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<p>DESCRIÇÃO</p><p>Apresentação da farmacogenética como a ciência das respostas distintas a fármacos e suas implicações</p><p>e aplicações clínicas.</p><p>PROPÓSITO</p><p>Conhecer as bases da genética aplicadas à farmacologia e reconhecer o impacto de sua aplicação em</p><p>distúrbios genéticos da cinética e na ação dos fármacos, como bagagem fundamental para os</p><p>profissionais atuantes, direta ou indiretamente, na elaboração de novos fármacos e nos estudos de</p><p>aplicações da medicina moderna e personalizada.</p><p>OBJETIVOS</p><p>MÓDULO 1</p><p>Identificar os principais eventos genéticos e as implicações éticas da farmacogenética</p><p>MÓDULO 2</p><p>Reconhecer as principais relações genes-fármacos em farmacogenética</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>A humanidade é composta por bilhões de indivíduos, cada um de nós diferente dos demais. Nossas</p><p>características culturais, sociais, afetivas e físicas nos dão a ideia de indivíduos e, ao mesmo tempo, de</p><p>coletividade.</p><p>Uma das principais fontes das diferenças entre nós está profundamente conectada ao nosso organismo:</p><p>a informação genética. Literalmente, cada pessoa se difere da outra em nível genético, com a exceção</p><p>de gêmeos idênticos (sendo talvez a única).</p><p>Sociedades e culturas sempre se desenvolveram por meio das trocas comerciais e genéticas, o que</p><p>causou nossa variabilidade genética e permitiu nossa evolução. Cada indivíduo possui, dessa forma,</p><p>uma miríade de genes que podem ser muito semelhantes ou distintos do seu vizinho, e isso pode afetar</p><p>diretamente como a saúde de cada um funciona e nossas respostas a diferentes medicamentos.</p><p>A seguir, exploraremos como o ramo que estuda a relação entre a genética e a farmacologia surgiu,</p><p>suas ideias e técnicas principais, e suas aplicações clínicas e científicas.</p><p>MÓDULO 1</p><p> Identificar os principais eventos genéticos e as implicações éticas da farmacogenética</p><p>HISTÓRIA DA FARMACOGENÉTICA E</p><p>CONCEITOS BÁSICOS</p><p>A farmacogenética é uma ciência recente que busca explicar variações na resposta a medicamentos e</p><p>drogas de caráter hereditário e populacional.</p><p>O entendimento de que indivíduos diferentes podem apresentar respostas variáveis ao mesmo</p><p>medicamento, por outro lado, não é novo. Remonta à Grécia Antiga e seus filósofos, precursores de</p><p>muitos conceitos-chave que temos hoje na filosofia e medicina ocidentais.</p><p> SAIBA MAIS</p><p>Na época, já se reconhecia que a ingestão de determinados alimentos, como o feijão-fava, poderia</p><p>causar o adoecimento e ser potencialmente fatal para algumas pessoas, enquanto para outras não</p><p>apresentava qualquer problema após a ingestão.</p><p>Por milênios, a exata causa de certas pessoas reagirem diferentemente a determinados compostos</p><p>químicos permaneceu oculta. Foi apenas no início do século passado que começamos a desvendar a</p><p>explicação para tal fenômeno, com a redescoberta dos trabalhos de Gregor Mendel (século XIX) sobre</p><p>a herança genética.</p><p> Gregor Mendel.</p><p>GREGOR MENDEL</p><p>Gregor Johann Mendel (1822-1884), foi um monge agostiniano, conhecido como o pai da genética pelos</p><p>seus relevantes estudos com ervilhas, o que lhe permitiu elaborar os conceitos fundamentais de como</p><p>as características são transmitidas de uma geração para a seguinte.</p><p>Mendel observou que fatores hereditários eram transmitidos às gerações futuras por meio dos gametas</p><p>(células reprodutivas maduras) e postulou três leis principais:</p><p>LEI DA DOMINÂNCIA</p><p>Explica o porquê de certa característica física predominar sobre outra, após cruzamento de dois</p><p>indivíduos com características discordantes ou após cruzamento de indivíduos com característica</p><p>dominante, porém híbridos geneticamente (também chamados de heterozigotos). A característica que se</p><p>manifesta mais frequentemente é chamada de dominante, e a que se manifesta menos frequentemente</p><p>é chamada de recessiva.</p><p>LEI DA SEGREGAÇÃO</p><p>Definida pela existência de pares de informações hereditárias (ou alelos) para cada característica, que</p><p>são separadas durante a produção de gametas, de forma que cada gameta apresente apenas uma</p><p>cópia de informação para cada característica.</p><p>javascript:void(0)</p><p>LEI DA SEGREGAÇÃO INDEPENDENTE</p><p>Explica que cada par de alelos é segregado de forma independente de outros alelos, tornando os</p><p>fenótipos independentes.</p><p> Herança Mendeliana.</p><p>Seus achados foram tão fundamentais para o campo, que Mendel é considerado o pai da genética.</p><p>Após a redescoberta dos trabalhos de Mendel, no início do século XX, foram criados os termos:</p><p>GENE</p><p>Do grego genos = nascimento, designando uma unidade hereditária mendeliana.</p><p>GENÓTIPO</p><p>Para descrever a composição genética de um indivíduo.</p><p>FENÓTIPO</p><p>Como o conjunto de características físicas determinadas geneticamente, mas também influenciáveis</p><p>pelo ambiente.</p><p>GENÉTICA</p><p>Como ciência que estuda a hereditariedade.</p><p>Posteriormente, características hereditárias mais complexas, como a existência de níveis de dominância</p><p>e penetração, fenótipos determinados por múltiplos alelos, além da existência de regulações genéticas</p><p>em diversos níveis, entre muitos outros tópicos de estudo, enriqueceram nossa compreensão da</p><p>genética.</p><p>javascript:void(0)</p><p>javascript:void(0)</p><p>javascript:void(0)</p><p>javascript:void(0)</p><p>Por outro lado, a ideia de que fármacos e outros compostos químicos têm efeitos distintos entre</p><p>indivíduos de acordo com sua herança genética começou a ser formulada.</p><p></p><p>Em 1931, o médico britânico Archibald Garrod postulou a “química individual”, conceito sobre o qual</p><p>escreveu em seu livro Os Erros Inatos do Metabolismo (The Inborn Errors of Metabolism, em tradução</p><p>livre). Em sua obra, ele elabora a ideia de que todas as doenças são fruto de erros em alguma</p><p>etapa dos processos químicos do corpo, hipótese derivada de seus estudos de hereditariedade dos</p><p>processos bioquímicos. Essa seria a explicação para a observação de que “uma dose que é inócua para</p><p>a maioria das pessoas, pode apresentar efeitos tóxicos em alguns indivíduos, enquanto outros</p><p>demonstram tolerância excepcional à mesma droga’”.</p><p>Após a publicação do livro de Garrod, outros dados começaram a dar forma e vislumbrar como a</p><p>genética está ligada às doenças e às diferentes reações a drogas. Larry Snyder foi um dos primeiros a</p><p>associar uma reação adversa a um composto orgânico com uma condição genética: algumas pessoas</p><p>apresentavam inabilidade de sentir o gosto amargo de feniltiocarbamida (phenylthiocarbamide — PTC)</p><p>em padrão autossômico recessivo.</p><p></p><p></p><p>Em 1937, foi descrita a indução farmacológica de porfiria (uma doença de manifestação cutânea), que</p><p>hoje sabemos que pode ser induzida por vários medicamentos. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi</p><p>visto que a primaquina, um antimalárico, era capaz de induzir doença hemolítica de soldados</p><p>americanos afrodescendentes. Anos depois, a hemólise desencadeada pela primaquina foi elucidada</p><p>como uma alteração metabólica das hemácias devido à deficiência de uma enzima (glicose-6-fosfato</p><p>desidrogenase — G6FD) que protege as hemácias contra danos oxidativos e destruição prematura.</p><p>javascript:void(0)</p><p>javascript:void(0)</p><p>PADRÃO AUTOSSÔMICO</p><p>Padrão autossômico é uma forma de transmissão de características hereditárias. Nesse caso, o gene</p><p>está presente em cromossomos autossômicos, ou seja, não ligados à característica sexual.</p><p>ANTIMALÁRICO</p><p>A malária é causada por um parasita que infecta as hemácias.</p><p>A farmacogenética começou a se tornar uma ciência independente e a ganhar foco na década de 1950,</p><p>quando várias observações sobre a interação entre drogas e alterações genéticas foram feitas.</p><p> EXEMPLO</p><p>Por exemplo, em 1953, cientistas observaram que a isoniazida, um antibiótico usado no tratamento da</p><p>tuberculose, poderia sofrer metabolização por acetilação (e inativação) de forma mais rápida ou lenta em</p><p>diferentes pacientes, alterando a efetividade da terapia. Muitos outros relatos de reações distintas a</p><p>fármacos foram feitos, de diferentes velocidades de metabolização a reações fatais a anestésicos.</p><p>Na mesma época, houve uma revolução no conhecimento da genética, com as descobertas de que a</p><p>hereditariedade dos organismos está contida no DNA (ácido desoxirribonucleico),</p><p>sua estrutura e como</p><p>a informação nele contida (genótipo) se converte — ou se traduz — em uma função ou estrutura</p><p>responsável pelo fenótipo.</p><p> Fita de DNA em frasco de medicamento.</p><p>No final da década de 1950, o médico russo Arno Motulsky refinou o conceito de que fatores genéticos</p><p>que controlam as enzimas estariam por trás da variabilidade de respostas aos fármacos. Seu trabalho</p><p>em genética humana e médica levou à sua indicação pelo Conselho sobre Drogas da Associação</p><p>Médica Americana para resumir os dados da época sobre genética e fármacos. Ele foi o primeiro a</p><p>formular o entendimento de que variações genéticas devem levar à seleção de drogas de acordo com as</p><p>necessidades pessoais, conceito base para o desenvolvimento da medicina personalizada (MP). O</p><p>termo farmacogenética foi cunhado por ele e por Friedrich Vogel, com quem escreveu o livro Genética</p><p>Humana: Problemas e Abordagens (Human Genetics: Problems and Approaches).</p><p>Um dos marcos históricos foi a identificação de alterações no metabolismo da debrisoquina (um anti-</p><p>hipertensivo) e da esparteína (um “cardiotônico” e antiarrítmico), a característica genética associada a</p><p>essas alterações e, principalmente, do gene que a causava: o da enzima citocromo P450 família 2</p><p>(cytochrome P450, ou CYP), subfamília D, polipeptídeo 6 (ou apenas CYP2D6), entre a década de 1970</p><p>e 1980. Posteriormente, ficaria provado que o CYP2D6 estaria envolvido no metabolismo de mais de 60</p><p>fármacos.</p><p>Outro grande marco foi atingido nessa época, com os estudos populacionais. Pesquisadores</p><p>demonstraram que uma parte de indivíduos pertencentes a determinado grupo étnico poderia ter maior</p><p>ou menor sensibilidade, diferentes taxas de metabolização e distintas reações a fármacos. Tomando</p><p>como exemplo o estudo que viu doença hemolítica em afro-americanos após uso de antimalárico, outros</p><p>estudos surgiram mostrando que populações do leste asiático apresentam metabolismo alterado de</p><p>barbitúricos, e que populações de origens africanas e chinesas diferem das de origem europeia na</p><p>velocidade de metabolização de debrisoquina, dentre muitos outros.</p><p>Como podemos ver, as primeiras relações entre fármacos e genética foram determinadas principalmente</p><p>por meio da variabilidade de parâmetros farmacocinéticos. Os pesquisadores olhavam respostas</p><p>distintas à determinada droga e avaliavam as velocidades de absorção, eliminação e as concentrações</p><p>plasmáticas do fármaco ativo de pessoas com respostas “normais”, em comparação com aquelas que</p><p>apresentavam resposta clínica alterada. Em seguida, os cientistas relacionavam a observação</p><p>farmacocinética com uma alteração metabólica determinada geneticamente que alterasse esses</p><p>parâmetros.</p><p>Já no final da década de 1980, pesquisadores identificaram que variações genéticas em proteínas-alvo</p><p>de determinados fármacos poderiam reduzir sua eficácia, sem, contudo, alterar parâmetros</p><p>farmacocinéticos.</p><p>Um dos primeiros relatos de alterações genéticas afetando a farmacodinâmica (ou seja, o mecanismo</p><p>de ação de um determinado fármaco) surgiu com a observação de que determinados indivíduos</p><p>apresentavam resistência hereditária a certos anticoagulantes, especialmente à varfarina. No entanto, foi</p><p>apenas no século XXI que o gene em si foi identificado. Outros medicamentos que possuem efeitos</p><p>adversos promovidos por alteração genética na farmacodinâmica incluem anti-hipertensivos,</p><p>anticoagulantes, antidepressivos e muitos outros.</p><p>Assim, considerando os mecanismos farmacocinéticos e farmacodinâmicos de variação genética</p><p>afetando a resposta aos fármacos, podemos classificar o uso da farmacogenética em três categorias:</p><p>Predição da dosagem de fármacos de forma individual, baseada nas características metabólicas de</p><p>cada pessoa.</p><p>Predição de ausência completa de resposta ao medicamento.</p><p>Predição de risco de toxicidade caso o fármaco seja usado.</p><p>Com o passar das décadas, mais e mais evidências comprovavam que as diferentes respostas a</p><p>medicamentos seriam decorrentes não só de alterações genéticas pontuais, mas sim de múltiplos</p><p>fatores genéticos que interagem entre si, além de fatores ambientais como a nutrição e idade.</p><p>Em 2002, foi criado um projeto ambicioso para catalogar as variações genéticas mais comuns. O</p><p>chamado HapMap foi concluído em 2009 e gerou um banco de dados extenso, gratuito e de acesso livre</p><p>para cientistas do mundo inteiro. Apesar de seu principal objetivo ter sido a identificação de variantes</p><p>genéticas envolvidas em doenças humanas, o HapMap também é útil na predição da resposta</p><p>farmacogenética.</p><p>HAPMAP</p><p>Em inglês, apelido para “mapa de haplótipos”. Os haplótipos são a forma de herança de genes que,</p><p>apesar de existirem como unidades separadas, são herdados juntos mais frequentemente.</p><p>O HapMap, somado aos estudos de genômica que têm sido desenvolvidos desde o início do século XXI,</p><p>permitiu que a farmacogenética ganhasse contorno mais holístico (global) com o desenvolvimento da</p><p>farmacogenômica.</p><p>E QUAL É A DIFERENÇA ENTRE FARMACOGENÉTICA E</p><p>FARMACOGENÔMICA?</p><p>Por vezes, os termos farmacogenética e farmacogenômica são usados de forma intercambiável.</p><p>Farmacogenética</p><p>Remete a como um gene específico influencia a resposta a um fármaco.</p><p></p><p>Farmacogenômica</p><p>Enquanto a farmacogenômica explora como um conjunto de genes pode influenciar a resposta a um ou</p><p>vários fármacos da mesma classe.</p><p>A farmacogenômica trouxe novos níveis de compreensão de como fármacos e drogas interagem com</p><p>organismos vivos complexos. As interações entre variantes genéticas e fatores externos têm sido objeto</p><p>de estudos em um campo novo e particularmente promissor da Medicina, a chamada medicina</p><p>personalizada. Mas, para entendermos com profundidade como fatores hereditários influenciam na</p><p>resposta aos fármacos, precisamos primeiro conhecer alguns princípios básicos da genética molecular.</p><p>javascript:void(0)</p><p>DESCOBRINDO E ENTENDENDO A</p><p>FARMACOGENÔMICA</p><p>A especialista Camila Baez abordará o histórico da farmacogenômica, sua importância e aplicações e as</p><p>perspectivas futuras.</p><p>CONCEITOS EM GENÉTICA MOLECULAR</p><p>Como sabemos, os seres vivos apresentam padrões de hereditariedade. Existem características físicas</p><p>(e metabólicas) que são passadas de geração em geração. Para entendermos a existência de variações</p><p>genéticas em nível molecular que afetam a farmacocinética e a farmacodinâmica, precisamos revisar</p><p>alguns conceitos básicos de genética molecular.</p><p>Apesar dos grandes avanços em genética feitos por Mendel e outros cientistas, o meio bioquímico pelo</p><p>qual os fatores hereditários existiam permaneceu um mistério até meados do século XX, quando o ácido</p><p>desoxirribonucleico foi identificado como o responsável pela informação genética.</p><p>O QUE É DNA?</p><p>O DNA consiste em uma longa sequência de nucleotídeos que se organizam em estruturas complexas</p><p>e compactas, os cromossomos. Em eucariontes, os cromossomos são lineares e encontrados no</p><p>núcleo. Cada cromossomo possui diversos genes, as unidades hereditárias mendelianas, que nada</p><p>mais são que sequências de DNA que codificam uma função específica.</p><p>EUCARIONTES</p><p>Organismos que apresentam membrana nuclear em suas células.</p><p>REPRESENTAÇÃO DA ESTRUTURA GENÉTICA DO DNA</p><p>javascript:void(0)</p><p>javascript:void(0)</p><p>Os humanos possuem duas cópias da maioria dos genes presentes em cromossomos homólogos (ou</p><p>seja, que apresentam estruturas genéticas e físicas muito semelhantes), e, por isso, somos chamados</p><p>diploides — em contraste, nossos gametas têm apenas uma cópia de cada cromossomo e, por isso,</p><p>são chamados haploides. A cópia que cada cromossomo homólogo tem de um determinado gene é</p><p>chamada de alelo. Portanto, alelos são versões alternativas de sequências genéticas localizadas no</p><p>mesmo lócus em cromossomos homólogos. Geralmente, um alelo contém uma versão — ou um</p><p>genótipo — que predomina sobre o outro alelo, determinando, assim, o fenótipo, ou seja, é dominante</p><p>sobre outro alelo, o recessivo.</p><p> Ploidia e alelos.</p><p>POLIMORFISMOS GENÉTICOS</p><p>Um dos momentos cruciais para a variabilidade genética é</p><p>a duplicação do DNA. Quando a célula está</p><p>no momento certo para a multiplicação, o DNA é duplicado pela DNA polimerase em um processo</p><p>conhecido por replicação e que pode ser dividido em três etapas:</p><p> Representação do complexo de replicação do DNA em uma célula.</p><p>HELICASE</p><p>PRIMASE</p><p>DNA POLIMERASE</p><p>Abertura da dupla hélice e separação das duas fitas de DNA promovida pela enzima helicase.</p><p>Em seguida, um complexo enzimático prepara as fitas-molde para a replicação. Nesta etapa, a primase</p><p>inicia a replicação, adicionando os primeiros nucleotídeos às fitas-filhas.</p><p>Após a colocação dos nucleotídeos iniciais (ou primers), a DNA polimerase se liga à fita-molde com as</p><p>bases nitrogenadas expostas, pareando-as por complementariedade a nucleotídeos trifosfatados livres e</p><p>catalisando a ligação fosfodiéster entre nucleotídeos. Essa ligação usa a energia do trifosfato do</p><p>nucleotídeo livre e é feita entre seu fosfato e o açúcar do nucleotídeo já presente na fita-filha.</p><p> ATENÇÃO</p><p>De certa forma, a DNA polimerase lê o DNA fita simples e duplica sua informação em uma nova fita. Por</p><p>vezes, no entanto, a DNA polimerase adiciona nucleotídeos errados à fita nascente de DNA, gerando o</p><p>que chamamos de mutações.</p><p>O QUE SÃO MUTAÇÕES?</p><p>As mutações são uma das principais formas de variabilidade genética e podem ser classificadas de</p><p>acordo com seu tamanho e função. De forma geral, são consideradas mutações as alterações genéticas</p><p>que alteram o número ou estrutura dos cromossomos (mutações cromossômicas) ou alteram a</p><p>sequência de DNA em porções menores que 100kb (mutações gênicas).</p><p>As mutações gênicas podem ser categorizadas em mutações pontuais por substituição de bases (com</p><p>ou sem alteração na sequência de proteínas), inserções e deleções de pequenos trechos do genoma.</p><p>Ainda, as mutações podem acontecer tanto em células somáticas quanto em células germinativas (ou</p><p>gametas).</p><p>javascript:void(0)</p><p> Exemplos de tipos de mutações.</p><p>Algumas mutações são prejudiciais às células e estão associadas a doenças genéticas que, de forma</p><p>geral, são raras. Por outro lado, as demais mutações podem permanecer na composição genética das</p><p>populações, alterando a sequência de DNA original de alelos, e constituindo uma variante. Conforme um</p><p>alelo variante é passado através das gerações e sua proporção na população aumenta, passamos a ter</p><p>o chamado polimorfismo genético. Por outro lado, chamamos de “alelo selvagem” ou “comum” o alelo</p><p>polimórfico que corresponde à maioria populacional, e que normalmente não está envolvido com</p><p>nenhum fenótipo farmacogenético.</p><p>ATIVIDADE DE REFLEXÃO DISCURSIVA</p><p>COMO OCORRE O POLIMORFISMO GENÉTICO?</p><p>RESPOSTA</p><p>Por definição, polimorfismo genético ocorre quando uma ou mais variações de um alelo são vistas em mais</p><p>de 1% da população de determinada espécie, independentemente de o tipo de mutação ser cromossômica</p><p>ou gênica. Assim, podemos considerar a existência de sexos em organismos superiores como exemplo de</p><p>polimorfismo, ou a existência de tipos sanguíneos (sistema ABO) em humanos.</p><p>A vasta maioria dos polimorfismos é do tipo mutações gênicas pontuais sinônimas (ou silenciosas, que</p><p>não trocam aminoácidos nas proteínas) ou não sinônimas (que resultam na alteração da sequência da</p><p>proteína), ambas conhecidas como SNPs (single nucleotide polymorphisms — polimorfismos de</p><p>nucleotídeos simples). Atualmente, mais de 14 milhões de SNPs são conhecidos, o que representa mais</p><p>de 0,3% de bases trocadas de um total de 3 bilhões de pares de base presentes no genoma humano.</p><p>No entanto, a maior parte dessas mutações não têm efeito conhecido. Em farmacogenética, estamos</p><p>particularmente interessados em polimorfismos que alterem a sequência de aminoácidos de proteínas, o</p><p>javascript:void(0)</p><p>que pode resultar em alterações na interação com fármacos, porém há exemplos de SNPs que não</p><p>alteram a proteína e influenciam na resposta das proteínas.</p><p> SNP não-sinônimos.</p><p>Ainda assim, mutações em regiões não codificadoras, como promotores e íntrons (regiões não</p><p>codificadoras intercaladas no meio das regiões codificadoras de um gene — os éxons), também podem</p><p>influenciar na expressão da proteína e são alvo da farmacogenética — apesar de serem</p><p>consideravelmente mais raras e de interpretação mais difícil.</p><p>Por serem largamente frequentes nas diversas populações humanas sem, na maioria das vezes, causar</p><p>nenhum fenótipo prejudicial, os polimorfismos podem permanecer indetectáveis clinicamente até que</p><p>determinada droga seja utilizada. Na maioria dos casos, no entanto, os polimorfismos não correspondem</p><p>a nenhuma alteração. Pelo contrário, eles são, de certa forma, o que nos dá a beleza da diversidade</p><p>genética.</p><p>Junto com nossa capacidade técnica de conhecer o genoma humano em profundidade para estudarmos</p><p>a farmacogenética e farmacogenômica de forma mais detalhada, vimos surgir desafios éticos</p><p>importantes, como discutiremos a seguir.</p><p>QUESTÕES ÉTICAS DA FARMACOGENÉTICA</p><p>A descoberta dos fenômenos biológicos relacionados às interações entre o perfil genético de indivíduos</p><p>a medicamentos específicos que hoje conhecemos como farmacogenética foi possível graças ao</p><p>progresso científico.</p><p>O surgimento de ferramentas para exploração em detalhes dos mecanismos de funcionamento das</p><p>drogas (para além dos efeitos observados pelos pacientes ou usuários), a capacidade de identificar</p><p>variações genéticas nas populações, e, é claro, a observação de que diferentes grupos ou indivíduos</p><p>reagem de formas distintas a um mesmo medicamento ou droga foram fundamentais. Tais ferramentas</p><p>têm sido continuamente melhoradas e substituídas por técnicas ainda mais eficazes na identificação dos</p><p>eventos genéticos que possam contribuir para um efeito farmacológico adverso. A contínua evolução</p><p>científica, logicamente, veio com alguns ônus, especialmente trazendo à tona questões éticas</p><p>relevantes.</p><p>Quais seriam essas questões éticas?</p><p>Um dos principais pontos éticos que levam ao questionamento do uso da farmacogenética em rotina</p><p>clínica é sua acessibilidade.</p><p>Décadas de investimento em pesquisa e desenvolvimento de fármacos melhores para cada grupo</p><p>genético representaram um custo que, em última instância, é frequentemente repassado ao paciente.</p><p>O que vemos na prática é que os pacientes e familiares de maior renda conseguem acesso às terapias</p><p>mais personalizadas, enquanto aqueles de menor renda não possuem qualquer amparo.</p><p>Tal desigualdade é vista, inclusive, no nível das nações: países com Índice de Desenvolvimento Humano</p><p>elevado apresentam muito mais oportunidades de terapia por farmacogenética do que os de IDH</p><p>inferiores. De fato, os países de IDH alto também possuem número muito maior de pesquisas genéticas</p><p>voltadas à farmacologia do que os demais. Isso em si induz a um viés: a maior parte das doenças</p><p>investigadas pela farmacogenética são doenças prevalentes em países ricos, pouco se</p><p>conhecendo sobre variações farmacogenéticas em países empobrecidos, com especial ausência</p><p>de estudos em minorias étnicas.</p><p>No mapa-múndi podemos observar as diferenças entre os IDH ao redor do mundo.</p><p> IDH ao redor do mundo.</p><p>Contudo, é entendido pela Organização Mundial da Saúde que o acesso à saúde e sua promoção sejam</p><p>universais. Esse assunto leva a alguns questionamentos:</p><p>Como podemos garantir que pessoas localizadas em países com IDH desiguais tenham o mesmo</p><p>acesso a terapias personalizadas e de alta performance, como a farmacogenética e farmacogenômica</p><p>prometem?</p><p>Como dizer que buscamos a igualdade na medicina se nem ao menos investimos o mesmo tempo e</p><p>dinheiro em investigar doenças genéticas e farmacogenéticas que acometem apenas populações</p><p>empobrecidas — e, é lógico, oferecer-lhes a mesma dedicação no desenvolvimento de medicamentos</p><p>eficazes?</p><p>Como podemos resolver essa desigualdade tão grave, quando não conseguimos nem garantir que</p><p>pacientes oriundos do mesmo país de altíssimo IDH tenham o mesmo direito e acesso à</p><p>farmacogenética independentemente de sua condição financeira?</p><p>Infelizmente, não há resposta clara e objetiva</p><p>para solução dessas questões, uma vez que a</p><p>farmacogenética em si exige uma gama de recursos altamente especializados, como exames de</p><p>diagnóstico, clínicas e hospitais para aplicação e acompanhamento de terapias mais complexas,</p><p>institutos de pesquisa para conhecimento das doenças e desenvolvimento de medicamentos, e pessoal</p><p>médico e de saúde altamente treinados.</p><p>Mesmo que consideremos aquele seleto grupo que tem acesso à farmacogenética, outras questões</p><p>fundamentais surgem quando pensamos no conteúdo da informação que clínicas e institutos têm a</p><p>respeito da genética de uma grande população: o que eles podem fazer com tamanha informação?</p><p>Mesmo em países de alto IDH, questionamentos quanto à confidencialidade e privacidade da</p><p>informação genética dos usuários e pacientes têm sido levantados. Uma das principais preocupações</p><p>quanto à informação genética é a de quebra da confidencialidade e privacidade por empresas de seguro</p><p>ou planos de saúde, empregadores e outras instituições e indivíduos que possam levar à discriminação</p><p>contra alguém que possua uma condição genética.</p><p> EXEMPLO</p><p>Planos e seguros de saúde podem aumentar os valores de mensalidade e coparticipação de exames e</p><p>terapias, ou até mesmo se recusarem a oferecer cobertura e serviços a pacientes baseados em perfis</p><p>genéticos mais “dispendiosos”.</p><p>Seria um futuro perturbador se não fizesse parte do passado: na década de 1970, populações afro-</p><p>americanas em alguns estados dos EUA foram compelidas a fazerem triagens para doenças genéticas e</p><p>posteriormente discriminadas por empregadores e seguradoras de saúde caso apresentassem doença</p><p>ou fossem portadoras do gene para a doença.</p><p>Foi apenas em 2008, após diretrizes internacionais terem sido estabelecidas, que o congresso</p><p>americano aprovou a lei-ato de não discriminação quanto à informação genética (Genetic Information</p><p>Nondiscrimination Act — GINA). O objetivo do ato é coibir os estados de requererem testagens</p><p>genéticas, proibir os seguros de saúde de cometerem discriminação genética (como critério de</p><p>elegibilidade para o seguro ou para determinação do preço do prêmio), e protegendo funcionários contra</p><p>exigências de empregadores (como requerimento de testes genéticos) ou de usar informações genéticas</p><p>em tomadas de decisão (contratações, demissões e promoções).</p><p>Os esforços internacionais contra a discriminação genética, entretanto, haviam começado cerca de uma</p><p>década antes da GINA ser aprovada nos EUA. Com o progresso no conhecimento da genética de</p><p>diversas populações humanas obtido pelo Projeto Genoma Humano, e a produção de quantidades</p><p>gigantescas de dados genéticos, discussões internacionais foram iniciadas para disposição de</p><p>mecanismos que impedissem a discriminação genética. Na virada do milênio, a Organização das</p><p>Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) aprovou a Declaração Universal sobre o</p><p>Genoma Humano e os Direitos Humanos (1997), complementada pela Declaração Internacional sobre</p><p>os Dados Genéticos Humanos (2004).</p><p>A redução de um indivíduo à sua condição genética, seja ela considerada favorável ou desfavorável em</p><p>qualquer ângulo, é eticamente reprovável e cientificamente errada. Ainda mais que, atualmente, é</p><p>reconhecido que a maioria das doenças genéticas têm influência multifatorial em diferentes níveis.</p><p>DECLARAÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DADOS</p><p>GENÉTICOS HUMANOS (2004)</p><p>Representa um guia para que Estados e nações formulem suas próprias legislações, para evitar a</p><p>discriminação genética, garantir o respeito à dignidade e direitos humanos e das liberdades</p><p>fundamentais, particularmente no tratamento e conservação de dados genéticos humanos e afins.</p><p>Países como EUA, Austrália, Canadá e a União Europeia (com variações entre os países que fazem</p><p>parte do bloco) já possuem legislação específica para promoção da não discriminação genética. O</p><p>Brasil, apesar de ser signatário da Declaração da UNESCO, permanece sem legislação específica</p><p>contra a discriminação genética e que regulamente o uso da farmacogenética.</p><p> RESUMINDO</p><p>Em outras palavras, a mera presença de um determinado genótipo associado a uma condição</p><p>considerada hereditária nem sempre é determinante para que ela ocorra, pois outros vários fatores</p><p>podem influenciar sua ocorrência. Reduzir indivíduos à sua informação genética pode não só acentuar</p><p>racismo e preconceitos que precisam ser removidos das sociedades, como gerar outras</p><p>marginalizações.</p><p>VERIFICANDO O APRENDIZADO</p><p>javascript:void(0)</p><p>MÓDULO 2</p><p> Reconhecer as principais relações genes-fármacos em farmacogenética</p><p>Com as evidências acumuladas de que polimorfismos genéticos frequentemente afetam a resposta a</p><p>fármacos em diferentes populações, a farmacogenética e farmacogenômica vêm crescendo em</p><p>conhecimento e atenção. Respostas inadequadas a medicamentos levaram a graves distúrbios e à</p><p>morte de pacientes no passado, o que seria completamente inaceitável nos dias de hoje, com as</p><p>ferramentas e o conhecimento disponíveis.</p><p> ATENÇÃO</p><p>Ainda assim, estimam-se milhares de mortes ao ano por reações adversas a medicamentos,</p><p>potencialmente preveníveis com o uso da farmacogenética. Somado a isso, anos ou décadas de</p><p>estudos no desenvolvimento farmacológico são, por vezes, desperdiçados ao não contemplarem os</p><p>perfis genéticos populacionais.</p><p>Múltiplos fatores têm influenciado a decisão sobre diferentes tratamentos, dentre ambientais,</p><p>nutricionais, idade, gênero, e genéticos, e, se usados em conjunto, podemos maximizar a eficácia das</p><p>terapias e ao mesmo tempo reduzir os riscos de reações adversas. Nesse sentido, a farmacogenética e</p><p>a farmacogenômica enriquecem grandemente o processo de tomada de decisão clínica a respeito do</p><p>melhor tratamento individual. Hoje, vemos começar um novo e excitante campo de intercessão entre</p><p>clínica, diagnóstico genético, fatores ambientais e farmacologia: a medicina personalizada.</p><p>MEDICINA PERSONALIZADA</p><p>A medicina personalizada, também conhecida como medicina de precisão, baseia-se na ideia de</p><p>utilizarmos a informação genética e o uso de biomarcadores como preditores para a melhor decisão</p><p>terapêutica para cada paciente.</p><p>COMO A MEDICINA PERSONALIZADA PODE AJUDAR?</p><p>A MP ajuda no acerto de doses e na combinação de terapias, monitoramento da segurança, predição de</p><p>riscos genéticos para que ferramentas de prevenção específicas possam ser usadas, e a diminuição de</p><p>custos e do tempo de tratamento, uma vez que ele pode ser direcionado. Com isso, a medicina</p><p>personalizada maximiza o bem-estar do paciente e tem o potencial de revolucionar a medicina e</p><p>melhorar todo o sistema de cuidado à saúde.</p><p>Em alguns setores da medicina, essa revolução já começou. A MP já mostra impacto na medicina</p><p>preventiva, com o diagnóstico de predisposições genéticas a doenças que pode auxiliar na prevenção</p><p>ou no tratamento precoce de enfermidades. Além disso, a MP tem se desenvolvido simultaneamente às</p><p>técnicas de diagnóstico molecular de polimorfismos mais rápidas, precisas e baratas, que permitem a</p><p>determinação de fatores genéticos com a agilidade necessária, “da bancada à beira-do-leito”.</p><p>Pacientes com doenças graves e com risco de morte também têm sido beneficiados com uma</p><p>abordagem personalizada de seu tratamento. Em muitos casos, a ideia de usarmos um mesmo</p><p>tratamento na mesma dosagem para todos, no estilo “tamanho único”, tem prejudicado o prognóstico e,</p><p>em pacientes terminais, a sobrevida e a qualidade de vida após um diagnóstico sombrio.</p><p>javascript:void(0)</p><p>Uma das áreas que mais se desenvolveu da MP e que exemplifica bem como ela pode melhorar</p><p>diversos aspectos da terapia e bem-estar do paciente é o tratamento oncológico, em que a</p><p>susceptibilidade de diversos tumores a drogas começa a ser diagnosticada a partir das alterações</p><p>moleculares específicas de cada paciente.</p><p>A imagem a seguir ilustra como a farmacogenética pode ajudar a definir o melhor fármaco, dosagem e</p><p>interações de acordo com as características genéticas da população.</p><p> Tamanho único.</p><p>A MP tem enfrentado dificuldades em sua</p><p>universalização.</p><p>ATIVIDADE DE REFLEXÃO DISCURSIVA</p><p>E QUAIS SERIAM OS DESAFIOS DA MEDICINA</p><p>PERSONALIZADA?</p><p>RESPOSTA</p><p>Uma das frentes em que a MP encontra desafios é na sua própria implementação. Devido aos custos do</p><p>diagnóstico molecular, à falta de estudos para populações étnicas variadas e à falta de acesso médico</p><p>básico, a MP tem se restringido a países e pacientes ricos, que podem arcar com os altos custos do</p><p>desenvolvimento da ciência por detrás dela. Em adição, é necessário criar uma constelação de dados</p><p>clínicos, epidemiológicos, familiares, e de estilo de vida (como prática de exercício e nutrição) para que a MP</p><p>possa dar significado a achados laboratoriais.</p><p>Diante de tamanha quantidade de dados obtidos, surge outro desafio: o de analisar o grande número de</p><p>dados, que permanece como um dos gargalos à aplicação da MP na rotina clínica, terapêutica e preventiva.</p><p>Aliadas à abordagem multifatorial da MP, a farmacogenética e a farmacogenômica contribuem</p><p>grandemente ao apontarem genes relevantes ao funcionamento de medicamentos. A variação na</p><p>resposta a fármacos devido a polimorfismos genéticos, apesar de não ser completamente absoluta,</p><p>causa perdas econômicas e sociais enormes.</p><p>Aprendemos que as variações genéticas podem influenciar na dosagem, na susceptibilidade e na</p><p>toxicidade de fármacos. Nesse contexto, existem diversas formas em que a genética pode induzir a</p><p>respostas distintas a medicamentos, como alterações no metabolismo, no transporte, e no alvo de</p><p>fármacos, que podem ser enzimas, receptores, transportadores e outras moléculas efetoras. Assim,</p><p>podemos classificar o uso da farmacogenética relacionado à farmacocinética e à farmacodinâmica.</p><p>javascript:void(0)</p><p>FARMACOGENÉTICA E FARMACOCINÉTICA</p><p>A maioria dos fármacos ingeridos passa por etapas até sua eliminação:</p><p>Primeiro são absorvidos</p><p></p><p>Distribuídos</p><p></p><p>Metabolizados (antes ou depois de agirem em seus alvos farmacológicos)</p><p></p><p>Por fim, excretados</p><p>Apesar de todas as etapas serem potencialmente variáveis entre indivíduos, a metabolização é um dos</p><p>processos mais complexos e mais frequentemente observado em associação com alterações</p><p>farmacológicas.</p><p>O metabolismo de drogas e fármacos pode ocorrer antes ou depois da ação farmacológica. Alguns</p><p>medicamentos são ministrados na forma de pró-fármacos, formas inativas de medicamentos que são</p><p>metabolizados em fármacos ativos por meio da bioativação. Outros medicamentos são processados de</p><p>forma a perderem a atividade, aumentarem a solubilidade e serem mais facilmente excretados. Entre as</p><p>principais alterações sofridas pelos fármacos durante seu metabolismo, temos a oxidação, redução,</p><p>hidrólise (também conhecidas como reações de fase I), e os de conjugação (ou de fase II, como</p><p>acetilação, glicuronidação, sulfatação, metilação, entre outros).</p><p>A maioria dos processos de biotransformações ocorre no fígado, o grande centro metabólico do nosso</p><p>organismo, embora outros órgãos também metabolizem drogas, como os rins e os pulmões. O</p><p>metabolismo de fármacos pelo fígado acontece em grande parte pela superfamília de enzimas citocromo</p><p>P450, ainda que outras enzimas metabólicas também sejam relevantes em farmacogenética.</p><p>Para estudarmos em detalhes as aplicações das enzimas, precisamos primeiro entender como</p><p>polimorfismos podem influenciar o metabolismo de fármacos e drogas.</p><p>Como aprendemos, a maioria dos genes presentes no genoma humano apresentam dois alelos, um em</p><p>cada cromossomo homólogo. Podemos considerar que, de acordo com o tipo e a quantidade de alelos</p><p>afetados por polimorfismos, teremos diferentes fenótipos. Dessa forma, podemos classificar os fenótipos</p><p>de metabolização de fármacos em 4 tipos:</p><p>METABOLIZADORES POBRES (MP)</p><p>METABOLIZADORES INTERMEDIÁRIOS (MI)</p><p>METABOLIZADORES NORMAIS (MN)</p><p>METABOLIZADORES RÁPIDOS (MR)</p><p>Metabolizam a medicação muito lentamente. Em geral, apresentam dois alelos defeituosos que</p><p>cancelam a atividade enzimática. Podem apresentar efeitos colaterais em doses normais, ter excesso de</p><p>medicação em doses normais, ou concentrações insuficientes em caso de pró-fármacos.</p><p>Metabolizam a medicação lentamente. Apresentam um alelo defeituoso e um alelo selvagem (ou</p><p>comum) ou, ainda, dois alelos parcialmente defeituosos, com menor atividade enzimática. Podem ter</p><p>excesso de medicação em doses normais, ou concentrações insuficientes em caso de pró-fármacos.</p><p>Metabolizam a medicação em velocidade normal. Apresentam dois alelos selvagens e funcionais para</p><p>atividade enzimática. Têm concentrações normais de fármacos após a dosagem normal.</p><p>Podem ser resultado de alelos duplicados e número aumentado de enzimas ou variações genéticas com</p><p>enzimas mais eficientes. Podem não ter concentrações suficientes de medicamento ministrados ou</p><p>sofrer de superdosagem no caso de pró-fármacos.</p><p> Tipos de metabolizadores.</p><p>Cada tipo de metabolizador terá um risco diferente: em metabolizadores mais lentos (como MP ou MI),</p><p>existe um risco aumentado de efeitos adversos em decorrência do acúmulo de fármacos que, em doses</p><p>padrões, não causariam dano. Os MR, por outro lado, podem não experimentar os efeitos terapêuticos</p><p>da dose-padrão porque o medicamento está sendo metabolizado e excretado muito rapidamente.</p><p>No caso da administração de pró-fármacos, os MR correm risco de efeitos adversos e superdosagem,</p><p>por produzirem o fármaco ativo mais rápido sem, contudo, eliminá-lo rapidamente, enquanto os MP não</p><p>observam os efeitos terapêuticos desejados.</p><p>Por isso, a investigação farmacogenética do metabolismo de drogas e fármacos pode orientar a</p><p>prescrição de dosagens adequadas para cada caso, de acordo com o perfil metabolizador.</p><p>FARMACOGENÉTICA E SUPERFAMÍLIA CYP</p><p>As CYP são enzimas que contêm o grupamento químico heme (que contém ferro em seu interior)</p><p>presente em diversos tecidos e que catalisam a oxidação de compostos.</p><p>As CYP são classificadas de acordo com as similaridades genéticas em famílias (denominadas por</p><p>números) e subfamílias (denominadas por letras).</p><p> Classificação das CYP.</p><p>Apesar de termos mais de 50 enzimas CYP, apenas 6 delas metabolizam cerca de 90% dos fármacos, e</p><p>são importantes porque possuem diversos polimorfismos descritos, sendo o grupo de enzimas mais bem</p><p>estudado quanto às aplicações em farmacogenética.</p><p> Representação da CYP2D6.</p><p>Uma das primeiras descrições da farmacogenética se deu com a identificação da CYP2D6 como</p><p>responsável pela divergência no metabolismo da debrisoquina e esparteína. Hoje, conhecemos mais de</p><p>80 alelos polimórficos diferentes para CYP2D6, com fenótipos que variam de MP a MR. Os</p><p>polimorfismos em CYP2D6 afetam o metabolismo de mais de 60 medicamentos, e perfis MP podem ser</p><p>identificados geneticamente com quase 100% de precisão.</p><p>Dentre as diversas drogas metabolizadas por CYP2D6, a metabolização ultrarrápida da codeína</p><p>aumenta em até 30 vezes a quantidade de morfina. O relato do falecimento de um bebê após</p><p>superdosagem por morfina ingerida por meio do leite de sua mãe metabolizadora ultrarrápida mostra</p><p>quão grave perfis MR podem ser.</p><p>Outras drogas metabolizadas por CYP2D6 incluem anti-hipertensivos como o metoprolol,</p><p>antidepressivos tricíclicos e inibidores seletivos da recaptação da serotonina, e medicamentos contra o</p><p>câncer.</p><p> Representação da CYP3A4.</p><p>Uma das enzimas CYP mais abundantes no fígado, a CYP3A4 é responsável pelo metabolismo de mais</p><p>de 50% dos medicamentos usados atualmente. Cerca de 20 alelos polimórficos foram identificados para</p><p>CYP3A4, a maioria deles relacionados à redução da atividade enzimática e mais frequentes em</p><p>caucasianos do que em asiáticos e africanos.</p><p>CYP3A5, por outro lado, é extremamente variável. Os fenótipos dos polimorfismos de CYP3A4 e</p><p>CYP3A5 são mais extensos quando há combinação de alelos variantes das duas enzimas. Isso é devido</p><p>ao fato de ambas metabolizarem alguns dos mesmos substratos, o que faz com que sejam</p><p>frequentemente referidas como CYP3A4/5.</p><p>Portanto, apesar de muitas classes de fármacos serem metabolizados por essas enzimas, os fenótipos</p><p>de polimorfismos</p><p>isolados não estão claros em muitos casos, o que reflete a importância da</p><p>farmacogenômica na integração gênica das diferentes combinações de polimorfismos.</p><p>Outras enzimas da superfamília CYP com importantes aplicações farmacogenéticas incluem a CYP2C9</p><p>e a CYP2C19.</p><p>CYP2C9</p><p>Possui mais de 60 alelos polimórficos, alguns deles mais frequentes em populações europeias,</p><p>enquanto outros são mais comuns em populações de origem africana. A CYP2C9 corresponde a cerca</p><p>de 20% das enzimas citocromo hepáticas e metaboliza aproximadamente 10% dos fármacos</p><p>comercializados, dentre os quais se destacam os anti-inflamatórios não esteroidais, antidiabéticos,</p><p>antiepiléticos e anticoagulantes. Um dos anticoagulantes metabolizados pela CYP2C9, a varfarina,</p><p>possui janela terapêutica estreita. Isso traz risco de hemorragias graves e potencialmente fatais em</p><p>função das diferenças na velocidade de metabolismo da varfarina pela CYP2C9. Portanto, o diagnóstico</p><p>farmacogenético é fundamental no uso desse anticoagulante.</p><p>CYP2C19</p><p>A enzima CYP2C19, por outro lado, não possui tantos alelos polimórficos, nem afeta o metabolismo de</p><p>tantas drogas quanto a CYP2D6 e CYP2C9. No entanto, polimorfismos nessa enzima, que reduzem sua</p><p>atividade, afetam o metabolismo de inibidores da bomba de prótons, usados no tratamento de úlceras</p><p>pépticas e distúrbios gástricos.</p><p>Além disso, polimorfismos em CYP2C19 afetam a bioativação de um antiplaquetário, Clopidogrel, em</p><p>sua forma ativa. Outros fármacos que podem ter seu metabolismo alterado por variações em CYP2C19</p><p>incluem medicamentos neurotrópicos, antifúngicos e anticâncer.</p><p>ENZIMAS CYP E SUAS FUNÇÕES NO CORPO HUMANO</p><p>FARMACOGENÉTICA E ENZIMAS DE FASE II</p><p>Vimos duas das primeiras enzimas descritas como responsáveis pela alteração da resposta a fármacos:</p><p>a deficiência da glicose-6-fosfato desidrogenase ligada à hemólise após administração de primaquina e</p><p>a velocidade de metabolização da isoniazida por acetilação.</p><p>Hoje, sabemos que a primaquina é metabolizada pelas enzimas CYP e resulta em um metabólito tóxico</p><p>que provoca estresse oxidativo e, em pacientes com deficiência funcional da G6FD, as hemácias estão</p><p>mais vulneráveis à lise por estresse oxidativo. A velocidade de metabolização da isoniazida, por outro</p><p>lado, é determinada por enzimas chamadas de N- acetiltransferases (NATs). Pacientes com alelos</p><p>polimórficos da enzima NAT2 podem ser classificados em acetiladores rápidos (AR) ou lentos (AL). Pelo</p><p>menos três polimorfismos por SNP estão associadas a AL, que são muito mais frequentes na população</p><p>árabe do que na caucasiana e asiática. Complicações decorrentes das altas concentrações plasmáticas</p><p>de isoniazida e outros medicamentos acetilados como a hidralazina (vasodilatador e anti-hipertensivo) e</p><p>a procainamida (um antiarrítmico) em AL incluem síndromes autoimunes induzidas por medicamentos,</p><p>hepatotoxicidade e neuropatia.</p><p>Outro grupo de enzimas envolvido no metabolismo e eliminação de drogas e que foram mais bem</p><p>estudadas do ponto de vista farmacogenético são as metiltransferases. Dentre elas, a tiopurina</p><p>metiltransferase (TPMT) possui polimorfismos que alteram sua capacidade de metilar tiopurinas, uma</p><p>classe de nucleotídeos modificados com função pró-fármaco.</p><p> Estrutura química de fármacos tiopurinas.</p><p>Quando bioativadas, as tiopurinas são convertidas em compostos tóxicos e, por isso, são usadas na</p><p>supressão de células imunológicas em leucemias, linfomas e terapias imunossupressoras em</p><p>transplante e doenças autoimunes. Existem apenas 3 alelos principais associados a mais de 90% dos</p><p>metabolizadores pobres (MP) da TPMT, que ocorrem em menos de 1% da população caucasiana. MPs</p><p>podem sofrer de toxicidade à medula óssea (toxicidade hematopoiética) por acúmulo de tiopurinas,</p><p>reduzindo o número total de células sanguíneas, tanto hemácias quanto leucócitos. O paciente sofre de</p><p>cansaço extremo, falta de ar, e risco aumentado a infecções que podem levá-lo rapidamente ao</p><p>óbito.</p><p> ATENÇÃO</p><p>Por isso, a recomendação é que pacientes com distúrbios imunológicos que necessitem de tiopurinas</p><p>sejam testados geneticamente e, caso tenham fenótipo MP para TPMT, tomem apenas uma fração da</p><p>dose padrão do fármaco.</p><p>FARMACOGENÉTICA E TRANSPORTADORES</p><p>As variações genéticas envolvidas na farmacocinética não se restringem a polimorfismos em enzimas.</p><p>Os processos de absorção e eliminação de substâncias afetam diretamente sua concentração,</p><p>aumentando ou diminuindo-a. As principais proteínas envolvidas nesse processo são as</p><p>transportadoras, presentes em grande número nos epitélios intestinais, endoteliais e renais, e nas</p><p>células hepáticas. Essas proteínas presentes nas membranas plasmáticas medeiam o transporte de</p><p>solutos através das membranas biológicas e são grandes reguladoras da homeostase celular, tecidual e</p><p>do organismo.</p><p>Entre as principais famílias de transportadores, está a dos transportadores de efluxo ABC (adenosine-</p><p>triphosphate binding cassete (ABC), um dos responsáveis pelo fenótipo de resistência a múltiplas drogas</p><p>— multiple drugs resistence (ou MDR)).</p><p> Transportadores de efluxo ABC.</p><p>O gene ABCB1 é um dos mais polimórficos dentre os transportadores, com mais de 50 SNPs e ao</p><p>menos 3 eventos de inserção ou deleção descritos. Polimorfismos em ABCB1 que reduzam sua</p><p>capacidade transportadora de efluxo (ou seja, de saída das células) podem causar aumento da</p><p>concentração plasmática de digoxina (um digitálico e glicosídeo cardiotônico usado no tratamento de</p><p>insuficiência cardíaca) por redução da eliminação renal. O uso desse digitálico com janela terapêutica</p><p>muito estreita, aliado a polimorfismos em ABCB1, está associado a risco aumentado de morte súbita por</p><p>doença cardíaca durante tratamento com digoxina. Outros medicamentos com eliminação reduzida</p><p>incluem inibidores da protease viral (usados na terapia antirretroviral contra o vírus da imunodeficiência</p><p>humana (HIV)), e estatinas (usadas no controle da hipercolesterolemia). Por outro lado, variações</p><p>genéticas em ABCC1/2 têm sido associadas com alteração da excreção biliar de estatinas e</p><p>quimioterápicos de diferentes ações (como tamoxifeno — um análogo de estrogênio usado na terapia do</p><p>câncer de mama; e metotrexato, um antifolato usado na quimioterapia de leucemia).</p><p>Os transportadores conhecidos como SLC (solute carriers, ou carreadores de soluto, em português)</p><p>compreendem mais de 300 transportadores de membrana que movimentam íons que não podem passar</p><p>pela membrana livremente por serem hidrossolúveis. Envolvidos na entrada de moléculas nas células</p><p>(influxo), os alelos polimórficos de SLCs têm sido associados à redução da entrada de fármacos nos</p><p>hepatócitos, gerando acúmulo plasmático. Um exemplo de medicamento afetado por variações</p><p>genéticas em SLCs é o acúmulo de pravastatina plasmática, com redução de sua função farmacológica,</p><p>que ocorre nos hepatócitos.</p><p> Representação ilustrando exemplos de carreadores de solutos SLC.</p><p>FARMACOGENÉTICA E FARMACODINÂMICA</p><p>O estudo da farmacodinâmica se propõe a explorar os mecanismos de ação moleculares, bioquímicos e</p><p>fisiológicos de drogas nas células e no organismo. Os fármacos podem ter diversos alvos terapêuticos,</p><p>sendo mais frequentes as proteínas que atuam como receptores celulares de membrana, enzimas e</p><p>canais iônicos. Variações genéticas que resultem na alteração dessas proteínas, ou até mesmo em</p><p>outras proteínas que interagem com elas, podem levar a alterações farmacológicas. Portanto, as</p><p>diferenças na farmacodinâmica também são objeto de estudo da farmacogenética.</p><p>FARMACOGENÉTICA E POLIMORFISMOS DE</p><p>RECEPTORES E TRANSPORTADORES</p><p>Os receptores de membrana plasmática correspondem a cerca de 50% dos alvos farmacológicos.</p><p>Presentes na superfície das células e expressos de forma específica para cada tecido e tipo celular, os</p><p>receptores são a interface de contato entre o meio extracelular e o interior da célula. Quando interagem</p><p>com seus ligantes, os receptores promovem respostas intracelulares específicas, conhecidas como</p><p>transdução de</p><p>sinais. Receptores podem alterar muitos aspectos do metabolismo celular, incluindo a</p><p>vida ou a morte da célula. Portanto, têm sido amplamente usados como alvos farmacológicos para</p><p>modulação da resposta celular, seja para amplificação, redução, ativação, inativação ou diferenciação.</p><p>Para entendermos melhor os efeitos dos polimorfismos em receptores, precisamos observar seu</p><p>funcionamento.</p><p> Representação do funcionamento de receptores de membrana plasmática.</p><p>Um dos receptores mais estudados quanto à variabilidade genotípica são os adrenorreceptores do tipo β</p><p>(ou receptores β-adrenérgicos), responsivos às catecolaminas (adrenalina e noradrenalina) quando a</p><p>resposta simpática de “luta-ou-fuga” é desencadeada.</p><p>A ação dos adrenorreceptores β envolve diversos tecidos e atua no aumento da frequência cardíaca,</p><p>aumento da força de contração cardíaca e relaxamento de musculatura lisa (vascular e respiratória),</p><p>com o intuito de aumentar a velocidade e força da resposta muscular esquelética (seja para luta, seja</p><p>para fuga).</p><p>A principal categoria de fármacos que agem em receptores β são antagonistas, os chamados β-</p><p>bloqueadores, que são usados no tratamento de doenças cardiovasculares e respiratórias como</p><p>hipertensão, insuficiência cardíaca e asma.</p><p> EXEMPLO</p><p>Metoprolol, atenolol e carvedilol, são exemplo comuns de fármacos β-bloqueadores.</p><p>O gene do receptor adrenérgico β1 (ADRB1) possui polimorfismos que afetam a ação farmacológica dos</p><p>β-bloqueadores. Dois polimorfismos SNP são frequentemente vistos em conjunto formando um haplótipo</p><p>(S49-R389) em ADBR1: um localizado na porção extracelular do receptor, e outro na porção intracelular.</p><p>O haplótipo produz maior resposta a agonistas que o alelo selvagem, o que leva a um risco de morte</p><p>três vezes maior em pacientes portadores de doenças cardíacas. Esses dois SNP de ADBR1 também</p><p>apresentam maior resposta a β-bloqueadores, e têm sido associados a menor risco de morte em</p><p>portadores do haplótipo com doenças cardíacas ― ou seja, os β-bloqueadores promovem um efeito</p><p>protetivo contra o haplótipo.</p><p>Outro grande ramo da farmacogenética compreende medicamentos psiquiátricos, e, em especial, os</p><p>receptores de serotonina. A serotonina, também conhecida como 5-HT (sigla em inglês para 5-</p><p>hidroxitriptamina), é um neurotransmissor envolvido em diversos processos cognitivos, como na</p><p>regulação do humor e emoções.</p><p>Processos que envolvam a inibição da serotonina têm sido associados a quadros como a depressão,</p><p>ansiedade, e outros transtornos relacionados. Por isso, existem medicamentos antidepressivos cujo</p><p>objetivo é evitar que a serotonina seja recapturada, de forma que ela permaneça na sinapse, local entre</p><p>os neurônios em que ela exerce seus efeitos; outros fármacos funcionarão como antagonistas ou</p><p>agonistas seletivos, dependendo do receptor de serotonina em questão.</p><p>Uma das classes de fármacos importantes do ponto de vista farmacogenético são os inibidores seletivos</p><p>de recaptação da serotonina (ISRS): em certas situações, para que a concentração sináptica da</p><p>serotonina seja mantida elevada, bloqueamos a recaptura da serotonina no neurônio pré-sináptico,</p><p>permitindo que ela aja no neurônio pós-sináptico. No entanto, o principal transportador de serotonina (da</p><p>sigla em inglês, SERT) é codificado pelo gene polimórfico SLC6A4. Uma inserção-deleção polimórfica</p><p>no promotor desse gene, conhecida como 5-HTTLPR-L, tem maior resposta a ISRS, já que sua</p><p>expressão é duas vezes maior do que a outra variante (5-HTTLPR-S).</p><p>FARMACOGENÉTICA E VARIAÇÕES EM ENZIMAS-</p><p>ALVO</p><p>Já estudamos como polimorfismos em enzimas podem alterar a forma e a velocidade de metabolização</p><p>de fármacos. No entanto, as enzimas também são alvos farmacológicos, sendo seu antagonismo (ou</p><p>bloqueio) o principal mecanismo farmacológico.</p><p>Conheça dois exemplos de enzimas que podem ter sua susceptibilidade a drogas alterada devido a</p><p>polimorfismos:</p><p>EXEMPLO 1</p><p>EXEMPLO 2</p><p>É a enzima conversora de angiotensina (ECA), umas das mais estudadas do ponto de vista</p><p>farmacogenético. A ECA converte angiotensina I em angiotensina II, um vasoconstritor que também atua</p><p>aumentando o volume sanguíneo. Sua inibição farmacológica é usada no tratamento da hipertensão.</p><p>Existem dois tipos principais de polimorfismos em ECA: uma deleção e uma inserção em um íntron. A</p><p>deleção tem sido associada a maiores concentrações plasmáticas de ECA. A maximização da dose de</p><p>inibidores da ECA, como o captopril, tem resultado em melhor prognóstico em pacientes portadores do</p><p>polimorfismo de deleção, cujo risco de morte por insuficiência cardíaca é maior do que nos portadores</p><p>de alelos selvagens.</p><p>É a enzima epóxido-redutase da vitamina K (VKORC1 ― vitamin K epoxide reductase complex 1), alvo</p><p>da varfarina. A varfarina se liga ao VKORC1 e impede que a vitamina K 2,3-epóxido seja reduzida em</p><p>vitamina K ativa, composto essencial na cascata de coagulação. Polimorfismos em VKORC1 têm sido</p><p>associados à necessidade de ajuste de dose da varfarina. Em especial, os genótipos 1639 G > A e</p><p>1173C > T, ambos em regiões não codificantes de VKORC1, são frequentemente encontrados juntos</p><p>(haplótipo) e requerem dose menor de varfarina. Um terceiro SNP em região não codificadora, 3730 G ></p><p>A, requer dose aumentada de varfarina para que o efeito anticoagulante seja obtido.</p><p>É interessante notarmos que, mesmo sendo raro, mutações em regiões não codificadoras também</p><p>podem influenciar a expressão de genes, a farmacodinâmica e a farmacogenética. Além disso, a</p><p>varfarina se torna um excelente exemplo de como a farmacogenômica é fundamental na predição de</p><p>doses, pois combina alterações genéticas importantes tanto no metabolismo quanto no alvo terapêutico.</p><p>FARMACOGENÉTICA NA ONCOLOGIA</p><p>A especialista Camila Baez falará sobre a importância da farmacogenética na terapia oncológica.</p><p>VERIFICANDO O APRENDIZADO</p><p>CONCLUSÃO</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>A farmacogenética surgiu com a observação de que indivíduos têm reações distintas a compostos</p><p>químicos, como drogas e medicamentos. Após décadas de estudo e o desenvolvimento de técnicas de</p><p>biologia molecular eficazes, descobrimos que a variabilidade genética entre indivíduos e populações</p><p>afeta como cada organismo absorve, metaboliza e excreta fármacos. A ação dos fármacos em cada</p><p>organismo também pode variar de acordo a genética. Do conhecimento acumulado sobre as interações</p><p>entre polimorfismos e respostas distintas a drogas emerge uma prática mais personalizada da medicina</p><p>e a prevenção de reações adversas graves e até fatais.</p><p> PODCAST</p><p>Agora, a especialista Camila Freze Baez encerra o tema falando um pouco mais sobre a prática da</p><p>farmacogenética.</p><p>AVALIAÇÃO DO TEMA:</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ALTMAN, R.; FLOCKHART, D.; GOLDSTEIN, D. Principles of Pharmacogenetics and</p><p>Pharmacogenomics. Cambridge: Cambridge University Press, 2012.</p><p>DNA FROM THE BEGINNING. Concept 13: Mendelian laws apply to human beings. Consultado na</p><p>Internet em: 5 abr. 2021.</p><p>EL SHAMIEH, S.; ZGHEIB, N.K. Pharmacogenetics in developing countries and low resource</p><p>environments. Hum Genetics. Publicado em: 9 fev. 2021. Consultado na Internet em: 15 jun. 2021.</p><p>GONG, L. et al. The Role of Pharmacogenetics in Precision Medicine. 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Nácul e</p><p>François Noël, Infarma.</p><p>CONTEUDISTA</p><p>Camila Freze Baez</p><p> CURRÍCULO LATTES</p><p>javascript:void(0);</p>

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