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Reflexões sobre a Vontade e o Pensamento

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Quem te obriga a levantar
altas torres sobre o vento?
Quem lhe deu ao pensamento
as asas para voar,
senão teu próprio ardimento?
Então, se a cera oportuna
não saíu, e te desterra
a luz do Sol importuna,
quando caies sobre a terra
porque infamas a Fortuna?
Fortuna, não, providência
é da mão que o mundo rege,
por mais que o esprito forceje,
pôr-lhe tudo em contingência,
para que nada deseje.
Aquele sempre temer,
aquele nunca acertar,
aquele nada entender,
aquele tanto enganar,
que outra cousa quer dizer?
Quantas vezes, persuadido
da fé dos olhos, errei,
e quantas vezes busquei
rosas no campo florido,
onde só serpes achei!
E quantas, bem diferente,
temendo-me dos abrolhos,
caminhada impaciente,
e contra o voto dos olhos
fui parar ditosamente!
Ai de quem se persuade
da teima do pensamento,
e para julgar o intento
manda assentar a Vontade
no trono do Entendimento!
Tal o processo seria
qual do juiz a eleição:
a prova será profia,
as rezões, a sem-razão,
e a sentença, tirania.
Eis-me aqui, sem diferença:
doutro tal juiz que elejo
executado me vejo,
e por outro tal sentença
que foi dar o meu desejo.
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