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1 PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU MESTRADO ACADÊMICO EM DIREITO MOISÉS BAUER LUIZ A IMPLEMENTAÇÃO DO ARTIGO 33 DA CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA E A DESIGNAÇÃO DE ESTRUTURA INDEPENDENTE DE MONITORAMENTO NO BRASIL Porto Alegre 2024 2 MOISÉS BAUER LUIZ A IMPLEMENTAÇÃO DO ARTIGO 33 DA CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA E A DESIGNAÇÃO DE ESTRUTURA INDEPENDENTE DE MONITORAMENTO NO BRASIL Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu da UniRitter – Grupo Ânima Educação, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Direito. Área de concentração: Direitos Humanos Orientadora: Profa. Dra. Sandra Regina Martini Porto Alegre 2024 3 AGRADECIMENTOS À Professora Sandra Regina Martini por toda acolhida e por suas valorosas orientações. À Professora Carina Rodrigues de Araújo Calabria por todas suas contribuições e orientações. Ao amigo Rafael Koerig Gessinger pelas relevantes reflexões e sugestões para o melhor desenvolvimento desta dissertação. Às amigas Luana Fornazier dos Santos e Clarissa Campani Mainieri pelas significativas e indispensáveis colaborações para a adequada apresentação formal deste trabalho. A todos os professores e colegas do Programa de Pós-Graduação em Direito da Uniritter por tantos aprendizados. A minha família, em especial meus pais, Maria e Eneu, e minha esposa Melissa, pelo incentivo. 4 RESUMO Transcorridos mais de quatorze anos desde a vigência da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência sem que o estado brasileiro implementasse o seu Artigo 33, tem-se o problema de pesquisa: como deve ser o mecanismo nacional de monitoramento da Convenção, para que seja assegurada a efetiva participação das pessoas com deficiência? Este estudo investigou os fundamentos e os requisitos necessários para a adequada estruturação de um mecanismo independente de monitoramento da citada Convenção no Brasil, tendo como objetivos específicos investigar como está delineado o sistema brasileiro de garantia dos direitos das pessoas com deficiência; identificar os critérios necessários para a estruturação de um mecanismo independente de monitoramento nacional de tratados de direitos humanos e identificar o modelo de mecanismo independente de monitoramento apropriado aos sistemas jurídico e administrativo brasileiros. A pesquisa foi desenvolvida a partir do método hipotético dedutivo, baseado em fontes documentais, por revisão bibliográfica e documental de fontes que abordam temas relacionados à participação social, às Instituições Nacionais de Direitos Humanos e ao monitoramento nacional de tratados internacionais. Fez-se um resgate histórico demonstrando a trajetória do movimento de luta das pessoas com deficiência pelo reconhecimento de cidadania, analisando a efetividade dos direitos conquistados e a fragilidade dos mecanismos de monitoramento das políticas públicas desenvolvidas em favor desse segmento no Brasil. Investigou-se a origem das instituições nacionais de direitos humanos (INDH), os princípios de Paris, os principais modelos de instituições nacionais de direitos humanos e os desafios para sua estruturação. Foram analisadas as estruturas de participação social existentes no Brasil e as diretrizes definidas pelo Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas referente aos mecanismos nacionais de monitoramento. Ao final, são apresentados alguns apontamentos para que o mecanismo independente de monitoramento a ser implementado no Brasil atenda as exigências da convenção e seja adequado aos sistemas jurídico e administrativo brasileiros. Palavras-chave: Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência; Artigo 33; participação social; instituições nacionais de direitos humanos; Princípios de Paris. 5 ABSTRACT More than fourteen years after the enactment of the Convention on the Rights of Persons with Disabilities, the Brazilian state has yet to implement Article 33, presenting the research problem: how should the national monitoring mechanism of the Convention be structured to ensure the effective participation of persons with disabilities? This study aimed to investigate the foundations and necessary requirements for the proper structuring of an independent monitoring mechanism of the said Convention in Brazil, with specific objectives to explore how the Brazilian system for guaranteeing the rights of persons with disabilities is outlined, to identify the criteria necessary for the structuring of an independent national human rights treaties monitoring mechanism, and to identify the model of independent monitoring mechanism appropriate to the Brazilian legal and administrative systems. The research was developed using the hypothetical deductive method, based on documentary sources, through bibliographic and document review of sources that addressed themes related to social participation, National Human Rights Institutions, and national monitoring of international treaties. An historical overview was sought to demonstrate the trajectory of the disability rights movement towards the recognition of citizenship, analyzing the effectiveness of the rights achieved and the fragility of the monitoring mechanisms of public policies developed in favor of this segment in Brazil. The origin of national human rights institutions (NHRI), the Paris Principles, the main models of national human rights institutions, and the challenges for their structuring were investigated. The existing structures for social participation in Brazil and the guidelines defined by the United Nations Committee on the Rights of Persons with Disabilities regarding national monitoring mechanisms were analyzed. In the end, some notes are presented so that the independent monitoring mechanism to be implemented in Brazil meets the convention's requirements and is suitable for the Brazilian legal and administrative systems. Keywords: Convention on the Rights of Persons with Disabilities; article 33; social participation; national human rights institutions; Paris Principles. 6 LISTA DE FIGURAS Figura A - Mapa de indicação de países com instituições credenciadas pela Aliança Global de Instituições Nacionais de Direitos Humanos (GANHRI) 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO................................................................................................................................................................... 8 1. A PARTICIPAÇÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NAS ESTRUTURAS DE PROTEÇÃO E GARANTIA DE DIREITOS ..................................................................................................... 12 1.1 A trajetória das pessoas com deficiência, da exclusão até a luta pela inclusão.. 12 1.2 Os direitos conquistados a partir da mobilização das próprias pessoas com deficiência .................................................................................................................................................................. 17 1.3 Os espaços de participação política das pessoas com deficiência no Brasil ....... 28 1.4 A efetividade dos mecanismos de monitoramento das políticas públicas existentes no Brasil .............................................................................................................................................. 34 2. INSTITUIÇÕES NACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS E OS PRINCÍPIOS DE PARIS 41 2.1 Origem das instituições nacionais de direitos humanos..................................................... 41 2.2 Os Princípios de Paris ................................................................................................................................44 2.3 Modelos de Instituições Nacionais de Direitos Humanos ................................................... 51 2.3.1 A Origem e a Evolução do Conceito do Modelo de Ombudsman Clássico ................ 52 2.3.2 A Comissão de Direitos Humanos como Instituição Nacional de Direitos Humanos ................................................................................................................................................................................................. 53 2.3.3 O Ombudsman de Direitos Humanos como Modelo de INDH ......................................... 54 2.4. Desafios para estruturação de uma instituição nacional de direitos humanos nos termos estabelecidos pelos Princípios de Paris e a atuação da aliança global de Instituições Nacionais de Direitos Humanos ....................................................................................... 54 2.4.1 Aliança Global de Instituições Nacionais de Direitos Humanos (GANHRI) ............... 56 2.4.2 Credenciamento de INDHs pela Aliança Global de Instituições Nacionais de Direitos Humanos (GANHRI) ......................................................................................................................... 57 2.4.3 O Status do Conselho Nacional dos Direitos Humanos do Brasil perante a Aliança Global de Instituições Nacionais de Direitos Humanos.................................................................... 59 3. A ESTRUTURA DE UM MECANISMO INDEPENDENTE PARA PROMOVER, PROTEJER E MONITORAR A IMPLEMENTAÇÃO DA CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO BRASIL ............................................................. 63 3.1. As estruturas existentes no Brasil que se propõem a monitorar a implementação da convenção ....................................................................................................................... 64 3.2. O projeto de lei nº 795 de 2022 e a proposta de criação da Instituição Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência – INADE ...................................................................... 69 3.3. As diretrizes do Comitê dos Direitos das Pessoas com Deficiência para as estruturas de monitoramento independentes ..................................................................................... 73 3.4. Como deve ser a estrutura de monitoramento independente da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência adequada ao sistema jurídico e administrativo brasileiro? ................................................................................................................................ 79 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................................... 84 REFERÊNCIAS .............................................................................................................................................................. 88 8 INTRODUÇÃO Esta pesquisa tem como tema a estrutura independente de monitoramento da Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, doravante denominada Convenção ou CDPD, no Brasil. A partir da ratificação da Convenção pelo Brasil, promulgada pelo Decreto 6.949, de 25 de agosto de 2009, surge a obrigação de a República Federativa do Brasil estabelecer um mecanismo de monitoramento em âmbito nacional, autônomo e independente, levando em conta os princípios relativos ao status e ao funcionamento das instituições nacionais de proteção e promoção dos direitos humanos, a fim de garantir a implementação do artigo 33 da CDPD (Brasil, 2009). O aludido artigo determina que o Estado Parte da Convenção manterá, fortalecerá, designará ou estabelecerá estrutura, incluindo um ou mais de um mecanismo independente, de maneira apropriada, para promover, proteger e monitorar a implementação da Convenção. Esse dispositivo determina que, ao designar ou estabelecer tal mecanismo, o Estado Parte levará em conta os princípios relativos ao status e ao funcionamento das instituições nacionais de proteção e promoção dos direitos humanos, também conhecidos por Princípios de Paris, ressaltando que a sociedade civil e, particularmente, as pessoas com deficiência e suas organizações representativas serão envolvidas e participarão plenamente no processo de monitoramento (Brasil, 2009). A partir da análise dos sistemas jurídico e administrativo brasileiros, considerando as dimensões geográfica e demográfica do País, as diversas condições de deficiências, como físicas, visuais, auditivas, intelectuais e mentais, as distintas realidades sociais, econômicas e culturais existentes no Brasil, tem-se o problema de pesquisa: como deverá ser o mecanismo nacional de monitoramento da Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, em especial quanto a sua composição, a fim de assegurar a efetiva participação das pessoas com deficiência? O objetivo geral deste estudo é investigar os fundamentos e os requisitos necessários para a adequada estruturação de um mecanismo independente de monitoramento da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência no Brasil, tendo como objetivos específicos os seguintes: 9 a) investigar como está delineado o sistema brasileiro de garantia dos direitos das pessoas com deficiência; b) identificar os critérios necessários para a estruturação de um mecanismo independente de monitoramento nacional de tratados de direitos humanos; c) identificar o modelo de mecanismo independente de monitoramento apropriado aos sistemas jurídico e administrativo brasileiro, que atenda ao disposto no artigo 33, parágrafos 2 e 3, da Convenção. O programa de Mestrado em Direito da UniRitter possui os direitos humanos como área de concentração, e esta pesquisa enquadra-se na linha de pesquisa “Direitos humanos, instituições e efetividade”, pois envolve temas da teoria geral dos direitos humanos, além da análise de instrumentos estatais para a proteção desses direitos. Conforme demonstraremos ao longo desta pesquisa, a adequada implementação do artigo 33 da Convenção é fundamental para a efetividade ou eficácia social dos direitos previstos pela própria CDPD. O método adotado por esta pesquisa foi o hipotético dedutivo, baseado em fontes documentais, por revisão bibliográfica e documental de fontes que abordam temas relacionados à participação social das pessoas com deficiência, às Instituições Nacionais de Direitos Humanos e ao monitoramento nacional da implementação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Este estudo está organizado em três capítulos. O primeiro capítulo apresenta um resgate histórico demonstrando a trajetória do movimento de luta das pessoas com deficiência pelo reconhecimento de cidadania, desde os períodos mais remotos da história da humanidade até a atualidade, percorrendo a linha do tempo da conquista de direitos e de espaços de participação social. Ainda no primeiro capítulo, foi analisada a efetividade dos direitos conquistados e a fragilidade dos mecanismos de monitoramento das políticas públicas desenvolvidas em favor das pessoas com deficiência no Brasil. O segundo capítulo abordará o conceito e a origem das instituições nacionais de direitos humanos (INDH), os Princípios de Paris, os principais modelos de instituições nacionais de direitos humanos e os desafios para sua estruturação. Finalizando o Capítulo 2, será analisada a estrutura do Conselho Nacional dos Direitos 10 Humanos do Brasil, a fim de ser verificada a observância ou não dos princípios de Paris. No terceiro capítulo, além de ser analisada a estrutura do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CONADE), será analisada a estrutura do Comitê Brasileiro de Organizações Representativas das Pessoas com Deficiência (CRPD) e o Projeto de Lei nº 795 de 2022, que propõe a criação da InstituiçãoNacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (INADE). Após, serão estudadas as diretrizes definidas pelo Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas referente aos mecanismos nacionais de monitoramento, bem como serão apresentados alguns apontamentos para que o mecanismo independente de monitoramento atenda as exigências da convenção e seja adequado aos sistemas jurídico e administrativo brasileiro. Oportuno consignar que a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência representa uma mudança profunda na abordagem da deficiência, reconhecendo as limitações da sociedade como barreiras a serem eliminadas e os impedimentos nas funções e nas estruturas dos corpos humanos como características a serem respeitadas. Assim, deixa-se de confundir deficiência com doença, passando- se a falar da necessidade de modificação dos ambientes e não das pessoas que possuem algum tipo de deficiência. Daí surge o modelo social da deficiência, no qual se percebe a deficiência na sociedade e não na pessoa, em substituição ao chamado modelo médico da deficiência, segundo o qual a deficiência restringia-se a uma questão clínica, sendo um problema exclusivamente do indivíduo que a possui, e não da sociedade. São os ambientes, e não os indivíduos, que devem mudar, e a Convenção fornece um roteiro para essa mudança. Nesse sentido, também vale registrar que em diversos momentos deste estudo aparecerão expressões como “pessoas portadoras de deficiência”, “pessoas deficientes”, “deficientes”, “excepcionais”, ou ainda, “inválidos” e “desvalidos”. No entanto, essas denominações somente foram utilizadas porque nos distintos contextos históricos assim constaram de textos normativos e de outros documentos oficiais. A partir da Convenção, passou a ser utilizada a expressão “pessoas com deficiência” para se referir a esse segmento social. Historicamente as pessoas com deficiência são invisibilizadas, não só pela sociedade em geral, mas também pelos sistemas de promoção e garantia de direitos humanos. Esta pesquisa dedica-se, em última análise, a buscar resposta ao problema 11 da efetividade dos direitos conquistados por esse segmento após séculos de absoluta exclusão social. 12 1. A PARTICIPAÇÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NAS ESTRUTURAS DE PROTEÇÃO E GARANTIA DE DIREITOS Neste primeiro capítulo, dedicado à participação das pessoas com deficiência nas estruturas de proteção e garantia de direitos, pretende-se fazer um resgate histórico, demonstrando a trajetória do movimento de luta pelo reconhecimento da cidadania dessas pessoas, desde os períodos mais remotos da história da humanidade até a atualidade. Primeiramente serão abordadas as diferentes fases da construção do que hoje se compreende por inclusão. A seguir, será apresentada uma linha do tempo da conquista de direitos por esse segmento e os espaços de participação política ocupados pelas pessoas com deficiência nas estruturas de proteção e garantia de seus direitos. Por fim, será analisada a efetividade dos direitos conquistados e a fragilidade dos mecanismos de monitoramento das políticas públicas desenvolvidas em favor das pessoas com deficiência no Brasil. 1.1 A trajetória das pessoas com deficiência, da exclusão até a luta pela inclusão Os registros históricos e bibliográficos que fazem referência ao período histórico mais remoto demonstram que, desde as civilizações primitivas, os seres humanos conviveram com situações de deficiência, motivada por causas congênitas ou adquiridas, o que restou demonstrado em diversos achados arqueológicos. Na história das diversas civilizações antigas, muitas são as menções a personagens com deficiência, cegos, coxos, surdos, anões, entre outros, na maioria das vezes aliados a relatos em que foram sujeitos de cuidados, assistência ou caridade (Silva, 1987). No pensamento filosófico dos pensadores clássicos da Grécia antiga, identificam-se argumentos para o abandono de crianças com deficiência, para deixar morrer pacientes com más condições físicas e para mandar matar os “mal conformados e incuráveis espiritualmente”. É o que se depreende do pensamento de filósofos como Aristóteles e Platão. Aristóteles em “A Política”, expressa o que segue: Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar, deve haver uma lei que proíba alimentar toda criança disforme (Aristóteles, 2011, p. 134). 13 Já Platão, em “A República”, descreve o seguinte diálogo entre Sócrates e Glauco: Sócrates - Portanto, estabelecerás na cidade médicos e juízes da espécie que dissemos; que hão de tratar, dentre os cidadãos, os que forem bem constituídos de corpo e de alma, deixarão morrer os que fisicamente não estiverem nessas condições e mandarão matar os que forem mal conformados e incuráveis espiritualmente? Glauco - Parece-me, que é o melhor, quer para os próprios pacientes, quer para a cidade” (Platão, 2012, p. 100). Romeu Kazumi Sassaki classifica quatro eras de práticas sociais em relação a pessoas com deficiência: era da exclusão, que vai da antiguidade até o início do século 20; era da segregação, nas décadas de 20 a 40; era da integração, nas décadas de 50 a 80, e era da inclusão, da década de 90 até os dias atuais (Sassaki, 2007). No Brasil, pode-se afirmar que os fatos mais relevantes para o reconhecimento da cidadania das pessoas com deficiência começam a ser verificados no período do império, com a criação, em 1854, do Imperial Instituto dos Meninos Cegos (atual Instituto Benjamin Constant - IBC), e, em 1856, o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos (hoje Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES), ambos localizados na cidade do Rio de Janeiro e em funcionamento até os dias de hoje (Lanna Júnior, 2010). Meio século depois, instituições privadas começam a ser estruturadas em outras regiões do País. Em 1909, na cidade de Recife/PE, foi criado o Instituto de Cegos Antônio Pessoa de Queiroz. Em 1926, na cidade de Belo Horizonte, foi criado o Instituto São Rafael, também voltado ao atendimento de pessoas cegas. Em 1929, na cidade de São Paulo, surge o Instituto de Cegos Padre Chico. No ano de 1941, em Porto Alegre, é fundado o Instituto Santa Luzia e, em 1946, na cidade de São Paulo, foi instituída a Fundação para o Livro do Cego no Brasil, que posteriormente recebeu o nome de sua fundadora, Dorina Nowill (Luiz, 2019). Destinado ao atendimento educacional de pessoas com deficiência intelectual, a primeira instituição criada no Brasil foi a Sociedade Pestalozzi, no ano de 1926, na cidade de Canoas/RS. Em 1932, na cidade de Belo Horizonte/MG, surge a segunda instituição do movimento pestalozziano, criada pela Professora Helena Antipoff; em 1948, foi fundada a Sociedade Pestalozzi do Estado do Rio de Janeiro e, em 1952, a Sociedade Pestalozzi de São Paulo (Lanna Júnior, 2010). Já o movimento Apaiano teve início no ano de 1954, com a criação da primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais, na cidade do Rio de Janeiro. 14 Rapidamente, se difundiu em outras quinze associações ao longo dos oito anos seguintes, o que propiciou a criação da Federação Nacional das APAEs no ano de 1962, reunindo 16 associações de diversos estados brasileiros (Lanna Júnior, 2010). Na área da deficiência física, as primeiras instituições criadas prestavam atendimento de reabilitação, sendo a Associação de Assistência à Criança Defeituosa (AACD), hoje Associação de Assistência à Criança Deficiente, a pioneira, fundada no ano de 1950, na cidade de São Paulo. Surgiram, nos anos seguintes, em 1954, a Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação, na cidade do Rio de Janeiro; o Instituto Baiano de Reabilitação, em 1956, na cidade de Salvador/BA; e o Instituto Fluminense de Reabilitação, em 1958, na cidade de Niterói/RJ (Lanna Júnior, 2010). Mário Cléber MartinsLanna Júnior, na obra “História do Movimento Político das Pessoas com Deficiência no Brasil”, constata que Tanto os institutos do Império, voltados para a educação de cegos e surdos, quanto as organizações surgidas na República, direcionadas às pessoas com deficiência intelectual e à reabilitação, embora não tivessem nenhum cunho político claramente definido, propiciaram, mesmo que para poucos, espaços de convívio com seus pares e discussão de questões comuns. Nesse sentido, contribuíram para forjar uma identidade das pessoas com deficiência. Foram precursoras, naquele momento, da formulação do ser cego, surdo, deficiente intelectual e deficiente físico não apenas na denominação, mas em sua identificação como grupo social (Lanna Júnior, 2010, p. 28). Com natureza não mais de atendimento, mas de articulação política, a primeira organização de âmbito nacional a ser criada no Brasil foi o Conselho Brasileiro para o Bem-Estar dos Cegos, no ano de 1954, no Rio de Janeiro. Após, conforme já referido, surge a Federação Nacional das APAEs no ano de 1962; no ano de 1970, a Federação Nacional das Associações Pestalozzi (Lanna Júnior, 2010). Assim, aos poucos, o movimento político das pessoas com deficiência foi sendo construído, chegando na década de 70, período da ditadura militar, momento histórico de intensa mobilização social clamando pela redemocratização. No contesto internacional, após as duas grandes guerras mundiais, com a Organização das Nações Unidas imprimindo maior ênfase aos direitos humanos, já consensuada a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, aprovaram-se resoluções importantes para o avanço das pessoas com deficiência. Em dezembro de 1971, adotou-se a Declaração dos Direitos do Deficiente Mental e, em dezembro de 1975, outra resolução com a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes (ONU, 1948, 1971, 1975). No ano seguinte, em dezembro de 1976, a Assembleia Geral das 15 Nações Unidas, na sua 30ª sessão, por meio da Resolução 31/123, proclamou, oficialmente, o ano de 1981 como o Ano Internacional das Pessoas Deficientes e estabeleceu os seguintes objetivos principais: 1. Ajudar os deficientes no seu ajustamento físico e psicossocial na sociedade; 2. Promover todos os esforços, nacionais e internacionais, para proporcionar aos deficientes assistência adequada, treinamento, cuidadosa orientação, oportunidades para trabalho compatível e assegurar a sua plena integração na sociedade; 3. Estimular projetos de estudo e pesquisa, visando a participação prática e efetiva de deficientes nas atividades da vida diária, melhorando as condições de acesso aos edifícios públicos e sistemas de transportes; 4. Educar e informar o público sobre o direito das pessoas deficientes de participarem e contribuírem nos vários aspectos da vida econômica, social e política; 5. Promover medidas eficazes para a prevenção de deficiências e para a reabilitação das pessoas deficientes (CNAIPD, 1981). A partir dessa tomada de decisão da Assembleia Geral das Nações Unidas, houve intensa mobilização para que os estados membros se engajassem na elaboração de um plano de ação preliminar para o Ano Internacional da Pessoa Deficiente. Em 1977, foi criado um Secretariado Especial pela ONU, bem como constituído um Comitê Assessor, composto por 15 representantes de estados membros para a elaboração do plano de ação. Em 1978, o Comitê Assessor teve sua representatividade ampliada para 23 representantes de estados membros, sendo recomendada a constituição de comissões nacionais para coordenar e executar as ações relativas ao Ano Internacional das Pessoas Deficientes (Lanna Júnior, 2010). No Brasil, o então Presidente Figueiredo criou a Comissão Nacional do Ano Internacional das Pessoas Deficientes pelo Decreto 84.919, de julho de 1980, no âmbito do Ministério da Educação e Cultura. Reflexo daquele momento histórico, a comissão foi instituída, inicialmente, sem considerar a participação da sociedade civil (Brasil, 1980). A essa altura, a mobilização social das pessoas com deficiência já apresentava alguns resultados, como a constituição de um movimento nacional, denominado Coalizão Pró-Federação Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes. Ao tomar conhecimento da criação da Comissão Nacional do Ano Internacional das Pessoas Deficientes, essa coalização elaborou uma carta, reivindicando a participação de representantes do segmento na comissão. O próprio Presidente Figueiredo recebeu pessoalmente esse documento das mãos de um grupo de pessoas com deficiência, 16 atendendo prontamente a reivindicação e alterando a composição da comissão nacional pelo Decreto 86.692, de dezembro de 1981 (Lanna Júnior, 2010; Brasil, 1981). No mês de outubro de 1980, o movimento da Coalizão Pró-Federação Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes realizou o primeiro encontro nacional de entidades, reunindo mais de 500 pessoas, na sua maioria com deficiência, o que foi algo inédito na história do segmento. No ano seguinte (1981), também no mês de outubro, a cidade de Recife/PE foi palco do 2º Encontro Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes e simultaneamente do 1º Congresso Brasileiro de Pessoas Deficientes, cujo tema era "A realidade das pessoas com deficiência no Brasil, hoje". Os dois eventos alcançaram significativa visibilidade também em razão do Ano Internacional das Pessoas Deficientes (Lanna Júnior, 2010; Secretaria [...], 2011). Com o intuito de avançar com os esforços para a consolidação da Federação Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes, foi realizado o 3º Encontro Nacional de Entidades, em julho de 1983, na cidade de São Bernardo do Campo/SP. Ao seu final, ficou deliberado que cada área de deficiência criaria sua própria federação nacional e que as federações nacionais comporiam o Conselho Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes, também a ser criado após a constituição das federações (Lanna Júnior, 2010). Em abril de 1984, na cidade de Brasília, foi fundada a Organização Nacional de Entidades de Deficientes Físicos. No mesmo mês e ano (abril de 1984), na cidade de Florianópolis/SC, foi fundada a Federação Brasileira de Entidades de e para Cegos, em que pese a existência do Conselho Brasileiro para o Bem-Estar dos Cegos desde o ano de 1954, conforme já registrado anteriormente (Lanna Júnior, 2010; Luiz, 2019). O movimento de surdos se organizou a partir da Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos, em maio de 1987, na cidade do Rio de Janeiro. Foram reformulados os estatutos e alterado o nome de uma organização criada por profissionais ouvintes no ano de 1978, inicialmente denominada de Federação Nacional de Educação e Integração do Deficiente Auditivo (Lanna Júnior, 2010). Observa-se que é chegado o ano de 1987, momento em que o Brasil elege parlamentares constituintes para elaborar um novo marco constitucional de sua história. Ao longo dos 25 anos que antecederam aquele momento, o segmento das pessoas com deficiência já havia conseguido se mobilizar social e politicamente, organizado representativamente pelas seguintes organizações: 17 1. Federação Nacional das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (1962); 2. Federação Nacional das Associações Pestalozzi (1970); 3. Organização Nacional de Entidades de Deficientes Físicos (1984); 4. Federação Brasileira de Entidades de e para Cegos (1984); 5. Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (1987)1. Como ficará demonstrado no próximo tópico deste capítulo, a trajetória de luta percorrida pelas pessoas com deficiência possibilitou a estruturação institucional de suas representações. Essa mobilização lhes assegurou a conquista de direitos essenciais para que possam exercer a plena participação na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. 1.2 Os direitos conquistadosa partir da mobilização das próprias pessoas com deficiência Nesta seção, será demonstrada a evolução histórica da conquista de direitos pelas pessoas com deficiência no Brasil. Parte-se da análise dos textos da Constituição do Império de 1824 e, em seguida, de todas as constituições republicanas, passando pelas declarações e tratados internacionais, bem como pelas inúmeras normas vigentes no ordenamento jurídico brasileiro. Em dois séculos de história política do Brasil, os primeiros cento e dez anos, de 1824 a 1934, foram marcados pela absoluta invisibilidade das pessoas com deficiência. A Constituição do Império de 1824 e a primeira constituição republicana de 1891 não fizeram nenhuma referência aos direitos dos cidadãos com algum tipo de deficiência. Limitaram-se a preceituarem o princípio da igualdade, a primeira no seu Art. 179, inciso XIII, afirmando que “a lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um” (Brasil, 1 Deixamos de relacionar o Conselho Brasileiro para o Bem-Estar dos Cegos (1954) e a Federação Nacional de Educação e Integração do Deficiente Auditivo (1978) por entender que o contesto em que ambas foram criadas não possibilitaram a representatividade atribuída a suas sucessoras. 18 1824). A segunda, no seu Art. 72, § 2º, expressou que “todos são iguais perante a lei” e que “a República não admite privilégios de nascimento, desconhece foros de nobreza e extingue as ordens honoríficas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliárquicos e de conselho” (Brasil, 1891). Somente a partir de 1934, na terceira constituição brasileira, podemos encontrar o que Luiz Alberto David Araújo (1997, p. 67) considera ser o “embrião do conteúdo do direito à inclusão social” das pessoas com deficiência, referindo-se ao disposto no Art. 138 da Constituição de 1934. O dispositivo citado estabelece que “Incumbe à União, aos Estados e aos Municípios, nos termos das leis respectivas, assegurar amparo aos desvalidos, criando serviços especializados e animando os serviços sociais, cuja orientação procurarão coordenar” (Brasil, 1934). No texto constitucional seguinte, na Constituição de 1937, já não mais é feita sequer a menção do “amparo aos desvalidos”. Dessa forma, volta-se a limitar a proteção de pessoas com deficiência ao princípio da igualdade, manifestando no seu Art. 122, § 1º, que todos são iguais perante a lei (Brasil, 1937). Já a constituição de 1946, ao tratar do trabalho e da previdência social, no seu Art. 157, inciso XVI, assegura “previdência, mediante contribuição da União, do empregador e do empregado, em favor da maternidade e contra as consequências da doença, da velhice, da invalidez e da morte” (Brasil, 1946). A constituição de 1967 manteve a mesma garantia de previdência social para a situação de “invalidez”, no seu Art. 158, inciso XVI, sem fazer qualquer outra referência a direitos dos cidadãos com deficiência (Brasil, 1967). A Emenda Constitucional nº 01 de 1969 inovou no seu Art. 175, § 4º ao afirmar que “lei especial disporá sobre a assistência à maternidade, à infância e à adolescência e sobre a educação de excepcionais”, demonstrando, ainda que timidamente, a preocupação do texto constitucional com a educação de pessoas com deficiência (Brasil, 1969). Observa-se que, nas sete primeiras cartas constitucionais – 1824, 1981, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1969 –, apenas quatro delas fizeram alguma menção a direito das pessoas com deficiência. Na Constituição de 1934, referindo-se aos “desvalidos”; nas constituições de 1946 e de 1967, tratando da invalidez; e, no texto da Emenda Constitucional nº 01 de 1969, reportando-se aos excepcionais. A ausência de referência aos direitos das pessoas com deficiência e/ou a utilização de expressões como “desvalidos”, “inválidos” e “excepcionais”, refletem a 19 realidade de absoluta exclusão ou de segregação, constatados naqueles períodos históricos do nosso país. Essa foi a demonstração na primeira parte deste capítulo. No entanto, antes de darmos sequência à evolução da proteção constitucional dedicada às pessoas com deficiência no ordenamento jurídico pátrio, cabe contextualizar o momento histórico pelo qual passava o tema dos direitos humanos em âmbito internacional. Já se aproximando da metade do século XX, após a ocorrência das duas grandes guerras mundiais, as quais, diga-se de passagem, deixaram muitas pessoas em situação de deficiência, em 10 de dezembro de 1948, a Organização das Nações Unidas aprova a Declaração Universal dos Direitos Humanos, apresentando no seu Artigo 25 a seguinte declaração: 1. Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade (ONU, 1948). Percebe-se que, assim como os últimos textos constitucionais brasileiros recém analisados, a Declaração Universal dos Direitos Humanos limitou-se a fazer a menção à situação de deficiência como sendo uma “invalidez”, deixando de fazer referência a outros direitos das pessoas com deficiência. Contudo, pouco mais de duas décadas após a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Organização das Nações Unidas, em sua Assembleia Geral realizada em 22 de dezembro de 1971, aprovou a Resolução n. A/8429, pela qual proclamou a Declaração de Direitos do Deficiente Mental, afirmando, entre outros direitos, que “o deficiente mental deve gozar, na medida do possível, dos mesmos direitos que todos os outros seres humanos” (ONU, 1971). Na mesma esteira, quatro anos depois, em 09 de dezembro de 1975, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas aprovou a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes. O documento conceitua quem seriam essas “pessoas deficientes”, afirmando que o termo seria referente a “qualquer pessoa incapaz de assegurar por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas ou mentais”. Segue reafirmando que as pessoas 20 deficientes, “qualquer que seja a origem, natureza e gravidade de suas deficiências, têm os mesmos direitos fundamentais que seus concidadãos da mesma idade, o que implica, antes de tudo, o direito de desfrutar de uma vida decente, tão normal e plena quanto possível” (ONU, 1975, p. 2). Mesmo sob o olhar crítico do conceito atual de deficiência e dos termos bastante distintos que a evolução científica nos apresenta, reconhece-se a importância dessas duas declarações. Igualmente importante é a proclamação do ano de 1981 como o Ano Internacional das Pessoas Deficientes, para que a pauta dos direitos das pessoas com deficiência fosse percebida como necessária para os ordenamentos jurídicos dos países de todo o mundo. Nesse sentido, foi justamente no ano de 1978 que, no Brasil, por meio da Emenda Constitucional nº 12, pela primeira vez o texto constitucional faz referências expressas às pessoas com deficiência. Naquele contexto histórico, eram denominadas de “deficientes”. A referida emenda constitucional possuía artigo único com quatro incisos, nos seguintes termos: Artigo único. É assegurado aos deficientes a melhoria de sua condição social e econômica especialmente mediante: I - educação especial e gratuita; II - assistência, reabilitação e reinserção na vida econômica e social do País; III - proibição de discriminação, inclusive quanto à admissão ao trabalho ou ao serviço público e a salários;IV - possibilidade de acesso a edifícios e logradouros públicos.” (Brasil, 1978). Observa-se que, mesmo com um texto conciso, a Emenda Constitucional nº 12 de 1978 alcançou direitos relevantes para as pessoas com deficiência, assegurando expressamente o direito à educação, à assistência, à reabilitação, à inclusão social, à não discriminação e à acessibilidade. Destaca-se que, segundo registros históricos, a citada emenda constitucional foi proposta pelo parlamentar Thales Ramalho, que se tornou pessoa com deficiência após seu ingresso na carreira política. Vítima de um acidente vascular cerebral, o deputado federal elaborou o teor de sua proposta de emenda constitucional com a efetiva participação do movimento social das pessoas com deficiência do Estado de Pernambuco, estado este que o elegeu (Lanna Júnior, 2010). Uma década após a Emenda Constitucional nº 12 de 1978, a mobilização das pessoas com deficiência logrou alcançar uma de suas maiores conquistas durante o 21 processo de elaboração de um novo texto constitucional, no âmbito da Assembleia Constituinte formada no ano de 1987. Uma Comissão Provisória de Estudos Constitucionais elaborou um anteprojeto de constituição, propondo um capítulo próprio para tratar de "Tutelas Especiais", em que estariam os direitos das pessoas com deficiência (Lanna Júnior, 2010). Assinala-se que, no ano de 1987, como demonstrado no tópico anterior, o movimento das pessoas com deficiência já estava articulado com a institucionalização de cinco federações nacionais, representando as distintas áreas de deficiência. Isso foi fundamental para manifestar, perante a Assembleia Constituinte, sua contrariedade em ter seus direitos em capítulo isolado, reivindicando que esses fossem garantidos transversalmente, junto aos direitos de todas as pessoas. A separação dos direitos das pessoas com deficiência em capítulo próprio era percebida pelo movimento como discriminatória (Lanna Júnior, 2010). Graças à capacidade de mobilização e articulação demonstrada pelo movimento das pessoas com deficiência, a Constituição de 1988 foi promulgada com inúmeras referências aos direitos desse segmento ao longo do texto constitucional. Como exemplo, cita-se a proibição de qualquer discriminação referente a salários e critérios de admissão no trabalho (Art. 7º, inciso XXXI); a reserva de cargos e empregos públicos (Art. 37, inciso VIII); habilitação, reabilitação e a promoção da inclusão social (Art. 203, inciso IV); a garantia de um salário mínimo de benefício mensal aos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família (Art. 203, inciso V); atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino (Art. 208, inciso III); e a acessibilidade em logradouros, em edifícios de uso público e na fabricação de veículos de transporte coletivo (Art. 227, § 2º) (Brasil, 1988). Além da previsão dos dispositivos acima transcritos, a Constituição de 1988 também deixou para a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios o cuidado com a proteção e garantia das pessoas com deficiência, assim estabelecido pelo Art. 23, inciso II: Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência» (Brasil, 1988). 22 A competência legislativa, por sua vez, ficou reservada, concorrentemente, à União Federal, aos Estados e ao Distrito Federal, conforme o Art. 24, inciso XIV: Art. 24. Compete União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: XIV - proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência” (Brasil, 1988). Em que pese o fato de o texto da Constituição de 1988 ser bastante abrangente, detalhando melhor os diversos direitos assegurados às pessoas com deficiência, Luiz Alberto David Araújo manifesta o entendimento de ser possível extrair mais força do texto anterior. O autor argumenta que, por estar este repleto de normas programáticas, o texto atual dificulta sua aplicação integral, por depender da edição de leis posteriores (Araújo, 1997). Após a promulgação da Constituição de 1988, inúmeros foram os diplomas normativos publicados para regulamentar os direitos previstos no texto constitucional e outros tantos criando novos direitos em favor das pessoas com deficiência. A primeira lei que merece destaque após o ano de 1988 é a Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989, que “dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social”, além de criar a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – Corde e instituir a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, também disciplinando a atuação do Ministério Público e definindo crimes, além de outras providências relacionadas (Brasil, 1989). A aludida legislação define as responsabilidades do poder público nas áreas de educação, saúde, formação profissional e do trabalho, recursos humanos e edificações. Dentre essas responsabilidades, destacam-se a oferta, obrigatória e gratuita, da Educação Especial em estabelecimento público de ensino; a garantia de acesso das pessoas com deficiência aos estabelecimentos de saúde públicos e privados, e de seu tratamento adequado, sob normas técnicas e padrões de conduta apropriados e a promoção de ações eficazes que propiciem a inserção nos setores públicos e privados de trabalho. A mesma lei prevê a obrigatoriedade da inclusão — nos censos nacionais — de questões específicas sobre pessoas com deficiência (Brasil, 1989). O ano de 1991 foi um marco para a inclusão profissional das pessoas com deficiência no Brasil. Após o transcurso de oito anos da aprovação da Convenção OIT 159 pela Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT, 1983), em 23 22 de maio de 1991 essa convenção entra em vigência no ordenamento jurídico pátrio, promulgada pelo Decreto nº 129 (Brasil, 1991a). Aproximadamente dois meses depois, é promulgada a Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 (Brasil, 1991b), que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. A relevância da Convenção 159 da Organização Internacional do Trabalho consiste na obrigação imposta aos seus Estados parte de adotar medidas de reabilitação e de inclusão profissional de pessoas com deficiência, na perspectiva de igualdade de oportunidades. O regramento enfatiza que a adoção de ações afirmativas em favor destas pessoas, desde que destinadas a promover a igualdade de oportunidades, não poderão ser consideradas discriminatórias em relação as demais pessoas (OIT, 1983). No Brasil, a Lei 8.213/1991 previu expressamente ação afirmativa em favor das pessoas com deficiência envolvendo de vagas de emprego na iniciativa privada. A partir de então, empresas com cem ou mais empregados foram obrigadas a contratar trabalhadores com deficiência, na proporção de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento), conforme o quantitativo de empregados contratados (Brasil, 1991b). No ano de 1996, foi publicada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996), que em seu Art. 58 definiu o conceito de educação especial, como sendo “a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais” (Brasil, 1996). No ano de 2000, em 8 de novembro e 19 de dezembro, são sancionadas, respectivamente, as Leis 10.048 e 10.098. Conforme a primeira delas, “as pessoas com deficiência, idosas com idade igual ou superior a 60 anos, gestantes, lactantes, pessoas com crianças de colo e obesas terão atendimento prioritário” (Brasil, 2000a). Já a Lei no 10.098 (Brasil, 2000b) é consideradao primeiro avanço efetivo na legislação brasileira em relação à acessibilidade. Isso porque, estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, pela eliminação de barreiras e obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação. Em 2001, o Brasil se comprometeu a tomar medidas de caráter legislativo, educacional, trabalhista, social e de qualquer outra natureza, visando a eliminação de qualquer forma de discriminação contra as pessoas com deficiência. Além disso, 24 assumiu o compromisso de garantir sua plena integração à sociedade, promulgando a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, mais conhecida por Convenção da Guatemala, com a publicação do Decreto 3.956, de 08 de outubro de 2001 (Brasil, 2001). No ano seguinte, a Língua Brasileira de Sinais é reconhecida como língua oficial no Brasil pela Lei 10.436, de 24 de abril de 2002 (Brasil, 2002), regulamentada pouco mais de três anos depois pelo Decreto 5.626, de 22 de dezembro de 2005 (Brasil, 2005), que também estabeleceu que o ensino de Libras fosse disciplina curricular. No ano de 2004, são regulamentadas pelo Decreto 5.296, de 02 de dezembro de 2004 a Lei 10.048 (referente ao atendimento prioritário) e a Lei 10.098 (sobre normas gerais de acessibilidade), ambas do ano dois mil. Por se dedicar amplamente à regulamentação das normas de acessibilidade, tornou-se conhecido como o decreto da acessibilidade (Brasil, 2004). Nos anos de 2005 e 2006, são intensificados os debates no âmbito da Organização das Nações Unidas em torno da elaboração de um tratado internacional que protegesse os direitos das pessoas com deficiência. A necessidade de um instrumento internacional vinculante de proteção aos direitos desse segmento foi pautada por Gilberto Rincón Gallardo, presidente da delegação do México, na Conferência Mundial contra o Racismo e a Discriminação Racial, a Xenofobia e as Formas Conexas de Intolerância realizada em setembro de 2001, na cidade de Durban, África do Sul (Lanna Júnior, 2010). Em dezembro de 2001, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou a Resolução no 56/168, criando um Comitê Especial ad hoc para elaborar proposta de convenção internacional sobre os direitos das pessoas com deficiência, amplo e integral, com enfoque no desenvolvimento social, nos direitos humanos e na não discriminação (Lanna Júnior, 2010). Após quatro anos de negociação, e realizadas oito sessões do Comitê Especial ad hoc com a participação efetiva de muitas pessoas com deficiência dos mais diversos países e continentes, sob o lema entoado por essas pessoas “nada sobre nós sem nós”, em 13 de dezembro de 2006, a Organização das Nações Unidas, por consenso, aprovou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, pela Resolução nº 61/106 (Lanna Júnior, 2010). 25 Em 30 de março de 2007, o Brasil assinou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, sem reservas, vindo a ratificá- los no ano seguinte, com força de norma constitucional, por ter observado o rito previsto no Art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, com a publicação do Decreto Legislativo nº 186, de 09 de julho de 2008 (Brasil, 2008). A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência passou a produzir seus efeitos jurídicos no âmbito internacional em 03 de maio de 2008, após vinte países a terem ratificado. No Brasil, foi efetivamente incorporada ao ordenamento jurídico nacional no ano seguinte, com a sua promulgação pelo Decreto 6.949, de 25 de agosto de 2009 (Brasil, 2009). A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência trouxe em seu conteúdo normativo importantes inovações conceituais, como a adoção do chamado "modelo social da deficiência". Esse modelo difere do modelo médico tradicional, que via a deficiência como uma questão exclusivamente relacionada à saúde da pessoa. O modelo social reconhece que as barreiras sociais, ambientais e atitudinais são as principais fontes de exclusão e desvantagem enfrentadas pelas pessoas com deficiência. Isso significa que a sociedade tem a responsabilidade de remover essas barreiras para garantir a plena participação desses indivíduos. A Convenção também estabelece o princípio da não discriminação como um direito fundamental. Ela proíbe explicitamente a discriminação com base na deficiência em todas as áreas da vida, incluindo emprego, educação, saúde e participação política. Além disso, a convenção exige que as pessoas com deficiência tenham igualdade de oportunidades em todas essas áreas e exige que os Estados Partes tomem medidas para garantir que essas pessoas tenham acesso a ambientes físicos, transportes, informações e comunicações, bem como a tecnologias e sistemas de apoio, de forma igualitária (Brasil, 2009). A convenção garante às pessoas com deficiência o direito de participar plenamente da vida política e pública. Ela estabelece que os Estados Partes devem garantir que essas pessoas possam votar e serem eleitas em igualdade de condições com os demais, além de terem acesso a processos judiciais e de tomada de decisão, incentivando a substituição de medidas de tutela e curatela por apoio à tomada de decisão, garantindo que as pessoas com deficiência possam exercer sua capacidade jurídica em igualdade de condições com os demais (Brasil, 2009). No ano de 2011, o Governo Federal do Brasil institui o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência - Plano Viver sem Limite, pelo Decreto 7.612, de 26 17 de novembro de 2011, com a finalidade de promover a articulação de políticas, programas e ações para garantir o exercício pleno e equitativo dos direitos das pessoas com deficiência, pautado pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Os eixos de atuação do Plano Viver sem Limite foram o acesso à educação, a atenção à saúde, a inclusão social e a acessibilidade (Brasil, 2011a). No ano seguinte, a Lei 12.764, de 27 de dezembro de 2012, institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Passa-se a reconhecer que essas pessoas têm os mesmos direitos que as pessoas com deficiência (Brasil, 2012). O ano de 2013 foi marcado pela adoção do Tratado de Marraqueche no âmbito da Organização Mundial de Propriedade Intelectual. A normativa tem por objetivo harmonizar direitos humanos e direitos autorais, facilitando o Acesso a Obras Publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com Outras Dificuldades para Ter Acesso ao Texto Impresso (WIPO, 2013). O Tratado estabelece cláusulas prevendo limitações e exceções aos direitos autorais, permitindo que obras literárias ou científicas sejam produzidas e distribuídas em formatos acessíveis, por entidades autorizadas, independente da autorização do detentor do direito de autor. Permite, inclusive, o movimento transfronteiriço dessas obras a partir da exportação e importação destas entre países signatários do tratado. O Brasil ratificou o Tratado de Marraqueche pelo Decreto Legislativo 261, em 25 de novembro de 2015. Aprovado com respeito aos ritos e critérios previstos pelo Art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, à normativa foi reconhecida força de norma constitucional. Com isso, recebe o status de segundo tratado de direitos humanos com força de norma constitucional a integrar o ordenamento jurídico brasileiro (Brasil, 2015b). O Tratado passou a produzir seus efeitos em âmbito internacional em 30 de setembro de 2016, após o vigésimo país depositar sua ratificação junto à Organização Mundial de Propriedade Intelectual. No Brasil, foi plenamente internalizadodois anos depois, em 09 de outubro de 2018, promulgado pelo Decreto 9.522, de 08 de outubro de 2018 (Brasil, 2018b). Em julho de 2015, foi publicada a Lei 13.146, mais conhecida por Lei Brasileira de Inclusão ou Estatuto da Pessoa com Deficiência, objetivando promover a implementação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência no sistema jurídico nacional. Dentre as principais inovações da Lei Brasileira de Inclusão 27 estão a avaliação biopsicossocial da deficiência, o conceito de discriminação em razão da deficiência, o tipo penal de crime de discriminação em razão da deficiência, o instituto da tomada de decisão apoiada, além de tantas outras (Brasil, 2015a). O Estatuto da Pessoa com Deficiência também criou o Cadastro Inclusão (Art. 92, ainda não implementado), e o Auxílio Inclusão (Art. 94), regulamentado seis anos mais tarde, pela Lei 14.176, de 22 de junho de 2021 (Brasil, 2021a). O benefício consiste no pagamento de meio salário mínimo às pessoas com deficiência que deixam de receber o benefício de prestação continuada, este no valor de um salário mínimo, para ingressar no mercado de trabalho, desde que seu salário como empregado não seja superior a dois salários mínimos. O Auxílio Inclusão é um estímulo para que a pessoa com deficiência deixe a condição de beneficiário da assistência social e passe a contribuir com a previdência social como trabalhador contribuinte, o que é extremamente fundamental para a promoção da inclusão social dessas pessoas e para a desoneração do erário (Brasil, 2015a). Por fim, recentemente o Governo Federal publicou o Decreto 11.793, de 23 de novembro de 2023, instituindo o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência - Novo Viver sem Limite, com a finalidade de promover, por meio da integração e da articulação de políticas, programas e ações, o exercício pleno e equitativo dos direitos das pessoas com deficiência. O Novo Viver sem Limite foi instituído com dez diretrizes e estruturado com os seguintes eixos: gestão e participação social; enfrentamento do capacitismo e da violência contra as pessoas com deficiência; acessibilidade e tecnologia assistiva; e promoção do direito à educação, à assistência social, à saúde e aos demais direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais (Brasil, 2023b). No lançamento do “Novo Viver sem Limite”, foi anunciado pelo Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania que mais de seis bilhões de reais serão investidos em aproximadamente cem ações em favor das pessoas com deficiência. O Decreto 11.793/2023 (Brasil, 2023b), em seu Art. 6º, prevê que a execução do Novo Viver sem Limite poderá contar com a realização de repasses, fundo a fundo, convênios, contratos de repasse, termos de execução descentralizada, acordos de cooperação, termos de fomento, termos de colaboração e outros instrumentos congêneres com órgãos e entidades da administração pública federal, municipal, estadual e distrital (R.O, 2023; Brasil, 2023b). 28 1.3 Os espaços de participação política das pessoas com deficiência no Brasil Na década de 80, com a mobilização social das pessoas com deficiência (já abordada anteriormente), além da estruturação das organizações não governamentais representativas dos distintos segmentos de deficiência, o Governo do Estado de São Paulo, pelo Decreto nº 23.131, de 19 de dezembro de 1984, criou o Conselho Estadual para Assuntos da Pessoa Deficiente. O Conselho contava com vinte e sete membros, composto por nove representantes das pessoas com deficiência, nove representantes de entidades prestadoras de serviços de reabilitação e nove representantes governamentais. Entre as atribuições, estavam “implantar e executar as diretrizes básicas da política estadual voltada para a integração social das pessoas deficientes” e “propor medidas que visem à defesa dos direitos das pessoas deficientes, a eliminação das discriminações que os atingem e à sua plena inserção na vida socioeconômica, política e cultural” (Estado de São Paulo, 1984). Registros históricos (Crespo, 2009; Secretaria [...], 2011) dão conta de que, cinco anos após a criação do Conselho Estadual para Assuntos da Pessoa Deficiente, o movimento social das pessoas com deficiência daquele estado manifestou-se pela extinção do conselho. A iniciativa foi motivada pelo entendimento de que a participação das pessoas com deficiência foi “insignificante” naquele órgão, visto que os representantes governamentais e os representantes das entidades prestadoras de serviços se uniram, formando maioria em oposição aos representantes das pessoas com deficiência. No ano de 1986, o Presidente da República, pelo Decreto 93.481, de 29 de outubro daquele ano, institui a Coordenadoria para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - CORDE, vinculada ao Gabinete Civil da Presidência da República. O órgão tinha a missão de promover o “tratamento prioritário e adequado aos assuntos relativos às pessoas portadoras de deficiências, visando a assegurar a estas o pleno exercício de seus direitos básicos e a efetiva integração social” (Brasil, 1986). No ano seguinte, com o Decreto 94.806, de 31 de agosto de 1987, a Presidência da República cria o Conselho Consultivo da Coordenadoria para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Era composto por quinze membros, sendo nove representantes governamentais e seis representantes de organizações representativas de pessoas com deficiência (Brasil, 1987). 29 De acordo com o estabelecido pelo inciso VII do Art. 2º do Decreto 94.806/1987, os representantes das pessoas com deficiência eram os seguintes: o Presidente da Federação Brasileira de Entidades de Cegos; o Presidente da Federação Brasileira das Instituições de Excepcionais; o Presidente da Federação Nacional das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais; o Presidente da Federação Nacional das Sociedades Pestalozzi; o Presidente da Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos; e o Presidente da Organização Nacional das Entidades de Deficientes Físicos. A esse Conselho competia opinar sobre o desenvolvimento da Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, apresentar sugestões para o encaminhamento dessa política e responder a consultas formuladas pela Coordenadoria (Brasil, 1987). Nos anos seguintes, diversos conselhos municipais e estaduais de direitos das pessoas com deficiência foram sendo estruturados nessas esferas governamentais Brasil a fora, em sua maioria com natureza deliberativa (Souza, 2018). No final da década de noventa, por exemplo, o Decreto nº 3.076, de 1º de junho de 1999, cria, no âmbito do Ministério da Justiça, o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência – CONADE, órgão superior de deliberação coletiva, com composição paritária entre representantes governamentais e da sociedade civil (Brasil, 1999a). Desde sua criação, o nome, as competências e a composição do CONADE sofreram alterações pelos decretos 3.298, de 20 de dezembro de 1999 (Brasil, 1999b); 9.494, de 06 de setembro de 2018 (Brasil, 2018a); 10.177, de 16 de dezembro de 2019 (Brasil, 2019); 10.812, de 27 de setembro de 2021 (Brasil, 2021b); e 10.841, de 20 de outubro de 2021 (Brasil, 2021c). Conforme o disposto pelo Decreto 10.177/2019 e alterações posteriores, atualmente o CONADE é o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, órgão superior de caráter paritário, consultivo e de deliberação colegiada sobre as políticas públicas destinadas às pessoas com deficiência, ao qual compete: acompanhar a implementação da Política Nacional para a Inclusão da Pessoa com Deficiência; acompanhar o planejamento e avaliar a execução das políticas setoriais de educação, saúde, trabalho, assistência social, transporte, cultura, turismo, desporto, lazer, política urbana, reabilitação e outras políticasrelativas à pessoa com deficiência; acompanhar a elaboração e a execução da proposta orçamentária do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, de modo a sugerir as 30 modificações necessárias à consecução da Política Nacional para a Inclusão da Pessoa com Deficiência; formular propostas sobre a efetivação do sistema descentralizado e participativo de defesa dos direitos da pessoa com deficiência; acompanhar e apoiar as políticas e as ações dos Conselhos de Direitos da Pessoa com Deficiência no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; propor a elaboração de estudos e pesquisas que objetivem a melhoria da qualidade de vida da pessoa com deficiência; propor e incentivar a realização de campanhas com vistas à promoção dos direitos da pessoa com deficiência e à prevenção das causas que levam à deficiência; avaliar e manifestar-se sobre o plano de ação anual da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos; acompanhar o desempenho dos programas e projetos da política nacional para inclusão da pessoa com deficiência por meio de relatórios de gestão; indicar as medidas a serem adotadas, no território nacional, nos casos de requerimentos, denúncias e reclamações formuladas por qualquer pessoa ou entidade, quando ocorrer ameaça ou violação aos direitos da pessoa com deficiência, assegurados pela Constituição, pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, promulgada pelo Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, pela Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, e pelas demais legislações aplicáveis; participar do monitoramento da promoção, da proteção e da implementação no país da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, da Lei nº 13.146, de 2015, e das demais legislações aplicáveis; e realizar, com o apoio do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, a cada quatro anos, a Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, observada a disponibilidade orçamentária e financeira e o disposto em ato do Ministro de Estado do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (Brasil, 2019). O Decreto 10.177/2019 e o regimento interno aprovado pela Resolução nº 01, de 20 de julho de 2022, preveem que o CONADE é composto por trinta e seis representações, sendo dezoito governamentais e dezoito da sociedade civil organizada. Dentre estas, treze são representações de organizações de pessoas com deficiência, distribuídas na seguinte proporção: uma da área de transtorno do espectro autista; uma da área de deficiência auditiva ou surdez; três da área de deficiência física; duas da área da deficiência mental ou intelectual; duas da área de deficiência decorrente de causas patológicas ou doenças raras; duas da área da deficiência 31 visual; uma da área de deficiências múltiplas e uma da área de síndromes (Brasil, 2019; Brasil, 2022a). Atualmente, o CONADE possui a seguinte composição (Portal gov.br, 2024): Entidades não governamentais Transtorno do Espectro Autista 1 - Associação Brasileira de Autismo - ABRA Deficiência Auditiva ou Surdez 2 - Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos - FENEIS Deficiência Física 3 - Federação das Fraternidades Cristãs de Pessoas com Deficiência do Brasil - FCD/BR Deficiência Física 4 - Associação dos Familiares, Amigos e Portadores de Doenças Graves - AFAG Deficiência Física 5 - Organização Nacional de Entidades de Deficientes Físicos - ONEDEF Deficiência Mental ou Intelectual 6 - Federação Nacional das Apaes - FENAPAES Deficiência Mental ou Intelectual 7 - Federação Nacional das Associações Pestalozzi - FENAPESTALOZZI Deficiência Decorrente de Causas Patológicas ou Doenças Raras 8 - Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras - FEBRARARAS Deficiência Decorrente de Causas Patológicas ou Doenças Raras 9 - Retina Brasil Deficiência Visual 10 - Confederação Brasileira de Desportos de Deficientes Visuais - CBDV 32 Deficiência Visual 11 - Organização Nacional de Cegos do Brasil - ONCB Deficiência múltiplas 12 - Associação de Pais, Amigos e Pessoas com Deficiência, de Funcionários do Banco do Brasil e da Comunidade - APABB Deficiência da área de síndromes 13 - Associação Brasileira da Síndrome de Williams - ABSW Organizações Nacionais de empregadores 14 - Confederação Nacional do Comércio de bens, Serviços e Turismo - CNC Organizações Nacionais de Trabalhadores 15 - União Geral dos Trabalhadores - UGT Organizações Nacionais da Comunidade Científica 16 - Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO 17 - Ordem dos Advogados do Brasil – OAB 18 - Conselho Federal de Engenharia e Agronomia – CONFEA. Poder Público 1 - Casa Civil da Presidência da República 2 - Ministério da Justiça e Segurança Pública 3 - Ministério das Relações Exteriores 4 - Ministério da Previdência Social 5 - Ministério do Trabalho e Emprego 6 - Ministério das Cidades 7 - Ministério da Educação 8 - Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome 9 - Ministério do Esporte 10 - Ministério da Saúde 11 - Ministério das Comunicações 12 - Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações 13 - Ministério do Turismo 14 - Ministério da Cultura 15 - Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania 33 Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência 16 - Ministério das Mulheres 17 - Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos 18 - Ministério dos Transportes Além dos conselhos de direitos da pessoa com deficiência, as organizações representativas das pessoas com deficiência buscam outros espaços de participação política, os quais disputam com segmentos sociais diversos. É o que se pode observar, por exemplo, na atual composição do Conselho Nacional de Saúde, com a presença das seguintes organizações: Associação Brasileira de Autismo (ABRA), Federação Brasileira das Associações Síndrome de Down (FBASD), Federação Nacional das APAES (FENAPAES), Federação Nacional das Associações Pestalozzi (FENAPESTALOZZI), Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (MORHAN) e Organização Nacional de Cegos do Brasil (ONCB) (CNS, 2023). Fenômeno semelhante pode ser observado nas composições do Conselho Nacional de Assistência Social, com a participação da FENAPAES e da FENAPESTALOZZI (Brasil, 2022a); do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, com a presença da FENAPESTALOZZI e da ONCB (Brasil, 2023a) e do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, com a participação da ONCB e do MORHAN (CNDM, 2021). No Brasil, atualmente todos os estados da federação possuem conselho estadual dos direitos da pessoa com deficiência, ao passo que mais de quinhentos municípios já criaram conselhos municipais dos direitos da pessoa com deficiência (Borges, 2021). Outro espaço de participação das pessoas com deficiência existente no sistema político brasileiro é o processo conferencial. Este consiste na convocação da Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência por parte do CONADE, a cada intervalo de quatro anos, conforme a competência atribuída a este colegiado pelo Decreto 10.177/2019 (Brasil, 2019). O processo conferencial ocorre a partir da convocação do CONADE, sendo a conferência nacional propriamente dita um conjunto de conferências que inicial, em 34 uma primeira etapa, em âmbito municipal ou regional. Nesta, as pessoas com deficiência e demais interessados se reúnem para avaliar as políticas públicas em favor desse segmento. Também elaboram suas propostas de aperfeiçoamento ou criação de novas políticas públicas, deliberam acerca dessas propostas e elegem os representantes que as irão defenderem um segundo momento, quando se realiza a conferência em âmbito estadual. Na etapa estadual, representantes eleitos nas conferências municipais ou regionais avaliam as propostas apresentadas pelos municípios e deliberam a respeito das propostas a serem apresentadas na etapa nacional, além de elegerem seus representantes (Brasília, 2023-B). Ao longo da história, foram realizados quatro processos conferenciais dos direitos da pessoa com deficiência. A primeira conferência nacional dos direitos da pessoa com deficiência foi realizada no ano de 2006; a segunda, em 2008; a terceira, em 2012 e a quarta no ano de 2016 (Borges, 2021). A V Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência está em execução, iniciando as etapas municipais a partir do mês de agosto de 2023 e com previsão de realização da etapa nacional em julho de 2024 (Brasília, 2023-B). Apresentados os espaços de participação política postos à disposição das pessoas com deficiência no Brasil, passaremos a analisar se os direitos conquistados por essas pessoas estão sendo de fato implementados, bem como se as estruturas de participação social são suficientes para o monitoramento do processo de implementação desses direitos. 1.4 A efetividade dos mecanismos de monitoramento das políticas públicas existentes no Brasil Observando a extensa trajetória de luta por reconhecimento da cidadania e pela conquista de direitos das pessoas com deficiência, resta analisar se todos esses direitos conquistados formalmente vêm sendo efetivamente implementados. Cabe, também, investigar se as estruturas de proteção e garantia de direitos das quais essas pessoas participam são suficientes para promover o devido monitoramento do processo de implementação desses direitos e de suas respectivas políticas públicas. Alguns indicadores que analisaremos a seguir podem auxiliar na resposta a essas indagações. 35 O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no censo realizado no ano de 2010, inicialmente informou que 45.606.048 pessoas, representativas de 23,9% da população brasileira, possuíam algum tipo de deficiência (SDH/PR, 2012a). Oito anos após a realização daquele censo, o IBGE tornou pública a Nota Técnica 01/2018, com a releitura dos dados de pessoas com deficiência no Censo Demográfico 2010, à luz das recomendações do Grupo de Washington2. Na oportunidade, foi informado que a população total de pessoas com deficiência residentes no Brasil e captada pela amostra do Censo Demográfico 2010 não se faz representada pelas 45.606.048 pessoas, ou 23,9% das 190.755.048 pessoas recenseadas nessa última operação censitária. Pela releitura, chegou-se ao quantitativo de 12.748.663 pessoas, ou seja, 6,7% do total da população registrada pelo Censo Demográfico de 2010 (IBGE, 2018). A discrepância entre os números divulgados em 2012 e os de 2018, ambos referentes ao mesmo censo demográfico, deveu-se a consideração, na primeira interpretação dos dados coletados, de que pessoas com deficiência seriam aquelas que responderam ao censo afirmando possuir alguma dificuldade para o exercício das funcionalidades de caminhar, ouvir ou enxergar, o que não necessariamente implica em possuir uma deficiência. Uma grande parcela da população possui, por exemplo, alguma dificuldade de enxergar. Porém, com adequada correção ótica (uso de óculos ou lentes de contato), tais pessoas não enfrentam barreiras que restrinjam sua participação na sociedade em igualdade de condições com as demais. Por recomendação do Grupo de Washington, o IBGE revisou a extração dos dados sobre deficiência, reconhecendo como pessoas com deficiência apenas aquelas que responderam possuir muita dificuldade ou não conseguir exercer as funções questionadas, o que ensejou a redução significativa da população com deficiência. Os dados estatísticos oficiais mais atuais são os apresentados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, realizada pelo IBGE e referente ao terceiro trimestre do ano de 2022, divulgada em julho de 2023. Segundo os dados apurados por esta amostra, atualmente há no Brasil 18,6 milhões de pessoas com 2 2 O Grupo de Washington busca padronizar e harmonizar definições, conceitos e metodologias, de modo a garantir a comparabilidade das estatísticas entre diferentes países. É formado sob a Comissão de Estatística das Nações Unidas e composto por representantes de Institutos Oficiais de Estatística e organizações representantes da sociedade civil. Como representante oficial do Brasil, o IBGE participa desde o início da formação do grupo, em 2001, acompanhando as discussões e estudos propostos. 36 anos ou mais de idade que possuem algum tipo de deficiência, o que corresponde a 8,9% da população de mesma faixa etária (IBGE, 2023). A mesma amostra de domicílio afirma que, dos 18,6 milhões de brasileiros com deficiência, 17,5 milhões tem quatorze anos ou mais. Destes, 5,1 milhões foram identificados como força de trabalho, o que significa trabalhando ou procurando uma oportunidade de trabalho. Outras 12,4 milhões de pessoas com deficiência e com 14 anos ou mais sequer estão sendo consideradas como força de trabalho (IBGE, 2023). Em que pese a vigência, por mais de três décadas, da Lei de Cotas (Lei nº 8.213/91), dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), indicam que, no ano de 2021, das 828.256 vagas reservadas no mercado de trabalho brasileiro, apenas 412.520 estavam ocupadas por pessoas com deficiência. Isso significa que 415 mil postos de trabalho que deveriam estar ocupados por pessoas com deficiência não estavam, de fato, ocupados por elas (Brasil, 1991b; Brasília, 2023c). E segundo dados da Dataprev, em dezembro de 2022 havia 2.770.710 Benefícios de Prestação Continuada ativos para pessoas com deficiência, o que representa 14,9% das pessoas com deficiência de acordo com a PNAD Contínua (Brasília, 2023-C; IBGE, 2023). Referente ao acesso à educação, dados divulgados em outubro de 2023 pela Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência dão conta de que dos 6 aos 14 anos, a taxa de escolarização entre crianças e adolescentes sem deficiência é de 99,4%. Entre pessoas com deficiência, a taxa é de 95,1%. Dos 15 aos 17 anos, esse percentual reduz para 93% entre adolescentes sem deficiência e 84,6% dos adolescentes com deficiência. Já o acesso ao Ensino Superior é ainda menor entre as pessoas com deficiência. Em 2021, apenas 7 em cada 1.000 matrículas nos cursos de graduação eram de estudantes com deficiência (Brasília, 2023-C). No ano de 2022, foram registradas no Sistema de Informação de Agravos de Notificação do Ministério da Saúde 11.979 casos de violência contra pessoas com deficiência no Brasil. A maioria das vítimas envolviam pessoas do sexo feminino, representando 62,8% do total. Em relação ao tipo de deficiência das vítimas, 55% tinham deficiência mental, 35% deficiência física, 12,5% deficiência visual e 10% deficiência auditiva. A violência física foi o tipo mais frequente, correspondendo a 47,2% dos casos. O segundo tipo de violência mais frequente foi a negligência ou abandono, correspondendo a 22,2% dos casos no mesmo ano. Foram ainda registradas 2.602 notificações de violência psicológica (21,7%), 1.790 de violência 37 sexual (14,9%), 453 de violência financeira e econômica (3,8%) e 307 notificações de tortura (2,6%). A maioria das agressões registradas ocorreram na própria residência da vítima (74,5%) e do total de notificações, 66,6% já haviam ocorrido outras vezes (Brasília, 2023-C). O Observatório sobre Deficiência da Universidade de Brasília desenvolveu pesquisa a respeito da implementação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência no Brasil, objetivando identificar o quanto essas pessoas estão acessando os direitos previstos por esse