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CENTRO UNIVERSITÁRIO DAS AMERICAS CURSO DE DIREITO KATARINA N. CALIXTO DE LIMA BIOCONHECIMENTO E DIREITOS AUTORAIS DOS POVOS INDÍGENAS SÃO PAULO/SP 2024 KATARINA N. CALIXTO DE LIMA BIOCONHECIMENTO E DIREITOS AUTORAIS DOS POVOS INDÍGENAS Projeto apresentado ao Curso de Direito do Centro Universitário das Américas, como pré- requisito para obtenção do título de graduação. Área de Concentração: Direito Autoral, Direito Constitucional. Orientadora: Prof.(a) Murilo Naves Amaral SÃO PAULO/SP 2024 SUMÁRIO Tema..............................................................................................................pág. 3. Delimitação do tema. ...................................................................................pág. 9. Objetivos da pesquisa e justificativa ......................................................... pág. 9. Procedimentos metodológicos. ................................................................. pág. 11. Bibliografia .................................................................................................pág. 11. 3 TEMA O desrespeito sociocultural aos povos nativos há tempos se faz comum na realidade brasileira, isto pois o colonialismo se encontra enraizado na formação social da América e Europa. As relações comerciais indígenas são fortemente caracterizadas pela prática tradicional do escambo. Esta, com fulcro na natureza comunitária, compartilhada e solidária dos povos indígenas (sistema de interdependência), vem sofrido com mecanismo vinculados a prática capitalista. O processo de (re)colonização comercial em cenários indígenas no Brasil, se fortalece com a prática da biopirataria, que transforma a biodiversidade em produtos patenteados por instituições financeiras sem a repartição justa das vantagens por elas obtidas. Práticas colonialistas violam direitos, conhecimentos, práticas comerciais tradicionais, fronteiras culturais, biodiversidade e biotecnologia, sendo ocasionadas por segmentos da sociedade nacional que detêm poder econômico, de modo articulado com as explorações ocorridas na Amazônia e em outros cenários brasileiros. Ademais, a Constituição Federal de 1988 no que se refere ao tratamento de indígenas e não indígenas, polariza e os trata como distintos. Em observância a tabela apresentada, é possível verificar quais são as origens, em relação as patentes do conhecimento da biodiversidade. 4 Tabela de Barbieri, 2014. Urge a necessidade de romper com o legado histórico que procura minimizar os efeitos de práticas que violentam e roubam os saberes, sujeitos, sociedades e culturas tradicionais. "No contexto do capitalismo, a política ambiental não rara é perversa com aqueles que conservaram, por meio de uso tradicional da terra e dos recursos naturais, as áreas naturais ainda existentes. Ao mesmo tempo que lhes nega o direito de manter seu modo de vida, enxerga-os através de uma lente utilitarista e etnocêntrica, que parece só admitir o direito a existência dos outros se estes servirem a algo para nós." - Castilho – Barbieri. 5 Esses conhecimentos são orientados por meio dos artigos 3, 23 e 24 da DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS e da DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS POVOS INDÍGENAS. A ONU, em 2007, assim fundamenta: Artigo III – Os indígenas têm o direito à autodeterminação […] e a buscar livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural. Artigo XXIII – […] Em especial, os povos indígenas têm o direito de participar da elaboração dos programas de saúde e demais programas econômicos e sociais. Artigo XXIV – os povos indígenas têm o direito de manter, controlar, proteger e desenvolver seu patrimônio cultural, seus conhecimentos tradicionais. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2008, p. 23 Em conjunto, os estados brasileiros deveriam adotar, de acordo com a Constituição Federal de 1988, medidas que fossem capazes de proteger e preservar o patrimônio imaterial e comercial dos povos indígenas, por meio da reparação equitativa de atividades econômicas. O fato é que essas ações de proteção e preservação não se efetivam a contento. Com isso, os povos indígenas ficam à margem de exploradores. Marés (2010, p. 62), afirma que: As comunidades indígenas entendem que, vetando-se a possibilidade de apropriação por quem quer que seja, 6 estar-se-ia limitando o interesse sobre o conhecimento e a biodiversidade dessas comunidades, na medida em que limitar-se-ia a possibilidade de um eventual titular explorar, em caráter de exclusividade, esse patrimônio. Diante desse princípio, iniciamos a presente seção com uma problematização da prática da biopirataria, as mudanças nas relações comerciais tradicionais indígenas e o impacto dessa exploração para o desenvolvimento social e econômico desses povos. A economia de mercado percebeu várias vantagens na exploração e venda oriundas da diversidade, dos conhecimentos e dos produtos tradicionais indígenas. Essa modalidade de biopirataria é um tema relativamente novo, porquanto não há regulação efetiva para coibir o uso de produtos/mercadorias sem o pagamento dos royalties, ou distribuição das vantagens econômicas de maneira justa. Royalties é uma palavra em inglês que significa privilégio. Consiste em uma quantia que é paga por alguém ao proprietário pelo direito de usar, explorar ou comercializar um produto, obra, terreno etc. Essa palavra é o plural de royalty, que significa realeza. O conceito de biopirataria surge em 1992, por meio da Fundação Internacional para o Progresso Rural (ONG RAFI), que o criou como alerta, visto que os conhecimentos e os comércios dos povos indígenas são patenteados por inúmeras multinacionais sem que disponibilizem lucros e créditos pela utilização do conhecimento. 7 Diante do evidente cenário de exploração, a proteção e regulamentação efetiva desses conhecimentos necessita prever um regime patentário que contribua para o desenvolvimento originário. A evolução da biopirataria, nos dizeres de Barbieri (2014), acarreta várias mudanças: como a vida pessoal e comunitária dos povos indígenas, desrespeita conhecimentos estruturantes de direitos humanos, afetando também a dinâmica da identidade cultural desses povos. Anísio Guató, líder indígena do Pantanal, alertou; “Discutem o uso do conhecimento tradicional. Mas, até hoje nossos conhecimentos permanecem desprotegidos da biopirataria. CARRASCO; PALÁCIOS, 2012, p. 147. É necessária regulação governamental para que haja controle efetivo sobre ações dessa natureza. Desta forma, fica evidente o descaso, a posse inadequada da biodiversidade e dos bens tradicionais – propriedade intelectual. “Os direitos de propriedade intelectual conferem ao titular o direito de exploração exclusiva de um determinado produto por certo período de tempo, e depois a patente cai em domínio público”. (BARBIERI, 2014, p. 167). Países com imensa riqueza de biodiversidade, e conhecimentos milenares, são voltados ao serviço privado, que é o titular das propriedades intelectuais. Os saberes dos povos indígenas, nos dizeres da Constituição, segundo o artigo 225 8 (BRASIL, 1988), não são públicos nem privados; são comuns a esses povos originários. Espera-se que esse entendimento seja protegido e conservado, contudo é comum a prática de atividades comerciais ilegais que colocam em risco a biodiversidade e a história desses povos. Parte importante dos entorpecentes utilizados pela Medicina ocidental é derivada de plantas tradicionais cujo uso medicinal foi desenvolvido por povos indígenas. Esses produtos originaram um mercado expansivoe dinamizador que recebeu vantagens econômicas provenientes de apropriações dos saberes indígenas, na maioria das vezes, sem consentimento. Para o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), a utilização desses saberes não fere o direito e a forma de viver desses povos. Contudo, quando há patenteamento e exploração dos recursos comerciais e imateriais sem distribuição dos lucros e reconhecimento de autoria, ocorre a violação de direitos. “A prática da biopirataria na Amazônia é o tripé do mercado econômico que movimenta U$100 milhões por ano nas indústrias farmacêuticas. O Brasil não possui um único centavo desse recurso” (NASCIMENTO, 2010). Não bastante, muito do conhecimento indígena já é considerado de domínio público. Dessa forma, foi fundamental mencionarmos o direito dos indígenas aos seus conhecimentos ancestrais como ação da pessoa humana, subsistindo com sua cosmovisão. É indubitável que seu legado cultural imaterial decorre de conhecimentos milenares. Seu conhecimento contextualmente produzido é 9 explorado, manipulado e mercantilizado ilegalmente por empresas multinacionais que colocam, no sistema comercial mundial, produtos de saberes indígenas. É prática histórica comum em nosso país limitar o registro do patrimônio cultural e imaterial que relaciona o conhecimento tradicional ao genético. Logo, se faz necessária regulamentação juridicamente efetiva que reprima a prática da biopirataria para que as comunidades indígenas possam, permitir ou não o acesso a seu conhecimento associado à biodiversidade, sem serem forçosamente submetidas à exploração de sua cultura e de suas práticas. DELIMITAÇÃO DO TEMA Essa pesquisa tem por objetivo esmiuçar a problemática da ineficácia da legislação ambiental brasileira, utilizando como método o estudo do posicionamento da legislação Constitucional, Ambiental e Internacional, em conjunto com a contextualização histórica do problema, trazendo a luz a violação dos Direitos Fundamentais, através da prática de crimes ambientais. OBJETIVOS DA PESQUISA E JUSTIFICATIVA Esse projeto tem por objeto de pesquisa a apresentação e exploração das implicações da Biopirataria, crime previsto na Lei de Crimes Ambientais, nº 9.605/98, abordando aspectos Constitucionais, Tratados Internacionais e a inserção da problemática em contexto histórico. A pesquisa utiliza de todos os recursos bibliográficos, documentais e registros para alcançar a etiologia do posicionamento da legislação brasileira no combate aos crimes ambientais que ocorrem em abundância no Brasil. 10 Objetivando a compreensão da prática da biopirataria, o contexto histórico, a inserção do crime, a relação direta do crime as violações dos Direitos Indígenas, a posição da Constituição de 1988 em comparações a constituições anteriores, atuações dos órgãos de preservação, criminalização de lideranças indígenas como cultura, os maus tratos as espécies nacionais, os sujeitos do crime e o destino do dinheiro obtido por meio dele, o posicionamento internacional, e a problemática das patentes difusas. O Brasil desde a sua constituição enfrenta sérios problemas para compreender a riqueza dos próprios bens. É através do estudo da ampla gama bibliografia acerca do tema, o projeto buscará compreender a viabilidade dos mecanismos de combate a Biopirataria, como forma de efetivação da garantia dos Direitos Fundamentais, utilizando como ferramenta para isso o método de pesquisa científico. Requerendo respostas aos questionamentos narrados abaixo. • O que é Biopirataria e quem são seus sujeitos • A Biopirataria em contexto colonial • Como a legislação brasileira se posiciona • Quais são as ferramentas de combate • Quais são os Tratados internacionais que abordam o tema • O que o torna um assíduo • Direitos Fundamentais violados por meio da prática do crime • Como funcionam as patentes de conhecimento difuso • A viabilidade da pesquisa de campo • Aplicabilidade do protocolo de Nagóia em crimes internacionais 11 • Quais são os caminhos de combate ao roubo de conhecimento originário para fins lucrativos PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS A presente pesquisa utilizará como métodos o estudo jurisprudencial, a Lei Seca, e estudo de campo realizado em órgãos e Centros de Preservação Nacional, criação de bancos de dados (quando estes não existirem) através, principalmente, da pesquisa de campo. Serve de base para outros tipos de pesquisa. É bastante empregada pelas ciências sociais. BIBLIOGRAFIA ALMEIDA, M. Os índios na história do Brasil. FGV Editora, 2010. BARBIERI, S. Os Direitos dos Povos Indígenas. Editora Almedina, 2021. BARBIERI, S. R. J. Biopirataria e povos indígenas. 1. Ed. Editora Almedina, 2014. BRASIL. Constituição Federal de 1988. Brasília: MEC, 1988. BRASIL. Leis de crimes ambientais: lei 9605/98 de 12 de fevereiro de 1988. Brasília: MEC. COLL, J. O. A resistência indígena: do México à Patagônia, a história da luta dos índios contra os conquistadores. L&PM Editores, 1974. CUNHA, M. Povos indígenas no Brasil: história, direitos e cidadania. Editora Claro Enigma, 2012. 12 FILHO, C. Renascer dos povos indígenas para o direito. Juruá Editora, 1998. FILHO, R. Apontamentos sobre o Direito Indigenista. Jurua Editora, 2005. GONZAGA, A. Decolonialismo indígena. Editora Matrioska, 2021. JECURÉ, K. A Terra dos Mil Povos: História Indígena do Brasil Contada por Um Índio. 2. Ed. Editora Peiropolis, 1998. MARÉS, F. O renascer dos povos indígenas para o direito. 2. ed. Editora Juruá, 2010. MENDES, S. Direitos dos povos e comunidades tradicionais e povos indígenas em contextos de retrocessos. Editora CRV, 2019. NASCIMENTO, D. Biopirataria na Amazônia. Editora Juruá, 2010. ONU. Direitos indígenas nas Nações Unidas: para uma atualização nas relações internacionais 2ª edição. Capa comum, 8 março 2021. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos. RIBEIRO, D. As américas e a civilização: processo de formação e causas do desenvolvimento desigual dos povos americanos. Companhia das Letras, 1969. RIBEIRO, D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. Companhia das Letras, 1995. SHIVA. Biopirataria: a pilhagem da natureza e do conhecimento. Editora Vozes, 2001. STEFANINI, M. Por uma reconstrução não europeizada dos Direitos Humanos em relação aos povos indígenas brasileiros. Editora Dialética, 2022.