,3 milhões de pessoas estão na condição de
refugiadas de seus países
Fonte: Sadik Gulec, Shutterstock, 2021.
#PraCegoVer
Na figura, temos adultos e crianças negros
vestidos com turbantes e lenços, utilizando um
sistema improvisado de água. Há um cano
enterrado e ligado a outro que transporta o
elemento. As pessoas carregam galões para
serem enchidos, os quais estão ao redor do
sistema. Ao fundo, pode-se observar uma cerca
alta e, atrás desta, mais pessoas e uma
vegetação seca.
As grandes ondas migratórias que assistimos atualmente são re�exo da
condição de mundo globalizado: por um lado, a facilidade tecnológica em
acessar informações e deslocar-se pelo globo; de outro, o protecionismo de
países desenvolvidos e as barreiras à livre circulação dos trabalhadores,
fenômeno  que se retroalimenta do medo xenofóbico ao imigrante, identi�cado
como inimigo da pátria e potencial terrorista. A livre circulação do capital e o
liberalismo econômico acarretam consequências drásticas à autonomia dos
Estados-Nação: em nome da economia global, impõe-se a economias periféricas
uma série de obrigações que as obrigam a deixar em segundo plano as políticas
de desenvolvimento social e distribuição de renda. Como consequência,
observamos um aprofundamento das desigualdades sociais e aumento da
pobreza, enquanto poucos conglomerados econômicos acentuam sua
acumulação econômica. Vamos continuar nosso estudo sobre os desa�os da
sociedade moderna com o tema da responsabilidade social. 
Atualmente, tanto a atuação das empresas quanto a dos indivíduos tem se
pautado cada vez mais por um viés sustentável, ético, e que considere a
responsabilidade social junto à sociedade e ao meio ambiente. Quando
pensamos em desenvolvimento sustentável, nos remetemos a um equilíbrio
entre os objetivos de desenvolvimento econômico, desenvolvimento social e
conservação ambiental. A responsabilidade social corporativa vem atraindo
olhares da sociedade e de estudiosos sobre o tema, especialmente em uma
época de acentuamento das desigualdades sociais e do aprofundamento da
degradação do meio ambiente. Mas quais são os fundamentos da
responsabilidade social? E como ela se aplica na atuação das empresas e
corporações?
O conceito de responsabilidade social tornou-se central a partir da emergência
da discussão sobre a necessidade de um desenvolvimento sustentável, que leve
em consideração a preservação do meio ambiente e a utilização consciente de
recursos naturais. Mas a ideia de não é recente. Iniciativas empresariais que
visam à atuação das corporações na sociedade de modo mais amplo,
4.3 Responsabilidade Social
4.3.1 Os fundamentos da responsabilidade social
extrapolando seu objetivo imediato, que é a obtenção de lucro, existem desde o
�nal do século XIX e início do século XX. Porém, nesse período, as ações das
empresas orientavam-se por um viés mais �lantrópico e assistencialista na sua
atuação junto à sociedade. Atualmente, a utilização do termo “�lantropia”,
quando se trata de ações de responsabilidade social, é visto de forma pejorativa,
pois remete a ações que não buscam a transformação da sociedade. 
Figura 6 - Diante dos desafios sociais e ambientais de nossa época, o conceito de responsabilidade social
está cada vez mais presente na atuação empresarial
Fonte: wk1003mike, Shutterstock, 2021.
#PraCegoVer
Na figura, temos uma fotografia editadadigitalmente. Há três torres de moedas
empilhadas, uma pequena, outra média e a
última mais alta. Elas trazem terra por cima e
uma mudinha de planta. Atrás dessas torres de
moeda, encontramos um espécie de gráfico
indicando crescimento conforme as torres
aumentam de tamanho.
A noção de responsabilidade social só ganhou forma a partir das décadas de
1960 e 1970, coincidindo com grandes transformações sociais, políticas e
culturais do mundo, especialmente a crescente crítica às guerras e ao uso de
armas químicas e nocivas à sociedade e ao meio ambiente. Já a partir da
década de 1980 e a crise no Estado de bem-estar social nos países centrais do
capitalismo, como Estados Unidos e da Europa, a participação das empresas e
das corporações na manutenção dos níveis de emprego foi sendo cada vez mais
valorizada (ALENCASTRO, 2012).
No Brasil, a consolidação do termo “responsabilidade social” se deu a partir dos
anos 1990, principalmente em função do crescimento de movimentos sociais
que pressionavam setores da sociedade – como governo e iniciativa privada –
pela diminuição da pobreza e da fome, bem como da desigualdade social.  A
criação do Instituto Ethos, em 1998, e a atuação do sociólogo Herbert de Souza
na campanha contra a fome, foram grandes molas propulsoras da discussão
sobre responsabilidade social nas empresas (ALENCASTRO, 2012).
É do Instituto Ethos, que tem como objetivo orientar e incentivar empresas
acerca de sua responsabilidade socioambiental, umas das de�nições mais
corrente para o conceito de responsabilidade social: 
Herbert de Souza, o Betinho, foi sociólogo mineiro que se notabilizou pela
criação da Campanha contra a Fome, a Miséria e Pela Vida e notabilizou a
discussão sobre a miséria e a desigualdade no país. Sua atuação em prol
da dignidade humana lhe rendeu uma indicação ao prêmio Nobel da Paz
em 1993. Hemofílico e soropositivo, Betinho faleceu em 1997, vítima de
Hepatite B.  
VOCÊ O CONHECE?
O sociólogo John Elkington formulou o conceito de triple bottom line, ou tripé da
sustentabilidade, isto é, para o autor, uma empresa é sustentável quando
respeita três princípios básicos: ser �nanceiramente viável, ser socialmente justo
e ser ambientalmente responsável (ALENCASTRO, 2012). Mas como podemos
pensar a atuação da empresa dentro do paradigma da responsabilidade social e
do tripé da sustentabilidade? 
Dentro das empresas, o conceito de responsabilidade social refere-se, segundo
Alencastro (2012), ao oferecimento de produtos socialmente corretos, ao
estabelecimento de um relacionamento ético com clientes, fornecedores e
funcionários, bem como a preocupação com o passivo  ambiental gerado pela
atividade da empresa. A prática da responsabilidade social deve alcançar tanto o
público interno, tais como os funcionários e seus familiares, quanto o público
externo, a comunidade na qual se insere o meio ambiente. Na prática, a
responsabilidade social refere-se a liderar e apoiar, dentro dos limites de
recursos da corporação, ações de interesse social. 
4.3.2 A responsabilidade social na atuação empresarial
Responsabilidade social empresarial é a forma de gestão que
se define pela relação ética e transparente da empresa com
todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo
estabelecimento de metas empresariais que impulsionem o
desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando
recursos ambientais e culturais para as gerações futuras,
respeitando a diversidade e promovendo a redução das
desigualdades sociais. (INSTITUTO ETHOS, apud ALENCASTRO,
2012, p. 134)
No Brasil, o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA) realizou, em
2006, a pesquisa “Ação Social das Empresas”, que demonstrou as principais
áreas e ações de responsabilidade social no país, bem como os públicos-alvo.
Ações relativas à segurança alimentar, assistência social, saúde, educação e
lazer e recreação formam os principais focos da responsabilidade social (IPEA,
2006).
Empresas podem se guiar também por normas e indicadores de
responsabilidade social, que estão na pauta da discussão pelo estabelecimento
de referências e parâmetros para este tema. A ONG internacional  Social
Accountability International  (SAI)  propôs nove itens de veri�cação no que se
refere ao público endógeno da empresa (ALENCASTRO, 2012): 
Não emprego de trabalho infantil.
Não emprego de trabalho forçado.
Garantia de saúde e segurança no local de
trabalho.
Item 1
Item 2
Item 3
O documentário Uma Empresa Decente, a Decent Factory em inglês,
(BALMÈS, 2004) apresenta o dilema de uma grande empresa de
telecomunicações entre guiar-se pelo lucro ou obedecer a princípios
morais. A re�exão do �lme centra-se na questão sobre o que signi�ca ser
uma empresa correta em uma época que se valoriza a responsabilidade
social. 
VOCÊ QUER VER?
Aliar a responsabilidade social aos objetivos de produtividade e competitividade
das corporações não é uma tarefa simples. Para obter maiores chances de êxito,
é necessário que o compromisso com a responsabilidade socioambiental esteja
presente já no planejamento estratégico das empresas, de modo a ser fator
constitutivo de sua atuação desde a concepção do negócio.
Garantia de liberdade de associação e
negociação coletiva aos funcionários.
Não discriminação de qualquer natureza.
Proibição de práticas disciplinares.
Respeito à lei quanto à jornada de trabalho.
Remuneração digna.
Garantia de que todos os requisitos da norma
sejam aplicados corretamente.
Item 4
Item 5
Item 6
Item 7
Item 8
Item 9
Antes de ser um entrave para os objetivos �nanceiros - que são legítimos em
qualquer empresa privada - a responsabilidade social pode ser uma aliada e
deve ser encarada como um investimento em médio e longo prazo. Os ganhos
para a imagem da empresa, a identi�cação com setores progressistas da
sociedade, cada vez mais preocupados com o impacto socioambiental das
corporações, bem como o reconhecimento social e estatal, que pode reverter-se
em futuros incentivos �scais, são algumas das vantagens para enquadrar-se no
paradigma cada vez mais presente no mundo corporativo: de atuação
responsável e ética junto à sociedade e o meio ambiente. Em nosso próximo
item, vamos abordar quais são os desa�os para se chegar a uma sociedade
justa e igualitária.   
Diante do cenário globalizado e regido pela lógica mercantil que caracteriza
nosso tempo, as sociedades e nações, especialmente das economias
periféricas, enfrentam grandes desa�os para alcançar níveis de desenvolvimento
4.4 Os desafios para a construção de uma
sociedade justa
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgou dados que
mostram que mais de 40 milhões de pessoas em todo o mundo foram
vítimas de trabalho escravo em 2016. Estimativas apontam que as
mulheres são as mais afetadas pelas modalidades modernas de
escravidão, representando quase 29 milhões de meninas e mulheres,
inclusive vítimas de trabalho forçado na indústria do sexo (CAZARRÉ,
2017). Leia mais em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-
humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit-
pede-mais-empenho-dos (http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-
humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit-
pede-mais-empenho-dos).
VOCÊ SABIA?
http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit-pede-mais-empenho-dos
social e econômico satisfatório em termos de igualdade, equidade e justiça
social para sua população. Mas o que signi�ca justiça social? Qual a sua relação
com os desa�os que marcam nossa época? Como dar materialidade à justiça
social? 
Com o advento da globalização e o agravamento das desigualdades sociais em
grande parte dos países do mundo, a discussão acerca do que é uma sociedade
justa e de como alcançá-la tornou-se uma questão de grande relevância. Nesse
contexto, o conceito de justiça social é central e refere-se, de forma sucinta, ao
problema de como uma sociedade deve, eticamente, distribuir os bens por ela
produzida (SANTA HELENA, 2008).
A construção de uma sociedadeque se pretende justa não pode prescindir de
dois princípios fundamentais: a igualdade e a equidade. A necessidade da
construção de políticas públicas que leve em conta tais princípios é
especialmente forte nas sociedades expostas ao sabor do livre mercado. Como
vimos ao longo deste capítulo, o liberalismo econômico vem aprofundando as
diferenças sociais, especialmente nos países periféricos, o que deve ser
contrabalançado com políticas sociais que tenham como foco a redistribuição
dos bens. 
4.4.1 O conceito de justiça social
Figura 7 - Em contextos de grande desigualdade, cabe ao Estado a aplicação de políticas e programas que
zelem pela igualdade e equidade social
Fonte: maxim ibragimov, Shutterstock, 2021.
#PraCegoVer
Na figura, temos a fotografia de uma criança em
meio ao lixo. Ela está ajoelhada e carrega um
saco. Ao fundo, pode-se observar caixas, sacolas
e pedras.
Dessa forma, é na justiça distributiva que se ancora atualmente a discussão
sobre justiça social. O conceito moderno de justiça distributiva, de acordo com
Fleischacker (2006), tem no Estado o agente garantidor de que os bens sejam
distribuídos na sociedade de modo a suprir necessidades e direitos básicos para
a condição da cidadania. Já o �lósofo John Rawls, em sua obra “Uma teoria da
Justiça”, expõe as bases da teoria de justiça como equidade. Para o autor
(2002), alcançar a equidade, condição da justiça social, são necessários três
pontos fundamentais:
A garantia de liberdades fundamentais: refere-se ao direito
de cada pessoa a um conjunto de liberdades básicas, que
seja compatível com o conjunto de liberdades de toda a
população, tais como a liberdade política, de associação,
de palavra, de consciência e de direito à propriedade.
A ênfase do conceito de justiça social no acesso aos direitos básicos da
cidadania a toda população, o que demanda esforços distributivos por parte do
Estado, é especialmente importante em países periféricos do capitalismo, nos
quais a globalização impacta mais fortemente em suas características
negativas. Políticas de compensação e distribuição de renda para pessoas em
desvantagem social são fundamentais para que se alcance uma condição
mínima de justiça social. E o que vem a ser justiça social? Aliás, justiça e direito
tem o mesmo signi�cado? Estes serão alguns dos assuntos tratados no tópico a
seguir.  
Embora as noções de Direito e Justiça pareçam sinônimos, é possível observar,
ao longo da história, períodos de maior ou menor afastamento entre os dois
conceitos. Na consciência coletiva, porém, essas noções se entrelaçam a ponto
de ser considerada uma coisa só. Mas na prática, é possível a�rmar que nem
tudo o que direito é justo, do mesmo modo que nem tudo o que é justo, é direito
(CAVALIERI FILHO, 2002).  
Enquanto a noção de justiça se refere a valores que são inerentes ao ser
humano, como a liberdade e a igualdade, dignidade, equidade etc., que se
relacionam com valores morais da sociedade, a noção de direito refere-se a um
instrumento criado para a realização da justiça. Conforme Cavalieri Filho (2002),
como a justiça é um sistema de valores em constante transformação, nem
sempre o Direito é capaz de satisfazer as necessidades da Justiça. Isso pode se
dar por diversos motivos: di�culdade do direito em acompanhar as mudanças
sociais, di�culdades na própria concepção das regras do direito, falta de
disposição política para implementá-lo, dentre outros. 
A igualdade de oportunidades.
A garantia de que as pessoas menos favorecidas na
sociedade recebam benefícios que os alcem a condição de
cidadania.
4.4.2 As interfaces da Justiça
O direito, assim, torna-se um direito injusto. Para o autor, a �nalidade do direito é
a realização da justiça. Já a �nalidade da justiça, é a transformação social, ou
seja, a condução de uma sociedade à justiça social. Se o direito deve ser um
instrumento para alcançar a justiça, o alcance da verdade é �nalidade do direto
para obter uma decisão justa (LUNARDI; DIMOULIS, 2007).
A discussão sobre a realização da justiça por meio da aplicação do direito evoca
também outra faceta: a distinção entre justiça universal e justiça particular. Esta
questão vem de Aristóteles e está intrinsecamente ligada ao debate sobre
justiça como equidade (RAWLS, 2002). A justiça universal relaciona-se à
legalidade, ou seja, remete ao todo da sociedade. A lei e a justiça aplicam-se a
todos e a todas as situações, de forma abstrata, genérica e universal.
Porém, existem casos particulares e especí�cos cuja justiça universal pode não
alcançar critérios de justiça, mas ao contrário, provocar injustiça. Nestes casos,
entra em cena a justiça particular. Essa segunda forma de justiça relaciona-se à
igualdade (ARISTÓTELES, 1979). Isso quer dizer que, casos em que a justiça
universal não satisfaça os critérios de equidade de um indivíduo ou um grupo
em particular, devendo então a justiça guiar-se, não pela lei genérica, aplicável a
todos, mas por critérios particulares que atendam a uma decisão justa e
equitativa. A seguir, vamos tratar dos desa�os enfrentados pela justiça social. 
O desenvolvimento econômico sem preocupação com o bem-estar coletivo
favorece a concentração de renda nas mãos de poucas pessoas e, por
consequência, a desigualdade social. O resultado disso são países que, mesmo
com índices econômicos em ascensão, não conseguem traduzir esse
crescimento em melhoria na condição de vida da população. O fato é que o
4.4.3 Os desafios da Justiça Social
O documentário Justiça (RAMOS, 2004) retrata a rotina do Tribunal de
Justiça do Rio de Janeiro, expondo a necessidade de mudanças drásticas
no sistema judicial do país. A justiça é retratada em toda sua burocracia,
desigualdade e injustiça, na qual setores marginalizados da sociedade
são duplamente culpabilizados: por seus supostos delitos e pelo lugar
que ocupam na escala social. 
VOCÊ QUER VER?
mercado não é capaz de gerar justiça social e acesso à cidadania. É necessário
que ações partam do Estado, tanto em termos de regulação da economia,
quanto em termos de programas e ações que visem garantir a toda população
diretos básicos e condições de vida dignas.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 3º, contempla aspectos
referentes à diminuição da desigualdade social e promoção de uma sociedade
justa: 
A aplicação dos desígnios da Constituição na prática, porém, é tarefa árdua e
complexa. Ao longo de sua história, o Brasil sempre se estruturou como uma
sociedade desigual, cujos interesses de uma parcela pequena da população
prevaleciam sobre os interesses – e direitos – da grande maioria. Desde os
primeiros anos do século XXI, observamos alguns avanços no sentido de
universalizar o acesso a direitos básicos da população: programas de
distribuição de renda, aumento do acesso de pessoas de baixa renda à
educação superior, programas de segurança alimentar, regulamentação de
pro�ssões historicamente marginalizadas, como o caso do emprego doméstico,
dentre outros. 
Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do
Brasil: i) construir uma sociedade livre, justa e solidária; ii)
garantir o desenvolvimento nacional; iii) erradicar a pobreza e
a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e
regionais; e iv) promover o bem de todos, sem preconceitos de
origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação. (BRASIL, 2002, p. 13)
Os esforços, porém, são frágeis diante do abismo social vivenciado no país:
segundo ranking de desigualdade social da ONU, o Brasil é o décimo país mais
desigual do mundo (PNUD, 2016). John Rawls (2002), a partir de sua teoria da
justiça como equidade, busca estabelecer princípios e instituições  necessários
para que se alcance a justiça social. Em primeiro lugar, aponta que o sistema
educacional deva ser subsidiado pelo governo, de modo a garantir liberdade de
consciência e igual acesso à educação para todos os cidadãos. Em segundo
lugar, o governo deve garantir uma renda mínima a todas as famílias, de modo
que os direitos básicos sejam garantidos.Rawls (2002) defende também que as
instituições governamentais devam comportar programas de apoio para, por um
lado, garantir a e�ciência da economia do mercado, mantendo o sistema de
preços em patamar competitivo e garantindo níveis de emprego; e por outro,
garantir a equidade social por meio de impostos sobre herança e consumo e por
políticas de transferência de renda para os setores mais fragilizados da
população.
Como vimos, os desa�os da justiça social em tempos de globalização e livre
circulação do capital econômico são imensos. Para que os países logrem
sucesso, é necessário atentar para o fortalecimento de políticas do Estado
frente às demandas e exigências do mercado. Além disso, ações de inclusão
social e diminuição da desigualdade - em curto, médio e longo prazo - devem ser
pensadas envolvendo todos os setores – sociedade civil, mercado e Governo. 
O Programa Bolsa Família, criado em 2003 pelo Governo Federal, tornou-
se um programa de referencia mundial em distribuição de renda. Estudos
sobre o impacto do programa mostram que, com um baixo custo aos
cofres públicos, o Bolsa Família contribui para o aquecimento da
economia; superação da extrema pobreza; melhorias na saúde e na
educação da população de baixa renda; redução do trabalho infantil; e
empoderamento das mulheres (CAMPELO; NERI, 2013). 
VOCÊ SABIA?
Chegamos ao �nal do capítulo e pudemos re�etir sobre as principais tendências
sociopolíticas do mundo pós-socialista, ou seja, do mundo globalizado.
Estudamos os problemas contemporâneos relacionados às migrações, à
responsabilidade social e à noção de justiça social.
Nesta unidade, você teve a oportunidade de:
CONCLUSÃO
estudar a Guerra Fria e suas consequências para as
sociedades contemporâneas, bem como identi�car as
características e tendências da globalização; 
conhecer os dilemas ensejados pelos deslocamentos
populacionais, seus motivos e consequências, e  desa�os
frente à globalização e à reestruturação econômica das
últimas décadas; 
compreender a responsabilidade social como questão
importante da sociedade contemporânea, sobretudo,
quando se trata da atuação das empresas; 
entender o conceito de justiça social e pensar sobre os
desa�os para a construção de uma sociedade com mais
igualdade social.
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