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.� ·�, .:_,..._-�.; Capítu lo 3 
PRINCÍPIOS, DIREITOS E 
GARANTIAS FUNDAMENTAIS 
1. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS 
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O Título 1 da Constituição brasi leira de 1 988, composto por quatro artigos, 
é dedicado aos denominados "princípios fundamentais" do Estado brasi leiro. 
O nosso constituinte uti l izou essa expressão genérica para traduzir a i deia 
de que nesses primeiros quatro artigos já se estabelecem a forma do nosso 
Estado e de seu governo, proclama-se o regime político democrático fundado 
na soberania popular e institui-se a garantia da separação de funções entre 
os poderes. Também neles encontram-se os valores e os fins mais gerais 
orientadores de nosso ordenamento constitucional, funcionando como dire­
trizes para todos os órgãos mediante os qt ais atuam os poderes constituídos. 
O art. I .º da Constituição, em seu caput, resume a um só tempo, em uma 
única sentença, as características mais essenciais do Estado brasileiro: trata-se 
de uma federação (forma de Estado), de uma república (forma de governo), 
que adota o regime político democrático ( traz ínsita a ideia de soberania assen­
tada no povo); constitui, ademais, um Estado de Direito ( implica a noção de 
l imitação do poder e de garantia de direitos fundamentais aos particulares). 
Todas essas noções nucleares acerca da estrutura do Estado e do funcio­
namento do poder político encontram-se assim sintetizadas (grifamos): 
Art. 1 .0 A República Federativa do Brasil, formada pela união 
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, 
constitui-se em Estado Democrático de Direito . . . 
92 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO • Vicente Paulo & Marca/o Alexandrino 
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce 
por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos 
desta Constituição. 
A forma de Estado adotada no Brasil é a de uma fede ração , o que 
significa a coexistência, no mesmo território, de unidades dotadas de autono­
mia política, que possuem competências próprias d�scriminadas diretamente 
no texto constitucional. 
A Federação brasi leira é composta pela União, estados-membros, Dis­
trito Federal e municípios (CF, art. l .0 e art. l 8) . Todos eles são pessoas 
j urídicas de direito público autônomas e encontram-se sujeitos ao princípio 
da indissolubilidade do vínculo federativo (não existe em nosso País o 
direito de secessão). 
Essas pessoas políticas descentralizadas possuem poder de autocorga­
nização, competências legislativas e administrativas e autonomia financeira 
(têm competências tributárias próprias). Além disso, os estados e o Distrito 
Federal são representados no órgão formador da vontade pol ítica geral do 
Estado (têm representação no Congresso Nacional - C F, art. 46) e podem 
propor emendas à Constituição (CF, art. 60, I I I ). 
Deve-se anotar, por fim, que a forma federativa de Estado é, no Brasi l , 
cláusula pétrea, não podendo ser nem mesmo objeto de del iberação qual­
quer proposta de emenda constitucional tendente a aboli- la (CF, art. 60, § 
4.0, 1) . 
O Brasil é uma república . Essa é a forma d e governo adotada em 
nosso País desde 1 5 de novembro de 1 889, consagrada na Constituição de 
1 89 1 e em todas as Constituições subsequentes. 
A Constituição de 1 988 não erigiu a forma republicana de governo ao 
stalus de cláusula pétrea. Entretanto, o desrespeito ao princípio republicano 
pelos estados-membros ou pelo Distrito Federal constitui motivo ensejador 
de medida drástica: a intervenção federal (art. 34, VII , "a"). 
Preleciona José Afonso da Si lva que forma de governo "é conceito que 
se refere à maneira como se dá a instituição do poder na sociedade e como 
se dá a relação entre governantes e governados. Responde à questão de quem 
deve exercer o poder e como este se exerce". 
A mais notória característica formal das repúblicas é a necessidade de 
alternância no poder. Entretanto, como assinala a mais abalizada doutrina, não 
é suficiente essa formalidade para que tenhamos uma república em seu sentido 
mais nobre, de "coisa pública". O conceito de república, hoje, encontra-se 
irremediavelmente imbricado com o princípio democrático e com o princípio 
da igualdade (ausência de privilégios em razão de estirpe). 
Cap. 3 • PRINCIPIOS, DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS 93 
Em suma, conforme a excepcional síntese de Roque Antônio Carrazza, 
a repúbl ica é a forma de governo fundada na igualdade jurídi ca das pessoas, 
em que os detentores do poder político exercem-no em caráter eletivo, re­
presentativo, transitório e com responsabi l idade. 
Quanto ao regime pol í t ico, o caput do art. 1 .0 da Constituição afirma 
que o Brasi l "constitui-se em Estado Democrático de Dire ito". Em suas 
origens, o concei to de "Estado de Dire i to" estava l igado tão somente à 
ideia de l imi tação do poder e sujeição do governo a leis gerais e abstratas. 
A noção de Estado democrático é posterior, e relaciona-se à necessidade 
de que seja assegurada a partic ipação popular no exercício do poder, que 
deve, ademais , ter por fim a obtenção de uma igualdade material entre os 
indivíduos. 
Atualmente, a concepção de "Estado de Direito" é i ndissociável do 
conceito de "Estado Democrático", o que faz com que a expressão "Estado 
Democrático de D ireito" traduza a ideia de um Estado em que todas as pes­
soas e todos os poderes estão sujeitos ao império da lei e do Direito e no 
qual os poderes públicos sejam exercidos por representantes do povo visando 
a assegurar a todos uma igualdade material (condições materiais mínimas 
necessárias a uma existência digna). 
Reforça o princípio democrático o parágrafo único do art. 1 .0 da CF/ 1 988, 
ao declarar que "todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de 
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição''. 
Democracia, na célebre conceituação de L incoln, é o governo do povo, 
pelo povo e para o povo. Tradic ionalmente, identificam-se como elementos 
essenciais do regime democrático: o princípio da maioria, o princípio da 
l iberdade e o princípio da igualdade. 
O parágrafo único do art. 1 .º da Carta da República permite concluir que 
em nosso Estado vigora a denominada democracia semicli reta, ou participa­
tiva, na qual são conjugados o princípio representativo com os i nstitutos da 
democracia direta (plebiscito, referendo, in ic iativa popular). 
O art. 1 .0 da Constituição de 1 988, a par de estabelecer a forma do Es­
tado brasi leiro (federação), a forma de seu governo (república) e o regime de 
governo (democracia partic ipativa fundada na soberania popular), enumera, 
em seus cinco incisos, os valores maiores que orientam nosso Estado. 
O constituinte denomi nou esses valores mais gerais de "fundamentos 
da República Federativa do Brasi l", exatamente para transmitir a noção de 
alicerces, de vigas mestras de nossa ordenação polít ico-j urídica. 
Os fundamentos da Repúbl ica Federativa do Brasi l são: ( 1 ) a soberania; 
(2) a cidadania; (3 ) a dignidade da pessoa humana; (4) os valores sociais do 
trabalho e da livre-iniciativa; e (5) o p lural ismo pol ítico. 
94 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO • Vicente Paulo & Marcelo Alexandrino 
A soberania significa que o poder do Estado brasileiro, na ordem in­
terna, é superior a todas as demais manifestações de poder, não é superado 
por nenhuma outra fonna de poder, ao passo que, em âmbito internacional, 
encontra-se em igualdade com os demais Estados independentes. 
Ao alçar a cidadania a fundamento de nosso Estado, o constituinte está 
util izando essa expressão em sentido abrangente, e não apenas técnico-jurídico. 
Não se satisfaz a cidadania aqui enunciada com a simples atribuição fonnal 
de direitos políticos ativos e passivos aos brasileiros que atendam aos requi­
sitos legais. É necessário que o Poder Público atue, concretamente, a fim de 
incentivar e oferecer condições propícias à efetiva participação política dos 
indivíduos na conduçãodos negócios do Estado, fazendo valer seus direitos, 
controlando os atos dos órgãos públ icos, cobrando de seus representantes 
o cumprimento de compromissos assumidos em campanha eleitoral, enfim, 
assegurando e oferecendo condições materiais para a integração i rrestrita do 
indivíduo na sociedade política organizada. 
A d ignidade da pessoa humana como fundamento da República Fede­
rativa do Brasil consagra, desde logo, nosso Estado como uma organização 
centrada no ser humano, e não em qualquer outro referencial . A razão de 
ser do Estado brasi leiro não se funda na propriedade, em classes, em cor­
porações, em organizações religiosas, tampouco no próprio Estado (como 
ocorre nos regimes totalitários), mas sim na pessoa humana. Na feliz síntese 
de Alexandre de Moraes, "esse fundamento afasta a ideia de predomínio das 
concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da l iberdade 
individual". São vários os valores constitucionais que decorrem diretamente 
da ideia de dignidade humana, tais como, dentre outros, o direito à vida, à 
intimidade, à honra e à imagem. 
A dign idade da pessoa humana assenta-se no reconhecimento de duas 
posições jurídicas ao indivíduo. De um lado, apresenta-se como um direito 
de proteção individual, não só em relação ao Estado, mas, também, frente 
aos demais indivíduos. De outro, constitui dever fundamental de tratamento 
igualitário dos próprios semelhantes. 
É fundamento do nosso Estado, ainda, o valor social cio trabalho e da 
l ivre-in iciativa. Assim dispondo, nosso constituinte configura o Brasil como 
um Estado obrigatoriamente capitalista e, ao mesmo tempo, assegura que, 
nas relações entre capital e trabalho será reconhecido o valor social deste 
último. No art. 1 70, a Constituição reforça esse fundamento, ao estatu i r 
que "a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na 
l ivre-iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, confonne os 
ditames da justiça social". 
Por último, nossa Carta arvora o pluralismo político em fundamento da 
República Federativa do Brasi l , implicando que nossa sociedade deve reco-
Cap. 3 • PRINCIPIOS, DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS 95 
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nhecer e garantir a inclusão, nos processos de formação da vontade geral, 
das diversas correntes de pensamento e grupos representantes de interesses 
existentes no seio do corpo comunitário. 
O art. 2 .0 da Constituição de 1 988 define como Poderes da República 
Federativa do Brasil , independentes e harmônicos entre si , o Legislativo, o 
Executivo e o Judiciário. Esse artigo consagra o princípio da separação dos 
Poderes, ou princípio da divisão funcional do poder do Estado. 
O critério de divisão funcional consiste em atribuir a órgãos indepen­
dentes entre si o exercício precípuo das funções estatais essenciais. Assim, 
ao Poder Executivo incumbe, tipicamente, exercer as funções de Governo e 
Administração (execução não contenciosa das leis); ao Poder Legislativo cabe 
precipuamente a elaboração das leis (atos normativos primários); ao Poder 
Judiciário atribui-se, como função típica, o exercício da jurisdição (dizer o 
direito apl icável aos casos concretos, na hipótese de l i t ígio). 
A lém dos fundamentos da República Federativa do Brasil , o constitu inte 
de 1 988 explicitou, no art. 3 .0 de nossa Carta Pol ítica, obj etivos fun damen­
ta is a serem perseguidos pelo Estado Brasileiro. 
Os objetivos fundamentais do Estado brasile iro arrolados no art. 3 .º da 
Constituição são: 
1 - construir uma sociedade l ivre, j usta e solidária; 
II - garantir o desenvolvimento nacional; 
III - erradicar a pobreza e a marginal ização e reduzir as desi­
gualdades sociais e regionais; 
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, 
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 
Constata-se que esses objetivos têm em comum assegurar a igualdade 
material entre os brasi leiros, possibilitando a todos iguais oportunidades para 
alcançar o pleno desenvolvimento de sua personalidade, bem como para auto­
determinar e lograr atingir suas aspirações materiais e espirituais, condizentes 
com a dignidade inerente a sua condição humana. Como bem resume José 
Afonso da Silva, alguns dos objetivos assinalados "valem como base das 
prestações positivas que venham a concretizar a democracia econômica, social 
e cultural, a fim de e fetivar na prática a dign idade da pessoa humana". 
O art. 4.0, que final iza o Títu lo 1 da Constituição de 1 988, enumera dez 
princípios fu ndamen tais orientadores das relaçües do Brasil na ordem 
i n ternacional. É esta a sua redação: 
Art. 4.º A Repúbl ica Federativa do Brasil rege-se nas suas 
relações internacionais pelos seguintes princípios: 
96 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO • Vicente Pauro & Marcelo Alexandrino 
----------------------
1 - independência naciona l ; 
I I - prevalência dos direitos humanos; 
l l I - autodeterminação dos povos; 
IV - não intervenção; 
V - igualdade entre os Estados; 
VI - defesa da paz; 
VII - solução pacífica dos conflitos; 
V I I I - repúdio ao terrorismo e ao racismo; 
IX - cooperação entre os povos para o progresso da huma­
nidade; 
X - concessão de asilo político. 
Parágrafo único. A República Federativa do Bras i l buscará a 
integração econômica, política, social e cultural dos povos da 
América Latina, visando à formação de uma comunidade latino­
-americana de nações. 
De um modo geral, esses princípios consubstanciam o reconhecimento 
da soberania, no plano internacional, como elemento igualador dos Estados, 
além de reconhecer, também nesse âmbito, o ser humano como centro das 
preocupações da nossa República. 
Assim, reforça-se a independência nacional como princípio (art. 4.0, 
I ), que nada mais é do que a man ifestação da soberania na ordem inter­
nacional. Como corolário, tem-se a igualdade en tre os Estados (art. 4 .º, 
V), consagração do princípio da não subordinação no plano internacional . 
Trata-se, aqui, de uma igualdade formal, essencialmente j urídica, uma vez 
que na esfera econômica são absurdamente desiguais as condições existentes 
entre os Estados. De toda sorte, uma noção de busca de igualdade material 
se manifesta no princípio da colaboração entre os Estados. A Constituição 
de 1 988 agrega ao princípio da colaboração o fim a ser perseguido mediante 
essa cooperação mútua, qual seja, o progresso da humanidade (cooperação 
entre os povos para o progresso da humanidade - - art. 4.0, IX). 
O princípio da não intervenção (art. 4_º, IV), e seu correlato, a au to­
determinação cios povos (art. 4_º, I I I ) , também têm origem no reconheci­
mento da igualdade entre os Estados. Respei ta-se a soberania de cada um, 
assegurando-se que, no âmbito interno, os Estados não devem sofrer ingerên­
cia na condução de seus assuntos. Vale lembrar que não existem princípios 
absolutos, devendo sua convivência seguir a lógica da ponderação. Assim, 
o inciso II do art. 4 .º enuncia como princípio fundamental i nternacional a 
prevalência dos direitos humanos, o que, em casos extremos de afronta 
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	CONS DES 2015_068_1L
	CONS DES 2015_068_2R
	CONS DES 2015_069_1L
	CONS DES 2015_069_2R
	CONS DES 2015_070_1L
	CONS DES 2015_070_2R
	CONS DES 2015_071_1L

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