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<p>PSICOLOGIA E</p><p>A PESSOA COM</p><p>DEFICIÊNCIA</p><p>Joseuda Borges</p><p>Castro Lopes</p><p>Atuação do psicólogo no</p><p>âmbito educacional</p><p>Objetivos de aprendizagem</p><p>Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:</p><p> Discutir como a psicologia enquanto ciência contribui com o sistema</p><p>escolar.</p><p> Identificar como o psicólogo escolar pode contribuir com o sistema</p><p>escolar compreendendo a aprendizagem e o desenvolvimento dos</p><p>sujeitos que estão inseridos nesse contexto.</p><p> Relacionar os conceitos desenvolvidos com a atuação do profissional.</p><p>Introdução</p><p>Neste capítulo, você vai estudar a contribuição da psicologia para a edu-</p><p>cação e o sistema escolar, assim como as implicações dessa contribuição.</p><p>Por um lado, a psicologia traz novas abordagens e conhecimentos à</p><p>escola; por outro, sua aplicação é a base de preconceitos e discriminação.</p><p>Como você vai ver, é possível falar em psicologia da educação e psi-</p><p>cologia escolar. De modo geral, a primeira estaria relacionada à teoria e a</p><p>segunda, à prática. No contexto teórico, são relevantes as contribuições</p><p>de Piaget e Vygotsky. No contexto prático brasileiro, as reflexões de Maria</p><p>Helena Patto merecem destaque. Essa autora afirma que o psicólogo deve</p><p>atuar a fim de modificar os processos de culpabilização e de exclusão</p><p>dos alunos.</p><p>Contribuições da psicologia para o sistema escolar</p><p>Você já deve ter ouvido falar em psicologia educacional e psicologia escolar,</p><p>não é? Apesar de essas duas noções estarem intimamente ligadas, é possível</p><p>diferenciá-las por meio do objeto de estudo e do local de aplicação (BARBOSA;</p><p>SOUZA, 2012; ANTUNES, 2008).</p><p>C13_Psicologia_deficiencia.indd 1 23/08/2018 15:47:58</p><p>De modo geral, a psicologia da educação corresponde à produç ã o de sabe-</p><p>res sobre o processo educativo (teoria). Já a psicologia escolar é o campo de</p><p>atuaç ã o do psicó logo em contextos educativos diversos, o que inclui a escola</p><p>e as relaç õ es que nela se estabelecem (prática). Antunes (2008 apud BAR-</p><p>BOSA; SOUZA, 2012) frisa a profunda relação entre psicologia educacional</p><p>e psicologia escolar. Contudo, você deve notar que uma não se reduz à outra,</p><p>guardando cada qual a sua autonomia. No Brasil, essa distinção relaciona-se</p><p>também ao contexto sócio-histórico, que trouxe a cisão entre teoria e prática. No</p><p>sistema escolar, existem contribuições de ambas as vertentes, teórica e prática.</p><p>Nos anos 1930, um pouco antes de a psicologia ser reconhecida como ciência</p><p>e profissão (1964), a psicologia educacional voltava-se para o atendimento</p><p>das demandas das Escolas Normais e dos cursos de formaç ã o. Refletindo os</p><p>estudos psicológicos internacionais — teorias do desenvolvimento, teorias de</p><p>aprendizagem, psicometria —, nessa época a psicologia educacional tinha o</p><p>objetivo principal de:</p><p>[...] diagnosticar as crianç as no interior da escola quanto a sua “normalidade”</p><p>ou “anormalidade” e, baseada nos experimentos e testagens, garantia-se a</p><p>divisã o em classes e/ou escolas especiais para atendimento das “necessidades</p><p>especiais” se fosse o caso (BARBOSA; SOUZA, 2012, p. 168).</p><p>A psicologia adquiriu seu status cientí fico em 1879, na Alemanha, com Wilhelm</p><p>Wundt. Mé dico fisiologista, Wundt interessava-se por desenvolver estudos sobre</p><p>a psicofisiologia dos processos mentais. Foi precedido por Francis Galton, que, em</p><p>1869, perí odo pó s-Revoluç ã o Industrial, realizou vá rios trabalhos em seu laborató rio</p><p>de psicometria, em Londres, tendo como objetivo medir a capacidade intelectual e</p><p>provar a determinaç ã o hereditá ria das aptidõ es humanas. A ideia era que fosse possí vel</p><p>selecionar as pessoas mais capazes, aprimorando a espé cie humana.</p><p>É importante você notar que nesse período as diferenç as entre classes sociais recebiam</p><p>respaldo de instrumentos de medida de inteligê ncia e personalidade como aqueles</p><p>criados por Galton. A primeira escala mé trica de inteligê ncia infantil foi desenvolvida</p><p>por Binet, na Franç a, em 1905. Esse estudioso desejava desenvolver instrumentos que</p><p>possibilitassem a seleç ã o, a adaptaç ã o, a orientaç ã o e a classificaç ã o de crianç as em</p><p>normais e anormais. Rapidamente, as escolas europeias e norte-americanas adotaram</p><p>os testes. Decorre daí a divisã o de crianç as em grupos homogê neos, separados em</p><p>normais e anormais, o que implicava uma seleç ã o do que era ensinado a cada um</p><p>(LIMA, 2005).</p><p>Atuação do psicólogo no âmbito educacional2</p><p>C13_Psicologia_deficiencia.indd 2 23/08/2018 15:47:58</p><p>Para Yazlle (1997 apud BARBOSA; SOUZA, 2012, p. 168), a educação</p><p>encontrou na psicologia “[...] explicaç õ es para as diferenç as individuais que</p><p>culpabilizavam o sujeito pela sua condiç ã o e ocultavam as desigualdades</p><p>sociais”. Recaía-se num determinismo sociológico. Tal visão alinhava-se ao</p><p>que era discutido no contexto americano quanto à teoria da carência cultural.</p><p>Da biologia aos fatores ambientais e socioeconômicos</p><p>Um novo marco surgiu na década de 1970, quando se buscavam novas explica-</p><p>ções para o comportamento escolar. Nesse período, o foco dado aos problemas</p><p>de aprendizagem mudou. Minimizaram-se os fatores biológicos e deu-se</p><p>ênfase aos fatores ambientais e socioeconômicos. Deixou-se de pensar em</p><p>“[...] objetivos ajustató rios ou discriminató rios para [se] pensar nos processos</p><p>educacionais de um modo mais amplo” (BARBOSA; SOUZA, 2012, p. 170).</p><p>É nesse contexto que surge a teoria da carência cultural. Segundo Barbosa</p><p>(2011), ela foi a resposta que o Estado norte-americano deu aos movimentos</p><p>sociais da década de 1970. A ideia era explicar as diferenç as individuais entre</p><p>as minorias pobres, negras e latinas no paí s partindo do princí pio de que a</p><p>inteligê ncia é algo que se pode aumentar pela estimulaç ã o ambiental.</p><p>Essa teoria reforçou estereótipos do senso comum e a perpetuação da</p><p>crença de que as crianças pobres possuíam baixo rendimento escolar devido</p><p>às precariedades socioeconômicas e culturais de suas famílias. Por outro</p><p>lado, possibilitou pensar a escola como uma instituição na qual se exerce</p><p>dominação cultural.</p><p>Para Kramer (1982), a teoria da carência cultural é a base dos programas compensatórios</p><p>que discriminam a cultura de origem culpabilizando as crianças, as famílias e o meio</p><p>pelo fracasso escolar. No link a seguir, você pode ler o artigo da autora intitulado</p><p>Privação cultural e educação compensatória: uma análise crítica.</p><p>https://goo.gl/w7Bu4F</p><p>3Atuação do psicólogo no âmbito educacional</p><p>C13_Psicologia_deficiencia.indd 3 23/08/2018 15:47:58</p><p>Uma visão mais ampla</p><p>Em 1981, Maria Helena Patto (1987) trouxe um novo olhar para o processo de</p><p>escolarizaç ã o e para o contexto sociopolí tico e cultural em que os processos</p><p>educativos estavam inseridos. A autora questionou o discurso de que o fracasso</p><p>seria culpa do aluno ou de sua família. Para ela, a proporção de determinantes</p><p>institucionais e sociais era maior do que a de problemas emocionais, orgânicos</p><p>e neurológicos. Assim, ela rompeu com as visões psicologizantes, da carência</p><p>cultural e das difi culdades de aprendizagem (PATTO, 1999).</p><p>Bernard Lahire, professor de sociologia da Universidade Lumière de Lyon II, na França, em</p><p>seu livro Sucesso escolar nos meios populares: As razões do improvável (1997), demonstra que</p><p>o bom ou o mau desempenho escolar não está necessariamente ligado às condições</p><p>socioeconômicas do aluno. Há crianças pobres com grande rendimento escolar e vice-versa.</p><p>Dessa perspectiva, a psicologia educacional é agora entendida como tradicional</p><p>e representante de todo o pensamento anterior de cunho ajustató rio, adaptacionista,</p><p>discriminató rio. Ela ora assume feiç õ es biologicistas, medicalizantes; ora defende</p><p>teorias como aquelas oriundas do pensamento higienista e da carê ncia cultural.</p><p>A psicologia escolar, também chamada de psicologia escolar crítica, traz</p><p>uma nova compreensã o. Ela busca investigar e intervir nos contextos educacio-</p><p>nais e processos de escolarizaç ã o. Entende que o “nã o aprender” relaciona-se</p><p>a uma produç ã o histórica do fracasso escolar que</p><p>inclui as polí ticas pú blicas</p><p>educacionais, a formaç ã o docente, o material didá tico, a organizaç ã o do espaç o</p><p>escolar, entre outros aspectos.</p><p>Agora que você já conhece essa diferenciação, vai ver a seguir as contribuições</p><p>da psicologia da educação à aprendizagem e ao desenvolvimento dos sujeitos.</p><p>Psicologia, aprendizagem e desenvolvimento</p><p>De acordo com Santrock (2010), a psicologia dialoga com a educação desde os</p><p>seus primórdios. William James, John Dewey e Thorndike seriam os pioneiros</p><p>no campo da psicologia da educação. As ideias defendidas por eles estão</p><p>presentes em muitas metodologias de ensino em vigor. De forma resumida:</p><p>Atuação do psicólogo no âmbito educacional4</p><p>C13_Psicologia_deficiencia.indd 4 23/08/2018 15:47:58</p><p> William James enfatizava a importância de se observar o ensino em sala</p><p>de aula. Achava que os experimentos em laboratório não capturavam o</p><p>que realmente acontecia em termos de como ensinar crianças.</p><p> Para John Dewey, a criança era um aprendiz ativo. A educação de-</p><p>veria focar a criança como um todo e enfatizar a adaptação dela ao</p><p>ambiente. Para ele, as crianças não deveriam ser educadas apenas em</p><p>tópicos acadêmicos, mas deveriam aprender a pensar e a se adaptar a</p><p>um mundo fora da escola.</p><p> Thorndike, por sua vez, defendia uma base científica para a psicologia</p><p>da educação, que deveria focar a medição.</p><p>Foi a visão de Thorndike que prevaleceu na primeira metade do século XX.</p><p>A partir dessa visão, focando em comportamentos observáveis, Skinner criou</p><p>uma metodologia de aprendizagem baseada no reforço do comportamento dos</p><p>estudantes a cada objetivo alcançado. Com o advento da revolução cognitiva, a</p><p>partir da década de 1980, os conceitos de memória, aprendizagem e raciocínio</p><p>passaram a ser aplicados também ao contexto educacional, retomando de certa</p><p>forma James e Dewey.</p><p>Também é interessante que você conheça Édouard Claparède, que criticava a es-</p><p>cola de seu tempo com os mesmos argumentos do filósofo norte-americano John</p><p>Dewey, com quem compartilhava a visão de uma escola ativa. Claparède defendia</p><p>uma abordagem funcionalista da psicologia, ou seja, para ele, o pensamento seria uma</p><p>atividade biológica a serviço do organismo, com funções de adaptação ao ambiente.</p><p>Santrock (2010) e Coll, Marchesi e Palacios (2007) elencam diversas contri-</p><p>buições da psicologia para a educação, que incluem os estudos de linguagem,</p><p>motivação e inteligência, passando pelas teorias de desenvolvimento humano.</p><p>Destacam-se, neste último viés, as contribuições de Piaget, Vygotsky e Erick-</p><p>son, que você vai conhecer a seguir.</p><p>A teoria do desenvolvimento cognitivo de Piaget</p><p>Para Piaget (1896–1980), a criança organiza (agrupa pensamentos e compor-</p><p>tamentos isolados) seu mundo por meio de ações ou representações mentais</p><p>5Atuação do psicólogo no âmbito educacional</p><p>C13_Psicologia_deficiencia.indd 5 23/08/2018 15:47:58</p><p>denominadas esquemas. Ao incorporar novas informações a um esquema,</p><p>a criança realiza um processo chamado de assimilação. Quando o esquema</p><p>se ajusta à nova informação assimilada, estando pronto para receber novas</p><p>informações e experiências, ocorre a acomodação. Dessa forma, o desenvol-</p><p>vimento cognitivo ocorre em estágios, de acordo com a idade aproximada.</p><p>Para Piaget, são quatro os estágios de desenvolvimento, descritos a seguir.</p><p> Estágio sensório-motor (do nascimento aos 2 anos): os bebês cons-</p><p>troem um entendimento de mundo coordenando as experiências senso-</p><p>riais (como a visão e a audição) com suas ações motoras (alcançar, tocar).</p><p>Realizações cognitivas: a) permanência do objeto — compreensão de</p><p>que objetos e eventos continuam a existir mesmo quando não podem</p><p>ser vistos, ouvidos ou tocados; b) percepção gradual de que há uma</p><p>diferença ou um limite entre a pessoa e o ambiente que a cerca.</p><p> Estágio pré-operacional (dos 2 aos 7 anos): pode ser dividido em dois</p><p>subestágios: função simbólica (2 a 4 anos) e pensamento intuitivo (4 a 7</p><p>anos). No subestágio de função simbólica, a criança ganha habilidade de</p><p>representar mentalmente um objeto que não está presente. Isso amplia</p><p>o seu mundo mental. Além disso, ela adquire um uso mais amplo da</p><p>linguagem e da prática de brincadeiras de faz de conta. No subestágio</p><p>intuitivo, as crianças começam a usar raciocínios primitivos e a querer</p><p>respostas para uma variedade de perguntas.</p><p> Estágio operacional concreto (dos 7 aos 11 anos): envolve o uso de</p><p>operações. O raciocínio lógico substitui o intuitivo, mas somente em</p><p>situações concretas. Habilidades de classificação estão presentes, mas</p><p>problemas abstratos continuam sem solução. As crianças conseguem</p><p>fazer mentalmente o que antes só conseguiam fazer fisicamente. Tam-</p><p>bém conseguem reverter operações concretas. Uma operação concreta</p><p>importante é classificar ou dividir as coisas em diferentes categorias</p><p>ou subcategorias, levando em conta sua inter-relação.</p><p> Estágio lógico-formal (dos 11 aos 15 anos): os indivíduos conseguem</p><p>ir além do raciocínio baseado apenas em experiências concretas e</p><p>pensam de maneira mais abstrata, idealista e lógica. Isso se evidencia</p><p>na solução de problemas verbais. Possuem as habilidades de idealizar e</p><p>imaginar possibilidades. Também começam a pensar de maneira lógica.</p><p>Desenvolvem estratégias para resolver problemas e testar soluções.</p><p>Atuação do psicólogo no âmbito educacional6</p><p>C13_Psicologia_deficiencia.indd 6 23/08/2018 15:47:58</p><p>A teoria sociocultural de Vygotsky</p><p>Para Vygotsky (1896–1934), a aprendizagem é um processo contínuo. Ela se</p><p>inicia antes da escola, onde as crianças chegam com uma série de conheci-</p><p>mentos adquiridos. A escola introduz elementos novos, sistematizados, que</p><p>não estão acessíveis à observação ou à ação imediata da criança.</p><p>Segundo Vygotsky, a evolução intelectual é caracterizada por saltos qualitati-</p><p>vos de um nível de conhecimento para outro. Existe uma zona, a zona proximal,</p><p>que separa o que a criança é capaz de fazer (desenvolvimento real) daquilo que</p><p>ela tem potencial de fazer (desenvolvimento potencial), mas que no momento</p><p>só é capaz de realizar com auxílio de alguém mais experiente (mediador). Na</p><p>escola, o professor e os colegas mais experientes são os principais mediadores.</p><p>Assim, as experiências são muito importantes. A criança aprende por</p><p>meio de diálogo, colaboração, imitação. A distância entre os dois níveis de</p><p>desenvolvimento chama-se zona de desenvolvimento proximal (ZDP).</p><p>Para aprender mais sobre o trabalho de Vygotsky, leia a obra A Formação Social de Mente.</p><p>A teoria psicossocial de Erickson</p><p>Para Erickson (1902–1994), o desenvolvimento humano ocorre em oito es-</p><p>tágios psicossociais que têm por base as relações sociais. Em cada estágio, o</p><p>ego (sentido freudiano) passa por uma crise (que dá nome ao estágio). Essa</p><p>crise pode ter um desfecho positivo ou negativo. Da solução positiva da crise,</p><p>surge um ego mais rico e forte; da solução negativa, um ego mais fragilizado.</p><p>1. Confiança versus desconfiança: essa seria a fase da primeira infância,</p><p>em que se inicia a relação social do bebê. A atenção do bebê se volta à</p><p>mãe, que provê seu conforto, satisfaz suas ansiedades e necessidades.</p><p>Ao notar que sua mãe não está ali, ou está demorando a voltar, o bebê</p><p>espera o seu retorno. Quando a mãe volta, ele compreende que é possível</p><p>querer e esperar. Ao vivenciar positivamente essas descobertas, e quando</p><p>a mãe confirma suas expectativas e esperanças, o bebê desenvolve a</p><p>confiança. Ou seja, a criança tem a sensação de que o mundo é bom,</p><p>7Atuação do psicólogo no âmbito educacional</p><p>C13_Psicologia_deficiencia.indd 7 23/08/2018 15:47:58</p><p>de que as coisas podem ser reais e confiáveis. Do contrário, surge a</p><p>desconfiança, o sentimento de que o mundo não corresponde às suas</p><p>expectativas, de que é mau e ingrato.</p><p>2. Autonomia versus vergonha e dúvida: nessa fase, a criança já tem</p><p>algum controle de seus movimentos musculares, então direciona sua</p><p>energia às experiências ligadas à atividade exploratória. Se a exploração</p><p>é encorajada, ela</p><p>desenvolve autonomia e independência. Se for cons-</p><p>tantemente impedida ou excessivamente protegida, ela sente vergonha,</p><p>infelicidade e duvida de si mesma.</p><p>3. Iniciativa versus culpa: nesse estágio, existe um conflito entre o desejo</p><p>de agir independentemente e a culpa que surge pelas consequências.</p><p>4. Diligência versus inferioridade: crescem as competências sociais e</p><p>acadêmicas da criança. As dificuldades nesse estágio geram sentimentos</p><p>de fracasso e inadequação.</p><p>5. Identidade versus confusão de identidade: o adolescente precisa de</p><p>segurança frente a todas as transformações — físicas e psicológicas — do</p><p>período. Ele começa a duvidar de tudo em que confiava anteriormente —</p><p>conhecimentos, habilidades e experiências —, o que traz uma crise aguda</p><p>de personalidade. Se os adolescentes processam bem a construção de sua</p><p>identidade, isso leva a um caráter sólido e a uma individualidade equilibrada.</p><p>Se isso não funcionar, experimentarão insegurança e poderão ficar presos</p><p>a uma preocupação constante ou a uma atividade autodestrutiva.</p><p>6. Intimidade versus isolamento: ao estabelecer uma identidade definitiva</p><p>e bem fortalecida, o indivíduo estará pronto para se unir a outra pessoa.</p><p>É preciso que tenha construído um ego forte e autônomo para aceitar o</p><p>convívio com outro ego sem se sentir anulado ou ameaçado. Quando</p><p>isso não acontece, a pessoa vai preferir o isolamento à união, pois terá</p><p>medo de compromissos.</p><p>7. Generatividade versus estagnação: nessa fase, o indivíduo tem a</p><p>preocupação com tudo o que pode ser gerado, desde filhos até ideias</p><p>e produtos. É uma forma de fazer-se sobreviver, de fazer valer todo o</p><p>esforço de sua vida.</p><p>8. Integridade versus desespero: agora é tempo de refletir, rever a vida.</p><p>Essa retrospectiva pode ser vivenciada de diferentes formas. Por um</p><p>lado, a pessoa pode entrar em desespero ao ver a morte se aproximando.</p><p>Nesse caso, ela terá o sentimento de que o tempo acabou e de que nada</p><p>mais pode fazer pela sociedade e pela família, caindo na nostalgia e</p><p>na tristeza. Por outro lado, pode ter a sensação de dever cumprido e</p><p>dividir sua experiência e sabedoria.</p><p>Atuação do psicólogo no âmbito educacional8</p><p>C13_Psicologia_deficiencia.indd 8 23/08/2018 15:47:58</p><p>A atuação do psicólogo escolar</p><p>Meira (2000) alerta que há uma pergunta fundamental a respeito da formaç ã o</p><p>do psicó logo: qual deve ser o compromisso é tico-polí tico do psicó logo que</p><p>se quer formar? Hoje, se compreende que o psicólogo escolar deve se com-</p><p>prometer com a modifi caç ã o do processo de culpabilizaç ã o e de exclusã o</p><p>dos alunos (OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚ JO, 2009). Contudo, isso tem</p><p>realmente ocorrido?</p><p>Souza et al. (2014), ao analisar publicações da área, indicam que ainda não</p><p>se rompeu com a perspectiva tradicional. Apesar das críticas, ainda observa-se</p><p>de forma recorrente a utilizaç ã o de instrumentos como anamnese e té cnicas</p><p>psicomé tricas visando a identificar um dé ficit, uma defasagem ou um distú rbio</p><p>nas crianç as e/ou pais atendidos. Conforme discutido e segundo a maioria das</p><p>publicaç õ es, esse tipo de atuaç ã o nã o tem se mostrado uma ferramenta ú til.</p><p>Os problemas educacionais possuem uma origem mais ampla e contextual.</p><p>De modo geral, as críticas são:</p><p>a) ao uso de testes psicoló gicos como sendo ú nica forma de aproximaç ã o das</p><p>queixas escolares; b) à explicaç ã o medicalizante das dificuldades ocorridas</p><p>nos processos de escolarizaç ã o; c) à nã o implicaç ã o dos fatores intraesco-</p><p>lares para entender e atender à s problemá ticas que surgem no processo de</p><p>escolarizaç ã o; d) à formaç ã o acrí tica dos estudantes de Psicologia; e) à prá tica</p><p>psicodiagnó stica presente nas clí nicas, que desconsideram os processos esco-</p><p>lares no atendimento à queixa escolar; f) ao atendimento clí nico das queixas</p><p>escolares, com foco nos indiví duos; g) à psicologizaç ã o das questõ es escolares</p><p>que enfatiza os conteú dos emocionais em detrimento da compreensã o das</p><p>relaç õ es institucionais (SOUZA et al., 2014, p. 113).</p><p>As “soluções” propostas apontam para a consideração dos aspectos so-</p><p>ciais, polí ticos e institucionais relacionados à queixa escolar. Dois autores se</p><p>destacam: Tanamachi (2000) e Meira (2000).</p><p>Para Tanamachi (2000 apud SOUZA et al. 2014, p. 132),</p><p>[...] o fazer crí tico do psicó logo escolar deve passar pela colaboraç ã o na criaç ã o</p><p>de condiç õ es concretas de ensino que garantam aprendizagem efetiva e fa-</p><p>vorecer uma aç ã o transformadora, visando crescimento e desenvolvimento</p><p>criativo, alé m da multiplicidade de aç õ es profissionais.</p><p>Para Meira (2000 apud SOUZA, 2014, p. 133), o profissional deve atuar</p><p>para “[...] colaborar na produç ã o de humanidade nos indiví duos e na luta pela</p><p>9Atuação do psicólogo no âmbito educacional</p><p>C13_Psicologia_deficiencia.indd 9 23/08/2018 15:47:59</p><p>transformaç ã o das relaç õ es sociais a partir da participaç ã o efetiva no processo</p><p>de democratizaç ã o da Educaç ã o”, contribuindo para “[...] transformaç õ es</p><p>qualitativas da aç ã o educativa e para que a escola cumpra sua funç ã o so-</p><p>cial de disseminaç ã o dos conhecimentos historicamente acumulados pela</p><p>humanidade”.</p><p>Souza et al. (2014) não apenas discutem a conduta de intervenç ã o do</p><p>psicó logo na escola, mas propõem ações de forma a:</p><p> construir um espaç o de escuta;</p><p> excluir o foco colocado na “crianç a problema”;</p><p> valorizar a produç ã o das crianç as de modo geral;</p><p> entender a escola como o principal agente de inserç ã o social;</p><p> incluir professores no processo de intervenção.</p><p>A seguir, você pode ver algumas das ações propostas.</p><p> Entrevistar os pais e/ou responsá veis para entender sua concepç ã o</p><p>sobre a queixa escolar.</p><p> Considerar a versã o que a crianç a apresenta a respeito de sua histó ria</p><p>escolar e dos problemas a ela atribuí dos.</p><p> Realizar grupos com professores para discutir e refletir a respeito dos</p><p>problemas encontrados nas instituiç õ es escolares, realizando leituras</p><p>orientadas e dinâ micas de grupo.</p><p> Realizar reuniõ es sobre temas especí ficos relacionados ao cotidiano</p><p>escolar, com todos os envolvidos no processo de escolarizaç ã o.</p><p> Realizar trabalhos no interior da escola para ajudar o profissional a</p><p>ampliar o seu entendimento sobre a situaç ã o escolar das crianç as com</p><p>dificuldades em seu processo de escolarizaç ã o; e discutir as estraté gias</p><p>pedagó gicas utilizadas pelos professores.</p><p> Encontrar formas de avaliaç ã o e intervenç ã o que rompam com o modelo</p><p>individualizante.</p><p>É importante você notar que tanto a psicologia educacional quanto a psico-</p><p>logia escolar trazem contribuições relevantes para o sistema de ensino. Barbosa</p><p>e Souza (2012) propõem a adoção da terminologia psicologia educacional e</p><p>escolar. Tal proposta é interessante pois considera a histó ria desse amplo e</p><p>multifacetado campo de conhecimento. Além disso, essa terminologia valoriza</p><p>as contribuiç õ es relevantes para o campo educacional, assim como evidencia a</p><p>necessidade de um processo de escolarização sem discriminaç ã o e preconceito.</p><p>Atuação do psicólogo no âmbito educacional10</p><p>C13_Psicologia_deficiencia.indd 10 23/08/2018 15:47:59</p><p>ANTUNES, M. A. M. Psicologia escolar e educacional: história, compromissos e pers-</p><p>pectivas. Psicologia Escolar e Educacional, v. 12, n. 2, 2008. Disponí vel em: <http://www.</p><p>scielo.br/scielo.php?pid=S1413-85572008000200020&script=sci_arttext>. Acesso em:</p><p>22 ago. 2018.</p><p>BARBOSA, D. R. Estudos para uma histó ria da psicologia educacional e escolar no Brasil. Tese</p><p>(Doutorado) - Programa de Pó s-Graduaç ã o em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento</p><p>Humano, Instituto de Psicologia, Universidade de Sã o Paulo, Sã o Paulo. 2011. Disponível</p><p>em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47131/tde-22072011-163136/pt-br.</p><p>php>. Acesso em: 22 ago. 2018.</p><p>BARBOSA, D. R.; SOUZA, M. P. R. de. Psicologia educacional ou escolar? Eis a questã o.</p><p>Revista Semestral da Associaç ã o Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, v. 16, n. 1,</p><p>jan./jum. 2012. Disponível em:</p><p><http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&p</p><p>id=S1413-85572012000100018>. Acesso em: 22 ago. 2018.</p><p>COLL, C.; MARCHESI, A.; PALACIOS, A. (Org.). Desenvolvimento psicológico e educação:</p><p>psicologia da educação. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2007. v. 2.</p><p>KRAMER, S. Privação cultural e educação compensatória: uma análise crítica. Cadernos</p><p>de Pesquisa, v. 42, ago. 1982. 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