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Justiça: Bases Filosóficas e Históricas

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HISTÓRIA DA COMUNICAÇÃO, LEGISLAÇÃO
E ÉTICA DA COMUNICAÇÃO
Letícia Jury
Jornalista. Mestra em Comunicação
e Doutoranda
As bases filosóficas da Justiça
As bases filosóficas da Justiça são fundamentadas em
diferentes tradições filosóficas ao longo da história. Uma
das representações mais simbólicas da Justiça é a Deusa
Themis, da mitologia grega, que personifica a ordem
divina, a lei natural e a justiça imparcial. Themis é
frequentemente retratada segurando uma balança,
simbolizando o equilíbrio e a imparcialidade que devem
estar presentes na aplicação da justiça. Além disso, a
venda nos olhos da deusa representa a imparcialidade,
indicando que a justiça deve ser cega, sem consideração
a status, poder ou riqueza.
Filosoficamente, a base da justiça muitas vezes é
associada à ideia de igualdade e equidade. Filósofos
como Platão e Aristóteles discutiram a justiça em seus
trabalhos, destacando a importância de um equilíbrio
entre o que é justo para o indivíduo e o que é justo para a
sociedade como um todo. Outras correntes filosóficas,
como o utilitarismo de Jeremy Bentham e John Stuart Mill,
baseiam a justiça na maximização da felicidade ou do
bem-estar geral. Em resumo, a Justiça, representada por
Themis, combina elementos de imparcialidade, equilíbrio e
equidade, fundamentando-se em diversas correntes
filosóficas que buscam garantir um tratamento justo e
igualitário para todos.
A concepção de justiça traz consigo a noção
de que tudo o que existe possui um propósito e,
como tal, uma relação dentro de uma ordem. É
então essa relação que expressa a justiça das
coisas, de maneira que noções como equilíbrio,
imparcialidade, harmonia e equidade guardam
ligação direta com a noção de justiça. 
A Justiça na antiguidade
Na Grécia Antiga, a justiça era um conceito central na vida cotidiana, na política e na
filosofia. A ideia de justiça estava profundamente enraizada na religião e na moralidade
grega, influenciando a forma como as pessoas interagiam umas com as outras e como
as decisões eram tomadas nas cidades-Estado.
Uma das formas mais conhecidas de justiça na Grécia Antiga era a justiça distributiva,
que se baseava na ideia de que os bens e benefícios da sociedade deveriam ser
distribuídos de forma justa e equitativa. Isso era especialmente importante nas cidades-
Estado como Atenas, onde a democracia direta era praticada e a participação igualitária
dos cidadãos era valorizada.
Além disso, a justiça na Grécia Antiga também estava relacionada à ideia de vingança e
retaliação. O conceito de "olho por olho, dente por dente", conhecido como lei de Talião,
era comum em casos de crimes e injustiças, buscando garantir uma punição
proporcional às transgressões cometidas.
A filosofia grega também contribuiu significativamente para a compreensão da justiça.
Filósofos como Platão e Aristóteles discutiram a natureza da justiça em suas obras,
destacando sua importância para a organização da sociedade e para a busca da virtude
e da excelência moral.
Ética para Aristóteles
Para Aristóteles, a ética é o estudo da excelência moral e da
virtude, buscando entender como os seres humanos podem
viver uma vida boa e alcançar a felicidade. Ele acreditava que a
ética não se baseia em regras fixas ou em um código de
conduta universal, mas sim na busca pelo equilíbrio e pela
moderação, conhecidos como "virtudes morais". Para
Aristóteles, a ética não se trata apenas de conhecer o que é
certo ou errado, mas de desenvolver hábitos e disposições que
levem a ações virtuosas e a uma vida plena e feliz, em harmonia
com a razão e a natureza humana.
Enquanto nas noções gregas a justiça era elemento
fundamental da organização social e estavam ligadas às
noções de ordem social e ordem da alma, nas noções
cristãs medievais o elemento fundamental da organização
social e da alma passa a ser o amor — e a misericórdia.
Disso não implica que a justiça tenha deixado de ocupar
espaço na organização social, nem que a justiça tenha
deixado de ser uma virtude. Em se tratado de justiça e
virtude, as noções gregas, principalmente de Aristóteles,
são muito próximas das noções medievais, notadamente,
às de São Tomás de Aquino.
A Justiça na Idade Média
São Tomás de Aquino foi o grande mestre da cristandade. O é até os dias
de hoje. O Santo, ao se deparar com as questões éticas levantadas no
período clássico (gregos e romanos), faz suas considerações e molda, por
assim dizer, o pensamento ocidental do que vem a ser a justiça.
Para São Tomás de Aquino, a ética é parte da filosofia moral que busca
entender o que é bom e como devemos viver para alcançar o bem. Ele
argumenta que a ética não se limita a uma lista de regras ou
mandamentos, mas é fundamentada na lei natural, que é uma participação
na lei divina. Para Aquino, a ética envolve a busca da felicidade e da
perfeição, que são alcançadas através da prática das virtudes, como a
justiça, a coragem e a temperança. Assim, a ética para São Tomás de
Aquino está intrinsecamente ligada à sua visão teológica do mundo,
buscando orientar a conduta humana de acordo com os princípios divinos. 
O direito natural é uma teoria ética e jurídica que postula a existência de
princípios morais e normativos fundamentais que são inerentes à natureza
humana e que servem como base para a justiça e a ordem social. Esses
princípios são considerados universais e imutáveis, independentes das leis
criadas pelos seres humanos. A noção de direito natural argumenta que
existem certos direitos e valores intrínsecos à condição humana, como a
vida, a liberdade e a propriedade, que devem ser respeitados e protegidos
em qualquer sociedade justa. Assim, o direito natural sustenta que as leis e
as instituições sociais devem estar em conformidade com esses princípios
fundamentais, garantindo a justiça, a igualdade e o respeito pelos direitos
individuais.
O Direito Medieval refere-se ao sistema jurídico que vigorou na Europa
durante a Idade Média, aproximadamente do século V ao XV. Ele foi
influenciado principalmente pelo direito romano e pelo direito canônico da
Igreja Católica, além de incorporar elementos das tradições germânicas e
celtas. Durante esse período, o direito era frequentemente fragmentado e
variava de acordo com a região e o contexto cultural. O Direito Medieval
refletia uma sociedade hierárquica e teocrática, onde a autoridade secular
e religiosa muitas vezes se sobrepunha. As normas legais eram
frequentemente baseadas em costumes locais, tradições orais e decisões
judiciais anteriores, sendo aplicadas de forma diferente conforme a posição
social e o poder político das partes envolvidas.
Justiça na
Idade Moderna
Na modernidade, a ruptura acontece, incialmente, quando os pensadores rompem com
a ligação entre lei natural e lei eterna. Vimos que os escolásticos plasmaram a noção de
lei eterna — advinda das Escrituras — com a lei natural da antiguidade, e com isso a
noção de direito natural tinha como fundamento a lei divina. 
Ao romperem com isso, os modernos postularam a noção de direito natural com
fundamento exclusivo na lei natural, usando como fundamento, precisamente, a razão
humana. Para os modernos, a natureza humana era, fundamentalmente, sua
capacidade intelectiva, a razão. Todos os demais aspectos como alma e corpo,
imagem e semelhança de Deus, e outros, foram rechaçados.
Ou seja, o homem já não teria que usar sua razão natural para alcançar os princípios da
lei divina. A razão natural, ou para utilizar as noções do início dessa unidade, o intelecto
teórico ou contemplativo e o intelecto prático, bastavam-se a si mesmos naquilo que
pudessem oferecer de princípios universais. Dito de outra forma, não era necessário
recorrer às Escrituras, à Tradição Cristã, aos elementos teológicos para auferirem
noções de justiça, ordem, virtude e natureza humana. 
A razão bastava-se. A essa concepção chamamos de jusnaturalismo, e compreende a
noção de direito natural com fundamentona razão. Esse fundamento significa que o
direito natural deve estar fundado em princípios naturais que podem ser captados pela
razão humana. A diferença do direito natural jusnaturalistas para o direito natural
medieval é que este estabelecia a subordinação da lei natural à lei divina, enquanto
aquele rompe com esta subordinação. Mantem-se, então, a noção de que o direito deva
estar subordinado a certos princípios morais advindos da lei natural.
Na Idade Moderna, a justiça passou por significativas mudanças em relação à Idade
Média. Com o Renascimento, o Humanismo e a Reforma Protestante, houve uma
transição para uma visão mais secular e individualista da justiça. A justiça na Idade
Moderna passou a ser mais racional, baseada em leis escritas e em princípios
universais, em contraste com a justiça medieval, que era mais fragmentada e baseada
em tradições locais e no direito consuetudinário. Além disso, a separação entre Igreja e
Estado, que se intensificou nesse período, levou a uma maior autonomia do poder
secular em relação ao religioso, resultando em sistemas jurídicos mais laicos
A justiça na Idade Moderna também foi influenciada pelo
pensamento iluminista, que enfatizava a razão, a igualdade
e os direitos naturais, contribuindo para o desenvolvimento
de conceitos como a igualdade perante a lei e a separação
dos poderes. Em resumo, a justiça na Idade Moderna
rompeu com a tradição medieval ao se tornar mais racional,
universalista, laica e centrada nos direitos individuais e na
igualdade perante a lei.

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