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Dissertação - Moisés Bauer Luiz


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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU 
MESTRADO ACADÊMICO EM DIREITO 
 
 
 
MOISÉS BAUER LUIZ 
 
 
 
 
 
 
A IMPLEMENTAÇÃO DO ARTIGO 33 DA CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS 
DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA E A DESIGNAÇÃO DE ESTRUTURA 
INDEPENDENTE DE MONITORAMENTO NO BRASIL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Porto Alegre 
2024 
2 
 
 MOISÉS BAUER LUIZ 
 
 
 
 
 
 
 
A IMPLEMENTAÇÃO DO ARTIGO 33 DA CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS 
DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA E A DESIGNAÇÃO DE ESTRUTURA 
INDEPENDENTE DE MONITORAMENTO NO BRASIL 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de 
Pós-Graduação Stricto Sensu da UniRitter 
– Grupo Ânima Educação, como requisito 
parcial para obtenção do grau de Mestre 
em Direito. 
 
Área de concentração: Direitos Humanos 
 
Orientadora: Profa. Dra. Sandra Regina 
Martini 
 
 
 
 
 
 
 
Porto Alegre 
2024 
 
3 
 
AGRADECIMENTOS 
 
À Professora Sandra Regina Martini por toda acolhida e por suas valorosas 
orientações. 
À Professora Carina Rodrigues de Araújo Calabria por todas suas contribuições 
e orientações. 
Ao amigo Rafael Koerig Gessinger pelas relevantes reflexões e sugestões para 
o melhor desenvolvimento desta dissertação. 
Às amigas Luana Fornazier dos Santos e Clarissa Campani Mainieri pelas 
significativas e indispensáveis colaborações para a adequada apresentação formal 
deste trabalho. 
A todos os professores e colegas do Programa de Pós-Graduação em Direito da 
Uniritter por tantos aprendizados. 
A minha família, em especial meus pais, Maria e Eneu, e minha esposa Melissa, 
pelo incentivo. 
 
4 
 
RESUMO 
 
Transcorridos mais de quatorze anos desde a vigência da Convenção sobre os 
Direitos das Pessoas com Deficiência sem que o estado brasileiro implementasse o 
seu Artigo 33, tem-se o problema de pesquisa: como deve ser o mecanismo nacional 
de monitoramento da Convenção, para que seja assegurada a efetiva participação 
das pessoas com deficiência? Este estudo investigou os fundamentos e os requisitos 
necessários para a adequada estruturação de um mecanismo independente de 
monitoramento da citada Convenção no Brasil, tendo como objetivos específicos 
investigar como está delineado o sistema brasileiro de garantia dos direitos das 
pessoas com deficiência; identificar os critérios necessários para a estruturação de 
um mecanismo independente de monitoramento nacional de tratados de direitos 
humanos e identificar o modelo de mecanismo independente de monitoramento 
apropriado aos sistemas jurídico e administrativo brasileiros. A pesquisa foi 
desenvolvida a partir do método hipotético dedutivo, baseado em fontes documentais, 
por revisão bibliográfica e documental de fontes que abordam temas relacionados à 
participação social, às Instituições Nacionais de Direitos Humanos e ao 
monitoramento nacional de tratados internacionais. Fez-se um resgate histórico 
demonstrando a trajetória do movimento de luta das pessoas com deficiência pelo 
reconhecimento de cidadania, analisando a efetividade dos direitos conquistados e a 
fragilidade dos mecanismos de monitoramento das políticas públicas desenvolvidas 
em favor desse segmento no Brasil. Investigou-se a origem das instituições nacionais 
de direitos humanos (INDH), os princípios de Paris, os principais modelos de 
instituições nacionais de direitos humanos e os desafios para sua estruturação. Foram 
analisadas as estruturas de participação social existentes no Brasil e as diretrizes 
definidas pelo Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização 
das Nações Unidas referente aos mecanismos nacionais de monitoramento. Ao final, 
são apresentados alguns apontamentos para que o mecanismo independente de 
monitoramento a ser implementado no Brasil atenda as exigências da convenção e 
seja adequado aos sistemas jurídico e administrativo brasileiros. 
 
Palavras-chave: Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência; Artigo 
33; participação social; instituições nacionais de direitos humanos; Princípios de Paris. 
 
5 
 
ABSTRACT 
 
More than fourteen years after the enactment of the Convention on the Rights of 
Persons with Disabilities, the Brazilian state has yet to implement Article 33, presenting 
the research problem: how should the national monitoring mechanism of the 
Convention be structured to ensure the effective participation of persons with 
disabilities? This study aimed to investigate the foundations and necessary 
requirements for the proper structuring of an independent monitoring mechanism of 
the said Convention in Brazil, with specific objectives to explore how the Brazilian 
system for guaranteeing the rights of persons with disabilities is outlined, to identify the 
criteria necessary for the structuring of an independent national human rights treaties 
monitoring mechanism, and to identify the model of independent monitoring 
mechanism appropriate to the Brazilian legal and administrative systems. The 
research was developed using the hypothetical deductive method, based on 
documentary sources, through bibliographic and document review of sources that 
addressed themes related to social participation, National Human Rights Institutions, 
and national monitoring of international treaties. An historical overview was sought to 
demonstrate the trajectory of the disability rights movement towards the recognition of 
citizenship, analyzing the effectiveness of the rights achieved and the fragility of the 
monitoring mechanisms of public policies developed in favor of this segment in Brazil. 
The origin of national human rights institutions (NHRI), the Paris Principles, the main 
models of national human rights institutions, and the challenges for their structuring 
were investigated. The existing structures for social participation in Brazil and the 
guidelines defined by the United Nations Committee on the Rights of Persons with 
Disabilities regarding national monitoring mechanisms were analyzed. In the end, 
some notes are presented so that the independent monitoring mechanism to be 
implemented in Brazil meets the convention's requirements and is suitable for the 
Brazilian legal and administrative systems. 
 
Keywords: Convention on the Rights of Persons with Disabilities; article 33; social 
participation; national human rights institutions; Paris Principles. 
 
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LISTA DE FIGURAS 
 
Figura A - Mapa de indicação de países com instituições credenciadas pela Aliança 
Global de Instituições Nacionais de Direitos Humanos (GANHRI) 
 
 
7 
 
SUMÁRIO 
INTRODUÇÃO................................................................................................................................................................... 8 
1. A PARTICIPAÇÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NAS ESTRUTURAS DE 
PROTEÇÃO E GARANTIA DE DIREITOS ..................................................................................................... 12 
1.1 A trajetória das pessoas com deficiência, da exclusão até a luta pela inclusão.. 12 
1.2 Os direitos conquistados a partir da mobilização das próprias pessoas com 
deficiência .................................................................................................................................................................. 17 
1.3 Os espaços de participação política das pessoas com deficiência no Brasil ....... 28 
1.4 A efetividade dos mecanismos de monitoramento das políticas públicas 
existentes no Brasil .............................................................................................................................................. 34 
2. INSTITUIÇÕES NACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS E OS PRINCÍPIOS DE PARIS 41 
2.1 Origem das instituições nacionais de direitos humanos..................................................... 41 
2.2 Os Princípios de Paris ................................................................................................................................44 
2.3 Modelos de Instituições Nacionais de Direitos Humanos ................................................... 51 
2.3.1 A Origem e a Evolução do Conceito do Modelo de Ombudsman Clássico ................ 52 
2.3.2 A Comissão de Direitos Humanos como Instituição Nacional de Direitos Humanos
 ................................................................................................................................................................................................. 53 
2.3.3 O Ombudsman de Direitos Humanos como Modelo de INDH ......................................... 54 
2.4. Desafios para estruturação de uma instituição nacional de direitos humanos 
nos termos estabelecidos pelos Princípios de Paris e a atuação da aliança global de 
Instituições Nacionais de Direitos Humanos ....................................................................................... 54 
2.4.1 Aliança Global de Instituições Nacionais de Direitos Humanos (GANHRI) ............... 56 
2.4.2 Credenciamento de INDHs pela Aliança Global de Instituições Nacionais de 
Direitos Humanos (GANHRI) ......................................................................................................................... 57 
2.4.3 O Status do Conselho Nacional dos Direitos Humanos do Brasil perante a Aliança 
Global de Instituições Nacionais de Direitos Humanos.................................................................... 59 
3. A ESTRUTURA DE UM MECANISMO INDEPENDENTE PARA PROMOVER, 
PROTEJER E MONITORAR A IMPLEMENTAÇÃO DA CONVENÇÃO SOBRE OS 
DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO BRASIL ............................................................. 63 
3.1. As estruturas existentes no Brasil que se propõem a monitorar a 
implementação da convenção ....................................................................................................................... 64 
3.2. O projeto de lei nº 795 de 2022 e a proposta de criação da Instituição Nacional 
dos Direitos das Pessoas com Deficiência – INADE ...................................................................... 69 
3.3. As diretrizes do Comitê dos Direitos das Pessoas com Deficiência para as 
estruturas de monitoramento independentes ..................................................................................... 73 
3.4. Como deve ser a estrutura de monitoramento independente da Convenção 
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência adequada ao sistema jurídico e 
administrativo brasileiro? ................................................................................................................................ 79 
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................................... 84 
REFERÊNCIAS .............................................................................................................................................................. 88 
 
 
8 
 
INTRODUÇÃO 
 
Esta pesquisa tem como tema a estrutura independente de monitoramento da 
Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, doravante denominada 
Convenção ou CDPD, no Brasil. A partir da ratificação da Convenção pelo Brasil, 
promulgada pelo Decreto 6.949, de 25 de agosto de 2009, surge a obrigação de a 
República Federativa do Brasil estabelecer um mecanismo de monitoramento em 
âmbito nacional, autônomo e independente, levando em conta os princípios relativos 
ao status e ao funcionamento das instituições nacionais de proteção e promoção dos 
direitos humanos, a fim de garantir a implementação do artigo 33 da CDPD (Brasil, 
2009). 
O aludido artigo determina que o Estado Parte da Convenção manterá, 
fortalecerá, designará ou estabelecerá estrutura, incluindo um ou mais de um 
mecanismo independente, de maneira apropriada, para promover, proteger e 
monitorar a implementação da Convenção. Esse dispositivo determina que, ao 
designar ou estabelecer tal mecanismo, o Estado Parte levará em conta os princípios 
relativos ao status e ao funcionamento das instituições nacionais de proteção e 
promoção dos direitos humanos, também conhecidos por Princípios de Paris, 
ressaltando que a sociedade civil e, particularmente, as pessoas com deficiência e 
suas organizações representativas serão envolvidas e participarão plenamente no 
processo de monitoramento (Brasil, 2009). 
A partir da análise dos sistemas jurídico e administrativo brasileiros, 
considerando as dimensões geográfica e demográfica do País, as diversas condições 
de deficiências, como físicas, visuais, auditivas, intelectuais e mentais, as distintas 
realidades sociais, econômicas e culturais existentes no Brasil, tem-se o problema de 
pesquisa: como deverá ser o mecanismo nacional de monitoramento da Convenção 
dos Direitos da Pessoa com Deficiência, em especial quanto a sua composição, a fim 
de assegurar a efetiva participação das pessoas com deficiência? 
O objetivo geral deste estudo é investigar os fundamentos e os requisitos 
necessários para a adequada estruturação de um mecanismo independente de 
monitoramento da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência no 
Brasil, tendo como objetivos específicos os seguintes: 
 
9 
 
a) investigar como está delineado o sistema brasileiro de garantia 
dos direitos das pessoas com deficiência; 
b) identificar os critérios necessários para a estruturação de um 
mecanismo independente de monitoramento nacional de tratados de direitos 
humanos; 
c) identificar o modelo de mecanismo independente de 
monitoramento apropriado aos sistemas jurídico e administrativo brasileiro, que 
atenda ao disposto no artigo 33, parágrafos 2 e 3, da Convenção. 
 
O programa de Mestrado em Direito da UniRitter possui os direitos humanos 
como área de concentração, e esta pesquisa enquadra-se na linha de pesquisa 
“Direitos humanos, instituições e efetividade”, pois envolve temas da teoria geral dos 
direitos humanos, além da análise de instrumentos estatais para a proteção desses 
direitos. Conforme demonstraremos ao longo desta pesquisa, a adequada 
implementação do artigo 33 da Convenção é fundamental para a efetividade ou 
eficácia social dos direitos previstos pela própria CDPD. 
O método adotado por esta pesquisa foi o hipotético dedutivo, baseado em 
fontes documentais, por revisão bibliográfica e documental de fontes que abordam 
temas relacionados à participação social das pessoas com deficiência, às Instituições 
Nacionais de Direitos Humanos e ao monitoramento nacional da implementação da 
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. 
Este estudo está organizado em três capítulos. O primeiro capítulo apresenta 
um resgate histórico demonstrando a trajetória do movimento de luta das pessoas 
com deficiência pelo reconhecimento de cidadania, desde os períodos mais remotos 
da história da humanidade até a atualidade, percorrendo a linha do tempo da 
conquista de direitos e de espaços de participação social. Ainda no primeiro capítulo, 
foi analisada a efetividade dos direitos conquistados e a fragilidade dos mecanismos 
de monitoramento das políticas públicas desenvolvidas em favor das pessoas com 
deficiência no Brasil. 
O segundo capítulo abordará o conceito e a origem das instituições nacionais 
de direitos humanos (INDH), os Princípios de Paris, os principais modelos de 
instituições nacionais de direitos humanos e os desafios para sua estruturação. 
Finalizando o Capítulo 2, será analisada a estrutura do Conselho Nacional dos Direitos 
10 
 
Humanos do Brasil, a fim de ser verificada a observância ou não dos princípios de 
Paris. 
No terceiro capítulo, além de ser analisada a estrutura do Conselho Nacional 
dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CONADE), será analisada a estrutura do 
Comitê Brasileiro de Organizações Representativas das Pessoas com Deficiência 
(CRPD) e o Projeto de Lei nº 795 de 2022, que propõe a criação da InstituiçãoNacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (INADE). Após, serão estudadas 
as diretrizes definidas pelo Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da 
Organização das Nações Unidas referente aos mecanismos nacionais de 
monitoramento, bem como serão apresentados alguns apontamentos para que o 
mecanismo independente de monitoramento atenda as exigências da convenção e 
seja adequado aos sistemas jurídico e administrativo brasileiro. 
Oportuno consignar que a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com 
Deficiência representa uma mudança profunda na abordagem da deficiência, 
reconhecendo as limitações da sociedade como barreiras a serem eliminadas e os 
impedimentos nas funções e nas estruturas dos corpos humanos como características 
a serem respeitadas. Assim, deixa-se de confundir deficiência com doença, passando-
se a falar da necessidade de modificação dos ambientes e não das pessoas que 
possuem algum tipo de deficiência. Daí surge o modelo social da deficiência, no qual 
se percebe a deficiência na sociedade e não na pessoa, em substituição ao chamado 
modelo médico da deficiência, segundo o qual a deficiência restringia-se a uma 
questão clínica, sendo um problema exclusivamente do indivíduo que a possui, e não 
da sociedade. São os ambientes, e não os indivíduos, que devem mudar, e a 
Convenção fornece um roteiro para essa mudança. 
Nesse sentido, também vale registrar que em diversos momentos deste estudo 
aparecerão expressões como “pessoas portadoras de deficiência”, “pessoas 
deficientes”, “deficientes”, “excepcionais”, ou ainda, “inválidos” e “desvalidos”. No 
entanto, essas denominações somente foram utilizadas porque nos distintos 
contextos históricos assim constaram de textos normativos e de outros documentos 
oficiais. A partir da Convenção, passou a ser utilizada a expressão “pessoas com 
deficiência” para se referir a esse segmento social. 
Historicamente as pessoas com deficiência são invisibilizadas, não só pela 
sociedade em geral, mas também pelos sistemas de promoção e garantia de direitos 
humanos. Esta pesquisa dedica-se, em última análise, a buscar resposta ao problema 
11 
 
da efetividade dos direitos conquistados por esse segmento após séculos de absoluta 
exclusão social. 
 
 
12 
 
1. A PARTICIPAÇÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NAS ESTRUTURAS DE 
PROTEÇÃO E GARANTIA DE DIREITOS 
 
Neste primeiro capítulo, dedicado à participação das pessoas com deficiência 
nas estruturas de proteção e garantia de direitos, pretende-se fazer um resgate 
histórico, demonstrando a trajetória do movimento de luta pelo reconhecimento da 
cidadania dessas pessoas, desde os períodos mais remotos da história da 
humanidade até a atualidade. 
Primeiramente serão abordadas as diferentes fases da construção do que hoje 
se compreende por inclusão. A seguir, será apresentada uma linha do tempo da 
conquista de direitos por esse segmento e os espaços de participação política 
ocupados pelas pessoas com deficiência nas estruturas de proteção e garantia de 
seus direitos. 
Por fim, será analisada a efetividade dos direitos conquistados e a fragilidade 
dos mecanismos de monitoramento das políticas públicas desenvolvidas em favor das 
pessoas com deficiência no Brasil. 
 
1.1 A trajetória das pessoas com deficiência, da exclusão até a luta pela inclusão 
 
Os registros históricos e bibliográficos que fazem referência ao período 
histórico mais remoto demonstram que, desde as civilizações primitivas, os seres 
humanos conviveram com situações de deficiência, motivada por causas congênitas 
ou adquiridas, o que restou demonstrado em diversos achados arqueológicos. Na 
história das diversas civilizações antigas, muitas são as menções a personagens com 
deficiência, cegos, coxos, surdos, anões, entre outros, na maioria das vezes aliados 
a relatos em que foram sujeitos de cuidados, assistência ou caridade (Silva, 1987). 
No pensamento filosófico dos pensadores clássicos da Grécia antiga, 
identificam-se argumentos para o abandono de crianças com deficiência, para deixar 
morrer pacientes com más condições físicas e para mandar matar os “mal 
conformados e incuráveis espiritualmente”. É o que se depreende do pensamento de 
filósofos como Aristóteles e Platão. Aristóteles em “A Política”, expressa o que segue: 
 
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar, deve 
haver uma lei que proíba alimentar toda criança disforme (Aristóteles, 2011, 
p. 134). 
 
13 
 
Já Platão, em “A República”, descreve o seguinte diálogo entre Sócrates e 
Glauco: 
Sócrates - Portanto, estabelecerás na cidade médicos e juízes da espécie 
que dissemos; que hão de tratar, dentre os cidadãos, os que forem bem 
constituídos de corpo e de alma, deixarão morrer os que fisicamente não 
estiverem nessas condições e mandarão matar os que forem mal 
conformados e incuráveis espiritualmente? 
Glauco - Parece-me, que é o melhor, quer para os próprios pacientes, quer 
para a cidade” (Platão, 2012, p. 100). 
 
Romeu Kazumi Sassaki classifica quatro eras de práticas sociais em relação a 
pessoas com deficiência: era da exclusão, que vai da antiguidade até o início do 
século 20; era da segregação, nas décadas de 20 a 40; era da integração, nas 
décadas de 50 a 80, e era da inclusão, da década de 90 até os dias atuais (Sassaki, 
2007). 
No Brasil, pode-se afirmar que os fatos mais relevantes para o reconhecimento 
da cidadania das pessoas com deficiência começam a ser verificados no período do 
império, com a criação, em 1854, do Imperial Instituto dos Meninos Cegos (atual 
Instituto Benjamin Constant - IBC), e, em 1856, o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos 
(hoje Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES), ambos localizados na cidade 
do Rio de Janeiro e em funcionamento até os dias de hoje (Lanna Júnior, 2010). 
Meio século depois, instituições privadas começam a ser estruturadas em 
outras regiões do País. Em 1909, na cidade de Recife/PE, foi criado o Instituto de 
Cegos Antônio Pessoa de Queiroz. Em 1926, na cidade de Belo Horizonte, foi criado 
o Instituto São Rafael, também voltado ao atendimento de pessoas cegas. Em 1929, 
na cidade de São Paulo, surge o Instituto de Cegos Padre Chico. No ano de 1941, em 
Porto Alegre, é fundado o Instituto Santa Luzia e, em 1946, na cidade de São Paulo, 
foi instituída a Fundação para o Livro do Cego no Brasil, que posteriormente recebeu 
o nome de sua fundadora, Dorina Nowill (Luiz, 2019). 
Destinado ao atendimento educacional de pessoas com deficiência intelectual, 
a primeira instituição criada no Brasil foi a Sociedade Pestalozzi, no ano de 1926, na 
cidade de Canoas/RS. Em 1932, na cidade de Belo Horizonte/MG, surge a segunda 
instituição do movimento pestalozziano, criada pela Professora Helena Antipoff; em 
1948, foi fundada a Sociedade Pestalozzi do Estado do Rio de Janeiro e, em 1952, a 
Sociedade Pestalozzi de São Paulo (Lanna Júnior, 2010). 
Já o movimento Apaiano teve início no ano de 1954, com a criação da primeira 
Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais, na cidade do Rio de Janeiro. 
14 
 
Rapidamente, se difundiu em outras quinze associações ao longo dos oito anos 
seguintes, o que propiciou a criação da Federação Nacional das APAEs no ano de 
1962, reunindo 16 associações de diversos estados brasileiros (Lanna Júnior, 2010). 
Na área da deficiência física, as primeiras instituições criadas prestavam 
atendimento de reabilitação, sendo a Associação de Assistência à Criança Defeituosa 
(AACD), hoje Associação de Assistência à Criança Deficiente, a pioneira, fundada no 
ano de 1950, na cidade de São Paulo. Surgiram, nos anos seguintes, em 1954, a 
Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação, na cidade do Rio de Janeiro; o 
Instituto Baiano de Reabilitação, em 1956, na cidade de Salvador/BA; e o Instituto 
Fluminense de Reabilitação, em 1958, na cidade de Niterói/RJ (Lanna Júnior, 2010). 
Mário Cléber MartinsLanna Júnior, na obra “História do Movimento Político das 
Pessoas com Deficiência no Brasil”, constata que 
 
Tanto os institutos do Império, voltados para a educação de cegos e surdos, 
quanto as organizações surgidas na República, direcionadas às pessoas com 
deficiência intelectual e à reabilitação, embora não tivessem nenhum cunho 
político claramente definido, propiciaram, mesmo que para poucos, espaços 
de convívio com seus pares e discussão de questões comuns. Nesse sentido, 
contribuíram para forjar uma identidade das pessoas com deficiência. Foram 
precursoras, naquele momento, da formulação do ser cego, surdo, deficiente 
intelectual e deficiente físico não apenas na denominação, mas em sua 
identificação como grupo social (Lanna Júnior, 2010, p. 28). 
 
Com natureza não mais de atendimento, mas de articulação política, a primeira 
organização de âmbito nacional a ser criada no Brasil foi o Conselho Brasileiro para o 
Bem-Estar dos Cegos, no ano de 1954, no Rio de Janeiro. Após, conforme já referido, 
surge a Federação Nacional das APAEs no ano de 1962; no ano de 1970, a Federação 
Nacional das Associações Pestalozzi (Lanna Júnior, 2010). Assim, aos poucos, o 
movimento político das pessoas com deficiência foi sendo construído, chegando na 
década de 70, período da ditadura militar, momento histórico de intensa mobilização 
social clamando pela redemocratização. 
No contesto internacional, após as duas grandes guerras mundiais, com a 
Organização das Nações Unidas imprimindo maior ênfase aos direitos humanos, já 
consensuada a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, aprovaram-se 
resoluções importantes para o avanço das pessoas com deficiência. Em dezembro de 
1971, adotou-se a Declaração dos Direitos do Deficiente Mental e, em dezembro de 
1975, outra resolução com a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes (ONU, 
1948, 1971, 1975). No ano seguinte, em dezembro de 1976, a Assembleia Geral das 
15 
 
Nações Unidas, na sua 30ª sessão, por meio da Resolução 31/123, proclamou, 
oficialmente, o ano de 1981 como o Ano Internacional das Pessoas Deficientes e 
estabeleceu os seguintes objetivos principais: 
 
1. Ajudar os deficientes no seu ajustamento físico e psicossocial na 
sociedade; 
2. Promover todos os esforços, nacionais e internacionais, para proporcionar 
aos deficientes assistência adequada, treinamento, cuidadosa orientação, 
oportunidades para trabalho compatível e assegurar a sua plena integração 
na sociedade; 
3. Estimular projetos de estudo e pesquisa, visando a participação prática e 
efetiva de deficientes nas atividades da vida diária, melhorando as condições 
de acesso aos edifícios públicos e sistemas de transportes; 
4. Educar e informar o público sobre o direito das pessoas deficientes de 
participarem e contribuírem nos vários aspectos da vida econômica, social e 
política; 
5. Promover medidas eficazes para a prevenção de deficiências e para a 
reabilitação das pessoas deficientes (CNAIPD, 1981). 
 
A partir dessa tomada de decisão da Assembleia Geral das Nações Unidas, 
houve intensa mobilização para que os estados membros se engajassem na 
elaboração de um plano de ação preliminar para o Ano Internacional da Pessoa 
Deficiente. Em 1977, foi criado um Secretariado Especial pela ONU, bem como 
constituído um Comitê Assessor, composto por 15 representantes de estados 
membros para a elaboração do plano de ação. Em 1978, o Comitê Assessor teve sua 
representatividade ampliada para 23 representantes de estados membros, sendo 
recomendada a constituição de comissões nacionais para coordenar e executar as 
ações relativas ao Ano Internacional das Pessoas Deficientes (Lanna Júnior, 2010). 
No Brasil, o então Presidente Figueiredo criou a Comissão Nacional do Ano 
Internacional das Pessoas Deficientes pelo Decreto 84.919, de julho de 1980, no 
âmbito do Ministério da Educação e Cultura. Reflexo daquele momento histórico, a 
comissão foi instituída, inicialmente, sem considerar a participação da sociedade civil 
(Brasil, 1980). 
A essa altura, a mobilização social das pessoas com deficiência já apresentava 
alguns resultados, como a constituição de um movimento nacional, denominado 
Coalizão Pró-Federação Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes. Ao tomar 
conhecimento da criação da Comissão Nacional do Ano Internacional das Pessoas 
Deficientes, essa coalização elaborou uma carta, reivindicando a participação de 
representantes do segmento na comissão. O próprio Presidente Figueiredo recebeu 
pessoalmente esse documento das mãos de um grupo de pessoas com deficiência, 
16 
 
atendendo prontamente a reivindicação e alterando a composição da comissão 
nacional pelo Decreto 86.692, de dezembro de 1981 (Lanna Júnior, 2010; Brasil, 
1981). 
No mês de outubro de 1980, o movimento da Coalizão Pró-Federação Nacional 
de Entidades de Pessoas Deficientes realizou o primeiro encontro nacional de 
entidades, reunindo mais de 500 pessoas, na sua maioria com deficiência, o que foi 
algo inédito na história do segmento. No ano seguinte (1981), também no mês de 
outubro, a cidade de Recife/PE foi palco do 2º Encontro Nacional de Entidades de 
Pessoas Deficientes e simultaneamente do 1º Congresso Brasileiro de Pessoas 
Deficientes, cujo tema era "A realidade das pessoas com deficiência no Brasil, hoje". 
Os dois eventos alcançaram significativa visibilidade também em razão do Ano 
Internacional das Pessoas Deficientes (Lanna Júnior, 2010; Secretaria [...], 2011). 
Com o intuito de avançar com os esforços para a consolidação da Federação 
Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes, foi realizado o 3º Encontro Nacional 
de Entidades, em julho de 1983, na cidade de São Bernardo do Campo/SP. Ao seu 
final, ficou deliberado que cada área de deficiência criaria sua própria federação 
nacional e que as federações nacionais comporiam o Conselho Nacional de Entidades 
de Pessoas Deficientes, também a ser criado após a constituição das federações 
(Lanna Júnior, 2010). 
Em abril de 1984, na cidade de Brasília, foi fundada a Organização Nacional de 
Entidades de Deficientes Físicos. No mesmo mês e ano (abril de 1984), na cidade de 
Florianópolis/SC, foi fundada a Federação Brasileira de Entidades de e para Cegos, 
em que pese a existência do Conselho Brasileiro para o Bem-Estar dos Cegos desde 
o ano de 1954, conforme já registrado anteriormente (Lanna Júnior, 2010; Luiz, 2019). 
O movimento de surdos se organizou a partir da Federação Nacional de 
Educação e Integração dos Surdos, em maio de 1987, na cidade do Rio de Janeiro. 
Foram reformulados os estatutos e alterado o nome de uma organização criada por 
profissionais ouvintes no ano de 1978, inicialmente denominada de Federação 
Nacional de Educação e Integração do Deficiente Auditivo (Lanna Júnior, 2010). 
Observa-se que é chegado o ano de 1987, momento em que o Brasil elege 
parlamentares constituintes para elaborar um novo marco constitucional de sua 
história. Ao longo dos 25 anos que antecederam aquele momento, o segmento das 
pessoas com deficiência já havia conseguido se mobilizar social e politicamente, 
organizado representativamente pelas seguintes organizações: 
17 
 
 
1. Federação Nacional das Associações de Pais e Amigos 
dos Excepcionais (1962); 
2. Federação Nacional das Associações Pestalozzi (1970); 
3. Organização Nacional de Entidades de Deficientes Físicos 
(1984); 
4. Federação Brasileira de Entidades de e para Cegos (1984); 
5. Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos 
(1987)1. 
 
Como ficará demonstrado no próximo tópico deste capítulo, a trajetória de luta 
percorrida pelas pessoas com deficiência possibilitou a estruturação institucional de 
suas representações. Essa mobilização lhes assegurou a conquista de direitos 
essenciais para que possam exercer a plena participação na sociedade em igualdade 
de condições com as demais pessoas. 
 
1.2 Os direitos conquistadosa partir da mobilização das próprias pessoas com 
deficiência 
 
Nesta seção, será demonstrada a evolução histórica da conquista de direitos 
pelas pessoas com deficiência no Brasil. Parte-se da análise dos textos da 
Constituição do Império de 1824 e, em seguida, de todas as constituições 
republicanas, passando pelas declarações e tratados internacionais, bem como pelas 
inúmeras normas vigentes no ordenamento jurídico brasileiro. 
Em dois séculos de história política do Brasil, os primeiros cento e dez anos, 
de 1824 a 1934, foram marcados pela absoluta invisibilidade das pessoas com 
deficiência. A Constituição do Império de 1824 e a primeira constituição republicana 
de 1891 não fizeram nenhuma referência aos direitos dos cidadãos com algum tipo 
de deficiência. Limitaram-se a preceituarem o princípio da igualdade, a primeira no 
seu Art. 179, inciso XIII, afirmando que “a lei será igual para todos, quer proteja, quer 
castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um” (Brasil, 
 
1 Deixamos de relacionar o Conselho Brasileiro para o Bem-Estar dos Cegos (1954) e a Federação 
Nacional de Educação e Integração do Deficiente Auditivo (1978) por entender que o contesto em que 
ambas foram criadas não possibilitaram a representatividade atribuída a suas sucessoras. 
18 
 
1824). A segunda, no seu Art. 72, § 2º, expressou que “todos são iguais perante a lei” 
e que “a República não admite privilégios de nascimento, desconhece foros de 
nobreza e extingue as ordens honoríficas existentes e todas as suas prerrogativas e 
regalias, bem como os títulos nobiliárquicos e de conselho” (Brasil, 1891). 
Somente a partir de 1934, na terceira constituição brasileira, podemos 
encontrar o que Luiz Alberto David Araújo (1997, p. 67) considera ser o “embrião do 
conteúdo do direito à inclusão social” das pessoas com deficiência, referindo-se ao 
disposto no Art. 138 da Constituição de 1934. O dispositivo citado estabelece que 
“Incumbe à União, aos Estados e aos Municípios, nos termos das leis respectivas, 
assegurar amparo aos desvalidos, criando serviços especializados e animando os 
serviços sociais, cuja orientação procurarão coordenar” (Brasil, 1934). 
No texto constitucional seguinte, na Constituição de 1937, já não mais é feita 
sequer a menção do “amparo aos desvalidos”. Dessa forma, volta-se a limitar a 
proteção de pessoas com deficiência ao princípio da igualdade, manifestando no seu 
Art. 122, § 1º, que todos são iguais perante a lei (Brasil, 1937). 
Já a constituição de 1946, ao tratar do trabalho e da previdência social, no seu 
Art. 157, inciso XVI, assegura “previdência, mediante contribuição da União, do 
empregador e do empregado, em favor da maternidade e contra as consequências da 
doença, da velhice, da invalidez e da morte” (Brasil, 1946). 
A constituição de 1967 manteve a mesma garantia de previdência social para 
a situação de “invalidez”, no seu Art. 158, inciso XVI, sem fazer qualquer outra 
referência a direitos dos cidadãos com deficiência (Brasil, 1967). 
A Emenda Constitucional nº 01 de 1969 inovou no seu Art. 175, § 4º ao afirmar 
que “lei especial disporá sobre a assistência à maternidade, à infância e à 
adolescência e sobre a educação de excepcionais”, demonstrando, ainda que 
timidamente, a preocupação do texto constitucional com a educação de pessoas com 
deficiência (Brasil, 1969). 
Observa-se que, nas sete primeiras cartas constitucionais – 1824, 1981, 1934, 
1937, 1946, 1967 e 1969 –, apenas quatro delas fizeram alguma menção a direito das 
pessoas com deficiência. Na Constituição de 1934, referindo-se aos “desvalidos”; nas 
constituições de 1946 e de 1967, tratando da invalidez; e, no texto da Emenda 
Constitucional nº 01 de 1969, reportando-se aos excepcionais. 
A ausência de referência aos direitos das pessoas com deficiência e/ou a 
utilização de expressões como “desvalidos”, “inválidos” e “excepcionais”, refletem a 
19 
 
realidade de absoluta exclusão ou de segregação, constatados naqueles períodos 
históricos do nosso país. Essa foi a demonstração na primeira parte deste capítulo. 
No entanto, antes de darmos sequência à evolução da proteção constitucional 
dedicada às pessoas com deficiência no ordenamento jurídico pátrio, cabe 
contextualizar o momento histórico pelo qual passava o tema dos direitos humanos 
em âmbito internacional. 
Já se aproximando da metade do século XX, após a ocorrência das duas 
grandes guerras mundiais, as quais, diga-se de passagem, deixaram muitas pessoas 
em situação de deficiência, em 10 de dezembro de 1948, a Organização das Nações 
Unidas aprova a Declaração Universal dos Direitos Humanos, apresentando no seu 
Artigo 25 a seguinte declaração: 
 
1. Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar 
e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, 
ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos 
serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na 
doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de 
meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade 
(ONU, 1948). 
 
Percebe-se que, assim como os últimos textos constitucionais brasileiros recém 
analisados, a Declaração Universal dos Direitos Humanos limitou-se a fazer a menção 
à situação de deficiência como sendo uma “invalidez”, deixando de fazer referência a 
outros direitos das pessoas com deficiência. Contudo, pouco mais de duas décadas 
após a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Organização das Nações 
Unidas, em sua Assembleia Geral realizada em 22 de dezembro de 1971, aprovou a 
Resolução n. A/8429, pela qual proclamou a Declaração de Direitos do Deficiente 
Mental, afirmando, entre outros direitos, que “o deficiente mental deve gozar, na 
medida do possível, dos mesmos direitos que todos os outros seres humanos” (ONU, 
1971). 
Na mesma esteira, quatro anos depois, em 09 de dezembro de 1975, a 
Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas aprovou a Declaração dos 
Direitos das Pessoas Deficientes. O documento conceitua quem seriam essas 
“pessoas deficientes”, afirmando que o termo seria referente a “qualquer pessoa 
incapaz de assegurar por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma 
vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, 
em suas capacidades físicas ou mentais”. Segue reafirmando que as pessoas 
20 
 
deficientes, “qualquer que seja a origem, natureza e gravidade de suas deficiências, 
têm os mesmos direitos fundamentais que seus concidadãos da mesma idade, o que 
implica, antes de tudo, o direito de desfrutar de uma vida decente, tão normal e plena 
quanto possível” (ONU, 1975, p. 2). 
Mesmo sob o olhar crítico do conceito atual de deficiência e dos termos 
bastante distintos que a evolução científica nos apresenta, reconhece-se a 
importância dessas duas declarações. Igualmente importante é a proclamação do ano 
de 1981 como o Ano Internacional das Pessoas Deficientes, para que a pauta dos 
direitos das pessoas com deficiência fosse percebida como necessária para os 
ordenamentos jurídicos dos países de todo o mundo. 
Nesse sentido, foi justamente no ano de 1978 que, no Brasil, por meio da 
Emenda Constitucional nº 12, pela primeira vez o texto constitucional faz referências 
expressas às pessoas com deficiência. Naquele contexto histórico, eram 
denominadas de “deficientes”. A referida emenda constitucional possuía artigo único 
com quatro incisos, nos seguintes termos: 
 
Artigo único. É assegurado aos deficientes a melhoria de sua condição social 
e econômica especialmente mediante: 
 I - educação especial e gratuita; 
 II - assistência, reabilitação e reinserção na vida econômica e social do 
País; 
 III - proibição de discriminação, inclusive quanto à admissão ao trabalho 
ou ao serviço público e a salários;IV - possibilidade de acesso a edifícios e logradouros públicos.” (Brasil, 
1978). 
 
Observa-se que, mesmo com um texto conciso, a Emenda Constitucional nº 12 
de 1978 alcançou direitos relevantes para as pessoas com deficiência, assegurando 
expressamente o direito à educação, à assistência, à reabilitação, à inclusão social, à 
não discriminação e à acessibilidade. Destaca-se que, segundo registros históricos, a 
citada emenda constitucional foi proposta pelo parlamentar Thales Ramalho, que se 
tornou pessoa com deficiência após seu ingresso na carreira política. Vítima de um 
acidente vascular cerebral, o deputado federal elaborou o teor de sua proposta de 
emenda constitucional com a efetiva participação do movimento social das pessoas 
com deficiência do Estado de Pernambuco, estado este que o elegeu (Lanna Júnior, 
2010). 
Uma década após a Emenda Constitucional nº 12 de 1978, a mobilização das 
pessoas com deficiência logrou alcançar uma de suas maiores conquistas durante o 
21 
 
processo de elaboração de um novo texto constitucional, no âmbito da Assembleia 
Constituinte formada no ano de 1987. Uma Comissão Provisória de Estudos 
Constitucionais elaborou um anteprojeto de constituição, propondo um capítulo 
próprio para tratar de "Tutelas Especiais", em que estariam os direitos das pessoas 
com deficiência (Lanna Júnior, 2010). 
Assinala-se que, no ano de 1987, como demonstrado no tópico anterior, o 
movimento das pessoas com deficiência já estava articulado com a institucionalização 
de cinco federações nacionais, representando as distintas áreas de deficiência. Isso 
foi fundamental para manifestar, perante a Assembleia Constituinte, sua contrariedade 
em ter seus direitos em capítulo isolado, reivindicando que esses fossem garantidos 
transversalmente, junto aos direitos de todas as pessoas. A separação dos direitos 
das pessoas com deficiência em capítulo próprio era percebida pelo movimento como 
discriminatória (Lanna Júnior, 2010). 
Graças à capacidade de mobilização e articulação demonstrada pelo 
movimento das pessoas com deficiência, a Constituição de 1988 foi promulgada com 
inúmeras referências aos direitos desse segmento ao longo do texto constitucional. 
Como exemplo, cita-se a proibição de qualquer discriminação referente a salários e 
critérios de admissão no trabalho (Art. 7º, inciso XXXI); a reserva de cargos e 
empregos públicos (Art. 37, inciso VIII); habilitação, reabilitação e a promoção da 
inclusão social (Art. 203, inciso IV); a garantia de um salário mínimo de benefício 
mensal aos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou 
tê-la provida por sua família (Art. 203, inciso V); atendimento educacional 
especializado, preferencialmente na rede regular de ensino (Art. 208, inciso III); e a 
acessibilidade em logradouros, em edifícios de uso público e na fabricação de veículos 
de transporte coletivo (Art. 227, § 2º) (Brasil, 1988). 
Além da previsão dos dispositivos acima transcritos, a Constituição de 1988 
também deixou para a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal 
e dos Municípios o cuidado com a proteção e garantia das pessoas com deficiência, 
assim estabelecido pelo Art. 23, inciso II: 
 
Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e 
dos Municípios: 
II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas 
portadoras de deficiência» (Brasil, 1988). 
 
 
22 
 
A competência legislativa, por sua vez, ficou reservada, concorrentemente, à 
União Federal, aos Estados e ao Distrito Federal, conforme o Art. 24, inciso XIV: 
 
Art. 24. Compete União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar 
concorrentemente sobre: 
XIV - proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência” 
(Brasil, 1988). 
 
Em que pese o fato de o texto da Constituição de 1988 ser bastante 
abrangente, detalhando melhor os diversos direitos assegurados às pessoas com 
deficiência, Luiz Alberto David Araújo manifesta o entendimento de ser possível extrair 
mais força do texto anterior. O autor argumenta que, por estar este repleto de normas 
programáticas, o texto atual dificulta sua aplicação integral, por depender da edição 
de leis posteriores (Araújo, 1997). 
Após a promulgação da Constituição de 1988, inúmeros foram os diplomas 
normativos publicados para regulamentar os direitos previstos no texto constitucional 
e outros tantos criando novos direitos em favor das pessoas com deficiência. A 
primeira lei que merece destaque após o ano de 1988 é a Lei nº 7.853, de 24 de 
outubro de 1989, que “dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua 
integração social”, além de criar a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa 
Portadora de Deficiência – Corde e instituir a tutela jurisdicional de interesses coletivos 
ou difusos dessas pessoas, também disciplinando a atuação do Ministério Público e 
definindo crimes, além de outras providências relacionadas (Brasil, 1989). 
A aludida legislação define as responsabilidades do poder público nas áreas de 
educação, saúde, formação profissional e do trabalho, recursos humanos e 
edificações. Dentre essas responsabilidades, destacam-se a oferta, obrigatória e 
gratuita, da Educação Especial em estabelecimento público de ensino; a garantia de 
acesso das pessoas com deficiência aos estabelecimentos de saúde públicos e 
privados, e de seu tratamento adequado, sob normas técnicas e padrões de conduta 
apropriados e a promoção de ações eficazes que propiciem a inserção nos setores 
públicos e privados de trabalho. A mesma lei prevê a obrigatoriedade da inclusão — 
nos censos nacionais — de questões específicas sobre pessoas com deficiência 
(Brasil, 1989). 
O ano de 1991 foi um marco para a inclusão profissional das pessoas com 
deficiência no Brasil. Após o transcurso de oito anos da aprovação da Convenção OIT 
159 pela Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT, 1983), em 
23 
 
22 de maio de 1991 essa convenção entra em vigência no ordenamento jurídico pátrio, 
promulgada pelo Decreto nº 129 (Brasil, 1991a). Aproximadamente dois meses 
depois, é promulgada a Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 (Brasil, 1991b), que dispõe 
sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. 
A relevância da Convenção 159 da Organização Internacional do Trabalho 
consiste na obrigação imposta aos seus Estados parte de adotar medidas de 
reabilitação e de inclusão profissional de pessoas com deficiência, na perspectiva de 
igualdade de oportunidades. O regramento enfatiza que a adoção de ações 
afirmativas em favor destas pessoas, desde que destinadas a promover a igualdade 
de oportunidades, não poderão ser consideradas discriminatórias em relação as 
demais pessoas (OIT, 1983). 
No Brasil, a Lei 8.213/1991 previu expressamente ação afirmativa em favor das 
pessoas com deficiência envolvendo de vagas de emprego na iniciativa privada. A 
partir de então, empresas com cem ou mais empregados foram obrigadas a contratar 
trabalhadores com deficiência, na proporção de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por 
cento), conforme o quantitativo de empregados contratados (Brasil, 1991b). 
No ano de 1996, foi publicada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 
9.394, de 20 de dezembro de 1996), que em seu Art. 58 definiu o conceito de 
educação especial, como sendo “a modalidade de educação escolar, oferecida 
preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de 
necessidades especiais” (Brasil, 1996). 
No ano de 2000, em 8 de novembro e 19 de dezembro, são sancionadas, 
respectivamente, as Leis 10.048 e 10.098. Conforme a primeira delas, “as pessoas 
com deficiência, idosas com idade igual ou superior a 60 anos, gestantes, lactantes, 
pessoas com crianças de colo e obesas terão atendimento prioritário” (Brasil, 2000a). 
Já a Lei no 10.098 (Brasil, 2000b) é consideradao primeiro avanço efetivo na 
legislação brasileira em relação à acessibilidade. Isso porque, estabelece normas 
gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com 
deficiência ou com mobilidade reduzida, pela eliminação de barreiras e obstáculos nas 
vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e 
nos meios de transporte e de comunicação. 
Em 2001, o Brasil se comprometeu a tomar medidas de caráter legislativo, 
educacional, trabalhista, social e de qualquer outra natureza, visando a eliminação de 
qualquer forma de discriminação contra as pessoas com deficiência. Além disso, 
24 
 
assumiu o compromisso de garantir sua plena integração à sociedade, promulgando 
a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação 
contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, mais conhecida por Convenção da 
Guatemala, com a publicação do Decreto 3.956, de 08 de outubro de 2001 (Brasil, 
2001). 
No ano seguinte, a Língua Brasileira de Sinais é reconhecida como língua 
oficial no Brasil pela Lei 10.436, de 24 de abril de 2002 (Brasil, 2002), regulamentada 
pouco mais de três anos depois pelo Decreto 5.626, de 22 de dezembro de 2005 
(Brasil, 2005), que também estabeleceu que o ensino de Libras fosse disciplina 
curricular. 
No ano de 2004, são regulamentadas pelo Decreto 5.296, de 02 de dezembro 
de 2004 a Lei 10.048 (referente ao atendimento prioritário) e a Lei 10.098 (sobre 
normas gerais de acessibilidade), ambas do ano dois mil. Por se dedicar amplamente 
à regulamentação das normas de acessibilidade, tornou-se conhecido como o decreto 
da acessibilidade (Brasil, 2004). 
Nos anos de 2005 e 2006, são intensificados os debates no âmbito da 
Organização das Nações Unidas em torno da elaboração de um tratado internacional 
que protegesse os direitos das pessoas com deficiência. A necessidade de um 
instrumento internacional vinculante de proteção aos direitos desse segmento foi 
pautada por Gilberto Rincón Gallardo, presidente da delegação do México, na 
Conferência Mundial contra o Racismo e a Discriminação Racial, a Xenofobia e as 
Formas Conexas de Intolerância realizada em setembro de 2001, na cidade de 
Durban, África do Sul (Lanna Júnior, 2010). 
Em dezembro de 2001, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou a 
Resolução no 56/168, criando um Comitê Especial ad hoc para elaborar proposta de 
convenção internacional sobre os direitos das pessoas com deficiência, amplo e 
integral, com enfoque no desenvolvimento social, nos direitos humanos e na não 
discriminação (Lanna Júnior, 2010). Após quatro anos de negociação, e realizadas 
oito sessões do Comitê Especial ad hoc com a participação efetiva de muitas pessoas 
com deficiência dos mais diversos países e continentes, sob o lema entoado por essas 
pessoas “nada sobre nós sem nós”, em 13 de dezembro de 2006, a Organização das 
Nações Unidas, por consenso, aprovou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas 
com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, pela Resolução nº 61/106 (Lanna Júnior, 
2010). 
25 
 
Em 30 de março de 2007, o Brasil assinou a Convenção sobre os Direitos das 
Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, sem reservas, vindo a ratificá-
los no ano seguinte, com força de norma constitucional, por ter observado o rito 
previsto no Art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, com a publicação do Decreto 
Legislativo nº 186, de 09 de julho de 2008 (Brasil, 2008). A Convenção sobre os 
Direitos das Pessoas com Deficiência passou a produzir seus efeitos jurídicos no 
âmbito internacional em 03 de maio de 2008, após vinte países a terem ratificado. No 
Brasil, foi efetivamente incorporada ao ordenamento jurídico nacional no ano seguinte, 
com a sua promulgação pelo Decreto 6.949, de 25 de agosto de 2009 (Brasil, 2009). 
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência trouxe em seu 
conteúdo normativo importantes inovações conceituais, como a adoção do chamado 
"modelo social da deficiência". Esse modelo difere do modelo médico tradicional, que 
via a deficiência como uma questão exclusivamente relacionada à saúde da pessoa. 
O modelo social reconhece que as barreiras sociais, ambientais e atitudinais são as 
principais fontes de exclusão e desvantagem enfrentadas pelas pessoas com 
deficiência. Isso significa que a sociedade tem a responsabilidade de remover essas 
barreiras para garantir a plena participação desses indivíduos. 
A Convenção também estabelece o princípio da não discriminação como um 
direito fundamental. Ela proíbe explicitamente a discriminação com base na 
deficiência em todas as áreas da vida, incluindo emprego, educação, saúde e 
participação política. Além disso, a convenção exige que as pessoas com deficiência 
tenham igualdade de oportunidades em todas essas áreas e exige que os Estados 
Partes tomem medidas para garantir que essas pessoas tenham acesso a ambientes 
físicos, transportes, informações e comunicações, bem como a tecnologias e sistemas 
de apoio, de forma igualitária (Brasil, 2009). 
A convenção garante às pessoas com deficiência o direito de participar 
plenamente da vida política e pública. Ela estabelece que os Estados Partes devem 
garantir que essas pessoas possam votar e serem eleitas em igualdade de condições 
com os demais, além de terem acesso a processos judiciais e de tomada de decisão, 
incentivando a substituição de medidas de tutela e curatela por apoio à tomada de 
decisão, garantindo que as pessoas com deficiência possam exercer sua capacidade 
jurídica em igualdade de condições com os demais (Brasil, 2009). 
No ano de 2011, o Governo Federal do Brasil institui o Plano Nacional dos 
Direitos da Pessoa com Deficiência - Plano Viver sem Limite, pelo Decreto 7.612, de 
26 
 
17 de novembro de 2011, com a finalidade de promover a articulação de políticas, 
programas e ações para garantir o exercício pleno e equitativo dos direitos das 
pessoas com deficiência, pautado pela Convenção Internacional sobre os Direitos das 
Pessoas com Deficiência. Os eixos de atuação do Plano Viver sem Limite foram o 
acesso à educação, a atenção à saúde, a inclusão social e a acessibilidade (Brasil, 
2011a). 
No ano seguinte, a Lei 12.764, de 27 de dezembro de 2012, institui a Política 
Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. 
Passa-se a reconhecer que essas pessoas têm os mesmos direitos que as pessoas 
com deficiência (Brasil, 2012). 
O ano de 2013 foi marcado pela adoção do Tratado de Marraqueche no âmbito 
da Organização Mundial de Propriedade Intelectual. A normativa tem por objetivo 
harmonizar direitos humanos e direitos autorais, facilitando o Acesso a Obras 
Publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com Outras Dificuldades 
para Ter Acesso ao Texto Impresso (WIPO, 2013). O Tratado estabelece cláusulas 
prevendo limitações e exceções aos direitos autorais, permitindo que obras literárias 
ou científicas sejam produzidas e distribuídas em formatos acessíveis, por entidades 
autorizadas, independente da autorização do detentor do direito de autor. Permite, 
inclusive, o movimento transfronteiriço dessas obras a partir da exportação e 
importação destas entre países signatários do tratado. 
O Brasil ratificou o Tratado de Marraqueche pelo Decreto Legislativo 261, em 
25 de novembro de 2015. Aprovado com respeito aos ritos e critérios previstos pelo 
Art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, à normativa foi reconhecida força de norma 
constitucional. Com isso, recebe o status de segundo tratado de direitos humanos com 
força de norma constitucional a integrar o ordenamento jurídico brasileiro (Brasil, 
2015b). O Tratado passou a produzir seus efeitos em âmbito internacional em 30 de 
setembro de 2016, após o vigésimo país depositar sua ratificação junto à Organização 
Mundial de Propriedade Intelectual. No Brasil, foi plenamente internalizadodois anos 
depois, em 09 de outubro de 2018, promulgado pelo Decreto 9.522, de 08 de outubro 
de 2018 (Brasil, 2018b). 
Em julho de 2015, foi publicada a Lei 13.146, mais conhecida por Lei Brasileira 
de Inclusão ou Estatuto da Pessoa com Deficiência, objetivando promover a 
implementação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência no 
sistema jurídico nacional. Dentre as principais inovações da Lei Brasileira de Inclusão 
27 
 
estão a avaliação biopsicossocial da deficiência, o conceito de discriminação em razão 
da deficiência, o tipo penal de crime de discriminação em razão da deficiência, o 
instituto da tomada de decisão apoiada, além de tantas outras (Brasil, 2015a). 
O Estatuto da Pessoa com Deficiência também criou o Cadastro Inclusão (Art. 
92, ainda não implementado), e o Auxílio Inclusão (Art. 94), regulamentado seis anos 
mais tarde, pela Lei 14.176, de 22 de junho de 2021 (Brasil, 2021a). O benefício 
consiste no pagamento de meio salário mínimo às pessoas com deficiência que 
deixam de receber o benefício de prestação continuada, este no valor de um salário 
mínimo, para ingressar no mercado de trabalho, desde que seu salário como 
empregado não seja superior a dois salários mínimos. O Auxílio Inclusão é um 
estímulo para que a pessoa com deficiência deixe a condição de beneficiário da 
assistência social e passe a contribuir com a previdência social como trabalhador 
contribuinte, o que é extremamente fundamental para a promoção da inclusão social 
dessas pessoas e para a desoneração do erário (Brasil, 2015a). 
Por fim, recentemente o Governo Federal publicou o Decreto 11.793, de 23 de 
novembro de 2023, instituindo o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com 
Deficiência - Novo Viver sem Limite, com a finalidade de promover, por meio da 
integração e da articulação de políticas, programas e ações, o exercício pleno e 
equitativo dos direitos das pessoas com deficiência. O Novo Viver sem Limite foi 
instituído com dez diretrizes e estruturado com os seguintes eixos: gestão e 
participação social; enfrentamento do capacitismo e da violência contra as pessoas 
com deficiência; acessibilidade e tecnologia assistiva; e promoção do direito à 
educação, à assistência social, à saúde e aos demais direitos econômicos, sociais, 
culturais e ambientais (Brasil, 2023b). 
No lançamento do “Novo Viver sem Limite”, foi anunciado pelo Ministério dos 
Direitos Humanos e Cidadania que mais de seis bilhões de reais serão investidos em 
aproximadamente cem ações em favor das pessoas com deficiência. O Decreto 
11.793/2023 (Brasil, 2023b), em seu Art. 6º, prevê que a execução do Novo Viver sem 
Limite poderá contar com a realização de repasses, fundo a fundo, convênios, 
contratos de repasse, termos de execução descentralizada, acordos de cooperação, 
termos de fomento, termos de colaboração e outros instrumentos congêneres com 
órgãos e entidades da administração pública federal, municipal, estadual e distrital 
(R.O, 2023; Brasil, 2023b). 
 
28 
 
1.3 Os espaços de participação política das pessoas com deficiência no Brasil 
 
Na década de 80, com a mobilização social das pessoas com deficiência (já 
abordada anteriormente), além da estruturação das organizações não 
governamentais representativas dos distintos segmentos de deficiência, o Governo do 
Estado de São Paulo, pelo Decreto nº 23.131, de 19 de dezembro de 1984, criou o 
Conselho Estadual para Assuntos da Pessoa Deficiente. O Conselho contava com 
vinte e sete membros, composto por nove representantes das pessoas com 
deficiência, nove representantes de entidades prestadoras de serviços de reabilitação 
e nove representantes governamentais. Entre as atribuições, estavam “implantar e 
executar as diretrizes básicas da política estadual voltada para a integração social das 
pessoas deficientes” e “propor medidas que visem à defesa dos direitos das pessoas 
deficientes, a eliminação das discriminações que os atingem e à sua plena inserção 
na vida socioeconômica, política e cultural” (Estado de São Paulo, 1984). 
Registros históricos (Crespo, 2009; Secretaria [...], 2011) dão conta de que, 
cinco anos após a criação do Conselho Estadual para Assuntos da Pessoa Deficiente, 
o movimento social das pessoas com deficiência daquele estado manifestou-se pela 
extinção do conselho. A iniciativa foi motivada pelo entendimento de que a 
participação das pessoas com deficiência foi “insignificante” naquele órgão, visto que 
os representantes governamentais e os representantes das entidades prestadoras de 
serviços se uniram, formando maioria em oposição aos representantes das pessoas 
com deficiência. 
No ano de 1986, o Presidente da República, pelo Decreto 93.481, de 29 de 
outubro daquele ano, institui a Coordenadoria para Integração da Pessoa Portadora 
de Deficiência - CORDE, vinculada ao Gabinete Civil da Presidência da República. O 
órgão tinha a missão de promover o “tratamento prioritário e adequado aos assuntos 
relativos às pessoas portadoras de deficiências, visando a assegurar a estas o pleno 
exercício de seus direitos básicos e a efetiva integração social” (Brasil, 1986). 
No ano seguinte, com o Decreto 94.806, de 31 de agosto de 1987, a 
Presidência da República cria o Conselho Consultivo da Coordenadoria para 
Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Era composto por quinze membros, 
sendo nove representantes governamentais e seis representantes de organizações 
representativas de pessoas com deficiência (Brasil, 1987). 
29 
 
De acordo com o estabelecido pelo inciso VII do Art. 2º do Decreto 94.806/1987, 
os representantes das pessoas com deficiência eram os seguintes: o Presidente da 
Federação Brasileira de Entidades de Cegos; o Presidente da Federação Brasileira 
das Instituições de Excepcionais; o Presidente da Federação Nacional das 
Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais; o Presidente da Federação Nacional 
das Sociedades Pestalozzi; o Presidente da Federação Nacional de Educação e 
Integração dos Surdos; e o Presidente da Organização Nacional das Entidades de 
Deficientes Físicos. A esse Conselho competia opinar sobre o desenvolvimento da 
Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, apresentar 
sugestões para o encaminhamento dessa política e responder a consultas formuladas 
pela Coordenadoria (Brasil, 1987). 
Nos anos seguintes, diversos conselhos municipais e estaduais de direitos das 
pessoas com deficiência foram sendo estruturados nessas esferas governamentais 
Brasil a fora, em sua maioria com natureza deliberativa (Souza, 2018). No final da 
década de noventa, por exemplo, o Decreto nº 3.076, de 1º de junho de 1999, cria, no 
âmbito do Ministério da Justiça, o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa 
Portadora de Deficiência – CONADE, órgão superior de deliberação coletiva, com 
composição paritária entre representantes governamentais e da sociedade civil 
(Brasil, 1999a). 
Desde sua criação, o nome, as competências e a composição do CONADE 
sofreram alterações pelos decretos 3.298, de 20 de dezembro de 1999 (Brasil, 1999b); 
9.494, de 06 de setembro de 2018 (Brasil, 2018a); 10.177, de 16 de dezembro de 
2019 (Brasil, 2019); 10.812, de 27 de setembro de 2021 (Brasil, 2021b); e 10.841, de 
20 de outubro de 2021 (Brasil, 2021c). 
Conforme o disposto pelo Decreto 10.177/2019 e alterações posteriores, 
atualmente o CONADE é o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com 
Deficiência, órgão superior de caráter paritário, consultivo e de deliberação colegiada 
sobre as políticas públicas destinadas às pessoas com deficiência, ao qual compete: 
acompanhar a implementação da Política Nacional para a Inclusão da Pessoa com 
Deficiência; acompanhar o planejamento e avaliar a execução das políticas setoriais 
de educação, saúde, trabalho, assistência social, transporte, cultura, turismo, 
desporto, lazer, política urbana, reabilitação e outras políticasrelativas à pessoa com 
deficiência; acompanhar a elaboração e a execução da proposta orçamentária do 
Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, de modo a sugerir as 
30 
 
modificações necessárias à consecução da Política Nacional para a Inclusão da 
Pessoa com Deficiência; formular propostas sobre a efetivação do sistema 
descentralizado e participativo de defesa dos direitos da pessoa com deficiência; 
acompanhar e apoiar as políticas e as ações dos Conselhos de Direitos da Pessoa 
com Deficiência no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; propor 
a elaboração de estudos e pesquisas que objetivem a melhoria da qualidade de vida 
da pessoa com deficiência; propor e incentivar a realização de campanhas com vistas 
à promoção dos direitos da pessoa com deficiência e à prevenção das causas que 
levam à deficiência; avaliar e manifestar-se sobre o plano de ação anual da Secretaria 
Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério da Mulher, da Família 
e dos Direitos Humanos; acompanhar o desempenho dos programas e projetos da 
política nacional para inclusão da pessoa com deficiência por meio de relatórios de 
gestão; indicar as medidas a serem adotadas, no território nacional, nos casos de 
requerimentos, denúncias e reclamações formuladas por qualquer pessoa ou 
entidade, quando ocorrer ameaça ou violação aos direitos da pessoa com deficiência, 
assegurados pela Constituição, pela Convenção Internacional sobre os Direitos das 
Pessoas com Deficiência, promulgada pelo Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 
2009, pela Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, e pelas demais legislações aplicáveis; 
participar do monitoramento da promoção, da proteção e da implementação no país 
da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, da Lei nº 
13.146, de 2015, e das demais legislações aplicáveis; e realizar, com o apoio do 
Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, a cada quatro anos, a 
Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, observada a 
disponibilidade orçamentária e financeira e o disposto em ato do Ministro de Estado 
do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (Brasil, 2019). 
O Decreto 10.177/2019 e o regimento interno aprovado pela Resolução nº 01, 
de 20 de julho de 2022, preveem que o CONADE é composto por trinta e seis 
representações, sendo dezoito governamentais e dezoito da sociedade civil 
organizada. Dentre estas, treze são representações de organizações de pessoas com 
deficiência, distribuídas na seguinte proporção: uma da área de transtorno do espectro 
autista; uma da área de deficiência auditiva ou surdez; três da área de deficiência 
física; duas da área da deficiência mental ou intelectual; duas da área de deficiência 
decorrente de causas patológicas ou doenças raras; duas da área da deficiência 
31 
 
visual; uma da área de deficiências múltiplas e uma da área de síndromes (Brasil, 
2019; Brasil, 2022a). 
Atualmente, o CONADE possui a seguinte composição (Portal gov.br, 2024): 
 
Entidades não governamentais 
Transtorno do Espectro Autista 
1 - Associação Brasileira de Autismo - ABRA 
Deficiência Auditiva ou Surdez 
2 - Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos - 
FENEIS 
Deficiência Física 
3 - Federação das Fraternidades Cristãs de Pessoas com 
Deficiência do Brasil - FCD/BR 
Deficiência Física 
4 - Associação dos Familiares, Amigos e Portadores de Doenças 
Graves - AFAG 
Deficiência Física 
5 - Organização Nacional de Entidades de Deficientes Físicos - 
ONEDEF 
Deficiência Mental ou Intelectual 
6 - Federação Nacional das Apaes - FENAPAES 
Deficiência Mental ou Intelectual 
7 - Federação Nacional das Associações Pestalozzi - 
FENAPESTALOZZI 
Deficiência Decorrente de Causas Patológicas ou Doenças 
Raras 
8 - Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras - 
FEBRARARAS 
Deficiência Decorrente de Causas Patológicas ou Doenças 
Raras 
9 - Retina Brasil 
Deficiência Visual 
10 - Confederação Brasileira de Desportos de Deficientes 
Visuais - CBDV 
32 
 
Deficiência Visual 
11 - Organização Nacional de Cegos do Brasil - ONCB 
Deficiência múltiplas 
12 - Associação de Pais, Amigos e Pessoas com Deficiência, de 
Funcionários do Banco do Brasil e da Comunidade - APABB 
Deficiência da área de síndromes 
13 - Associação Brasileira da Síndrome de Williams - ABSW 
Organizações Nacionais de empregadores 
14 - Confederação Nacional do Comércio de bens, Serviços e 
Turismo - CNC 
Organizações Nacionais de Trabalhadores 
15 - União Geral dos Trabalhadores - UGT 
Organizações Nacionais da Comunidade Científica 
16 - Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO 
17 - Ordem dos Advogados do Brasil – OAB 
18 - Conselho Federal de Engenharia e Agronomia – CONFEA. 
 
Poder Público 
1 - Casa Civil da Presidência da República 
2 - Ministério da Justiça e Segurança Pública 
3 - Ministério das Relações Exteriores 
4 - Ministério da Previdência Social 
5 - Ministério do Trabalho e Emprego 
6 - Ministério das Cidades 
7 - Ministério da Educação 
8 - Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família 
e Combate à Fome 
9 - Ministério do Esporte 
10 - Ministério da Saúde 
11 - Ministério das Comunicações 
12 - Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações 
13 - Ministério do Turismo 
14 - Ministério da Cultura 
15 - Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania 
33 
 
Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência 
16 - Ministério das Mulheres 
17 - Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania 
Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos 
Humanos 
18 - Ministério dos Transportes 
 
Além dos conselhos de direitos da pessoa com deficiência, as organizações 
representativas das pessoas com deficiência buscam outros espaços de participação 
política, os quais disputam com segmentos sociais diversos. É o que se pode 
observar, por exemplo, na atual composição do Conselho Nacional de Saúde, com a 
presença das seguintes organizações: Associação Brasileira de Autismo (ABRA), 
Federação Brasileira das Associações Síndrome de Down (FBASD), Federação 
Nacional das APAES (FENAPAES), Federação Nacional das Associações Pestalozzi 
(FENAPESTALOZZI), Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela 
Hanseníase (MORHAN) e Organização Nacional de Cegos do Brasil (ONCB) (CNS, 
2023). 
Fenômeno semelhante pode ser observado nas composições do Conselho 
Nacional de Assistência Social, com a participação da FENAPAES e da 
FENAPESTALOZZI (Brasil, 2022a); do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e 
do Adolescente, com a presença da FENAPESTALOZZI e da ONCB (Brasil, 2023a) e 
do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, com a participação da ONCB e do 
MORHAN (CNDM, 2021). 
No Brasil, atualmente todos os estados da federação possuem conselho 
estadual dos direitos da pessoa com deficiência, ao passo que mais de quinhentos 
municípios já criaram conselhos municipais dos direitos da pessoa com deficiência 
(Borges, 2021). 
Outro espaço de participação das pessoas com deficiência existente no 
sistema político brasileiro é o processo conferencial. Este consiste na convocação da 
Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência por parte do CONADE, 
a cada intervalo de quatro anos, conforme a competência atribuída a este colegiado 
pelo Decreto 10.177/2019 (Brasil, 2019). 
O processo conferencial ocorre a partir da convocação do CONADE, sendo a 
conferência nacional propriamente dita um conjunto de conferências que inicial, em 
34 
 
uma primeira etapa, em âmbito municipal ou regional. Nesta, as pessoas com 
deficiência e demais interessados se reúnem para avaliar as políticas públicas em 
favor desse segmento. Também elaboram suas propostas de aperfeiçoamento ou 
criação de novas políticas públicas, deliberam acerca dessas propostas e elegem os 
representantes que as irão defenderem um segundo momento, quando se realiza a 
conferência em âmbito estadual. Na etapa estadual, representantes eleitos nas 
conferências municipais ou regionais avaliam as propostas apresentadas pelos 
municípios e deliberam a respeito das propostas a serem apresentadas na etapa 
nacional, além de elegerem seus representantes (Brasília, 2023-B). 
Ao longo da história, foram realizados quatro processos conferenciais dos 
direitos da pessoa com deficiência. A primeira conferência nacional dos direitos da 
pessoa com deficiência foi realizada no ano de 2006; a segunda, em 2008; a terceira, 
em 2012 e a quarta no ano de 2016 (Borges, 2021). A V Conferência Nacional dos 
Direitos da Pessoa com Deficiência está em execução, iniciando as etapas municipais 
a partir do mês de agosto de 2023 e com previsão de realização da etapa nacional 
em julho de 2024 (Brasília, 2023-B). 
Apresentados os espaços de participação política postos à disposição das 
pessoas com deficiência no Brasil, passaremos a analisar se os direitos conquistados 
por essas pessoas estão sendo de fato implementados, bem como se as estruturas 
de participação social são suficientes para o monitoramento do processo de 
implementação desses direitos. 
 
1.4 A efetividade dos mecanismos de monitoramento das políticas públicas 
existentes no Brasil 
 
Observando a extensa trajetória de luta por reconhecimento da cidadania e pela 
conquista de direitos das pessoas com deficiência, resta analisar se todos esses 
direitos conquistados formalmente vêm sendo efetivamente implementados. Cabe, 
também, investigar se as estruturas de proteção e garantia de direitos das quais essas 
pessoas participam são suficientes para promover o devido monitoramento do 
processo de implementação desses direitos e de suas respectivas políticas públicas. 
Alguns indicadores que analisaremos a seguir podem auxiliar na resposta a essas 
indagações. 
35 
 
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no censo realizado no 
ano de 2010, inicialmente informou que 45.606.048 pessoas, representativas de 
23,9% da população brasileira, possuíam algum tipo de deficiência (SDH/PR, 2012a). 
Oito anos após a realização daquele censo, o IBGE tornou pública a Nota Técnica 
01/2018, com a releitura dos dados de pessoas com deficiência no Censo 
Demográfico 2010, à luz das recomendações do Grupo de Washington2. Na 
oportunidade, foi informado que a população total de pessoas com deficiência 
residentes no Brasil e captada pela amostra do Censo Demográfico 2010 não se faz 
representada pelas 45.606.048 pessoas, ou 23,9% das 190.755.048 pessoas 
recenseadas nessa última operação censitária. Pela releitura, chegou-se ao 
quantitativo de 12.748.663 pessoas, ou seja, 6,7% do total da população registrada 
pelo Censo Demográfico de 2010 (IBGE, 2018). 
A discrepância entre os números divulgados em 2012 e os de 2018, ambos 
referentes ao mesmo censo demográfico, deveu-se a consideração, na primeira 
interpretação dos dados coletados, de que pessoas com deficiência seriam aquelas 
que responderam ao censo afirmando possuir alguma dificuldade para o exercício das 
funcionalidades de caminhar, ouvir ou enxergar, o que não necessariamente implica 
em possuir uma deficiência. Uma grande parcela da população possui, por exemplo, 
alguma dificuldade de enxergar. Porém, com adequada correção ótica (uso de óculos 
ou lentes de contato), tais pessoas não enfrentam barreiras que restrinjam sua 
participação na sociedade em igualdade de condições com as demais. 
Por recomendação do Grupo de Washington, o IBGE revisou a extração dos 
dados sobre deficiência, reconhecendo como pessoas com deficiência apenas 
aquelas que responderam possuir muita dificuldade ou não conseguir exercer as 
funções questionadas, o que ensejou a redução significativa da população com 
deficiência. 
Os dados estatísticos oficiais mais atuais são os apresentados pela Pesquisa 
Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, realizada pelo IBGE e referente ao 
terceiro trimestre do ano de 2022, divulgada em julho de 2023. Segundo os dados 
apurados por esta amostra, atualmente há no Brasil 18,6 milhões de pessoas com 2 
 
2 O Grupo de Washington busca padronizar e harmonizar definições, conceitos e metodologias, de 
modo a garantir a comparabilidade das estatísticas entre diferentes países. É formado sob a Comissão 
de Estatística das Nações Unidas e composto por representantes de Institutos Oficiais de Estatística e 
organizações representantes da sociedade civil. Como representante oficial do Brasil, o IBGE participa 
desde o início da formação do grupo, em 2001, acompanhando as discussões e estudos propostos. 
36 
 
anos ou mais de idade que possuem algum tipo de deficiência, o que corresponde a 
8,9% da população de mesma faixa etária (IBGE, 2023). 
A mesma amostra de domicílio afirma que, dos 18,6 milhões de brasileiros com 
deficiência, 17,5 milhões tem quatorze anos ou mais. Destes, 5,1 milhões foram 
identificados como força de trabalho, o que significa trabalhando ou procurando uma 
oportunidade de trabalho. Outras 12,4 milhões de pessoas com deficiência e com 14 
anos ou mais sequer estão sendo consideradas como força de trabalho (IBGE, 2023). 
Em que pese a vigência, por mais de três décadas, da Lei de Cotas (Lei nº 
8.213/91), dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do 
Trabalho e Emprego (MTE), indicam que, no ano de 2021, das 828.256 vagas 
reservadas no mercado de trabalho brasileiro, apenas 412.520 estavam ocupadas por 
pessoas com deficiência. Isso significa que 415 mil postos de trabalho que deveriam 
estar ocupados por pessoas com deficiência não estavam, de fato, ocupados por elas 
(Brasil, 1991b; Brasília, 2023c). E segundo dados da Dataprev, em dezembro de 2022 
havia 2.770.710 Benefícios de Prestação Continuada ativos para pessoas com 
deficiência, o que representa 14,9% das pessoas com deficiência de acordo com a 
PNAD Contínua (Brasília, 2023-C; IBGE, 2023). 
Referente ao acesso à educação, dados divulgados em outubro de 2023 pela 
Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência dão conta de que dos 6 
aos 14 anos, a taxa de escolarização entre crianças e adolescentes sem deficiência 
é de 99,4%. Entre pessoas com deficiência, a taxa é de 95,1%. Dos 15 aos 17 anos, 
esse percentual reduz para 93% entre adolescentes sem deficiência e 84,6% dos 
adolescentes com deficiência. Já o acesso ao Ensino Superior é ainda menor entre 
as pessoas com deficiência. Em 2021, apenas 7 em cada 1.000 matrículas nos cursos 
de graduação eram de estudantes com deficiência (Brasília, 2023-C). 
No ano de 2022, foram registradas no Sistema de Informação de Agravos de 
Notificação do Ministério da Saúde 11.979 casos de violência contra pessoas com 
deficiência no Brasil. A maioria das vítimas envolviam pessoas do sexo feminino, 
representando 62,8% do total. Em relação ao tipo de deficiência das vítimas, 55% 
tinham deficiência mental, 35% deficiência física, 12,5% deficiência visual e 10% 
deficiência auditiva. A violência física foi o tipo mais frequente, correspondendo a 
47,2% dos casos. O segundo tipo de violência mais frequente foi a negligência ou 
abandono, correspondendo a 22,2% dos casos no mesmo ano. Foram ainda 
registradas 2.602 notificações de violência psicológica (21,7%), 1.790 de violência 
37 
 
sexual (14,9%), 453 de violência financeira e econômica (3,8%) e 307 notificações de 
tortura (2,6%). A maioria das agressões registradas ocorreram na própria residência 
da vítima (74,5%) e do total de notificações, 66,6% já haviam ocorrido outras vezes 
(Brasília, 2023-C). 
O Observatório sobre Deficiência da Universidade de Brasília desenvolveu 
pesquisa a respeito da implementação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas 
com Deficiência no Brasil, objetivando identificar o quanto essas pessoas estão 
acessando os direitos previstos por esse

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