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O desenvolvimento público, econômico e político no brasil

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O desenvolvimento público, econômico e político no brasil:
Uma revisão de literatura
Introdução
	No contexto brasileiro, em se tratando de políticas públicas, em meados do ano de 1930, surgiram as primeiras atividades sistemáticas no que tange a mobilização de conhecimento de base científica para servir de subsídio para a formulação de políticas públicas no Brasil, através da implantação do Estado Nacional-Desenvolvimentista (Vaitsman, Ribeiro e Lobato, 2013). 
Essencialmente, o que caracterizava o Estado brasileiro nesse período (1920-1980) era seu caráter desenvolvimentista, conservador, centralizador e autoritário. Não era um Estado de Bem-Estar Social. O Estado era o promotor do desenvolvimento e não o transformador das relações da sociedade. Um Estado conservador que logrou promover transformações fantásticas sem alterar a estrutura de propriedade, por exemplo. Nessa fase, o grande objetivo do Estado brasileiro era consolidar o processo de industrialização. Desde o começo do século, optou-se pela industrialização. A grande tarefa era consolidar esse processo e fazer do Brasil uma grande potência. Assim, o grande objetivo era de ordem econômica: construir uma potência intermediária no cenário mundial. O Estado desempenhava a função de promover a acumulação privada na esfera produtiva. O essencial das políticas públicas estava voltado para promover o crescimento econômico, acelerando o processo de industrialização, o que era pretendido pelo Estado brasileiro, sem a transformação das relações de propriedade na sociedade brasileira (Santos Junior, Orlando Alves, [et al]. 2003).
O processo econômico tem que se servir da natureza de um modo mais duradouro, sóbrio e saudável do que tem sido a prática até hoje. Embora, rigorosamente, não se deva confundir crescimento (expansão) com desenvolvimento (realização de um potencial) – como algumas pessoas têm salientado (Daly, 1991) – é inegável que, no discurso sobre desenvolvimento em um país como o Brasil, subentende-se sempre aumentar a renda per capita indefinidamente e isto representa crescimento. Seria muito bom, se o último implicasse redução verdadeira e permanente ou eliminação da pobreza. Infelizmente, tal coisa não é o que se depreende tanto da experiência do Brasil, como do mundo em gerais Mais ainda, testemunha-se hoje, em toda a parte, o fenômeno do “crescimento sem empregos” (Sheng, cap.10), com desigualdade e miséria crescentes.
Fazendo um comparativo com outros países, por volta dos últimos anos do século XX e início do século XXI, nos países considerados periféricos e centrais, ficou bem nítido que estes foram apresentando consideráveis transformações no campo das políticas sociais, principalmente no que se refere às mudanças no mercado capitalista, mas em contrapartida devido a crescente concentração do capital financeiro, como também a regionalização dos mercados, acabou causando o aumento da pobreza e consequentemente a exclusão da maioria da população. (SILVA, YASBEK e GIOVANNI, 2012, p.123).
Desenvolvimento:
O INÍCIO DA ERA VARGAS
Entre os anos de 1930 a 1945 e de 1951 até o ano de 1954, o Brasil vivia um período de desenvolvimento através da implantação do Estado Nacional-Desenvolvimentista, o nosso presidente e chefe do executivo era Getúlio Vargas, Vargas tinha a meta de organizar o aparelho do Estado de acordo com o modelo burocrático weberiano, o qual os funcionários eram recrutados por meio de concurso público. 
	Essa época tornou-se muito importante para a história do nosso país, tendo em vista a grande contribuição que o governo Vargas deu ao povo brasileiro, principalmente no tocante as políticas que visam a proteção dos trabalhadores, através da criação da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), dando maior segurança para a classe trabalhadora, pois antes disso sabe-se que mesmo não havendo mais o sistema escravista no Brasil, mas o que restava eram algumas mínimas garantias de emprego digno, pois a jornada de trabalho era exaustiva, violando até mesmo a tão falada hoje “dignidade da pessoa humana”. Com o cumprimento das suas promessas e modelo de desenvolvimento econômico, o governo da época ganhou grande destaque nacional e internacional ficando conhecido como a “Era Vargas”.
	Os historiadores dividem a Era Vargas em três fases: Governo Provisório (1930-34), Governo Constitucional (1934-37) e Estado Novo (1937-1945).
	O governo provisório, como o próprio nome sugere, deveria ter sido uma fase de transição em que Vargas rapidamente organizaria uma Assembleia Constituinte para elaborar uma nova Constituição para o Brasil. Getúlio Vargas, porém, nesse momento, já deu mostras da sua habilidade de se sustentar no poder, pois adiou o quanto foi possível a realização da Constituinte. Nessa fase, Vargas já realizou as primeiras medidas de centralização do poder e, assim, dissolveu o Congresso Nacional, por exemplo. A demora de Vargas em realizar eleições e convocar uma Constituinte teve impactos em alguns locais do país, como São Paulo, que se rebelou contra o governo em 1932 no que ficou conhecido como Revolução Constitucionalista de 1932 (SILVA).
	O movimento foi um fracasso e, após a sua derrota, Getúlio Vargas atendeu as demandas dos paulistas, nomeando para o estado um interventor (governador) civil e nascido em São Paulo, além de garantir a realização de uma eleição em 1933 para compor a Constituinte. Dessa Constituinte, foi promulgada a Constituição de 1934. A nova Constituição foi considerada bastante moderna para a época e trouxe novidades, como o sufrágio universal feminino (confirmando o que já havia sido estipulado pelo Código Eleitoral de 1932). Junto da promulgação da nova Constituição, Vargas foi reeleito indiretamente para ser presidente brasileiro entre 1934 e 1938. Após isso, um novo presidente deveria ser eleito. Nessa fase, a política econômica de Vargas concentrou-se em combater os efeitos da Crise de 1929 no Brasil. Para isso, agiu comprando milhares de sacas de café e incendiando-as como forma de valorizar o principal produto da nossa economia. Nas questões trabalhistas, autorizou a criação do Ministério do Trabalho em 1930 e começou a intervir diretamente na atuação dos sindicatos (SILVA).
Para que isto pudesse ser concretizado no Brasil dos anos 30, dada a ausência de capacidade empresarial habilitada e disposta a pôr em prática um conjunto de mudanças de vulto, o Estado Nacional assumiu a responsabilidade de formar, dentro do sistema existente, não só uma rede de órgãos com o objetivo de acelerar o desenvolvimento econômico brasileiro, mas inclusive tentando transformar-se num Estado empresário, inovador e, em menor intensidade, banqueiro. Isto não significa que o Estado tenha em si substituído o empresário, nem que a classe empresarial tenha sido passiva, mas que sua atuação, ao criar instituições e tomar a si a responsabilidade crescente pelas decisões econômicas, foi fundamental para a mudança de rumo que a economia brasileira conheceu a partir de 1930 (Fonseca, 2003, p.135).
Assim, o governo de Vargas logo percebeu a necessidade de transformação nas ações estatais, entendendo que a ampliação da complexidade das relações econômicas necessitava a presença no Estado de uma função coordenadora, como fica claro na passagem abaixo: 
“Na época em que os fins sociais são preponderantemente econômicos, em que se organiza de maneira científica a produção e o pragmatismo industrial é elevado a limites extremos, assinala-se a função do Estado, antes, e acima de tudo, como elemento coordenador desses múltiplos esforços, devendo sofrer, por isso, modificações decisivas” (Vargas, 1938, v.1, p. 192). 
A partir deste momento, o governo de Vargas passou a investir na modernização da economia brasileira, via revisão das legislações que regiam tanto as relações sociais como as econômicas e, na criação de novos órgãos que tinham por objetivo planejar e concretizar as políticas públicas de planejamento da produção e distribuição. Agindo assim, criavam-se as tão necessárias instituições que “azeitariam” as engrenagenssociais para o desenvolvimento econômico do Brasil, de tal forma que, dado o impulso inicial, o próprio funcionamento destas instituições contribuiria para construção de um processo contínuo de desenvolvimento, separando a figura pessoal de Vargas, bem como de seu governo, do processo nacional desenvolvimentista. Em outras palavras, substitui-se o “comandante” por instituições, evitando-se que a própria perda do líder pudesse ser motivo para estancar todo o processo de desenvolvimento (CARRARO, FONSECA, 2003).
	É claro que, se por um lado as ações do governo na economia assumiam uma forte dose de antiliberalismo, por outro lado, principalmente na década de 1930, este intervencionismo estatal procurava justificar-se perante a sociedade pela busca de eficiência e pela promessa de relações impessoais entre governo e sociedade. Eficiência, porque a criação de novas instituições possibilitaria o planejamento econômico, a adoção de critérios científicos na tomada de decisões e no aperfeiçoamento das técnicas gerenciais, contribuindo para eliminar o uso de soluções políticas, falcatruas, promessas demagógicas das eleições e o coronelismo no meio rural. Impessoalidade, pois se tratava de pensar um Estado integrado, centralizado em órgãos nacionais, com objetivos acima das questões eleitorais e partidárias, sempre que possível livre das influências dos líderes locais e, preocupado com a organização do governo de forma a garantir o cumprimento das metas de desenvolvimento do país. Não resta dúvida de que este processo de mudança só foi possível politicamente com forte autoritarismo (CARRARO, FONSECA, 2003). 
	A preocupação de Vargas em coordenar os diversos setores produtivos da economia brasileira, interligando-os, vai na direção de instaurar e consolidar novo processo de acumulação. Esta ação do governo voltada a organizar e a desenvolver a economia brasileira não esqueceu a questão do crédito bancário. A ação do Estado inovador (em substituição ao empresário inovador) apresenta-se importante não somente por promover a aplicação de novas técnicas de produção ou por promover o aparecimento de novos setores industriais, o que resulta em novas oportunidades de investimento e de ganho, mas também em possibilitar o acesso das iniciativas de investimento privadas ao capital necessário para a concretização da intenção de investir. Já antes de assumir a Presidência da República, Vargas afirmava que o “desenvolvimento econômico deve ter por objetivo tornar a riqueza abundante”, e que se “o dinheiro metálico é a medida dos valores, ele, no conceito corrente dos economistas, pela escassez de seu volume (...) já não satisfaz à exigência do progresso econômico”. Assim, por “imposição da própria necessidade, surgiu um elemento imaterial destinado a atingir os limites da flexibilidade, que é o crédito” (Correio do Povo, 03/12/1927). 
Após 1930, essa consciência sobre o papel do crédito materializou-se com a criação, Estado Inovador Mudança Institucional Ampliação do Mercado Criação de novos Mercados Desenvolvimento Econômico Inovação: a) na produção b) na estrutura do mercado c) no produto d) nas relações entre agentes 14 em 1937, a Carteira de Crédito Agrícola do Banco do Brasil, que concedia empréstimo a juros baixos para aquisição de máquinas e equipamentos. Não se trata ainda de um banco de desenvolvimento, tal qual Hirschman considera, junto com a criação de empresas estatais, como instrumento de ação direta necessário para caracterizar uma política deliberada de desenvolvimento (Apud Suzigan, 2000, p. 41), mas não deixa de ser um embrião de uma nova relação entre o Estado e o empresariado nacional, já que institucionaliza o crédito em uma carteira específica, teoricamente seletiva por critérios técnicos, diferente da forma pessoal com que se concedia crédito até então (Fonseca, 1989, p. 261).
	Na fase constitucional, o governo de Vargas, em teoria, estender-se-ia até 1938, pois o presidente não poderia concorrer à reeleição. No entanto, a política brasileira como um todo – o próprio Vargas, inclusive – caminhava para a radicalização. Assim, surgiram grupos que expressavam essa radicalização do nosso país (SILVA). 
Ação Integralista Brasileiro (AIB): grupo de extrema-direita que surgiu em São Paulo em 1932. Esse grupo possuía inspiração no fascismo italiano, expressando valores nacionalistas e até mesmo antissemitas. Tinha como líder Plínio Salgado. 
Aliança Libertadora Nacional (ANL): grupo de orientação comunista que surgiu como frente de luta antifascista no Brasil e converteu-se em um movimento que buscava tomar o poder do país pela via revolucionária. O grande líder desse grupo era Luís Carlos Prestes. 
A ANL, inclusive, foi a responsável por uma tentativa de tomada do poder aqui no Brasil em 1935. Esse movimento ficou conhecido como Intentona Comunista e foi deflagrado em três cidades (Rio de Janeiro, Natal e Recife), mas foi um fracasso completo (SILVA). 
Após a Intentona Comunista, Getúlio Vargas ampliou as medidas centralizadoras e autoritárias, o que resultou no Estado Novo. Essa fase constitucional da Era Vargas estendeu-se até novembro de 1937, quando Getúlio Vargas realizou um autogolpe, cancelou a eleição de 1938 e instalou um regime ditatorial no país. O golpe do Estado Novo teve como pretexto a divulgação de um documento falso conhecido como Plano Cohen. Esse documento falava sobre uma conspiração comunista que estava em curso no país (SILVA).
No campo político, Vargas governou a partir de decretos-leis, ou seja, as determinações de Vargas não precisavam de aprovação do Legislativo, pois já possuíam força de lei. O Legislativo, por sua vez, foi suprimido e, assim, o Congresso e as Assembleias Estaduais e Câmaras Municipais foram fechadas. Todos os partidos políticos foram fechados e colocados na ilegalidade. A censura instituída ficou a cargo do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), responsável por censurar as opiniões contrárias ao governo e produzir a propaganda que ressaltava o regime e o líder. Para fazer a propaganda do governo, foi criado um jornal diário na rádio chamado “A Hora do Brasil” (SILVA).
Um projeto desenvolvido por Getúlio Vargas durante a ditadura do Estado Novo, a “Marcha para o Oeste” com o objetivo de promover o desenvolvimento populacional e a integração econômica das regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil. O projeto promoveu a criação de pequenos núcleos de colonização, entretanto, teve resultados modestos. Esse período ficou marcado pela repressão das ideias e pela forte propaganda política realizada pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). A marcha para o oeste foi um dos projetos propagandeados pelo DIP (SILVA).
As regiões Norte e Centro-Oeste eram consideradas pouco povoadas e pouco integradas com as regiões litorâneas, sobretudo Sudeste e Sul do Brasil. Assim, a proposta inicial era promover o desenvolvimento populacional e econômico dessas regiões. Outra proposta era a integração dessas áreas a partir do desenvolvimento da malha rodoviária, sobretudo em Goiás, considerado estratégico graças à sua posição centralizada no mapa do Brasil. Com essa finalidade, foram criadas colônias de habitação em Goiás, Amazonas, Mato Grosso, Pará e Maranhão (SILVA).
A proposta varguista defendia a integração econômica dessas áreas a partir, sobretudo, do aumento da produção agrícola. Para que isso acontecesse, a marcha para o oeste defendia o desmonte dos latifúndios existentes e a promoção da reforma agrária para que os colonos desenvolvessem em pequenos lotes de terra uma agricultura familiar. A integração dessas regiões também seria uma tentativa de maior contato com as populações indígenas. O desenvolvimento populacional seria realizado a partir de voluntários (principalmente originários do Nordeste) que se dispusessem a se deslocar para as regiões promovidas pelo projeto. Esse desenvolvimento populacional seria realizado, primordialmente, por brasileiros pobres (SILVA).
Por fim, era importante para o governo que o desenvolvimento da malha rodoviária acontecesse paraque a produção agrária da região tivesse melhor escoamento para as regiões litorâneas. Pela posição geográfica estratégica, o estado de Goiás era visto como fundamental, pois interligava o litoral com o interior do país. A campanha do governo varguista teve sucesso na promoção do desenvolvimento populacional das regiões. Além disso, houve o desenvolvimento da produção e o crescimento da malha rodoviária. O projeto, entretanto, não conseguiu desarticular os latifúndios existentes, e as colônias de habitação desenvolvidas sofreram bastante com a falta de incentivo e apoio, como foi registrado no caso goiano, no qual muitos colonos venderam suas terras pouco tempo depois de estabelecerem-se na colônia que originou a cidade de Ceres (SILVA).
Durante esse período, também se destacou a política trabalhista, destacando-se a criação do salário-mínimo (1940) e Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em 1943. Os sindicatos passaram para o controle do Estado. A participação brasileira na Segunda Guerra e o desgaste desse projeto político autoritário enfraqueceram o Estado Novo perante a sociedade. Assim demandas por novas eleições começaram a acontecer. Pressionado, Vargas decretou para o fim de 1945 a realização de eleição presidencial e, em outubro desse mesmo ano, foi deposto do poder pelos militares (SILVA).
No início de 1945, como forma de contornar a oposição que sofria, Getúlio Vargas decretou o Ato Adicional, responsável por agendar a realização de eleições presidenciais para o fim de 1945 e por criar as condições para a organização de partidos políticos no Brasil. Vale lembrar que eleições livres e diretas para presidente não aconteciam desde 1930 e os partidos políticos haviam sido fechados em 1937. A partir do Ato Adicional, passaram então a organizar-se os partidos que estiveram no centro da disputa política do Brasil durante o período da Quarta República (SILVA).
O Estado Novo se encerrou por causa de um golpe promovido pelos militares em outubro de 1945. A perda de sustentação de Vargas no poder fez com que o ministro da Guerra, Góis Monteiro, desse um ultimato a Vargas exigindo sua renúncia. Ele aceitou renunciar e foi deposto em 29 de outubro de 1945. José Linhares, presidente do STF, assumiu a presidência interinamente (SILVA).
A eleição de 1945 foi realizada conforme havia sido convocada por Getúlio Vargas. A deposição de Vargas fez com que ele se retirasse da disputa, mesmo com um apoio significativo da população, por meio do queremismo (movimento político que surgiu espontaneamente em meados de 1945 por meio do qual as classes de trabalhadores manifestaram apoio a Vargas) (SILVA).
A disputa teve fim com a vitória de Eurico Gaspar Dutra, militar apoiado por Getúlio Vargas. Dutra (PSD/PTB) obteve 55,39% dos votos, enquanto Eduardo Gomes (UDN) obteve 34,74%. Ledo Fiúza obteve (PCB) 9,71%, e Mário Rolim (PAN) obteve apenas 0,17%. Com esse resultado, Eurico Gaspar Dutra tornou-se o primeiro presidente do Brasil no período da República de 1946 (SILVA).
O GOVERNO DUTRA
Primeiramente, durante o governo de Eurico Gaspar Dutra, organizou-se a redação de uma nova Constituição para o Brasil. A nova Constituição brasileira foi promulgada no dia 18 de setembro de 1946 e restabeleceu uma série de direitos democráticos e políticos aos cidadãos que estavam suspensos há anos.
Os trabalhos da Constituinte iniciaram logo nos primeiros dias do governo de Dutra e se estenderam por meses. A nova Constituição tinha um caráter muito mais democrático, embora houvesse certas limitações aos direitos e liberdades, e foi inspirada no modelo político proposto pelos liberais. O Brasil se estabeleceu como uma república presidencialista, com os presidentes sendo eleitos para um mandato de cinco anos sem direito a reeleição. Os brasileiros também tinham que votar para escolher o vice-presidente do país. No entanto, o direito ao voto ficou limitado aos maiores de 18 anos alfabetizados, excluindo, assim, uma vasta parcela de nossa sociedade na época: os analfabetos (SILVA).
O governo de Dutra ficou marcado por assumir uma postura de aliado incondicional dos Estados Unidos no contexto da Guerra Fria. Nesse sentido, uma forte repressão contra os partidos e movimentos sociais de esquerda se estabeleceu. Havia um grande temor sobre o crescimento do comunismo no Brasil, pois o PCB (Partido Comunista do Brasil) havia conseguido cerca de 9% dos votos na candidatura de Ledo Fiúza e, além disso, a presença dos comunistas entre organizações de trabalhadores era muito forte. Assim, o governo de Dutra alinhou-se com os interesses dos EUA e adotou uma política contrária ao comunismo (SILVA).
O resultado disso foi o rompimento das relações diplomáticas do Brasil com a União Soviética e o fechamento do PCB após o funcionamento do partido ter sido proibido por determinação do STF (Superior Tribunal Federal) em 1947. Pouco tempo depois, em janeiro de 1948, a candidatura dos políticos eleitos pelo PCB foi cassada (SILVA).
Nos primeiros dois anos de seu governo, Dutra adotou uma política econômica liberal que se colocou contrária às intervenções estatais na economia e, portanto, permitiu que o mercado tivesse uma grande liberdade, principalmente na importação de bens de consumo. Isso resultou em uma alta na importação de mercadorias, escorada pela valorização da moeda nacional. Essa política fez com que as importações aumentassem de volume exponencialmente, o que resultou no esgotamento das reservas cambiais do Brasil, e nenhum resultado positivo foi alcançado pela economia. Isso forçou o governo brasileiro a adotar uma nova postura e intervir de forma mais incisiva na economia, sobretudo no campo das importações (SILVA). 
Baer (1966) considera que o esforço industrializante ocorrido ao fim da guerra foi resultado da decisão política de utilizar o progresso industrial para transformar a estrutura econômica brasileira. Dessa forma, “[...] os responsáveis pelo país [...] se tornaram conscientes de que, no futuro, o Brasil não poderia alcançar elevado ritmo de crescimento se continuasse a se apoiar basicamente na exportação de seus principais produtos primários [...]” (BAER, 1966, p. 35). Além disso, a redução nas importações de bens de consumo manufaturados foi uma medida orientada aos moldes do PSI, em um momento de redução na importância relativa do comércio externo para o país.
Os recursos da nossa exportação são insuficientes. Ou procuramos outras fontes de exportação, ou havemos de substituir os nossos acréscimos de compra com produção nacional, evitando, desse modo, o aumento crescente da importação. Não é possível escolher, com exclusividade um ou outro caminho. Não há dúvida, porém, sobre a conveniência e urgência de dotar o país de meios para incrementar a produção de energia e da exploração do petróleo, cuidando simultaneamente da saúde e da alimentação do homem brasileiro. Saúde, alimentação, transporte, energia e petróleo – são as balizas que devem orientar o nosso esforço de recuperação (BRASIL, 1978, p. 69).
	Os indicadores mais importantes e que dão margem à controvérsia sobre a política econômica do governo Dutra, como crescimento do PIB, inflação e balanço de pagamentos, estão sintetizados na Tabela 1.
Tabela 1 - Brasil: taxa de crescimento de indicadores macroeconômicos (1946-1951)
Fonte: Abreu (1990, p. 388-415).
	Como é possível observar, as taxas de crescimento do PIB e da produção industrial do período foram, em média, bastante altas, não sugerindo, na análise de dados ex post, um refluxo do crescimento ou recessão. Cabe indagar se elas resultam simplesmente do ciclo econômico, de uma conjuntura favorável, ou se havia um projeto ou intenção deliberada do governo visando sua consecução. Só nesse último caso se pode associá-la a desenvolvimentismo, ou seja, resultante, pelo menos em parte, de um projeto intervencionista consciente, com evidências empíricas de medidas deliberadas em favor da industrialização (FONSECA, 2014, p. 56).
A primeira mensagem presidencial de Dutra foi publicada em 15 de março de 1947. Ao longodo texto, ao tratar sobre a indústria nacional, o presidente faz ressalvas sobre o setor de transportes, cujos custos estariam muito altos devido ao aparelhamento defasado e pouco eficiente. Dutra salienta os problemas herdados da guerra e que prejudicavam a importação de bens essenciais como: combustíveis, alimentos, equipamento industrial e de transportes. Além disso, o presidente apontava a inflação como um dos principais problemas econômicos (AYRES, FONSECA, 2017).
O segundo ano de mandato (1947) é avaliado na mensagem presidencial de 15 de março de 1948 em documento que apresenta as realizações do governo na economia nacional com superávit orçamentário de 460 milhões de cruzeiros, além da redução da emissão monetária. 
A sequência do texto remete à necessidade do crescimento da industrialização brasileira. Nota-se o embrião do Plano Salte, quando da escolha do governo de priorizar saúde, alimentação, transporte e energia – além do petróleo –, considerados fundamentais para ancorar o desenvolvimento econômico e social do Brasil. Esse era um plano quinquenal com investimento total estimado em Cr$ 19,9 bilhões, sendo Cr$ 11,4 bilhões para os transportes, Cr$ 3,2 bilhões para a energia, Cr$ 2,7 bilhões para a produção alimentícia e Cr$ 2,6 bilhões para a saúde (BAER, 1966, p. 63). Os recursos da nossa exportação são insuficientes. Ou procuramos outras fontes de exportação, ou havemos de substituir os nossos acréscimos de compra com produção nacional, evitando, desse modo, o aumento crescente da importação. Não é possível escolher, com exclusividade um ou outro caminho. Não há dúvida, porém, sobre a conveniência e urgência de dotar o país de meios para incrementar a produção de energia e da exploração do petróleo, cuidando simultaneamente da saúde e da alimentação do homem brasileiro. Saúde, alimentação, transporte, energia e petróleo – são as balizas que devem orientar o nosso esforço de recuperação (BRASIL, 1978, p. 69).
Na área da saúde, o Plano Salte pretendia, abrangendo a Campanha Nacional de Saúde, elevar o nível sanitário da população, sobretudo a rural. Na área dos transportes, o plano delineava um programa baseado nos planos ferroviários e rodoviários já existentes, e contemplava ainda o reaparelhamento dos portos, a melhoria das condições de navegabilidade dos rios, o aparelhamento da frota marítima e a construção de oleodutos.
A parte dedicada à energia era a mais densa e abundante do Plano Salte. A maioria das iniciativas relacionadas com a exploração da energia elétrica seria financiada pelo capital privado, inclusive estrangeiro, reservando-se o governo uma posição reflexa de amparo e de estímulo às empresas concessionárias. Foram adotadas as conclusões e recomendações gerais do Plano Nacional de Eletrificação, elaborado por uma comissão especial instituída em 1944. 
Quanto ao petróleo, era prevista uma pesquisa intensiva em extensa área, a aquisição de material necessário à perfuração de poços, a aquisição e montagem de refinarias para a produção diária de 45.000 barris, além da ampliação da capacidade da refinaria de Mataripe, e a aquisição de 15 petroleiros de 15.000 toneladas cada um, que viriam a constituir a Frota Nacional de Petroleiros (Fronape). Dutra enviou o Plano Salte ao Congresso sem levar em conta o trabalho contido no problemático Estatuto do Petróleo. A prática do governo, como já se viu, trilhou os caminhos da iniciativa estatal, com a construção de refinarias e a aquisição de petroleiros.
O abandono do plano, a partir de 1951, tornou letra morta todas as disposições.
O fim da era Vargas
	Vargas concorreu à presidência na eleição de 1950. A estratégia de Vargas foi perfeita e deu-lhe grande vantagem sobre seus adversários. Primeiramente, Vargas procurou apoio de pessoas importantes e que lhe garantiriam uma grande quantidade de votos, como demonstrou sua aliança com Ademar de Barros, político populista muito forte em São Paulo. Além disso, Vargas procurou realizar alianças com membros do PSD e, até mesmo, aliou-se com membros da União Democrática Nacional (UDN), partido abertamente antivarguista. Candidatou-se pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e enfrentou Cristiano Machado (PSD) e Eduardo Gomes (UDN) (SILVA).
Durante a campanha eleitoral, como candidato, Vargas defendera exaustivamente a necessidade de crescimento acelerado. Este adviria tanto de investimentos privados, voltados à modernização do setor primário e ao aprofundamento da industrialização – a qual deveria avançar dos bens de consumo para os bens de capital –, quanto de investimentos públicos em infraestrutura, como transportes, comunicações e energia. Mesmo nos estados menos industrializados (cujos eleitores e dirigentes, em princípio, seriam menos sensíveis às “causas da indústria”) defendeu este projeto, em síntese o que mais tarde os analistas denominariam de Nacional-Desenvolvimentismo. As dificuldades da conjuntura, entretanto, limitavam sua execução e impunham cautela. A rigor, deparava-se com o clássico dilema entre estabilização versus crescimento: crescer envolvia mais importações de insumos e de bens de capital, além de mais gastos públicos e consumo doméstico, os quais aguçariam os problemas do balanço de pagamentos e da inflação. Que caminho seguir não dependia apenas de vontade política: caso a opção fosse pelo crescimento, teria provavelmente voo curto: a inflação corroía as finanças estatais, os investimentos privados e os salários – variáveis indispensáveis para um crescimento sustentado –, ao mesmo tempo em que a substituição de importações para novos segmentos exigia a curto prazo importação de outros bens, o que tornava cada vez mais difícil a substituição e repunha, contraditoriamente, o estrangulamento externo (FONSECA, 2009). Vargas também soube moldar seu discurso para cada local do país em que passava e dizia aquilo que as pessoas queriam ouvir. 
O resultado da ótima estratégia de campanha não poderia ter sido outro: Vargas venceu por uma larga vantagem os seus adversários e obteve 48,7% dos votos. Com isso, garantiu (dessa vez de maneira democrática) o seu retorno à presidência.
Ao tomar posse como Presidente da República, em janeiro de 1951, Vargas deparou-se com uma conjuntura econômica que emitia sinais de agravamento de um quadro de dificuldades. Os indicadores não eram alarmantes, mas já passara o clima de euforia dos últimos anos da II Guerra e do início do Governo Dutra. Este, possivelmente interpretando que o estrangulamento externo verificado na década de 1930 era coisa do passado, optou por uma política de liberalização no mercado cambial, a qual em poucos meses trouxe de volta o problema crônico deparado pelas autoridades econômicas desde a Grande Depressão: o fechamento das contas do balanço de pagamentos (FONSECA, 2009).
Na metade do ano de 1947, a política econômica inverteu o sinal e começou a intervenção no mercado cambial através da Instrução nº 25 da Superintendência da Moeda e do Crédito – SUMOC, com a determinação da obrigatoriedade de as instituições que operavam com moedas arbitráveis venderem 30% das divisas ao Banco do Brasil segundo a taxa oficial. Mas, mais importante, começou no Governo Dutra uma administração política dos problemas cambiais que vigoraria até o governo Jânio Quadros, no início dos anos 60: em substituição aos mecanismos “normais” de mercado, passaram a se estabelecer, através de diferentes instrumentos, prioridades a determinadas importações, ao privilegiarem-se produtos classificados como “essenciais”. Embora tradicionalmente a memória histórica tenha registrado como marca do Governo Dutra o liberalismo daqueles primeiros meses – o qual, associado à declaração de ilegalidade do Partido Comunista Brasileiro (PCB), em 1948, e sua simpatia pessoal pelo nazifascismo no início da II Guerra, consagrou sua imagem de conservadorismo –, esta discricionariedade mostra alinhamento com a defesa do Processo de Substituição de Importações (PSI) e opção pela continuidade do projeto de desenvolvimento acelerado, assentado na industrialização,que vinha sendo implementado desde a década de 1930. Por essenciais, entendiam-se via de regra os bens de capital e intermediários, como insumos básicos necessários à produção industrial e à modernização agrícola. Em decorrência, impunham-se barreiras à importação de bens de consumo já produzidos internamente ou cuja oferta doméstica se pretendia estimular, bem como a bens considerados supérfluos (FONSECA, 2009).
Em parte, as dificuldades econômicas decorriam do acordo de Bretton Woods (1944), o qual estabelecera a adoção de taxas fixas de câmbio em relação ao dólar, ora definido como moeda por excelência para as transações internacionais. O Brasil acumulara na guerra parte de suas divisas em moedas agora não mais conversíveis – de forma que a leitura do balanço de pagamentos em parte camuflava a extensão da gravidade da escassez de dólares. A adoção da taxa fixa de Cr$ 18,50 por dólar, em cotação próxima ao período anterior à guerra, significava uma valorização real do cruzeiro, a qual gradualmente se tornava mais problemática com o crescimento da inflação. Até quando se poderia manter a taxa fixa era o grande dilema, pois o dólar barato desestimulava o setor exportador e as importações tendiam a crescer. As interpretações sobre o período assinalam, acertadamente, que se tratava, do ponto de vista distributivo, da utilização do mecanismo cambial para proporcionar transferência de renda do setor exportador para a indústria e para quem dependia de insumos importados (como adubos para a agricultura, por exemplo). A oposição, liderada pela União Democrática Nacional (UDN), levantava uma bandeira liberal ao denunciar o intervencionismo e o PSI: rejeitava ferrenhamente essa opção do governo, assumindo a defesa do setor exportador e do “consumidor nacional”, o qual pagava mais caro por bens que poderia importar, sem contar a melhor qualidade dos similares estrangeiros. A despeito disso, em fevereiro de 1948 o Governo Dutra tomou sua medida mais arrojada: o denominado “contingenciamento de importações”: mantinha a taxa cambial fixa e administrava a escassez de dólares condicionando as operações de importação à obtenção de “licenças prévias”, as quais eram concedidas pelo critério de essencialidade (FONSECA, 2009).
Vargas assume nesse quadro, com a valorização real do cruzeiro e de escassez de moedas conversíveis, além de crescimento da inflação, a qual, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor do Rio de Janeiro, praticamente triplicara em dois anos: de 3,4% em 1948 para 9,4% em 1950. Esta aceleração dos preços não era desprezível, a contar que, além das políticas de austeridade já adotadas, mais duas medidas do Governo Dutra serviam como âncora anti-inflacionária: a fixação da taxa cambial do cruzeiro com o dólar e o congelamento do salário-mínimo durante todo o seu mandato, mantendo-o no mesmo nível de 1943. Soma-se a essas, ao final do seu mandato, certo afrouxamento na concessão de licenças (talvez com o propósito de ajudar no controle da inflação), mas com o agravante de repercutir negativamente no balanço de pagamentos, ainda mais abalado na conjuntura com a retração do comércio mundial devido à Guerra da Coréia e a uma crise internacional na indústria têxtil de algodão, segundo item da pauta de exportações, depois do café (FONSECA, 2009).
A saída encontrada foi diminuir o ritmo do crescimento a curto prazo, a permitir a leitura segundo a qual, na percepção da equipe econômica, liderada pelo Ministro da Fazenda Horácio Lafer, tratava-se de problema conjuntural. Contava em favor de certo otimismo a recuperação, desde meados de 1949, dos preços internacionais do café, e havia sinais positivos por parte do presidente norte-americano Truman com relação ao Brasil – lembrem-se o papel destacado de Osvaldo Aranha na ONU, o contexto de Guerra Fria e a emergência da Guerra da Coréia, para a qual se esperava o envio de tropas brasileiras e o mesmo alinhamento seguido com os EUA na II Guerra. Em julho de 1951 foi instalada a Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, a qual deveria elaborar um diagnóstico da economia brasileira e propor um conjunto de projetos de desenvolvimento, a ser financiado pelo BIRD e pelo EXIMBANK, com a expectativa do governo brasileiro de receber até US$ 300 milhões. A solução ao dilema – não apenas no plano retórico, mas materializado em medidas –, veio com a adoção por Lafer da “fórmula” Campos Salles-Rodrigues Alves, pela qual primeiro dever-se-ia passar por uma etapa de saneamento, com prioridade ao equilíbrio orçamentário e ao combate à inflação, mesmo em prejuízo ao crescimento econômico (o que lembrava a política ortodoxa de Campos Salles), para, após conseguida a estabilidade, ingressar-se numa fase de crescimento (Rodrigues Alves). Sua defesa buscava um delicado equilíbrio entre o ideário pró-estabilização e as promessas desenvolvimentistas da campanha presidencial, não abandonadas por Vargas após a posse, e que também contava com apoio de parte significativa da equipe, como de Ricardo Jafet, Presidente do Banco do Brasil, e da Assessoria Econômica de Vargas. Esta subordinava-se diretamente à Presidência da República e voltava-se a pensar e propor medidas de largo prazo (FONSECA, 2009).
Em setembro de 1951, o ministro da Fazenda, Horácio Lafer (PLANO NACIONAL DE REAPARELHAMENTO ECONÔMICO), apresentou um plano de desenvolvimento a ser implementado com a cooperação financeira dos Estados Unidos. O plano exigia que parte dos recursos — ao menos quinhentos milhões de dólares — fosse subscrita pelo Brasil, enquanto a outra metade seria obtida através de empréstimos junto ao BIRD e ao Eximbank. O plano continha projetos relativos à criação de novas fontes de energia elétrica, à criação e à ampliação das indústrias de base e à introdução de novas técnicas na agricultura. Previa também a modernização da rede de transportes ferroviários e rodoviários, a construção de armazéns e frigoríficos, a criação e a ampliação dos serviços portuários. O novo plano ressaltava enfim os itens do Plano Salte que tinham maior possibilidade de êxito rápido e eram mais importantes para o desenvolvimento do país (ABREU).
Por outro lado, no Brasil, para financiar e garantir os empréstimos estrangeiros obtidos para os projetos do Plano Lafer, foi criado o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE). A implementação do Plano Lafer encontrou assim sérios obstáculos durante o governo Vargas. Todavia, muitos de seus projetos foram retomados durante o governo Kubitschek, que os integrou no Plano de Metas (ABREU).
Assim, por estranho que possa parecer para quem ingenuamente quer ver na política um exercício de lógica aristotélica, no primeiro ano de governo registra-se claramente a coexistência de um discurso desenvolvimentista com outro cujo epicentro era a estabilização. A Mensagem Presidencial enviada ao Congresso Nacional na abertura do ano legislativo de 1951 a ilustra com menções, em várias passagens, ao projeto maior de desenvolvimento econômico com justiça social; todavia acrescenta que, de fato, por ora se tinha “pouco a dividir” e dever-se-ia impedir que “uma distribuição insensata venha prejudicar o potencial de capitalização necessário ao desenvolvimento econômico geral e, assim, à criação de maiores e mais amplas oportunidades de emprego e salários”. Surpreende esta manifestação com reconhecimento a uma relação inversa entre taxa de crescimento dos salários e nível de emprego, já que tese oposta – defensora do salário como demanda, a qual propunha não apenas a compatibilidade, mas o impacto positivo de seu crescimento nos níveis de produção e emprego – era dominante no ideário trabalhista e utilizada pelo próprio Vargas, desde o Estado Novo, como um dos argumentos em defesa da legislação social. Consta da mesma Mensagem crítica áspera ao governo anterior, responsabilizando-o pela emissão de moeda irresponsável e pelo déficit público, cuja solução, então enfaticamente defendida, passava por “medidas rigorosas de compressão de despesas” e aumento de arrecadação. Vários outros pronunciamentos presidenciaisde 1951 seguem a mesma linha. E esta postura não se restringiu ao plano das ideias e do convencimento retórico, pois se materializou em políticas que resultaram na queda de 3% do investimento público em 1951, com relação ao ano anterior, e na retração expressiva da participação governamental na formação bruta de capital fixo, de 28,4% para 20,3% do PIB no mesmo período. A meta de superávit orçamentário foi viabilizada com crescimento real da receita da União entre 1950 e 1951, de Cr$ 19,37 para Cr$ 23,17 bilhões, enquanto as despesas caíam de Cr$ 23,67 para Cr$ 20,78 bilhões, em valores de 1950. Como consequência, houve desaceleração no ritmo de crescimento do PIB em 1951 com relação a 1950, com taxa de 4,9%, a qual contrasta com os 9,7% e 7,7% do biênio 1948-49 e, principalmente, com a queda do crescimento do produto industrial para 5,3%, quando atingira 11- 12% nos últimos anos do Governo Dutra (FONSECA, 2009).
Essa evolução da receita (que ultrapassou em 12% o arrecadado de 1951) deveu-se, além da permanência de alto nível de importações, ao aumento das alíquotas dos impostos de renda, selo e transferência de fundos para o exterior. Todos os principais tributos carrearam para o tesouro nacional recursos superiores as estimativas orçamentarias, nas seguintes proporções: imposto de renda, +24%; de consumo, +14%; do selo, +26%; e de importação, +44%. Em relação as arrecadações de 1951, esses tributos evoluíram da seguinte forma: renda, +23%; consumo, +11%; selo, +12%; e importação, -7,6% (VIANNA, 1987).	
A evolução político-econômica do governo Vargas tem um corte significativo com a reforma cambial de 1953. Seu primeiro movimento 1951/52 é presidido pelo Plano Lafer que combina a proposta do programa de infraestrutura mediante um plano quinquenal que previa investimentos na ordem de US$ 1 bilhão, englobando o apoio oficial americano suposto na época na ordem de 500 milhões de dólares. Este programa seria executado ao compasso de um esquema de estabilização que previa o equilíbrio fiscal e a contenção creditícia. A aceleração inflacionária 48-50 era qualificada como disfuncional para o crescimento da economia e explicitamente imputada aos grandes déficits fiscais do final da administração Dutra (LESSA, FIORI, 1991).
É nesse quadro econômico difícil que Vargas começa a se preparar para enfrentar as eleições parlamentares e para os governos estaduais, assim como para a sua própria sucessão. Apenas tendo em mente que esse objetivo político se sobrepunha a todos os outros é que podemos compreender a sucessão de eventos ocorridos entre janeiro e agosto de 1954. 
A crise política concentrou-se em um assunto central do debate político brasileiro na época – o caminho para o desenvolvimento econômico do Brasil. Existiam duas tendências abertamente opostas para o crescimento do país: uma tinha uma postura mais nacionalista, e a outra, uma postura mais liberal. Os nacionalistas defendiam que o desenvolvimento do país deveria passar pela atuação de empresas estatais que explorassem recursos e áreas fundamentais da economia. Além disso, a influência do capital estrangeiro deveria ser limitada por meio da intervenção do Estado na economia. A proposta liberal defendia que o desenvolvimento brasileiro deveria ser realizado com a utilização de capital estrangeiro, e a intervenção do Estado na economia deveria ser limitada ao máximo (SILVA).
Getúlio Vargas tendia para a proposta desenvolvimentista-nacionalista, e a ação do governo que mais repercutiu foi a proposta de criação de uma estatal para explorar o petróleo e de outra para a produção de energia elétrica – a Petrobras e a Eletrobras, respectivamente. A Petrobras acabou sendo fundada em um clima de mobilização nacional muito grande, enquanto o projeto da Eletrobras não avançou. O fato de Vargas estar na presidência e seu histórico de uma política próxima dos trabalhadores já desagradavam à elite do país. Essa insatisfação só aumentou com as medidas do presidente na economia. A intervenção estatal e a ação do governo para retirar investimentos estrangeiros em áreas importantes prejudicaram os interesses de grupos poderosos, que se voltaram contra o governo (SILVA).
Vargas procurou contornar essa situação ao tentar aproximar-se dos grandes partidos do Brasil. Ele era vinculado ao PTB, tinha muito apoio no PSD e tentou garantir o apoio da UDN (é importante ressaltar o papel da UDN de tornar a situação insustentável para que Vargas pudesse governar. Um dos grandes nomes da oposição udenista foi o jornalista Carlos Lacerda, que defendia a ideia de “recorrer à revolução para impedir Vargas de governar”), do PTB e PSD, e a situação saiu do controle de Vargas. Quem se aproveitou dessa situação foi a própria UDN, que conseguiu se fortalecer e travou o governo (SILVA).
O Ministro do Trabalho João Goulart, nomeado em julho de 1953, sob intensas suspeitas da elite econômica e da própria classe média, propôs em fevereiro de 1954 um aumento de 100% do salário-mínimo, o que eliminaria qualquer chance de o Plano Aranha funcionar, A proposta de Jango era uma forma de compensar o desgaste na renda do trabalhador causado pela inflação. O despropósito dessa medida era tão evidente que Vargas foi obrigado, por pressão da imprensa e principalmente do Exército, a demitir seu ministro no mesmo dia em que este divulgou a proposta. Ao mesmo tempo deu a entender que o aumento do salário-mínimo atingiria no máximo 42% e acentuou o seu discurso nacionalista, o que contribuiu para acalmar os militares e a opinião pública de classe média (BUENO,2005).
Além do Exército e da UDN, a imprensa brasileira também atuou abertamente para desestabilizar o governo de Getúlio Vargas. Jornais como O Estado de São Paulo, O Globo e Tribuna da Imprensa teciam críticas constantemente. Tudo se agravou com a descoberta de empréstimos concedidos a um jornal situacionista (que apoiava o governo) chamado “Última Hora”, o que levou à abertura de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). A imprensa explorou amplamente o assunto como demonstração da corrupção do governo Apesar da forte crise política, a oposição não tinha força suficiente para derrubar Vargas. Carlos Lacerda usava o seu jornal (Tribuna da Imprensa) para denunciar diariamente os atos de corrupção do governo, sendo as denúncias verdadeiras ou não. Uma tentativa de impeachment foi realizada e fracassou. (SILVA).
O fracasso da tentativa da UDN de afastar o presidente, em razão de uma suposta conspiração com o peronismo para implantar uma ditadura no Brasil, foi um sinal claro de que a situação política ainda estava sob controle em abril de 1954. Mas então, inesperadamente, contrariando a opinião de todos os seus assessores econômicos, Vargas decretou o aumento de salário-mínimo de 100% que o havia levado a demitir seu Ministro do Trabalho (BUENO, 2005).
Vargas seguiu com o aumento do salário-mínimo pois dois setores da população que tinham sido importantes para a eleição de Vargas em 1950 (principalmente em São Paulo) foram profundamente afetados pelo programa de estabilização: os industriais, que tiveram que arcar com uma redução de sua margem de lucros, além da redução da despesa pública em obras de infraestrutura, e a população urbana, em geral mais afetada pela elevação dos índices de custo de vida, A situação no Rio de Janeiro, por exemplo, pode ser um bom indicativo desse quadro, pois o custo de vida havia aumentado 11% em 1950, 11% em 1951 e 21% em 1952. Isso tudo ainda ecoava no fato de que o trabalhador não tinha um reajuste salarial desde 1943, o que representava a perda do seu poder de compra. Um terceiro setor importante também foi afetado, mas por fatores exógenos (BUENO, 2005).
Um aumento salarial havia sido determinado no final de 1951, mas não foi suficiente para aplacar a insatisfação da população. Como os sindicatos nesse governo foram reorganizados, a mobilização dos trabalhadores foi certa e, assim, manifestações exigindo melhorias salariais começaram a acontecer no país. A tensão social encontrou seu auge em 1953, e dois grandesmomentos foram a Marcha das Panelas Vazias e a Greve dos 300 mil, ambas em março de 1953. O tamanho das mobilizações deixou uma mensagem clara para Vargas: ele estava perdendo o apoio dos trabalhadores operários. Para impedir que isso acontecesse, Vargas ousou e nomeou João Goulart (figura que tinha boa relação com os sindicatos) para o Ministério do Trabalho (SILVA).	
A situação crítica em que a economia brasileira se encontrava foi resultado de uma junção de acontecimentos. O preço elevado do café encheu o país de divisas (dólar) e deixou a nossa balança comercial positiva, mas o temor de que a Guerra da Coreia se estendesse por muitos anos fez com que o governo gastasse muito mais do que deveria com a importação de bens para a industrialização, deixando a balança comercial negativa (SILVA).
	Vargas estava acuado, mas se sustentava de alguma forma. No entanto, o dia 5 de agosto de 1954 trouxe o elemento que a oposição precisava: o Atentado da Rua Tonelero. Nesse dia, foi realizado um ato contra a vida de Carlos Lacerda, maior opositor de Vargas. Lacerda sobreviveu, contudo, seu guarda-costas, o major da Aeronáutica Rubens Vaz, morreu. A morte do major da Aeronáutica enfureceu as forças armadas brasileiras, que atropelaram o processo da Justiça e a Constituição e abriram um inquérito por conta própria para investigar a morte de Rubens Vaz. Carlos Lacerda engrossou o coro acusando Vargas como mandante do crime. As investigações realizadas chegaram ao nome do mandante do crime: Gregório Fortunato, chefe de segurança do palácio presidencial (SILVA).
	A partir daí, novas investigações foram feitas e descobriram atos de corrupção praticados por membros do governo, que começara com a instalação da chamada “CPI da Última Hora”, destinada a apurar desvios de recursos do governo para o jornal de Samuel Wainer. Apesar disso, as investigações nunca conseguiram incriminar diretamente o presidente. De qualquer forma, o exército deu um ultimato e passou a exigir a renúncia do presidente.
Em 23 de agosto, o vice-presidente Café Filho rompeu abertamente com Vargas e reforçou o isolamento do presidente. Os militares e a UDN exigiam a renúncia imediata de Vargas, e os militares o fizeram em um documento conhecido como “Manifesto à Nação”, no dia 24 de agosto de 1954. Por fim, Vargas recebeu um ultimato dos militares.
No mesmo dia, em seu quarto localizado no Palácio do Catete, Vargas cometeu suicídio atirando contra o próprio coração. Uma carta-testamento foi redigida pelo presidente, defendendo os feitos de seu governo. A reação da população foi de comoção e milhares de pessoas acompanharam o funeral de Vargas. Deixou uma carta-testamento acusando seus opositores e colocando-se como mártir da nação. A comoção popular foi imediata, e os relatos contam que as pessoas saíram às ruas para chorar a morte de Vargas. Inconformada, a população passou a atacar os opositores de Vargas, jornais, sedes da UDN etc. Carlos Lacerda precisou fugir às pressas do país. A sucessão presidencial foi realizada pelo vice, Café Filho, e a UDN saiu enfraquecida.
O GOVERNO DE CAFÉ FILHO
	Após a morte do presidente Vargas, assumiu a presidência da República o vice-presidente João Café Filho, líder do PSP, que fora eleito graças ao acordo firmado entre Ademar de Barros e Getúlio Vargas. Em seu ministério havia elementos ligados à UDN.
	Procurando diminuir o impacto produzido pela divulgação da Carta-Testamento de Vargas, Café Filho emitiu logo sua primeira nota oficial, afirmando seu compromisso com a proteção dos humildes, “preocupação máxima do presidente Getúlio Vargas”. Ao mesmo tempo, compôs o primeiro e o segundo escalões de seu governo com preponderância de políticos e militares identificados com as posições da UDN, na medida em que havia sido desobrigado por Ademar de Barros de qualquer compromisso com o PSP, cuja bancada no Congresso não tinha força suficiente para sustentar o novo presidente (KELLER).
	O primeiro teste (no sentido de manter a legalidade) que Café Filho enfrentou foi as eleições para o Congresso realizadas a 03 de outubro de 1954. Os resultados revelaram sensível crescimento do PSD e ligeiro enfraquecimento do PTB e da UDN. “O resultado indicava que quem quer que fosse eleito presidente em 1955 enfrentaria um congresso com a mesma perplexidade política substancial daquele que Vargas havia enfrentado.” (Thomas Skidmore)
	Com dificuldade de formar uma base parlamentar para seu governo, Café Filho dirigiu-se aos presidentes da Câmara dos Deputados, Carlos Luz, e do Senado, Nereu Ramos, buscando apoio ao governo. Café Filho declarou nesses contatos que pretendia estabilizar a economia do país, que sofria com a alta da inflação, e governar até a efetivação do próximo pleito eleitoral (RODRIGUES).
	Em 31 de agosto, reafirmou que não representava nenhum partido e caracterizou seu governo como de transição, voltado para a estabilização da economia e a realização de eleições dentro dos prazos legais. Baseado nessa caracterização, resistiu às pressões da UDN para realizar uma devassa em busca de irregularidades na administração anterior (KELLER).
	Os grandes problemas econômicos da época (a inflação e o déficit da balança comercial) foram combatidos através da limitação do crédito, a redução das despesas públicas, a criação de uma taxa única de energia elétrica e a retenção automática do imposto de renda sobre os salários. Além disso, para buscar apoio junto aos parlamentares na aprovação de tais medidas, Café Filho declarou que seu governo tinha caráter provisório e não tinha maiores pretensões políticas.
	Além de seus propósitos de realizar eleições para a presidência, Café Filho tomou medidas de estabilização econômica. Eugênio Gudin, ministro da Fazenda, procurou diminuir os déficits governamentais e combater o processo inflacionário. Inicialmente, Gudin restringiu as reservas monetárias e estabeleceu que metade de todos os novos depósitos dos bancos comerciais deveriam ser recolhidos na SUMOC (Superintendência da Moeda e do Crédito), órgão monetário do governo, dirigido por Otávio Gouveia de Bulhões. Vários bancos, principalmente em São Paulo, foram à falência, estabelecendo-se então um início de pânico. A política econômica governamental, além de seus efeitos drásticos na área bancária, provocou séria crise nas indústrias paulistas. O governador de São Paulo, Jânio Quadros, foi obrigado a negociar com o Presidente da República uma alteração nas medidas econômicas, visando a aliviar a política de restrição de créditos sustentada por Gudin. Este, em sinal de protesto, temeroso de que seu programa anti-inflacionário tivesse “caído em desgraça”, demitiu-se. Foi substituído pelo banqueiro paulista José Maria Whitaker, que procurou abrandar a campanha anti-inflacionária de seu antecessor.
	Café Filho conseguiu relativo sucesso no campo da estabilização de preços. O aumento do custo de vida no Rio de Janeiro, que fora de 26% em 1954, caiu para 19% em 1955. Além disso, o Brasil, por meio de cortes radicais nas importações, conseguiu equilibrar sua balança de pagamentos e liquidar mais de 230 milhões de dólares de dívidas. Entretanto, o governo não tinha condições, pelo seu próprio caráter interino, de manter, por muito tempo, sua política financeira de grandes restrições.
	Para a sucessão procurou-se, inicialmente, um candidato de “união nacional”, inutilmente. Movimentaram-se as áreas políticas getulistas e antigetulistas. O primeiro partido a escolher candidato foi o PSD: o médico Juscelino Kubitschek de Oliveira, governador de Minas Gerais, foi apontado na convenção do partido (fevereiro de 1955).
Em abril de 1955, confirmando rumores que haviam deixado em pânico os antigetulistas, realizou-se uma aliança eleitoral. Kubitschek para presidente e João Goulart, antigo ministro do Trabalho de Getúlio Vargas, para vice-presidente. Em maio, Adhemar de Barros, “com os olhos voltados para o palácio presidencial, que no seu entender lhe fora prometido na barganha eleitoral com Vargas em 1950”, também se declarou candidato. Em junho,a UDN desistiu de seu candidato inicial, Etelvino Lins, lançou o antigo tenente Juarez Távora, chefe da Casa Militar do Governo Café Filho. Távora, também indicado pelo Partido Democrata Cristão (PDC) fora importante aliado de Vargas nos idos da Revolução de 1930, mas havia rompido com o regime do ditador em 1937. Nessa oportunidade, deixara o país para tornar-se adido militar no Chile, e após 1945, identificara-se com os militares anti-Vargas, atuara na Cruzada Democrática e chegara a ser comandante da Escola Superior de Guerra. Completou o quadro de candidatos à presidência da República o ex-chefe nacional do integralismo, Plínio Salgado.
A campanha eleitoral baseou-se nos conflitos entre o moralismo udenista, temeroso de um retorno ao getulismo, e a pregação desenvolvimentista em Kubitschek. “Na convenção nacional da UDN, em junho, o líder João Agripino pintou um lúgubre retrato do abuso da liberdade no Brasil” e sugeriu que seria melhor “viver limpo num cárcere do que livre nesta podridão.” (Thomas Skidmore). Kubitschek procurou apelar, em sua obstinada defesa da industrialização acelerada, para as classes empresariais e, a fim de garantir o processo eleitoral, para os sentimentos democráticos da classe média e do Exército.
A 03 de outubro de 1955, os eleitores sufragaram os nomes de Kubitschek e Goulart. O Governador de Minas, que só obteve grande votação em seu estado natal, foi eleito pela maioria: obteve 33% dos votos contra 30% conseguidos por Juarez Távora. Devido à pequena diferença entre Juscelino e os demais candidatos ocorreram rumores de que as eleições seriam anuladas. Algumas áreas antigetulistas, lideradas por Carlos Lacerda, procuraram impedir a posse de Kubitschek e Goulart: publicaram um documento, a “Carta Brandi”, procurando provar que João Goulart mantivera contatos com Perón visando à compra de armamentos para equipar uma milícia operária no Brasil. A UDN, sustentando que, segundo a Constituição os candidatos vencedores deveriam ter maioria absoluta, tentou impedir a posse dos eleitos, levando o caso à Justiça Eleitoral. A medida não surtiu efeito e as áreas anti-Vargas desesperaram.
Na manhã de 03 de novembro, Café Filho, vitimado por um ataque cardiovascular, foi forçado a transferir os poderes presidenciais. A 08 de novembro, o presidente da Câmara dos Deputados, Carlos Luz, adversário de Kubitschek dentro do PSD, assumiu inteiramente a presidência da República. O novo Presidente se recusou a concordar com a punição de Mamede e, como represália, a 10 de novembro, substituiu Lott pelo general Fiúza de Castro, na Pasta da Guerra.
No entanto, antes de entregar seu cargo, o general Lott foi convencido por outros militares legalistas para conduzir um golpe contra o presidente Carlos Luz. No dia 11 de novembro de 1955, Lott ordenou que as forças do Exército ocupassem prédios públicos, estações de rádio e os principais jornais. Carlos Luz foi obrigado a pedir refúgio num cruzador, o Tamandaré, ao lado de vários ministros de seu governo e de Carlos Lacerda. A belonave, após disparar contra as baterias instaladas na baía da Guanabara, dirigiu-se para Santos; seus ocupantes planejavam instalar um governo em São Paulo. 
O Congresso entrou em sessão. No mesmo dia, a Câmara dos Deputados legitimou a posse de Nereu Ramos, presidente do Senado, na presidência da República, embora sem votar o impedimento de Carlos Luz. Uma semana depois, a 21 de novembro, Café Filho, já convalescente, anunciou sua disposição de reassumir a presidência, Café Filho era acusado de conspirar contra a posse de JK e Jango. Novamente, o Exército interveio, repetindo-se a mobilização militar e os desfiles de tropas e tanques pelas ruas do Rio. No dia seguinte, a Câmara dos Deputados confirmou Nereu Ramos como presidente até a posse de Kubitschek e votou o estado de sítio por trinta dias, prazo que seria prorrogado em dezembro.
“Em termos de conflito político, as lições de novembro foram notáveis. A oposição liberal, que aparentemente ganhara tanto com a morte de Vargas, em agosto de 1954, perdeu todas as possibilidades de um caminho extralegal para o poder a curto prazo. Os militares esforçaram-se por se afastar da tentação de impor sua própria opinião aos políticos. A intenção de Lott era garantir as regras do processo eleitoral, porém a ironia de sua devoção à legalidade repousara no fato de que essa mesma legalidade teve de ser garantida pelo ato arbitrário do golpe militar. O resultado foi que se criou uma nova divisão no meio da oficialidade, a divisão entre o movimento de 24 de agosto e o grupo de 11 de novembro.” (Thomas Skidmore)
	
O REGIME MILITAR
Um pouco mais adiante, por volta de 1970 a 1980, tem como destaque o marco inicial com transformações muito significativas nas áreas sociais e econômicas, em especial a política de proteção social, onde o Estado começa a assumir de maneira mais atuante seu papel de promover o bem-estar social, como também o desenvolvimento econômico do país, de acordo com (Santos, 1987) esse modelo de proteção social é baseado na lógica autoritária implantada na ditadura militar, período em que esses programas e serviços foram muito usados como mecanismo de compensação à forte repressão do governo perante a sociedade dessa época.
A ditadura militar e seus governos perpetuaram no comando do Brasil de 1964 até meados de 1985, O golpe de 1964 assinalou uma modificação decisiva na função política dos militares no Brasil. A ação final contra a “democracia populista” (1946-1964) ou, como preferem os conservadores, a “Revolução”, trouxe duas novidades. Não se tratava mais de uma operação intermitente das Forças Armadas com um objetivo preciso, quase sempre o de combater a “desordem” (a política de massas) ou o “comunismo” (a política social) ou a “corrupção” (i. e., a política propriamente dita), mas de uma intervenção permanente. A garantia política que as Forças Armadas emprestaram aos governos civis, notadamente no pós-1930, convertia-se agora num governo militar. Há, de fato, uma mudança de regime político. Da mesma forma, não mais se tratava de um pronunciamento, em que um chefe militar de prestígio ou um grupo de oficiais se recusava a obedecer ao governo, mas de um movimento institucional das Forças Armadas (O’DONNELL, 1975; CARDOSO, 1982). Foi o aparelho militar, e não um líder político militar, que passou a controlar primeiramente o governo (i. e., o Executivo), depois o Estado (e seus vários aparelhos) e, em seguida, a cena política (i. e., as instituições representativas). Os presidentes que governaram na época foram Humberto Castello Branco (1964-1967); Artur Costa e Silva (1967-1969); Emílio Médici (1969-1974); Ernesto Geisel (1974-1979); João Figueiredo (1979-1985).
A economia brasileira nunca cresceu tanto como nos primeiros anos do regime militar. Com o plano, chamado econômico implementado na década de 1970, A taxa média anual de crescimento do PIB naquele período girava em torno de 10%, grande parte dessa expansão foi possível graças a empréstimos tomados de instituições internacionais e pelo investimento estrangeiro feito no Brasil por empresas multinacionais. Idealizado pelo economista e Ministro da Fazenda Antônio Delfim Neto, o milagre econômico incentivou três ramos produtivos, empresas privadas brasileiras, empresas multinacionais e empresas estatais.
O governo militar, quando assume em 1964, enfrenta um período de bastante desorganização da economia, com desequilíbrio fiscal, inflação alta e desemprego. Havia um desgaste muito grande do modelo econômico anterior, com o fracasso do Plano Trienal (para retormar o crescimento econômico). Eles conseguiram modernizar a economia, mas isso teve um alto preço, que acabou sendo pago após a redemocratização, como hiperinflação e dívida externa estratosférica (Vinicius Müller, 2018)
Inflação anual no Brasil de 1964 a 1985 (em %)
Fontes: IBGE, FGV e BC
Duas crises de combustíveis em 6 anos. Em 1973, o país começou a enfrentar as consequências da chamada crise do petróleo. O valor do barril subiu 400% e afetou diversospaíses importadores, entre eles o Brasil. E novamente em 1979, onde naquele ano, o governo militar lançou uma campanha em que alertava para a necessidade de se conter o consumo de combustíveis até que o Brasil tivesse à disposição fontes alternativas do produto. Entre a primeira e a segunda crise do petróleo, a dívida externa brasileira foi de US$ 12,5 bilhões para US$ 50 bilhões. Entre a segunda crise e o fim do regime militar, ela praticamente dobrou, chegando a US$ 96 bilhões (UOL). 
Evolução da dívida externa do Brasil de 1964 a 1985 (Em US$ bilhão)
 
Fontes: IBGE, FGV e BC
Müller explica que a dependência do Brasil de empréstimos para sustentar a situação econômica resultou na explosão da dívida externa naquele período. "A inflação e os impactos da crise internacional do petróleo foram rapidamente desqualificados pela propaganda do governo”
	Dentre todos os governos da ditadura o governo Geisel teve destaque tendo legenda, como se sabe, distensão política “lenta, gradual e segura”. Esse procedimento deveria ser suficientemente arrastado para que não pudesse ser interpretado como uma involução da “Revolução”, servindo de pretexto à contestação aberta da extrema-direita, militar e civil. Ele deveria ser também gradual, isto é, progressivo e limitado, pois não poderia abrir caminho a uma ofensiva oposicionista que conduzisse, por exemplo, à uma ruptura democrática (QUARTIM DE MORAES, 1982, p. 766-767). E deveria ser controlado pelo próprio Presidente, uma vez que as duas tarefas anteriores exigiam supervisão estrita tanto dos movimentos políticos da direita militar como da esquerda parlamentar. Só assim se reconstitui o sentido da estratégia pendular de Geisel, ora à direita (cassações), ora à esquerda (eleições) (MARTINS, 1988).
	O propósito do governo Geisel (1974-1979) foi promover uma distensão, isto é, um relaxamento dos controles políticos impostos à sociedade. A censura prévia foi parcialmente suspensa, os resultados eleitorais, depois de algumas manipulações das regras, foram admitidos, os protestos dos empresários contra o “modelo econômico” foram, embora com reservas, tolerados e as inesperadas reivindicações operárias, surgidas a partir de 1978, foram um efeito não antecipado da ação liberalizante. Esse projeto foi mantido, no governo Figueiredo (1979-1985), sob o nome de “política de abertura”, com lances controversos e sob oposição da extrema-direita militar. Concluída no fim do governo Sarney (1985-1990).
O fracasso da abertura controlada dos militares consolidou-se durante o governo de João Figueiredo. A movimentação popular permitiu a conquista do direito para eleger governador em 1982. Entre 1983 e 1984, a população brasileira engajou-se na Campanha das Diretas Já. Nessa campanha, a população brasileira exigia o retorno do direito de escolher quem seria o presidente do país. A última vez que isso tinha acontecido havia sido em 1960. A campanha fracassou e a eleição indireta foi mantida. 
Os 21 anos de ditadura deixou muitas sequelas, 434 mortos por conta do autoritarismo do regime, além de mais de 8 mil indígenas mortos pela política de ocupação da Amazônia, 20 mil torturados, Quase cinco mil pessoas com direitos políticos cassados, Aumento da corrupção, pois não havia liberdade para investigar os crimes dos militares, Redução nos direitos dos trabalhadores, Aumento da desigualdade social, Aumento do endividamento do Brasil, hiperinflação e crise econômica, entre outros.
Em 1985, a eleição indireta para presidente aconteceu: o candidato dos militares era Paulo Maluf e o candidato da oposição era Tancredo Neves. A eleição de Tancredo Neves e seu vice, José Sarney, colocou fim à ditadura militar e deu início a um novo período democrático na história brasileira. 
Um País ansioso para ver o primeiro presidente civil depois de 21 anos de ditadura militar não poderia ter imaginado o pior. Na noite anterior à sua posse, 14 de março de 1985, Tancredo Neves, presidente eleito indiretamente pelo Colégio Eleitoral, não pôde assumir porque foi internado às pressas para tratar de apendicite aguda no Hospital de Base de Brasília. Em seu lugar foi empossado o vice-presidente José Sarney. Durante 38 dias o Brasil acompanhou a agonia de Tancredo Neves. Foram sete cirurgias e uma traqueostomia até sua morte em 21 de abril de 1985 (EDUARDO, 2020).
O governo Sarney (1985-1990) foi a expressão máxima do fim do círculo de ferro que, com sucesso, controlou a mudança política no Brasil. Recorde-se que as palavras de ordem da Aliança Democrática, “conciliação” e “pacto social”, conseguiram neutralizar tanto os ensaios de oposição ao regime ditatorial surgidos na conjuntura 1977- 1980 (greves operárias, movimentos sociais “de base” e protestos empresariais contra a “intervenção do Estado na economia”), quanto a famosa campanha pelas eleições diretas para Presidente da República, em 1984. O resultado foi o aperfeiçoamento de um regime antipopulista e antipopular ou, como o denominou Florestan Fernandes, uma “democracia forte”, isto é, uma forma política nem explicitamente ditatorial, a ponto de ser combatida como tal, nem plenamente democrática e liberal (FERNANDES, 1981, p. 10).
A “transição política” (de 1974 a 1989) foi peculiar: ela durou, ironicamente, mais que o regime propriamente dito (1964-1974). Sua principal característica foi o continuísmo excepcional do autoritarismo (MARTINS, 1988) nas instituições do governo civil que deveria, afinal, ser “de transição”. Stepan e Linz já sugeriram que “a duração incomum da transição brasileira”, quando comparada com a de outros países, está relacionada “ao fato de que o regime autoritário [...] era hierarquicamente controlado por uma organização militar que detinha poder suficiente para controlar o ritmo da transição e para extrair um alto preço por se retirar do poder” (LINZ & STEPAN, 1999, p. 205).
	A década de noventa foi, de acordo com grande parte da literatura, o período da consolidação do regime liberal-democrático. Esse processo compreende os governos de Collor de Mello (1990-1992), Itamar Franco (1992-1995) e Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). A “consolidação democrática” deu-se em um quadro institucional peculiar. O cenário resultante da nova Constituição conjugou o presidencialismo como a forma de governo, o federalismo como a fórmula de relação entre o Estado central e as unidades subnacionais (MAINWARING, 1997), a coalizão política como a fórmula de governabilidade (ABRANCHES, 1988), tudo isso apoiado sobre um sistema partidário fragmentado (NICOLAU, 1996), pouco institucionalizado e demasiadamente regionalizado (ABRUCIO, 1998). Essa combinação institucional – ou, para alguns, essa deformação institucional – conduziu no final das contas o processo de transição para o seguinte ponto: uma democracia eleitoral, um Executivo imperial e um regime congressual que atua ora como colaborador, ora como sabotador das iniciativas do Presidente, ator central do sistema político 
A análise da política brasileira tende a variar entre dois extremos. De um lado, há uma tendência que vê o sistema político como excessivamente consensual, repleto de jogadores de veto, o que tornaria o processo decisório intrinsecamente problemático. Em tal cenário, somente propostas que têm o apoio de uma ampla maioria podem ser aprovadas. Nesse sistema político atomizado, muitos fatores restringem o processo decisório: 1) um Congresso fraco, em que a representação desproporcional fortalece os Estados pequenos, enquanto os frágeis mecanismos de accountability eleitoral – resultado do sistema de representação proporcional com lista aberta – favorecem grupos de interesse organizados e facilitam a constante troca partidária; 2) um sistema partidário fraco, que permite a existência de um grande número de partidos fragmentados, instáveis e regionalizados; 3) a fraqueza do gabinete presidencial cujos ministérios são utilizados em parte como um instrumento para assegurar a manutenção das coalizões legislativas; 4) a natureza do Estado e, especialmente, dos servidores públicos, quetendem a lutar veementemente pela preservação de seus privilégios dentro da burocracia estatal; 5) um Senado com poderes sem paralelo para interferir em muitas questões políticas; e 6) o federalismo e, os poderosos governadores, especialmente o impacto deles nas discussões sobre assuntos fiscais da federação. Sob essa ótica, potenciais entraves institucionais existem em abundância: como nota Kinzo (2001), a representação política no Brasil “reproduz à enésima potência o sistema de contrapesos do modelo madisoniano”.
	
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