Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original
HEPATITES VIRAIS Geral As Hepatites B e C são inflamações no fígado causadas vírus e constituem um grave problema de saúde pública no mundo. As hepatites B e C costumam ser silenciosas e acabam sendo descobertas quando a doença já está muito evoluída, com cirrose ou até com câncer de fígado (hepatocarcinoma). Sendo assim, a transmissão das Hepatites B e C pode ocorrer pelo compartilhamento de objetos contaminados como lâminas de barbear e de depilar, escovas de dentes, alicates de unha, instrumentos para uso de drogas injetáveis (cocaína, anabolizantes e complexos vitamínicos), inaláveis (cocaína) e pipadas (crack), uso de materiais não esterilizados para colocação de piercing e para confecção de tatuagens, através de acidentes com exposição a material biológico e procedimentos cirúrgicos, odontológicos e de hemodiálise, em que não se aplicam as normas adequadas de biossegurança. Sintomas É muito comum que pessoas portadoras de hepatites não apresentem nenhum sintoma. Caso ocorra são os mesmos das outras hepatites: falta de apetite, náuseas, vômitos, diarreia, febre baixa, dor de cabeça, mal-estar, cansaço, dores no corpo, evoluindo para icterícia (amarelão) e dor abdominal. Diagnóstico e Tratamento Atualmente existem os testes rápidos que são exames de triagem para as hepatites B e C. O teste rápido é gratuito e está disponível para população a partir dos 2 anos de idade nas Unidades de saúde. O diagnóstico é confirmado através do exame de sangue laboratorial. Tratamento Após confirmação diagnóstica da hepatite B e C o usuário deve ser encaminhado aoserviço especializado de referência. Na hepatite B a doença aguda não é tratada. Na hepatite C a doença aguda pode ser tratada e evoluir para cura. Se hepatite B ou C crônica, existem critérios de tratamento e medicamentos adequados. Os tratamentos são obtidos através do componente especializado da Assistência Farmacêutica, ou seja, através de processos administrativos. Medidas de prevenção comuns às Hepatites B e C Sexo seguro: uso de preservativos masculinos ou femininos; Evitar compartilhamento de objetos pessoais: lâminas de barbear e depilar, escovas de dentes, alicates de unha e outros; Evitar compartilhamento de instrumentos de drogadição; Frequentar locais (consultórios e clínicas médicas e dentárias, estúdios de tatuagem e colocação de piercings, salões de beleza, entre outros) que seguem as normas de biossegurança da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Visão geral HEPATITE B Introdução Acredita-se que as hepatites virais sejam a maior causa de transplantes hepáticos no mundo. Entre elas, há a hepatite B, uma doença de elevada transmissibilidade e impacto em saúde pública. Aproximadamente um terço da população mundial atual já se expôs ao vírus da hepatite B (HBV) – e estima- se que 240 milhões de pessoas estejam infectadas cronicamente. A hepatite B é responsável por aproximadamente 780.000 óbitos ao ano no mundo. A história natural da infecção pelo HBV é marcada por evolução silenciosa: muitas vezes, a doença é diagnosticada décadas após a infecção. Os sinais e sintomas são comuns às demais doenças parenquimatosas crônicas do fígado e costumam manifestar- se apenas em fases mais avançadas da doença. Diferentemente da infecção pelo vírus da hepatite C, a hepatite B não necessita evoluir para cirrose hepática para causar o hepatocarcinoma/carcinoma hepatocelular (CHC). No Brasil, apesar da introdução da vacina na Amazônia Ocidental, em 1989, e dos esforços progressivos em imunização e prevenção no Sistema Único de Saúde (SUS), a transmissão da hepatite B ainda é uma realidade. Aproximadamente 17.000 novos casos são detectados e notificados anualmente, o que contribui para evidenciar o impacto da doença no território brasileiro. As hepatites virais são eventos que impactam a saúde pública em todo o mundo. A perda de qualidade de vida dos pacientes e dos comunicantes exige esforços no sentido de fortalecer a promoção à saúde, vigilância, prevenção e controle desses agravos. Epidemiologia De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se que aproximadamente dois bilhões de indivíduos tenham tido contato com o HBV; desses, 240 milhões têm hepatite B crônica. A infecção crônica pode evoluir para cirrose e para o CHC, eventos de elevada morbimortalidade. A epidemiologia da hepatite B não é homogênea no cenário nacional; as áreas em que há dificuldade de acesso aos serviços de saúde são desproporcionalmente afetadas. As populações tradicionais, remanescentes de quilombos e povos indígenas constituem grupos residentes em áreas silvestres ou pouco urbanizadas e estão expostas a um maior risco de transmissão da doença – incluindo transmissão vertical –, o que reforça as evidências de maior prevalência de hepatite B em populações de locais com menor complexidade urbana. Em áreas em que a assistência está presente e é de fácil acesso para a população, há grupos populacionais específicos que, independentemente da oferta de serviços de saúde, ainda enfrentam obstáculos a esse acesso. São exemplos desses grupos: profissionais do sexo, pessoas que usam drogas, pessoas privadas de liberdade e pessoas em situação de rua. Além de apresentarem elevado risco para a hepatite B, essas populações também estão expostas a outros agravos e barreiras que prejudicam os resultados de estratégias de prevenção, diagnóstico, assistência e vigilância. Os estudos epidemiológicos sobre hepatite B e coinfecções realizados no Brasil, disponíveis em acervo digital, datam desde 1987. Agente etiológico e história natural da doença A hepatite viral B é causada por um vírus DNA pertencente à família Hepadnaviridae. Os vírus dessa família têm características em comum, como fita dupla incompleta e replicação do genoma viral por enzima transcriptase reversa. No entanto, apenas no gênero Orthohepadnavirus estão os vírus que infectam mamíferos, sendo que o HBV tem a característica de infectar humanos e também outros primatas superiores não humanos; porém, isso é menos frequente. O genoma do HBV é composto por um DNA circular e parcialmente duplicado de aproximadamente 3.200 pares de bases. Uma de suas fitas é maior que a outra. As partículas virais esféricas possuem diâmetro de 42 nm e são compostas de envelope externo proteico que constitui o HBsAg. O glicocapsídeo possui simetria icosaédrica e é constituído pela proteína do core ou núcleo (HBcAg) e pelo genoma viral. É considerado um vírus oncogênico e apresenta dez genótipos, classificados de A a J. Estes são distintos entre si pela sequência de nucleotídeos no genoma, patogenicidade e distribuição geográfica. Alguns genótipos do HBV são classificados em subgenótipos, exceto E, G e H. Mais de 30 subgenótipos já foram identificados. O genótipo A está presente na África subsaariana, África, Norte da Europa e África Ocidental; os genótipos B e C, na Ásia; o genótipo C, no Sudeste Asiático; o genótipo D, na África, Europa e Índia; o genótipo G, na França, Alemanha e Estados Unidos; o genótipo H, nas Américas do Sul e Central; o genótipo I, no Vietnã e Laos; e o genótipo J, no Japão. No Brasil, alguns estudos identificaram a predominância dos subgenótipos A1, A2, F2a e F4. O HBV possui tropismo pela célula hepática e, ao se ligar a receptores presentes na superfície celular, é internalizado e perde seu envoltório. Em seguida, o conteúdo viral migra para o núcleo e replica-se por meio de um sistema semelhante ao dos retrovírus. Entende- se que a variabilidade de resultados no tratamento e na evolução da hepatite crônica poderia ser atribuída às características virais. Alguns genótipos apresentariam melhor resposta ao tratamento com alfainterferona; outros genótipos aparentariam possuir maior potencial carcinogênico. Entretanto, até o momento, não há evidências que suportem a escolha da terapêutica em função da genotipagem do HBV. A hepatite B é uma doença de transmissão parenteral. A transmissão do agente infeccioso pode ocorrer por solução de continuidade (pele e mucosas), via parenteral (compartilhamento de agulhas, seringas, material de manicure e pedicure, lâminas de barbear e depilar, tatuagens, piercings, procedimentos odontológicos ou cirúrgicos que não atendam às normas de biossegurança, entre outros) e relações sexuais desprotegidas, sendo esta a via predominante. A transmissão vertical (materno-infantil) também é importante e ocasiona uma evolução desfavorável, com maior chance de cronificação. O HBV permanece viável durante longo período quando fora do corpo, como, por exemplo, em uma gota de sangue, e tem maiores chances de infectar um indivíduo suscetível do que os vírus da hepatite C (HCV) e da imunodeficiência humana (HIV). Outros líquidos orgânicos – como sêmen, secreção vaginal e leite materno – também podem conter o vírus e representar fontes de infecção. A infecção pelo vírus da hepatite B pode causar hepatite aguda ou crônica; habitualmente, ambas as formas são oligossintomáticas (poucos sintomas ou nenhum sintoma característico). Infecções causadas pelo vírus da hepatite B raramente causam icterícia (coloração amarelada de pele, mucosas e escleróticas): menos de um terço dos indivíduos infectados apresenta esse sinal clínico. Aproximadamente 5% a 10% dos indivíduos infectados tornam-se portadores crônicos do HBV. Cerca de 20% a 25% dos casos crônicos de hepatite B que apresentam replicação do vírus evoluem para doença hepática avançada. A infecção pelo HBV também é condicional para o desenvolvimento da hepatite Delta, doença resultante da infecção pelo HDV e de grande impacto na Região Amazônica. Para o acompanhamento da infecção, utilizam-se marcadores séricos de imunidade (anti-HBs), a avaliação da presença do antígeno de superfície do HBV (HBsAg) e a quantificação do vírus na corrente sanguínea (carga viral/HBV-DNA). O aparecimento do anti-HBs e o desaparecimento do HBsAg e da carga viral indicam resolução da infecção pelo HBV na maioria dos casos. Em raras situações, a doença pode evoluir para a forma crônica, mesmo com esse perfil sorológico e viral. Em indivíduos adultos expostos exclusivamente ao HBV, a cura espontânea se dá em cerca de 90% dos casos. A evolução para infecção crônica, por sua vez, ocorre em menor proporção – e é definida como a persistência do vírus ou a presença do HBsAg por mais de seis meses, detectada por meio de testes sorológicos. Os extremos de idade e outros fatores comportamentais e genéticos, características demográficas ou concomitância de substâncias tóxicas – incluindo álcool, fumo, história familiar de CHC e contato com carcinógenos como aflatoxinas, por exemplo – aumentam o risco de cirrose hepática e de CHC em pacientes portadores da hepatite B crônica. A replicação viral persistente, a presença de cirrose, o genótipo C do HBV, a mutação na região promotora do pré-core e a coinfecção com o HIV ou HCV também são fatores que aumentam a probabilidade de evolução para formas graves. Embora a cirrose seja fator de risco para CHC, 30% a 50% dos casos de CHC por HBV ocorrem na ausência desta. Vias de contágio A Hepatite B é transmitida pelo esperma e secreção vaginal (via sexual) e pelo contato com sangue (via parenteral, percutânea e vertical). Período de transmissibilidade da Hepatite B A transmissão da hepatite B se estende de 2 a 3 semanas antes de aparecerem os sintomas, até o término da doença. Em caso de cronificação o paciente permanece transmitindo a hepatite B. Hepatite B em gestante e RN No pré-natal deve-se realizar testagem para hepatite B no 1º trimestre e no 3º trimestre de gestação. Para os recém-nascidos de mães com hepatite B é importante receber a 1ª dose da vacina contra o vírus da hepatite B a e imunoglobulina contra a hepatite B preferencialmente nas primeiras 12 horas de vida. A amamentação é liberada. Diagnóstico e apresentação clínica e laboratorial O diagnóstico preciso e precoce da infecção pelo HBV permite o tratamento adequado da doença e tem impacto direto sobre a qualidade de vida do indivíduo, sendo ainda um poderoso instrumento de prevenção de complicações como a cirrose e o CHC. Em vista disso, o DIAHV e especialistas em diagnóstico clínico e laboratorial elaboraram o Manual Técnico para o Diagnóstico das Hepatites Virais. Esse documento tem como objetivos oferecer orientações aos profissionais de saúde e ampliar o acesso ao diagnóstico das hepatites virais. A publicação apresenta algoritmos (fluxogramas) a serem seguidos para o diagnóstico seguro e eficiente da infecção por HBV em diferentes situações e localidades, inclusive aquelas em que a infraestrutura laboratorial não esteja presente. 1) Testes rápidos Os testes rápidos (TR) são ensaios de execução simples e que não necessitam de estrutura laboratorial, embora, a depender da amostra trabalhada, sejam necessários cuidados essenciais de biossegurança. Por isso, os TR são fundamentais para a ampliação do acesso ao diagnóstico, sendo recomendados primariamente para testagens presenciais. Para a hepatite B, o Ministério da Saúde realiza a distribuição de testes rápidos capazes de detectar o HBsAg (antígeno de superfície do vírus da hepatite B). O Telelab, plataforma de ensino a distância voltada para o treinamento de profissionais que atuam na área da saúde, permite a capacitação para realização de diferentes TR. A ferramenta está disponível no site: <www.telelab.aids.gov.br>. 2) Imunoensaios São exames sorológicos para a detecção de anticorpo ou testes de detecção combinada de antígeno e anticorpo contra o HBV. Para fins de otimização do diagnóstico e dos recursos, recomenda-se a realização dos testes para detecção de HBsAg e do anti-HBC. Entretanto, mais testes são necessários para caracterizar a fase da infecção pelo HBV. É necessário compreender que a infecção pelo HBV é um processo dinâmico, dividido em cinco fases: I) Fase imunotolerante Nessa fase, há elevada replicação viral (>20.000 UI/mL), sem evidências de agressão hepatocelular. A denominação de fase de imunotolerância deve-se ao fato de a replicação viral ser tolerada pelo sistema imunológico do hospedeiro. Assim, a fase é caracterizada por positividade de HBeAg e elevados índices de HBV-DNA sérico, indicativos de replicação viral. Também é caracterizada por níveis de aminotransferases normais ou próximos do normal, pouca atividade necroinflamatória no fígado e lenta progressão de fibrose. Essa fase é geralmente mais longa nos indivíduos infectados por transmissão vertical. Em virtude da elevada viremia, os pacientes nessa fase podem transmitir a doença com maior facilidade. II) Fase imunorreativa Nessa fase, a tolerância imunológica esgota-se diante da incapacidade do sistema imune de eliminar o vírus. É caracterizada pelo teste HBeAg reagente e por menores índices de HBV-DNA sérico, indicativo de menor replicação viral. Os valores das aminotransferases podem apresentar flutuações, e a atividade necroinflamatória no fígado, por sua vez, pode ser moderada ou grave. A progressão da fibrose é acelerada. Essa fase pode durar de várias semanas a vários anos e é alcançada mais rapidamente por indivíduos infectados na idade adulta. Encerra-se com a soroconversão para anti-HBe. III) Estado de portador inativo Devido à dinâmica da hepatite B, é necessário acompanhar os níveis de aminotransferases e HBV-DNA sérico antes de classificar o paciente nessa fase. Ela é caracterizada por níveis muito baixos – ou até mesmo indetectáveis – de HBV- DNA sérico, com normalização das aminotransferases e, habitualmente, soroconversão anti-HBe. Nessa situação, o sistema imunológico do hospedeiro é capaz de reprimir a replicação viral, reduzindo o risco de cirrose e CHC. Esse processo corresponde a um bom prognóstico. Pacientes que estejam estabelecidos nessa fase devem ser acompanhados regularmente e submetidos a investigação clínica se apresentarem elevações de transaminases com baixos títulos de HBV- DNA sérico. O acompanhamento regular também permite rápida detecção de escape viral, resultado da imunossupressão ou de mutações que conferem ao vírus a capacidade de evadir a resposta imune do hospedeiro. IV) Fase de reativação Essa fase pode surgir após o período inativo, quando ocorrerem mutações na região pré-core e/ou core-promoter do vírus, mantendo-se a replicação viral mesmo na vigência de HBeAg não reagente. A atividade necroinflamatória e de fibrose no fígado persistem durante essa fase. A hepatite B crônica HBeAg não reagente também está associada a baixas taxas de remissão espontânea e risco elevado para complicações, como cirrose descompensada e CHC. O acompanhamento regular é imperativo para o paciente nessa fase. V) Fase HBsAg negativa (não reagente) Mesmo após resposta imune com eliminação do HBsAg, há possibilidade de uma baixa replicação viral (índices indetectáveis ou muito baixos de HBV-DNA sérico). Existem poucas informações sobre a importância dessa infecção oculta e persistente, mas compreende-se que a reativação pode ocorrer em pacientes com perfil sorológico atípico, caracterizado pela presença de anti-HBc reagente, independentemente da reatividade para anti-HBs. O acompanhamento regular também está indicado para os pacientes nessa fase, principalmente em situações de imunossupressão. Objetivos do tratamento O objetivo principal do tratamento é reduzir o risco de progressão da doença hepática e de seus desfechos primários, especificamente cirrose, CHC e óbito. Desfechos substitutivos ou intermediários – como níveis de HBV-DNA, títulos de aminotransferases e marcadores sorológicos – estão validados e têm sido utilizados como parâmetros para inferir a probabilidade de benefícios da terapêutica em longo prazo. O conjunto desses exames pode refletir supressão da replicação viral sustentada e atividade necroinflamatória no fígado, reduzindo o risco de complicações, de progressão para cirrose e de CHC. Resultado ideal: a perda sustentada do HBsAg, com ou sem soroconversão para anti-HBs, é o resultado ideal da terapia. Esse perfil corresponde à completa remissão da atividade da hepatite crônica; porém, raramente é alcançado. Portanto, devem-se buscar desfechos alternativos para pacientes com HBsAg persistente e HBeAg reagente ou HBeAg não reagente: soroconversão para anti-HBe, redução de carga viral (resposta virológica) e/ou normalização de ALT (resposta bioquímica). Pacientes com HBsAg persistente: o HBeAg reagente: quando o resultado ideal é improvável, a soroconversão para anti-HBe é um desfecho satisfatório, pois essa resposta está associada a um melhor prognóstico. Independentemente da soroconversão para anti-HBe e da negativação do HBeAg, deve-se buscar a normalização da ALT e a redução do HBV-DNA para menos de 2.000 UI/mL ou no limite de indetectabilidade. o HBeAg não reagente e anti-HBe reagente: o desfecho que se busca é a normalização da ALT e a redução do HBV-DNA para menos de 2.000 UI/mL ou no limite de indetectabilidade. Pacientes portadores de cirrose hepática: a redução da carga viral e o desaparecimento do HBeAg, espontâneos ou induzidos por tratamento, associam-se à diminuição no risco de carcinogênese, descompensação clínica e melhora da qualidade de vida. Sobre as consultas A hepatite B é uma doença que exige disciplina do paciente e compreensão do profissional de saúde para rápida identificação de situações que interfiram de forma significativa no sucesso do acompanhamento e na adesão ao tratamento. Assim, é fundamental que o profissional de saúde estabeleça uma sólida relação com o paciente. Para o adequado atendimento ao paciente portador de hepatite B crônica, é importante que os elementos da anamnese e do exame físico sejam respeitados e descritos corretamente em prontuário – e que façam parte da rotina dos serviços de triagem e referência. O mesmo cuidado deve ser dispensado ao preenchimento das fichas utilizadas na notificação do agravo no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) e à solicitação de exames. A adesão do paciente portador de hepatite B crônica ao serviço de saúde é fundamental para o sucesso das estratégias de atenção à saúde. Além de pesquisar comorbidades e coinfecções por HCV, HDV e HIV, faz-se necessária uma cuidadosa avaliação pré- tratamento das condições clínicas, psiquiátricas e sociais do paciente. Devido às características fisiopatológicas da infecção crônica pelo HBV, é necessário que as consultas sejam realizadas, no mínimo, duas a quatro vezes ao ano. Essa periodicidade deve ser individualizada para os pacientes em que a terapêutica tenha sido recém-iniciada ou em que o risco de eventos adversos exija cuidado prioritário. As orientações de prevenção às hepatites virais devem ser compartilhadas com os contatos domiciliares e parceiros sexuais. A prevenção requer atitudes e práticas seguras – a exemplo do uso adequado do preservativo e do não compartilhamento de instrumentos perfurocortantes e objetos de higiene pessoal, como escovas de dente, alicates de unha, lâminas de barbear ou depilar. Essas orientações devem permear todos os momentos do atendimento aos portadores de HBV. Exames complementares A abordagem laboratorial inicial e de rotina do paciente portador de hepatite B crônica possui múltiplos objetivos: os exames podem definir o momento de início do tratamento; o tipo de tratamento instituído; a qualidade da resposta obtida com a terapêutica; e o rastreamento de CHC. Para facilitar o monitoramento do paciente portador de hepatite B crônica e auxiliar no melhor uso dos recursos técnicos e financeiros, o DIAHV, com o apoio dos CTA, recomenda exames complementares conforme listados neste documento. Contudo, salienta-se que exames adicionais ou modificações na rotina de exames poderão ocorrer conforme a presença de comorbidades e a consequente instituição – ou não – de tratamento antiviral. * Caso o paciente não apresente anti-HAV reagente (exposição anterior ao vírus da hepatite A), a imunização ativa com vacina para hepatite A está recomendada. ** Os exames são recomendados para os pacientes procedentes de região endêmica. Nos demais casos, os exames são recomendados apenas nas situações de descompensação clínica. *** Não se aplica aos casos em que forem identificados antecedentes de hemorragia digestiva alta ou varizes em EDA (74). **** Embora não seja obrigatória para iniciar o tratamento, a biópsia hepática deverá ser realizada em casos nos quais há dúvida diagnóstica, para auxiliar na decisão de iniciar ou postergar o tratamento (10). ***** Métodos não invasivos de avaliação de fibrose podem ser úteis para identificar o estágio de fibrose avançada (F3 e F4) – mas os resultados podem ser alterados na presença de intensa atividade inflamatória com elevação dos níveis de ALT. Situações clínicas, indicação de tratamento e recomendações terapêuticas Publicações recentes recomendam que decisões sobre o tratamento e conduta terapêutica sejam baseadas nos seguintes fatores: características individuais e familiares (história de CHC, comorbidades e gestação); quadro clinico apresentado; perfil sorológico (HBeAg); elevação dos níveis de ALT, quando excluídas outras causas; níveis de HBV-DNA; e histologia hepática, quando disponível. Com o diagnóstico de hepatite B crônica (definido como persistência do vírus ou a presença do HBsAg por mais de seis meses), os pacientes devem ser prontamente avaliados quanto a indicação de tratamento. Pode-se proceder ao tratamento conforme os critérios de inclusão, na ausência de HBsAg por mais de seis meses, desde que se mantenha a investigação epidemiológica do caso. Critérios de inclusão para tratamento da hepatite B sem agente Delta: Paciente com HBeAg reagente e ALT > 2x limite superior da normalidade (LSN); Adulto maior de 30 anos (3, 32) com HBeAg reagente; Paciente com HBeAg não reagente, HBV-DNA >2.000 UI/mL e ALT > 2x LSN. Outros critérios de inclusão para tratamento independentemente dos resultados de HBeAg, HBV-DNA e ALT para hepatite B sem agente Delta: História familiar de CHC; Manifestações extra-hepáticas com acometimento motor incapacitante, artrite, vasculites, glomerulonefrite e poliarterite nodosa; Coinfecção HIV/HBV ou HCV/HBV; Hepatite aguda grave (coagulopatias ou icterícia por mais de 14 dias); Reativação de hepatite B crônica; Cirrose/insuficiência hepática; Biopsia hepática METAVIR ≥ A2F2 ou elastografia hepática > 7,0 kPa; Prevenção de reativação viral em pacientes que irão receber terapia imunossupressora (IMSS) ou quimioterapia (QT) (Anexo B). Contraindicações ao tratamento com alfapeguinterferona: Consumo atual de álcool e/ou drogas; Cardiopatia grave; Disfunção tireoidiana não controlada; Distúrbios psiquiátricos não tratados; Neoplasia recente; Insuficiência hepática; Antecedente de transplante, exceto hepático; Distúrbios hematológicos: anemia, leucopenia, plaquetopenia; Doença autoimune; Intolerância ao medicamento. Contraindicações ao tratamento com tenofovir: Doença renal crônica; Osteoporose e outras doenças do metabolismo ósseo; Terapia antirretroviral com didanosina (ddI); Cirrose hepática (contraindicação relativa); Intolerância ao medicamento. 3) Biópsia hepática A biópsia hepática é o exame padrão-ouro para a avaliação da fibrose hepática; porém, é excepcional na avaliação de hepatite B crônica e reservada aos casos em que há dúvidas na indicação de tratamento. Pode ser realizada com diferentes técnicas e tipos de agulha. Além disso, é útil no diagnóstico de outras doenças hepáticas concomitantes com hepatite viral crônica – como a doença gordurosa, que impacta de maneira significativa a evolução dos casos e o manejo dos pacientes. Entretanto, a biópsia hepática é um procedimento invasivo, que requer uma estrutura apropriada. O adequado treinamento dos profissionais envolvidos é fundamental para o sucesso da biópsia hepática – desde a coleta do fragmento até o seu preparo e a interpretação do exame. Dá-se preferência à biópsia por agulha transcutânea, pois esta permite a retirada de fragmentos de áreas distantes da cápsula de Glisson e dispensa a anestesia geral. Na realização de biópsia em cirurgia, orienta-se o cirurgião a realizar coleta de material em cunha profunda e evitar a região subcapsular. A biópsia também pode ser realizada por via transjugular, mas a realização desse procedimento está restrita aos centros de alta complexidade, mediante a contraindicação dos demais métodos apresentados. A principal limitação da biópsia é o erro de amostragem – muitas vezes relacionado ao tamanho do fragmento e ao local do qual foi coletado. A biópsia ideal deve ser cilíndrica, não fragmentada, contendo de 10 a 20 espaços-porta. Após a coleta, o material deverá ser imediatamente fixado em formol tamponado a 10% ou formol em salina a 10% e encaminhado ao laboratório de anatomia patológica. A biópsia hepática percutânea é contraindicada nos seguintes casos: Contraindicações relativas: ascite, obesidade mórbida, possibilidade de lesões hepáticas vasculares, amiloidose, incapacidade de cooperação do paciente; Contraindicações absolutas: coagulopatia grave, infecção no parênquima hepático, obstrução biliar extrahepática. São critérios necessários à realização da biópsia: Doença hepática compensada; Contagem de plaquetas > 60.000/mm3 Atividade de protrombina > 50%. Para pacientes que apresentem contraindicações ou não preencham os critérios necessários, recomenda-se a utilização de métodos não invasivos de avaliação hepática, validados na prática clínica. Há diversos sistemas para estadiar as hepatites crônicas. Neste PCDT, utiliza-se o METAVIR para caracterizar fibrose hepática. A correspondência aproximada com outras classificações anotomopatológicas é apresentada nas tabelas a seguir: 4) Elastografia hepática Realizado por meio de diferentes metodologias, esse procedimento não invasivo permite a estratificação dos graus de fibrose. Uma de suas principais vantagens é a avaliação de uma área maior do que a pesquisada por fragmento de biópsia hepática. Suas principais limitações são a especificidade da tecnologia; o inadequado treinamento do profissional de saúde que realiza o exame; o custo; a necessidade de atualização e manutenção de equipamentos; e a potencial interferência em situações que aumentem a rigidez hepática, independentemente de fibrose e de atividade necroinflamatória (ALT > 5x LSN), colestase e ascite. A elastografia também pode apresentar mau desempenho em casos de obesidade (IMC > 30 kg/m2), com falhas em aproximadamente 20% dos casos. Identificação da cirrose descompensada A cirrose compensada é geralmente distinguida da cirrose descompensada por meio do escore de Child-Pugh, utilizado para avaliar o grau de deterioração da função hepática, além de ser marcador prognóstico. O escore de Child-Pugh é calculado somando-se os pontos dos cinco fatores abaixo, que vão de 5 a 15. As classes de Child-Pugh são: A (escore de 5 a 6), B (7 a 9) ou C (acima de 10). Em geral, a descompensação indica cirrose com um escore de Child-Pugh > 7 (classe B de Child-Pugh), sendo esse nível um critério aceito para inclusão no cadastro de transplante hepático. Tratamento da hepatite b crônica Em função dos novos avanços da medicina na assistência à hepatite B – e de questões relacionadas à segurança, posologia, custo, abrangência de pacientes tratados e efetividade do tratamento–, este PCDT opta por não recomendar os medicamentos alfainterferona e adefovir. Ressalta-se que os pacientes em uso dos medicamentos em terapia finita têm seu tratamento garantido, e aqueles em terapia contínua com análogos devem ser orientados quanto à substituição apropriada por um dos fármacos recomendados a seguir. Com este novo PCDT, adiciona-se ao arsenal terapêutico do SUS alfapeguinterferona, citocina com ação antiviral e imunomoduladora, e amplia-se a participação de entecavir e tenofovir, análogos nucleos(t)ídeos de maior eficácia e barreira genética. A alteração no arsenal terapêutico busca simplificar o tratamento para pacientes, profissionais de saúde e gestores – tornando-o mais eficaz e zelando pelo contínuo aprimoramento do SUS. As novas opções também oferecem facilidade posológica e menos efeitos adversos. Este documento contém fluxogramas para o tratamento da hepatite B. 1) Posologia Alfapeguinterferona 2a 40 KDa – 180 mcg/semana viacsubcutânea (SC) Alfapeguinterferona 2b 12 KDa – 1,5 mcg/kg/semanacvia SC Entecavir 0,5 mg – 0,5-1,0 mg/dia via oral (VO) Tenofovir (fumarato de tenofovir desoproxila) 300 mgc– 300 mg/dia VO A experiência da utilização da alfapeguinterferona 2a ou alfapeguinterferona 2b são equivalentes em pacientes virgens de terapia. A escolha do medicamento a ser utilizado deve estar subordinada à garantia de sustentabilidade financeira e à progressão da assistência no SUS. 2) Ajustes posológicos e segurança: Alfapeguinterferona: não há interações medicamentosas conhecidas. Entecavir: os efeitos da coadministração de entecavir com medicamentos excretados pelos rins, que afetam a função renal – ciclosporina e tacrolimo – ainda não foram avaliados. Tenofovir: a coadministração de tenofovir e didanosina resultou em aumento da exposição sistêmica à didanosina, o que pode elevar o risco de eventos adversos. A coadministração não está recomendada. 3) Tratamento com tenofovir Todos os pacientes que apresentam os critérios de inclusão de tratamento são candidatos à terapia com tenofovir, um análogo de nucleotídeo que bloqueia a ação da enzima transcriptase reversa. Esse medicamento constitui a primeira linha de tratamento para a hepatite B crônica. Apresenta elevada potência de supressão viral e alta barreira genética de resistência contra as mutações do HBV. Embora bem tolerado, o tenofovir está associado a toxicidade renal e a desmineralização óssea, particularmente no tratamento de pessoas vivendo com HIV/aids e doença renal pregressa. Seu uso está contraindicado em pacientes com doença renal crônica, osteoporose e outras doenças do metabolismo ósseo, além de pacientes portadores de coinfecção HIV/HCV em terapia antirretroviral com didanosina. Pacientes portadores de cirrose hepática apresentaram melhora clínica e histológica com o uso de tenofovir em cinco anos de terapia; entretanto, recomenda- se cautela na escolha desse tratamento. 4) Tratamento com entecavir Nas situações em que houver contraindicação ao uso do tenofovir, ou presença de alteração da função renal em decorrência do seu uso, deve-se indicar o tratamento com entecavir, um análogo de nucleosídeo. Ambas as opções de monoterapia são equivalentes em eficácia, salvo na presença de mutações virais. O medicamento de primeira linha para pacientes em tratamento de imunossupressão e quimioterapia deve ser o entecavir. O entecavir apresenta eficácia reduzida quando há presença de mutações, encontradas especialmente em vírus de pacientes experimentados com análogos de nucleosídeo, como lamivudina e telbivudina. Recomenda-se evitar seu uso em pacientes já experimentados com os medicamentos supracitados. A posologia recomendada para pacientes virgens de tratamento e/ou portadores de cirrose compensada deve ser de 0,5 mg/dia, e de 1 mg/dia para pacientes portadores de cirrose descompensada. O fármaco deve ser administrado por via oral, com ou sem alimentos. 5) Tratamento com alfapeguinterferona A alfainterferona é um grupo de proteínas e glicoproteínas com atividade antiviral, antiproliferativa e imunomoduladora. Trata-se de uma medicação de aplicação subcutânea semanal, indicada para tratamento alternativo de 48 semanas, reservado a pacientes portadores de infecção pelo vírus da hepatite B com exame HBeAg reagente. A extensão ou repetição da modalidade terapêutica não está autorizada, e o ciclo de tratamento do paciente deverá ser realizado uma única vez. Excepcionalmente, o ciclo de tratamento poderá ser reiniciado mediante comprovação por relatório médico e retificação do processo de solicitação do medicamento. O consumo atual de álcool ou drogas, a cardiopatia grave, a disfunção tireoidiana não controlada, os distúrbios psiquiátricos não tratados, a neoplasia recente, a insuficiência hepática, a exacerbação aguda de hepatite viral e o transplante (exceto transplante hepático) são contraindicações ao tratamento com alfapeguinterferona. Pacientes que engravidarem ou desenvolverem depressão, descompensação cardíaca, disfunção tireoidiana grave ou diabetes de difícil controle devem ter o tratamento interrompido e ser avaliados por especialistas. Pacientes com plaquetopenia merecem conduta individualizada, com suspensão obrigatória do tratamento quando os índices de plaquetas se reduzirem para menos de 30.000/mm3. A terapia com alfapeguinterferona em pacientes que não apresentarem soroconversão do anti-HBs ao final da 48a semana de tratamento deverá ser substituída por tenofovir (TDF) ou entecavir (ETV). 6) Monitoramento durante tratamentos com tenofovir, entecavir e alfapeguinterferona A eficácia dos tratamentos instituídos é verificada pela mudança no perfil sorológico, aminotransferases e níveis de HBV-DNA dos pacientes. Pacientes portadores de hepatite B crônica HBeAg reagente: o HBsAg, anti-HBs, HBeAg, anti-HBe e HBV-DNA realizados anualmente. Pacientes portadores de hepatite B crônica HBeAg não reagente: o HBsAg, anti-HBs, HBV-DNA realizados anualmente. Pacientes em tratamento com alfapeguinterferona: o Monitoramento clínico: Hemograma completo a cada 12 semanas; AST/ALT na 2a semana de tratamento e a cada quatro semanas de tratamento; Glicemia de jejum, TSH e T4L a cada 12 semanas. Diante de resultados fora dos valores de referência, os pacientes devem ser encaminhados aos serviços de referência. o Avaliação de resposta: HBsAg, anti-HBs, HBeAg, anti-HBe ao final da 48ª semana; HBV-DNA ao final da 24a e 48a semana de Tratamento (Pacientes que apresentarem HBV-DNA > 20.000 UI/mL podem ter o tratamento com alfapeguinterferona substituído por tenofovir ou entecavir, em virtude da baixa probabilidade de resposta terapêutica). Pacientes previamente experimentados com medicações para o tratamento da hepatite B 1) Resistência Resistência é definida como redução da susceptibilidade do HBV aos medicamentos análogos de nucleos(t)ídeos. A resistência pode ser classificada em: Primária: resposta ausente ou insuficiente ao tratamento, com redução de menos de 1 log10 UI/mL em exame de HBV-DNA, realizado seis meses após instituído o tratamento; Adquirida: no paciente que apresentou supressão viral (virological breakthrough), elevação do HBV-DNA de mais de 1 log10 UI/mL em relação ao menor valor de HBV-DNA apresentado, ou alterações nos exames de função hepática (biochemical breakthrough). Resistência à alfapeguinterferona: Não há resistência viral documentada. Resistência ao entecavir: Diante de resistência ao tratamento com entecavir, recomenda-se que o resgate de pacientes experimentados seja estruturado com associação de tenofovir ao esquema de tratamento vigente. Após um ano de resgate e indetectabilidade do HBV-DNA, deve- se proceder à substituição da terapia dupla por monoterapia com tenofovir. Resistência ao tenofovir: A resistência ao tenofovir não foi descrita até o momento. Na eventualidade de detecção de uma resistência ao fármaco, recomenda-se que o resgate de pacientes experimentados seja estruturado com associação de entecavir ao esquema de tratamento vigente. Resistência à lamivudina: Devido à fraca barreira genética e ao fácil desenvolvimento de resistência, não se recomenda o uso de lamivudina para o tratamento da infecção pelo vírus da hepatite B. O tratamento de pacientes que já estão em uso do fármaco deve ser substituído, preferencialmente, por tenofovir, devido à possibilidade de resistência cruzada com entecavir, descontinuando- se progressivamente o uso da lamivudina. A substituição do fármaco será regulamentada em adultos, conforme o escopo deste documento, por meio de Nota Informativa Conjunta. Resistência ao adefovir: Devido à maior frequência de efeitos adversos e barreira genética inferior, não se recomenda o uso de adefovir para o tratamento da infecção pelo vírus da hepatite B. O tratamento de pacientes que já estão em uso do fármaco deve ser substituído por tenofovir ou entecavir, conforme situação clínica. A substituição do fármaco será regulamentada em adultos, conforme o escopo deste documento, por meio de Nota Informativa Conjunta. Situações especiais 1) Transmissão vertical O principal fator associado a evolução para cronicidade da infecção pelo vírus da hepatite B é a faixa etária na qual a infecção ocorre. Quando a infecção aguda pelo HBV se dá no primeiro trimestre da gestação, o risco de transmissão da infecção ao recém-nascido (RN) é pequeno, inferior a 10%; porém, quando a infecção ocorre no segundo ou terceiro trimestres da gestação, a transmissão pode ocorrer em mais de 60% dos casos. Quando a gestante é portadora de infecção crônica por HBV, com perfil sorológico HBsAg/HBeAg positivo, há um grave risco para o RN. Sem a imunoprofilaxia adequada no momento do parto, a maioria das crianças recém-nascidas desenvolverá infecção aguda por HBV, com progressão para infecção crônica, além de complicações da doença hepática crônica na idade adulta. A administração de imunoprofilaxia reduz esse risco. Potencialmente, o HBV pode ser transmitido por fissura no mamilo, embora seja difícil comprovar o efeito exclusivo dessa via. A transmissão do HBV pelo leite materno vem sendo discutida há muito tempo, a partir da detecção do HBsAg em amostras de leite de mães infectadas. Estudos publicados antes da vacinação universal já mostravam que o aleitamento materno não era fator de risco maior para a transmissão do que o uso de fórmulas ou compostos lácteos. 2) Coinfecções Os vírus das hepatites B, C e Delta e o HIV apresentam formas de transmissão em comum. Dessa maneira, a coinfecção com outros vírus pode ocorrer e afetar de forma significativa a história natural da doença. A presença concomitante desses agentes infecciosos agrava a atividade necroinflamatória e acelera a evolução da hepatite. I) Coinfecção do vírus da hepatite B com o HIV A história natural da infecção pelo vírus da hepatite B é alterada pelo HIV. Indivíduos infectados pelo HIV que desenvolvem hepatite aguda pelo HBV têm cinco a seis vezes mais chance de se tornarem portadores crônicos do HBV, quando comparados a indivíduos soronegativos para o HIV. Em pacientes coinfectados, o HIV aumenta a replicação do HBV, levando à forma mais grave de doença hepática. Uma vez portador do HBV, o indivíduo tende a evoluir com menores taxas de soroconversão espontânea do HBeAg/anti-HBe e HBsAg/anti- HBs – e apresentar altas taxas de replicação viral. Formas mais graves de doença hepática também têm sido associadas à síndrome de reconstituição imune após a terapia antirretroviral (TARV), ocasionando piora nas provas de função hepática, possivelmente em decorrência do aumento da atividade necroinflamatória. Pacientes coinfectados HBV/HIV podem evoluir com “HBV oculto”, caracterizado por baixa carga viral de HBV-DNA e HBsAg não reagente, estando autorizada a realização de exame para quantificação do HBV-DNA em regime semestral para elucidação diagnóstica. A infecção pelo HIV está associada a uma pior resposta do tratamento da infecção pelo HBV com alfainterferona, aumento da toxicidade hepática e menor eficácia da TARV. Por outro lado, o real impacto da infecção crônica do HBV sobre a evolução do HIV é pouco compreendido, embora essa coinfecção esteja associada a uma maior mortalidade. Conforme o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Manejo da Infecção pelo HIV em Adultos (2013), a TARV para o HIV deve ser instituída prontamente. O início precoce da terapia está associado a redução da transmissibilidade e da morbimortalidade relacionadas à infecção pelo HIV. O tenofovir e a lamivudina são fármacos antirretrovirais com atividade contra o HIV e contra o HBV, diminuindo o risco de progressão para cirrose e CHC. Esses fármacos constam como primeira opção terapêutica para a infecção pelo HIV e podem ser obtidos em coformulação para tomada única diária. A combinação desses medicamentos também resulta em sinergismo para o tratamento do HIV e apresenta um perfil de toxicidade favorável. A didanosina apresenta interação medicamentosa significativa com tenofovir; portanto, a coadministração de didanosina e tenofovir não está recomendada para pacientes portadores de coinfecção HBV/HIV. II) Coinfecção do vírus da hepatite B com o vírus da hepatite C Pacientes coinfectados pelo vírus da hepatite B com o vírus da hepatite podem ser submetidos ao tratamento do vírus predominante – habitualmente o vírus C, quando se configura indicação de tratamento conforme o PCDT para Hepatite C e Coinfecções –, ou submetidos ao tratamento simultâneo. Caso o profissional de saúde opte por tratar o HCV exclusivamente com regime de tratamento sem alfapeguinterferona, recomenda-se cautela e periodicidade nos exames de monitoramento do HBV. c) Imunossupressão e quimioterapia Pacientes devem receber tratamento com análogos de nucleos(t)ídeos antes de receber terapia imunossupressora ou quimioterapia – pelo risco de hepatite grave, insuficiência hepática e óbito. O medicamento de primeira linha para essa indicação terapêutica é o entecavir. A lamivudina poderá ser utilizada quando o entecavir não estiver disponível. Recomenda-se, no entanto, que essa medicação seja utilizada somente em pacientes com HBV-DNA indetectável e apenas por um curto período de tempo (< 4 meses), em razão do elevado risco de resistência, devendo a lamivudina ser substituída por entecavir ou tenofovir o mais rapidamente possível. Caso o paciente já tenha utilizado lamivudina em tratamento prévio, podendo já apresentar resistência viral, é mais indicado o uso de tenofovir ao invés de entecavir – pelo risco de desenvolvimento de resistência cruzada. As terapias antiviral profilática (antes da reativação) e preemptiva (após areativação) deverão ser mantidas por 6 a 12 meses após o término do tratamento imunossupressor. Caso a terapia seja por tempo indefinido (transplante renal e hepático, por exemplo), o análogo também deverá ser mantido indefinidamente. Pacientes com indicação de terapia com imunossupressores ou quimioterápicos deverão realizar testes sorológicos com pesquisa de HBsAg e do Anti-HBc total, antes de iniciar o tratamento. Pacientes com exame HBsAg reagente e com Anti-HBc reagente isolado devem ser submetidos à quantificação do HBV-DNA. A indicação de terapia preventiva será orientada pelo perfil sorológico –tipo de tratamento imunossupressor – e pelo risco de reativação viral. Nos pacientes com risco elevado, tais como aqueles que farão uso de quimioterápicos ou outros medicamentos imunossupressores – considerados de alto risco para reativação viral –, o tratamento profilático está indicado e pode ser iniciado antes da terapia imunossupressora ou concomitantemente a esta. Todavia, em casos de neoplasias ou doenças com manifestações graves, o início da profilaxia contra a reativação da hepatite B não deve retardar o tratamento da doença de base. Se houver impossibilidade de medicamentos para o início da profilaxia antes ou junto com a imunossupressão, deve-se iniciar o tratamento da Nos casos de risco moderado e baixo, a terapia poderá ser iniciada imediatamente, ou postergada e iniciada apenas após o diagnóstico de reativação viral. Pacientes que não iniciarem a terapia profilática deverão ter os níveis de HBV-DNA e ALT monitorados a cada dois meses; no caso de haver reativação viral, deve-se iniciar terapia preventiva. Quando não houver a disponibilidade de testes de HBV-DNA para o monitoramento sequencial durante a terapia imunossupressora ou quimioterápica, o tratamento profilático deverá ser iniciado nos pacientes com risco elevado e moderado. Pode-se considerar reativação viral a elevação da viremia (≥ 2 log) em relação à viremia basal; o reaparecimento do HBV-DNA em pacientes com viremia inicialmente indetectável; e a sororreversão HBsAg em pacientes antes HBsAg não reagentes. Pacientes com HBsAg reagente ou HBsAg não reagente com anti-HBc reagente (independentemente dos títulos de anti-HBs), que são candidatos à terapia com anti-CD20 (rituximabe), anti-CD52 (alemtuzumab), quimioterapia para neoplasias hematológicas e transplante de medula óssea, são considerados de alto risco para reativação viral, devendo receber terapia profilática antes do início do tratamento, independentemente dos níveis de HBV-DNA Medidas de Prevenção e Controle na Hepatite B A vacina contra Hepatite B é a principal medida de prevenção da doença e está disponível para a população em geral nas Unidades de Saúde. A imunização para a hepatite B é realizada em três doses, com intervalo recomendado de um mês entre a primeira e a segunda dose e de seis meses entre a primeira e a terceira dose. É recomendada para todas as pessoas sem restrição de idade. O calendário infantil do Ministério da Saúde recomenda a 1ª dose da vacina da hepatite B (ao nascer) e 3 doses de pentavalente bacteriana (aos 2, 4 e 6 meses de idade). Fazer pré-natal com testagem para hepatite B no 1º trimestre e no 3º trimestre de gestação. Para os recém-nascidos de mães com hepatite B é importante receber a 1ª dose da vacina contra o vírus da hepatite B a e imunoglobulina contra a hepatite B, preferencialmente nas primeiras 12 horas de vida. HEPATITE C Introdução O vírus da hepatite C (HCV) pertence ao gênero Hepacivirus, família Flaviviridae. Sua estrutura genômica é composta por uma fita simples de ácido ribonucleico (RNA), de polaridade positiva, com aproximadamente 9.400 nucleotídeos. Existem, pelo menos, sete genótipos e 67 subtipos do vírus. Classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde – CID-10 -B17.1 – Hepatite viral aguda C -B18.2 – Hepatite viral crônica C Epidemiologia Estima-se que cerca de 71 milhões de pessoas estejam infectadas pelo HCV em todo o mundo e que cerca de 400 mil por ano vão a óbito devido a complicações dessa doença, principalmente por cirrose e CHC. O Ministério da Saúde (MS), em parceria com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e o Center for Diseases Analysis (CDA), por meio da elaboração do Modelo Matemático, atualizou os dados epidemiológicos relativos à epidemia da hepatite C no Brasil, visando aprimorar as ações de atenção, prevenção, vigilância e tratamento das hepatites virais no país. Estima-se que a prevalência de pessoas sororreagentes (anti-HCV) seja de aproximadamente 0,7%, o que corresponde aproximadamente a cerca de 1.032.000 pessoas sororreagentes para o HCV no Brasil. Desses casos, estima-se que 657.000 sejam virêmicos e que realmente necessitem de tratamento. Ressalta-se que a prevalência de 0,7% é referente à população geral compreendida na faixa etária de 15 a 69 anos, até o ano de 2016. O genótipo 1 é o mais prevalente em todo o mundo e é responsável por 46% de todas as infecções pelo HCV, seguido pelo genótipo 3 (30%). O mesmo se observa no Brasil, com pequenas variações na proporção de prevalência desses genótipos. O genótipo 2 é frequente na região Centro-Oeste (11% dos casos), enquanto o genótipo 3 é mais comumente detectado na região Sul (43%). Vigilância epidemiológica das hepatites virais Por representarem um problema de saúde pública no Brasil, as hepatites virais são de notificação compulsória desde o ano de 1996. O objetivo geral da vigilância epidemiológica das hepatites virais é monitorar o comportamento da doença e seus fatores condicionantes e determinantes, com a finalidade de recomendar e adotar medidas de prevenção e controle, bem como avaliar o seu impacto. As hepatites virais são doenças de notificação compulsória regular, ou seja, a notificação deve ser feita em até sete dias. Portanto, todos os casos confirmados e surtos devem ser notificados e registrados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) por meio da “Ficha de Investigação das Hepatites Virais”, que deve ser encaminhada periodicamente ao órgão responsável pela vigilância epidemiológica local. As principais fontes notificadoras são: unidades de saúde, hemocentros e bancos de sangue, clínicas de hemodiálise, laboratórios, comunidade, escolas e creches, dentre outras. A identificação de fatores de risco e da doença em seu estágio inicial e o encaminhamento ágil e adequado para o atendimento especializado conferem à Atenção Básica um papel essencial para o alcance de um melhor resultado terapêutico e prognóstico dos casos. Transmissão A transmissão do HCV ocorre principalmente por via parenteral, por meio do contato com sangue contaminado, a exemplo do compartilhamento de agulhas, seringas e outros objetos para uso de drogas, reutilização ou falha de esterilização de equipamentos médicos ou odontológicos, falha de esterilização de equipamentos de manicure e reutilização de material para realização de tatuagem, além do uso de sangue e seus derivados contaminados. A transmissão sexual do HCV também tem sido relatada de forma esporádica. De modo geral, a transmissão sexual desse vírus é pouco eficiente e ocorre em relações sem uso de preservativo. Há também a possibilidade de transmissão vertical, em menor proporção dos casos. OBS: Os indivíduos que receberam transfusão de sangue e/ou hemoderivados antes de 1993 devem ser testados, pois são considerados de risco para essa infecção. A partir de 1993 passou a existir a testagem para as hepatites C nos bancos de sangue, o que tornou a doação sanguínea um ato muito seguro. Período de transmissibilidade da Hepatite C A transmissão da hepatite C se estende de 1 semana antes dos sintomas até não ter mais carga viral detectável. Em caso de cronificação o paciente permanece transmitindo a hepatite C. Hepatite C em gestante e RN Não há recomendação pelo Ministério da Saúde para testar hepatite C no pré-natal, porém se for possível deve-se realizar a testagem para hepatite C também. Não existe vacina contra o vírus da hepatite C. Amamentação ao recém- nascido é liberada, porém se houver fissuras nos mamilos com sangramento, orienta-se suspender temporariamente a amamentação e ordenhar o leite até a resolução das lesões. Diagnóstico Com o objetivo de ampliar o acesso ao diagnóstico e ao tratamento da hepatite C em todo o território nacional, recomenda-se que os grupos populacionais mencionados a seguir sejam prioritariamente testados quanto à presença do HCV. Alguns grupos desses populacionais, por sua maior vulnerabilidade no que concerne à chance de exposição ao HCV, devem ser testados de forma periódica pelo menos uma vez ao ano ou em intervalo menor, se clinicamente indicado: Pessoas vivendo com o vírus da imunodeficiência humana (HIV) – PVHIV; Pessoas sexualmente ativas prestes a iniciar Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) ao HIV (a indicação de testagem seguirá o protocolo de PrEP); Pessoas com múltiplos parceiros sexuais ou com múltiplas infecções sexualmente transmissíveis; Pessoas trans; Trabalhadores (as) do sexo; Pessoas em situação de rua. Os seguintes grupos populacionais devem também ser prioritariamente testados, mas basta que a testagem seja realizada uma única vez, desde que essas pessoas não apresentem histórico de exposições associadas ao risco de aquisição de nova infecção: Pessoas com idade igual ou superior a 40 anos; Pacientes ou profissionais de saúde que tenham frequentado ambientes de hemodiálise em qualquer época; Pessoas que usam álcool e outras drogas; Pessoas com antecedente de uso de drogas injetáveis em qualquer época, incluindo aquelas que as utilizaram apenas uma vez; Pessoas privadas de liberdade; Pessoas que receberam transfusão de sangue ou hemoderivados antes de 1992 ou transplantes em qualquer época; Pessoas com antecedente de exposição percutânea/parenteral a sangue ou outros materiais biológicos em locais que não obedeçam às normas da vigilância sanitária (ambientes de assistência à saúde, tatuagens, escarificações, piercing, manicure, lâminas de barbear ou outros instrumentos perfurocortantes); Pessoas com antecedente ou em risco de exposição a sangue ou outros materiais biológicos contaminados: profissionais de saúde, cuidadores de pacientes, bombeiros, policiais, etc.; Crianças nascidas de mães que vivem com o HCV; Familiares ou outros contatos íntimos (comunicantes), incluindo parceiros sexuais, de pessoas que vivem com ou têm antecedente de infecção pelo HCV; Pessoas com antecedente de uso, em qualquer época, de agulhas, seringas de vidro ou seringas não adequadamente esterilizadas, ou de uso compartilhado, para aplicação de medicamentos intravenosos ou outras substâncias lícitas ou ilícitas recreativas (vitamínicos, estimulantes em ex- atletas, etc.); Pacientes com diagnóstico de diabetes, doenças cardiovasculares, antecedentes psiquiátricos, histórico de patologia hepática sem diagnóstico, elevação de ALT e/ou AST, antecedente de doença renal ou de imunodepressão, a qualquer tempo. Diagnóstico clínico Os sintomas da infecção pelo HCV estão presentes na minoria de casos (20% a 30%) e geralmente são inespecíficos, tais como anorexia, astenia, mal-estar e dor abdominal. Uma menor parte dos pacientes apresenta icterícia ou escurecimento da urina. Casos de insuficiência hepática ou casos fulminantes são extremamente raros. A eliminação viral espontânea, após a infecção aguda pelo HCV, ocorre em 15% a 40% dos casos. Alguns fatores do hospedeiro parecem associados à eliminação viral espontânea, tais como idade inferior a 40 anos, sexo feminino, aparecimento de icterícia e fatores genéticos, como polimorfismo CC da interleucina-28B (IL28B). Quando estão presentes sintomas inespecíficos, o diagnóstico diferencial é possível apenas com a realização de testes para detecção de anticorpos ou para a detecção do RNA do HCV (HCV-RNA). Diagnóstico laboratorial Hepatite C aguda O RNA do HCV pode ser identificado no soro ou plasma antes da presença do anti-HCV. A presença do HCV-RNA pode ocorrer cerca de duas semanas após a exposição ao agente infeccioso. A presença dos anticorpos anti-HCV é mais tardia e ocorre cerca de 30 a 60 dias após a exposição ao vírus. Os níveis séricos do HCV-RNA aumentam rapidamente durante as primeiras semanas, atingindo os valores máximos de 105 a 107 UI/mL imediatamente antes do pico dos níveis séricos de aminotransferases, podendo coincidir com o início dos sintomas. Nos pacientes sintomáticos, os sintomas da infecção aguda costumam ocorrer entre quatro a doze semanas após a exposição ao HCV. A fase aguda da hepatite C pode durar até seis meses, mas sua resolução costuma acontecer até a 12a semana. A definição de hepatite C aguda se dá por: Soroconversão recente (há menos de seis meses) e com documentação de anti- HCV não reagente no início dos sintomas ou no momento da exposição, e anti-HCV reagente na segunda dosagem, realizada com intervalo de 90 dias; OU Anti-HCV não reagente e detecção do HCV-RNA em até 90 dias após o início dos sintomas ou a partir da data de exposição, quando esta for conhecida. Hepatite C crônica 1) Anti-HCV e HCV-RNA A investigação da infecção pelo HCV pode ser feita em ambiente laboratorial ou ambulatorial, em ações de rua ou mediante campanhas em regiões de difícil acesso. A testagem para o anti-HCV realizada em ambiente laboratorial utiliza testes sorológicos, como os do tipo Elisa (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay). Os exames que podem ser realizados fora do ambiente laboratorial são os testes por imunocromatografia de fluxo, mais conhecidos como teste rápido (TR). O anti-HCV é um marcador que indica contato prévio com o vírus. Isoladamente, um resultado reagente para o anticorpo não permite diferenciar uma infecção resolvida naturalmente de uma infecção ativa. Por isso, para o diagnóstico laboratorial da infecção, um resultado anti-HCV reagente precisa ser complementado por meio de um teste para detecção direta do vírus. Os testes de ácidos nucleicos (ou testes moleculares) devem ser utilizados para detectar o HCV- RNA circulante no paciente e, portanto, confirmar a presença de infecção ativa. Os testes moleculares quantitativos também são conhecidos como testes de carga viral (CV), e são capazes de quantificar o número de cópias de genomas virais circulantes em um paciente. As metodologias quantitativas disponíveis hoje são similares às metodologias qualitativas no que se refere à sensibilidade e especificidade do teste. No âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), o MS mantém uma rede de laboratórios que realiza testes para a detecção quantitativa do HCV-RNA (CV do HCV). Dessa forma, recomenda-se que o diagnóstico laboratorial da hepatite C seja realizado com, pelo menos, dois testes, conforme detalhado no texto anterior e no fluxograma a seguir: 1- O teste inicial deve ser realizado mediante pesquisa de anticorpos para o HCV. A pesquisa de anticorpos pode ser feita por meio de metodologia sorológica clássica (tipo Elisa) ou de testes rápidos (TR); 2- Caso o primeiro teste seja reagente por qualquer uma dessas metodologias, em uma segunda etapa deve-se realizar a investigação da presença de replicação viral, por meio de teste de biologia molecular que identifique a presença do RNA viral, conforme o fluxograma a seguir: * Caso a suspeita de infecção pelo HCV persista, sugere-se que uma nova amostra seja coletada 30 dias após a data da primeira amostra. ** A repetição do teste molecular está indicada, a critério médico, nos seguintes casos: (1) suspeita de nova exposição nos seis meses que antecedem a realização da sorologia; (2) forte suspeita clínica de doença pelo HCV; (3) qualquer suspeita em relação ao manuseio ou armazenamento do material utilizado para realização do teste molecular. Além disso, o teste molecular deverá ser repetido nos casos de pacientes em diálise. A definição de hepatite C crônica se dá por: Anti-HCV reagente por mais de seis meses; E Confirmação diagnóstica com HCV-RNA detectável por mais de seis meses. Não existe necessidade de confirmação sorológica (teste tipo Elisa) após a realização de um TR cujo resultado seja reagente. Ambos os testes são equivalentes e devem ser seguidos por método complementar de biologia molecular. Vale mencionar que em determinadas situações clínicas, a exemplo de pacientes com doença aguda pelo HCV em fase inicial (até 30 dias) e pacientes imunodeprimidos e/ou dialíticos, pode não haver presença de anticorpos anti-HCV, em razão da incapacidade imunológica desses pacientes para produzir anticorpos. Nessas situações, o diagnóstico da infecção pelo HCV deverá ser realizado pela presença do HCV-RNA, por método de biologia molecular. Com o objetivo de normatizar o diagnóstico do HCV e coinfecções, o MS disponibiliza o “Manual Técnico para o Diagnóstico das Hepatites Virais”, que deverá ser consultado pelos profissionais nos serviços de saúde. 2) Genotipagem O exame de genotipagem do HCV utiliza testes moleculares capazes de identificar os genótipos, subtipos e populações mistas do HCV. A metodologia utilizada para a genotipagem exige que a amostra apresente carga viral mínima de 500 UI/mL, comprovada por teste de quantificação de CV-HCV realizado em um período anterior máximo de 12 meses. Nos casos de CV-HCV inferior ao limite de detecção (500 UI/mL) ou em situações em que não é possível caracterizar o genótipo, deve-se considerar o mesmo esquema terapêutico recomendado para o genótipo 3. Este Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) versa sobre esquemas terapêuticos para os subtipos “a” e “b” do genótipo 1 da hepatite C. Nas situações em que o subtipo do genótipo 1 não puder ser determinado ou quando outros subtipos do genótipo 1 forem identificados (1c ou outros), devem-se adotar os esquemas de tratamento indicados para o genótipo 1a. Ressalta-se que a necessidade de realização do teste de genotipagem dependerá da alternativa terapêutica a ser ofertada. Posto isso, a orientação acerca das condições para realização da genotipagem será feita por meio de Nota Técnica específica. 3) Estadiamento da doença hepática O tratamento da hepatite C está indicado na presença da infecção aguda ou crônica pelo HCV, independentemente do estadiamento da fibrose hepática. No entanto, é fundamental saber se o paciente tem fibrose avançada (F3) ou cirrose (F4), pois a confirmação desse diagnóstico poderá afetar a condução clínica do paciente e o esquema de tratamento proposto. Dessa forma, recomenda-se que o estadiamento da doença hepática seja realizado para todos os pacientes infectados pelo HCV, coinfectados ou não pelo HIV, de modo a caracterizar ausência ou presença de doença avançada, a fim de definir o esquema terapêutico mais adequado. O estadiamento poderá ser realizado por qualquer um dos métodos disponíveis: APRI ou FIB4, biópsia hepática ou elastografia hepática. Devido à maior praticidade e disponibilidade da utilização dos métodos APRI e FIB4, estes devem ser preferencialmente indicados. Para a recomendação de esquemas terapêuticos específicos aos pacientes com cirrose compensada ou descompensada, é necessária a caracterização clínica da doença avançada. As características clínicas ou ultrassonográficas que definem doença hepática avançada/cirrose são: presença de circulação colateral, fígado e bordas irregulares, esplenomegalia, aumento do calibre da veia porta, redução do fluxo portal, ascite e varizes esofágicas. Dessa forma, exames complementares que caracterizem a doença avançada poderão substituir o estadiamento da doença hepática pelos métodos descritos a seguir. I. APRI e FIB4 APRI e FIB4 são escores de biomarcadores que apresentam boa especificidade, porém baixa sensibilidade. Caso o paciente não seja classificado como F3 ou F4 por esses métodos, a realização de métodos complementares, como a biópsia hepática ou a elastografia hepática, poderá ser indicada a critério do médico assistente responsável. Coinfecções podem afetar os escores, superestimando o grau de comprometimento hepático. Entretanto, na impossibilidade de realização de elastografia ou biópsia hepática em pacientes coinfectados pelo HIV, a utilização do APRI ou FIB 4, de maneira opcional, poderá ser utilizada na caracterização de doença hepática avançada. No entanto, a realização da biópsia hepática é opcional na indicação do tratamento da hepatite C. II. Biópsia hepática A biópsia hepática é o exame padrão-ouro para a avaliação da fibrose hepática. Pode ser realizada com diferentes técnicas e tipos de agulha. Além disso, é útil no diagnóstico de outras doenças hepáticas concomitantes – como a doença gordurosa, que influencia de maneira significativa a evolução dos casos e o manejo dos pacientes. Entretanto, a biópsia hepática é um procedimento invasivo, que requer estrutura apropriada A biópsia hepática não está indicada para casos de hepatite C aguda, que se caracteriza pela presença predominante de alterações necroinflamatórias no parênquima, em contraposição à hepatite crônica, cuja inflamação é predominantemente portal e sem atividade de interface. Nessa situação, a realização da biópsia hepática poderá ser realizada, excepcionalmente, quando houver dúvida em relação ao diagnóstico, ou quando outros diagnósticos diferenciais estiverem sendo investigados. Os resultados da biópsia hepática devem ser avaliados conforme a classificação da alteração arquitetural (estágio de fibrose) e da atividade inflamatória. A correspondência das classificações anatomopatológicas à escala METAVIR está detalhada nos quadros a seguir: III. Elastografia hepática Realizada por meio de diferentes métodos, a elastografia hepática é um procedimento não invasivo que permite a identificação do estágio de fibrose hepática. Uma das suas principais vantagens é a possibilidade de avaliação de uma área maior do que a avaliada por fragmento de biópsia hepática. Algumas limitações são a especificidade da tecnologia; a potencial interferência em situações que aumentam a rigidez hepática, independentemente de fibrose, como: elevada atividade necroinflamatória (ALT >5x o limite superior da normalidade – LSN); excesso de ingestão de bebidas alcoólicas; colestase extra-hepática; congestão hepática; alto grau de esteatose/obesidade; ausência de jejum de quatro horas; doenças de depósito e infiltração celular anômala no parênquima hepático. A elastografia apresenta também outras limitações, como valores de referência distintos, variando de acordo com a origem da doença hepática, e eventual mau desempenho em casos de obesidade (IMC >30kg/m2), com falhas em aproximadamente 20% dos casos. Não é possível realizar a elastografia hepática em pacientes com ascite. A elastografia não está indicada para pessoas que apresentem comorbidades com alterações do parênquima ou da função hepática, como a esquistossomose ou a leishmaniose. Todo resultado diagnóstico deve ser avaliado no contexto do caso em questão e as disparidades necessitam ser checadas por outros métodos, mais precisos. Recomenda-se, para melhorar a acurácia do diagnóstico, a associação de APRI e/ou FIB4 com elastografia. Os pontos de corte da elastografia para classificação do estadiamento de fibrose hepática conforme a escala METAVIR são apresentados segundo modalidade de imagem e aparelho utilizado. IV. Identificação da cirrose descompensada (Child-Pugh) A cirrose compensada distingue-se da descompensada por meio do escore de Child-Turcotte-Pugh (Child-Pugh), utilizado para avaliar o grau de deterioração da função hepática, além de ser marcador prognóstico. O escore de Child-Pugh é calculado somando-se os pontos dos cinco fatores a seguir, que variam entre 5 e 15. As classes de Child-Pugh são A (escore de 5 a 6), B (7 a 9) ou C (acima de 10). Em geral, a descompensação indica cirrose com um escore de Child-Pugh >7 (classe B de Child-Pugh), sendo este um critério para inclusão do paciente no cadastro de transplante hepático. Nos pacientes com sinais clínicos e/ou achados ecográficos de cirrose hepática, não há necessidade de biópsia hepática ou outro método diagnóstico para indicação de tratamento. O tratamento da hepatite C, quando indicado em pacientes descompensados, exige atenção especial e deve ser realizado em centros especializados. 4) Manifestações extra-hepáticas Além das alterações hepáticas, é muito importante investigar manifestações clínicas e laboratoriais extra-hepáticas fortemente relacionadas à hepatite C. Dentre estas, podem-se citar as seguintes: crioglobulinemia, linfoma de células B, porfiria cutânea tarda, líquen plano, neuropatia e glomerulopatias. Quanto às manifestações possivelmente associadas ao HCV, têm-se: úlcera corneana (úlcera de Mooren), doença da tireoide, fibrose pulmonar, síndrome de Sjögren, doença renal crônica, diabetes tipo II, vasculite sistêmica (poliarterite nodosa, poliangiitemicroscopica), artralgias, mialgias, poliartrite inflamatória, trombocitopenia autoimune e disfunção neurocognitiva, dentre outras. 5) Exames complementares *A vacina para hepatite A está disponível nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIE) e a vacina para hepatite B, nas salas de vacina do SUS. **Características ultrassonográficas que definem doença hepática avançada/cirrose: circulação colateral, fígado reduzido e irregular, esplenomegalia, aumento do calibre da veia porta, redução do fluxo portal, ascite. ***A biópsia hepática deve ser realizada a critério médico, pois o tratamento está indicado para todas as pessoas, independentemente do grau de fibrose hepática. ****Métodos não invasivos para avaliação de fibrose são úteis para identificar o estágio de fibrose avançada (F3 e F4), com a finalidade de avaliar a duração do tratamento. *****A realização do clearance de creatinina com periodicidade de três a seis meses está indicada apenas nos casos de doença renal crônica e cirrose. A abordagem laboratorial inicial e de rotina do paciente com hepatite C crônica possui diversas finalidades, tais como definir o momento de início do tratamento, estabelecer o esquema terapêutico recomendado, avaliar a qualidade da resposta obtida com a estratégia terapêutica e auxiliar no rastreamento de câncer. A fim de facilitar o monitoramento clínico do paciente com hepatite C crônica e auxiliar no melhor uso dos recursos técnicos e financeiros, este PCDT indica uma relação de exames complementares. Contudo, salienta-se que exames adicionais ou modificações na rotina de exames poderão ocorrer conforme a presença de comorbidades e a introdução – ou não – de tratamento antiviral. As consultas devem ser realizadas considerando-se o estado clínico do paciente, o tratamento em curso e a gravidade da doença. Critérios de inclusão Incluem-se neste PCDT todos os pacientes com diagnóstico de infecção pelo HCV, conforme critérios de diagnóstico. Critérios de exclusão Crianças com idade inferior a três anos; Pacientes oncológicos com cirrose Child-Pugh B ou C, ou cuja expectativa de vida seja inferior a 12 meses, sem remissão da doença (nos casos de doença em remissão, a indicação de tratamento poderá ser individualizada); Pacientes adultos com cirrose descompensada e indicação de transplante hepático com MELD score ≥20, ainda não submetidos a transplante hepático (caso o tempo de espera na fila para o transplante seja superior a seis meses, a indicação do tratamento medicamentoso poderá ser discutida individualmente); Pacientes cuja expectativa de vida for inferior a 12 meses, devido à hepatopatia e outras comorbidades; esses pacientes poderão ter a indicação de tratamento individualizada; Pacientes com hipersensibilidade ou intolerâncias que impossibilitem o uso de todas as alternativas terapêuticas previstas. Casos especiais 1) Crianças A prevalência de infecção crônica pelo HCV na infância varia de 0,05% a 0,36% nos Estados Unidos e na Europa e de 1,8% a 5,8% em alguns países em desenvolvimento. Atualmente, a principal fonte de infecção na infância é a transmissão vertical, ou seja, a transmissão materno-infantil. Na infância, a evolução da doença é geralmente benigna, com valores de enzimas hepáticas normais ou pouco elevadas, e mínima atividade inflamatória ou fibrose. Crianças com genótipo 3 têm maiores níveis de aminotransferases nos primeiros dois anos de vida, mas podem eliminar espontaneamente o vírus antes dos cinco anos de idade. A resolução espontânea pode ocorrer em 25% a 40% dos lactentes, sendo menor em pré-escolares – cerca de 6% a 12% – e rara em crianças em idade escolar. A maioria das crianças são totalmente assintomáticas. A cirrose na infância é rara, ocorrendo em 1% a 2% dos casos. O grau de fibrose correlaciona-se, geralmente, com a idade e a duração da infecção. Na idade adulta, a doença pode evoluir para cirrose e CHC, e estima-se que a evolução para o óbito aumente em até 26 vezes nos adultos quando o HCV é adquirido na infância, seja por transmissão vertical ou parenteral. Considerando-se a escassez de fatores preditivos de progressão da doença na infância, justifica-se tratar as crianças com mínima atividade inflamatória, em virtude da possibilidade real de eliminar o vírus. O tratamento de crianças com idade entre 3 e 11 anos deverá ser realizado independentemente das alterações de enzimas hepáticas. 2) Gestantes Os medicamentos utilizados para o tratamento da hepatite C aguda e crônica são teratogênicos ou não possuem dados que comprovem segurança na gestação; por isso, são contraindicados durante esse período. A gravidez deverá ser evitada durante todo o tratamento antiviral e até os seis meses seguintes ao seu término. Se for confirmada a gestação durante o tratamento da hepatite C, este deverá ser suspenso. Caso a paciente não esteja em tratamento antiviral, o aleitamento materno pode ser realizado, desde que na ausência de lesões nos mamilos ou de coinfecção pelo HIV. OBS: Para mais informações, orienta-se consultar o “Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Prevenção da Transmissão Vertical do HIV, Sífilis e Hepatites Virais”. 3) Pacientes com doença renal crônica As pessoas que apresentam doença renal crônica devem ter monitorização periódica da função renal durante todo o período do tratamento. Em pacientes com disfunção renal leve a moderada (depuração de creatinina superior a 30mL/min), não há contraindicação para o uso de antivirais de ação direta (DAA), nem é necessário o ajuste da dose dos medicamentos indicados. Em pacientes em diálise e potenciais receptores de transplante de rim, o emprego de sofosbuvir deve ser realizado com cautela e de forma individualizada, considerando-se os riscos e benefícios potenciais da terapia antiviral, uma vez que não há recomendação para o seu uso em pacientes com depuração de creatinina inferior a 30mL/min. 4) Pacientes com coinfecções Coinfecção pelo HIV O tratamento da hepatite C crônica está indicado para todos os adultos (≥18 anos) coinfectados pelo HIV, independentemente do estadiamento de fibrose hepática ou da contagem de células LT-CD4+. As indicações terapêuticas para as pessoas que apresentam coinfecção HCV-HIV são as mesmas preconizadas para pacientes não coinfectados HCV-HIV. Para os pacientes cujo diagnóstico de ambas as infecções ocorre concomitantemente, é aconselhável iniciar, primeiramente, o tratamento para o HIV e atingir a supressão virológica antes de iniciar o tratamento para o HCV – especialmente em pacientes com imunossupressão grave (contagem de LT-CD4+ <200 células/mm3). Para os demais, o tratamento da hepatite C, antes da introdução da terapia antirretroviral (TARV), poderá ser considerado em casos excepcionais e por indicação do médico assistente. Os medicamentos utilizados para o tratamento da hepatite C em pacientes coinfectados HCV-HIV devem ser compatíveis com a TARV, a fim de evitar interações medicamentosas indesejáveis com os DAA. Dessa forma, recomenda-se sempre avaliar as possíveis interações medicamentosas, sobretudo para os pacientes já em uso de TARV. As principais interações observadas entre os medicamentos para o tratamento da hepatite C e a TARV estão detalhadas no Anexo I. Eventualmente, serão necessários ajustes posológicos ou substituições medicamentosas a fim de se evitarem essas interações indesejáveis. Nesse sentido, respeitando-se o histórico de uso de TARV e genotipagens prévias, deve ser avaliada e considerada a substituição de medicamentos contra o HIV por esquemas contendo dolutegravir (DTG). Caso se faça alguma substituição no esquema da TARV, não é obrigatório o retorno ao esquema anterior ao tratamento para HCV após a conclusão deste. Nos casos em que essa substituição ocorra e que, por indicação médica, haja necessidade de retorno ao esquema de TARV anterior, esse retorno não deve ocorrer antes de duas semanas após a suspensão do tratamento da hepatite C. A extensão do uso do esquema modificado de TARV é necessária devido à meia-vida prolongada de alguns DAA e ao potencial risco de interações medicamentosas caso a TARV seja substituída muito precocemente. A utilização de ribavirina e zidovudina (AZT) deve ser contraindicada, no sentido de prevenir o surgimento de anemia. Em pacientes com presença de HBsAg, antes do início do uso dos DAA, é necessária a utilização de medicação antiviral ativa para o vírus da hepatite B (lamivudina e tenofovir) na composição da TARV, a fim de evitar a reativação da hepatite B devida ao tratamento da hepatite C. Coinfecção pelo vírus da hepatite B (HBV) Pacientes coinfectados HCV-HBV devem ser prioritariamente tratados para hepatite C e hepatite B, independentemente do estadiamento de fibrose hepática. O tratamento para hepatite B poderá ser realizado concomitantemente e, caso ainda não se configure indicação de tratamento para hepatite B, o paciente deverá ser acompanhado. A reativação viral da hepatite B tem sido descrita em pacientes tratados com DAA durante ou após o término do tratamento. Os indivíduos com HBsAg reagente devem realizar o teste de HBV-DNA (CV-HBV), e os casos com indicação de tratamento da hepatite B devem iniciar o tratamento para hepatite B anteriormente ou de forma concomitante ao início da terapia para hepatite C. Pacientes com HBV-DNA indetectável ou baixo (<2.000 UI/mL) deverão ser monitorados durante e após o tratamento. A introdução da terapia antiviral deverá ser considerada se houver elevação dos níveis de HBV-DNA. Recomenda-se, sempre que possível, que essa situação seja discutida em serviços de referência para tratamento da hepatite B. Fármacos Alfapeguinterferona 2a 180mcg – solução injetável; Ribavirina 250mg – cápsula; Daclatasvir 30mg e 60mg – comprimido; Sofosbuvir 400mg – comprimido; Ledipasvir 90mg/sofosbuvir 400mg – comprimido; Elbasvir 50mg/grazoprevir 100mg – comprimido; Glecaprevir 100mg/pibrentasvir 40mg – comprimido; Sofosbuvir 400mg/velpatasvir 100mg – comprimido; Alfaepoetina 10.000 UI – pó para solução injetável; Filgrastim 300mcg – solução injetável. Posologias *É necessário reduzir a posologia de daclatasvir para 30mg ao dia quando coadministrado com atazanavir/ritonavir ou atazanavir/cobicistate. Quando administrado com efavirenz, etravirina ou nevirapina, recomenda-se elevar a dose de daclatasvir para 90mg/dia. **Em pacientes com cirrose Child-Pugh B e C, a dose inicial de ribavirina deve ser de 500mg ao dia, podendo ser aumentada conforme a tolerância do paciente e avaliação médica. A dose máxima não deve ultrapassar 11mg/kg/dia. Esquemas de tratamento As atuais alternativas terapêuticas para o tratamento da hepatite C, com registro no Brasil e incorporadas ao Sistema Único de Saúde (SUS), apresentam alta efetividade terapêutica. De forma geral, a efetividade terapêutica, mensurada pela resposta virológica sustentada (RVS), é absolutamente comparável entre todos os esquemas propostos, quando se avaliam situações clínicas semelhantes. Apenas algumas características específicas desses esquemas os diferenciam entre si, tais como: indicações para determinadas populações, diferenças inerentes à comodidade posológica, dispensabilidade da realização de exames em alguns casos e o preço praticado pelas indústrias fabricantes. Essa condição de similaridade permite que a análise da oferta dos esquemas terapêuticos no SUS seja baseada em uma análise de custo-minimização, ou seja, priorização das alternativas que implicam um menor impacto financeiro ao sistema,sem deixar de garantir o acesso a terapias seguras e eficazes aos pacientes com hepatite C. Tal estratégia proporciona a ampliação do acesso ao tratamento medicamentoso a todos os pacientes infectados pelo HCV. Diante do exposto, este PCDT passa a dispor sobre as condições de uso de todas as tecnologias incorporadas no SUS para o tratamento da hepatite C. Entretanto, o MS emitirá recomendação por meio de Nota Técnica específica sobre quais tecnologias estarão ofertadas na Rede, de acordo com a indicação e o critério de custo-minimização. ANEXO 1 E 2 Pacientes pediátricos com idade entre 3 e 17 anos Manejo da neutropenia/plaquetopenia Pacientes com quadro de neutropenia/plaquetopenia poderão receber tratamento com filgrastim, conforme critérios especificados a seguir: Indicação: pacientes com neutropenia severa, caracterizada por neutrófilos <500 células/mm3 ou <750 células /mm3, com cirrose, transplantados ou coinfectados pelo HIV. Posologia: 300mcg, SC, uma a duas vezes por semana. Tempo de uso: variável, conforme a necessidade para manter o paciente com neutrófilos ≥750 células/mm3. Indicador de resposta: elevação de neutrófilos para valores ≥750 células/mm3. Manejo da anemia A alfaepoetina está indicada para o manejo da anemia, de acordo com os seguintes critérios: Hemoglobina atual <10g/dL ou queda >3,0g/dL em relação ao nível pré- tratamento; Pacientes sintomáticos. A utilização de alfaepoetina poderá ser realizada em pacientes em uso de DAA e/ou alfapeguinterferona. Objetivos do uso: resolução da anemia e manutenção de hemoglobina >12g/dL, permitindo o uso de, pelo menos, 80% da dose preconizada de ribavirina. Posologia: 10.000 UI a 40.000 UI por semana, SC, a critério clínico. Tempo de uso: variável conforme a necessidade, a fim de manter o paciente com hemoglobina >10g/dL. Monitorização As interações medicamentosas entre os DAA e os medicamentos coadministrados podem levar ao aumento do risco de toxicidade ou perda de eficácia do tratamento. É fundamental checar essas interações antes e durante todo o tratamento da hepatite C. O paciente deve ser alertado sobre essa questão e evitar a automedicação. Os novos medicamentos de ação direta, de forma geral, cursam com menor número de eventos adversos; todavia, não são isentos à sua ocorrência. Portanto, todos os medicamentos utilizados no tratamento da hepatite C podem ocasionar o surgimento de eventos adversos. Dessa forma, é obrigatório o acompanhamento rigoroso de todos os pacientes em tratamento, para monitorar o surgimento desses eventos. Os pacientes devem realizar hemograma, teste de creatinina (ou clearance de creatinina estimado) e exame de função hepática ao início de tratamento e, sempre que clinicamente indicado, devem repetir esses exames durante o tratamento. Pacientes em uso de ribavirina devem realizar hemograma e teste de creatinina nas semanas 4, 8 e 12 para avaliar anemia, ou com maior frequência, caso necessário. Nos casos de surgimento de anemia, a dose de ribavirina pode ser ajustada, levando-se em consideração a gravidade da anemia, a função renal e a presença de comorbidades, com especial atenção aos pacientes com doença renal crônica grave. Em pacientes sem cardiopatia, a dose de ribavirina pode ser reduzida para 500mg ou 750mg por dia, quando a hemoglobina estiver entre 8,5g e 10g/dL, e deverá ser suspensa caso os níveis de hemoglobina baixarem para menos de 8,5 g/dL. Em cardiopatas, a dose de ribavirina deve ser reduzida para 500mg se houver uma queda da hemoglobina ≥2g/dL em um período inferior a quatro semanas, devendo ser suspensa em pacientes sintomáticos ou a critério do médico assistente. Essa orientação também se aplica a pacientes com cirrose descompensada, os quais têm maior chance de apresentar esse evento adverso quando em uso de ribavirina. Pacientes em uso de alfapeguinterferona com plaquetas <50.000/mm3 deverão ter a dose do medicamento reduzida em 50%. Pacientes com cirrose hepática devem ser frequentemente monitorados em relação à função hepática, principalmente aqueles em uso de medicamentos inibidores de protease. Objetivos e critérios de supensão do tratamento Objetivos do tratamento O objetivo do tratamento é a obtenção da resposta virológica sustentada (RVS), ou seja, a ausência de HCV-RNA (CV-HCV) na 12a ou 24a semana após o término do tratamento. A realização do teste para identificação do HCV-RNA por método de biologia molecular está indicada para confirmar o diagnóstico de hepatite C crônica imediatamente antes de iniciar o tratamento, e na 12a ou 24a semana após o término do tratamento, para avaliar a eficácia terapêutica. A mensuração do HCV-RNA deve ser realizada por metodologia de PCR em tempo real com limite de detecção de <12 UI/mL. Ressalta-se que a hepatite C (aguda ou crônica) não confere imunidade protetora após a primeira infecção, havendo o risco de reinfecção. Mesmo após a eliminação espontânea do HCV, na fase aguda ou após a RVS, o paciente permanece sujeito à reinfecção caso mantenha a exposição aos fatores relacionados à infecção. Assim, recomenda-se o rastreamento de reinfecção pelo HCV, regularmente, em pacientes em risco contínuo de exposição, como homens que fazem sexo com homens, pessoas usuárias de drogas ilícitas e profissionais do sexo. Critérios de suspensão do tratamento O tratamento deverá ser suspenso nas seguintes situações: Ocorrência de eventos adversos importantes; Ausência de adesão ao tratamento; Identificação de situação que contraindique o tratamento, como a gestação; Elevação das aminotransferases em níveis dez vezes acima do limite superior da normalidade; Infecção bacteriana grave, independentemente da contagem de granulócitos; Ocorrência de sepse; Descompensação hepática, como ascite e encefalopatia, ou significativo aumento de bilirrubina direta, em pacientes previamente compensados; Pacientes em uso de alfapeguinterferona com plaquetas <25.000 mm3. Observação: o tempo de interrupção aceitável do uso de DAA não está definido. É possível que interrupções acima de três a quatro dias comprometam a resposta ao tratamento. Seguimento após RVS Pacientes com estadiamento de fibrose F3 e F4 não devem receber alta após a RVS. Além do rastreamento contínuo de CHC em pacientes com F3 e F4 e rastreamento de varizes gastroesofágicas em F4, são sugeridas outras condutas. Aconselha-se a prevenção da reinfecção; o monitoramento da abstinência de álcool, drogas e tabaco; e o controle das comorbidades, do peso e dos distúrbios metabólicos. O uso de medicações potencialmente hepatotóxicas deve ser evitado. Pacientes F0-F2, na ausência de outras contraindicações para alta, podem ser liberados, com aconselhamento. Pacientes F2, com outros fatores de risco para progressão de doença hepática (etilistas, coinfectados pelo HIV e/ou HBV, obesos, diabéticos, etc.) deverão ser acompanhados ambulatorialmente, a critério do médico assistente. Regulação/controle/avaliação pelo gestor Devem ser observados os critérios de inclusão e exclusão de pacientes constantes neste PCDT e a duração e a monitorização do tratamento, bem como a verificação periódica das doses prescritas e dispensadas, a adequação de uso do medicamento e os critérios de interrupção do tratamento. Em função da complexidade dos casos e da necessidade de monitoramento contínuo, os pacientes com cirrose descompensada deverão ser atendidos e tratados exclusivamente em centros de referência. Casos de coinfecção HCV/HBV em crianças deverão ser, preferencialmente, monitorados e tratados em centros de referência e atendidos por médicos experientes no manejo de crianças com hepatopatias, seguindo-se as recomendações terapêuticas para tratamento das hepatites B e C. Pacientes com depuração de creatinina inferior a 30mL/min deverão ter tratamento supervisionado por médicos especialistas no tratamento de hepatite C e doença renal avançada. Deve-se verificar, na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename) vigente, em qual Componente da Assistência Farmacêutica se encontram os medicamentos preconizado. RESUMO VACINAS