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Em 1922, membros do Partido Fascista reunidos em Nápoles decidiram fazer uma manifestação em Roma, partindo de várias cidades, para pressionar pela participação fascista no governo liberal. Precedida da ocupação de prédios públicos e estações ferroviárias, a Marcha sobre Roma ocorreu em 28 de outubro de 1922 e não encontrou resistência, sendo um enorme sucesso. O rei escolheu Mussolini como primeiro- -ministro em 30 de outubro. Iniciou-se assim a escalada do fascismo no Estado italiano. O FASCISMO NO PODER Entre 1922 e 1925, o fascismo conviveu com as instituições liberais do país, mas reativou sua milícia para intimidar a oposição. Governos locais de orientação socialista foram dissolvidos e a imprensa foi censurada. A polícia colaborava com os militantes nos ataques aos comunistas. O próprio Mussolini definiu o fascismo como anticomunismo: O Fascismo é a completa oposição ao socialismo, à concepção mate- rialista das civilizações humanas, que explica a evolução humana como simples conflitos de interesses entre vários grupos sociais [...]. MUSSOLINI, B. The Political and Social Doctrine of Fascism. London: Hogarth Press, 1932. p. 15. Em 1924, o líder socialista Giacomo Matteotti (1885-1924) foi sequestrado e morto pelos camisas- -negras depois de proferir um discurso, no parla- mento, contra a violência dos fascistas nas eleições parlamentares daquele ano, nas quais os fascistas obtiveram 65% dos votos. Mussolini recusou a responsabilidade pelo crime, mas os deputados antifascistas abandonaram o parlamento, exigindo a volta da legalidade. Pediram a intervenção do rei, que apelou para a “concórdia nacional”. O resultado foi o aniquilamento das oposições e o estabelecimento da ditadura: prisão, exílio e morte de lideranças de esquerda. Em outubro de 1925, o sindicalismo livre foi liquidado, abolindo-se o direito de greve. A primeira grande medida do fascismo foi o chamado corporativismo na adminis- tração das relações trabalhistas. Ainda em 1925, o Estado declarou a ilegalidade de todos os partidos políticos, exceto o fascista. Mesmo este foi subordinado ao Estado, criando-se um Conselho Fascista como elo entre o partido e Mussolini. Na prática, o partido foi estatizado e passou a controlar o Estado. A democracia liberal entrou em colapso e, apesar de a monarquia ter sido mantida, o rei era uma figura decorativa. FASCISMO APOIADO E RECONHECIDO Em 1929, o Estado convocou um plebiscito para que a população avaliasse o go- verno. Mussolini obteve cerca de 98% dos votos, tornando-se o duce (derivado de dux, termo utilizado na Roma antiga e que significa “chefe”) – chefe do partido, do Estado e da nação. As democracias ocidentais viram com bons olhos a ascensão de Mussolini, sobretudo graças à ofensiva anticomunista. Os jornais britânicos e franceses o apresentavam apenas como um personagem extravagante, embora não considerassem que tal regime pudesse servir de modelo para outros países. A avaliação feita pelos jornais internacionais ajudou a naturalizar um comporta- mento autoritário que ameaçava a ordem democrática, dando forças ao regime. O tempo mostraria que estavam enganados em naturalizá-lo. Giacomo Matteotti, político socialista italiano, em foto da década de 1920. O delito Matteotti Direção de Flores- tano Vancini. Itália, 1973. Duração: 118 min. Filme sobre o assassinato do deputado socialista Giacomo Matteotti pelos fascistas. F I C A A D I C A Após a liquidação do sindicalismo livre pelo Pacto do Palácio Vindoni, em 1925, instituiu-se o regime da Carta del Lavoro de 1927, pelo qual o Estado passou a mediar as relações entre capital e trabalho, o que caracteriza o corporativismo. Somente os sindicatos operários reconhecidos pelo Estado poderiam negociar com os sindicados patronais. OBSERVE QUE . . . Em 1929, Mussolini celebrou a Concordata de Latr‹o com o papa Pio XI, em que a Igreja reconheceu o Estado italiano e recebeu a área pegada à Basílica de São Pedro, em Roma, como sede do Estado do Vaticano, desde então independente. A aliança com a Igreja foi essencial para a consolidação do regime. OBSERVE QUE . . . R e p ro d u ç ã o /C o le ç ã o p a rt ic u la r 45 P5_V5_CIE_HUM_Vainfas_g21Sa_Cap2_040a065_LA .indd 45P5_V5_CIE_HUM_Vainfas_g21Sa_Cap2_040a065_LA .indd 45 8/31/20 10:10 AM8/31/20 10:10 AM Desfile dos “filhos da loba” em Roma (Itália), no início da década de 1930. Ao fundo, o líder fascista Benito Mussolini acompanha o desfile. O mito da romanidade foi levado ao extremo, instituindo-se uma autêntica glo- rificação do Império Romano, como uma alusão ao tempo em que um império poderoso, com sede no mesmo local da então capital italiana, Roma, governava o mundo ocidental. A sociedade foi fascistizada, a começar pela juventude, or- ganizada em classes de idade: os figli della lupa (“filhos da loba”, crianças), os balilla (adolescentes) e os avanguardisti (jovens). O lema imposto à juventude era simples: “Crer, obedecer, combater”. R e n é D a zy /B ri d g e m a n I m a g e s /F o to a re n a A universidade livre também foi devorada pelo regime, o que deu origem aos Grupos Universitários Fascistas. Os professores foram obrigados a jurar fidelidade ao fascismo, sob pena de demissão. Manifestações públicas multi- plicaram-se em louvor ao fascismo e ao duce. O fascismo tornou-se consenso na sociedade italiana, e as oposições foram eliminadas pelo terror. A política econômica do fascismo facilitou a adesão de vários grupos so- ciais. A política fiscal protecionista estimulou a indústria de bens de consumo e o mercado interno a ponto de a Itália ter sofrido menos com a crise mundial de 1929 do que outros países. Mesmo assim, o desemprego saltou de 300 mil para 1,3 milhão, em 1929. Em 1935, voltou a baixar para 765 mil, devido à intervenção do Estado, com sua forte política de obras públicas, sobretudo rodovias, conjugada à redução dos salários. A criação do Instituto para a Reconstrução Industrial, em 1933, deu forte impulso aos setores siderúrgico, mecânico e de construção naval, ampliando o número de empregos. Ele foi criado com fundos estatais, que chegaram a con- centrar 22% do capital das empresas. No campo, o regime promoveu a Batalha do Trigo, programa destinado a tornar o país autossuficiente na produção de cereais e fixar os agricultores no campo. Mussolini também instituiu tarifas protecionistas para deter a importação de alimentos e favoreceu as pequenas propriedades e os sistemas de parceria. Foi a chamada política de ruralização. A organização da juventude em diferentes faixas etárias tinha por objetivo incutir no povo italiano os ideais fascistas desde a tenra idade, por meio de discursos direcionados. Os "filhos da loba", por exemplo, eram crianças entre 4 e 8 anos que compunham a sociedade italiana. O nome celebrava a origem lendária de Roma, fundada por Rômulo e Remo, dois bebês alimentados por uma loba. Essa narrativa ajudava a criar uma conexão entre a Itália de então e o Império Romano, com a grandeza que o fascismo prometia aos italianos. OBSERVE QUE . . . 46 P5_V5_CIE_HUM_Vainfas_g21Sa_Cap2_040a065_LA .indd 46P5_V5_CIE_HUM_Vainfas_g21Sa_Cap2_040a065_LA .indd 46 8/31/20 10:10 AM8/31/20 10:10 AM