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<p>Demências</p><p>características e avaliação</p><p>Prof. Luísa Pelucio</p><p>A síndrome demencial é caracterizada por declínio cognitivo adquirido, cuja intensidade é capaz de interferir nas atividades profissionais e sociais da vida diária do indivíduo. Segundo a definição do DSM IV, o déficit cognitivo deve compreender alteração de memória associado à alteração em pelo menos um outro domínio cognitivo, como praxia (capacidade de realizar atividades motoras), linguagem, funções executivas ou gnosia (capacidade de reconhecer ou identificar objetos).</p><p>As demências ocorrem mais frequentemente em indivíduos idosos, e a prevalência de demência dobra a cada cinco anos a partir dos 65 anos de idade.</p><p>Envelhecimento populacional é um processo mundial e, como resultado, as consequências socioeconômicas relacionadas aos quadros demências, que já são enormes, se tornarão ainda maiores em decorrência desse processo.</p><p>Prevalência de demência nas diversas faixa etárias idade:</p><p>Idade Demência (%)</p><p>60-64 0,7</p><p>65-69 1,4</p><p>70-74 2,8</p><p>75-79 5,6</p><p>80-84 10,5</p><p>85-89 20,8</p><p>90-95 38,6</p><p>Jorm et al. 1998</p><p>As diferentes causas de demência podem estar relacionadas não apenas a quadros neurológicos primários, mas também a condição médica sistêmica, a efeitos persistentes de abuso de substâncias, ou à combinação desses fatores. Devemos lembrar que o diagnóstico de demência não deve ser feito na vigência de delirium (situação clínica em que há agudamente um déficit global da atenção, geralmente causado por doenças clínicas).</p><p>A doença de Alzheimer (DA) e demência vascular (DV) são as causas mais comuns de demência, seguidas pela demência com corpos de Lewy (DCL). No entanto, muitas outras causas podem ser responsáveis por esse processo. Segundo Mesulam, podemos dividir as diferentes etiologias das demências em dois grupos: o das doenças que costumam se apresentar como demência pura e o das doenças que apresentam sintomas sensitivo-motores mais proeminentes associados à demência</p><p>Doenças que podem se apresentar como demência pura Doenças degenerativas doença de Alzheimer</p><p>Degeneração lobar frontotemporal</p><p>demência com corpos de Lewy</p><p>Doença vascular</p><p>Múltiplos infartos</p><p>Doença de Binswanger</p><p>Arterites</p><p>CADASIL</p><p>Lesões com efeito de massa Neoplasias</p><p>Hidrocefalia de pressão normal</p><p>Hematoma subdural</p><p>Cistos parasitários, abscessos cerebrais</p><p>Doenças infecciosas</p><p>HIV</p><p>Sífilis</p><p>Herpes simples</p><p>Doença de Lyme</p><p>Doença de Whipple</p><p>Nutricional-tóxico-metabólico</p><p>Doença de Wernicke-Korsakoff</p><p>Alcoolismo crônico</p><p>Deficiência de vitamina B12</p><p>Hipotiroidismo severo</p><p>Pelagra</p><p>Exposição a solventes orgânicos</p><p>Intoxicação por metais pesados</p><p>Encefalopatia hepática</p><p>Imune/Inflamatório Encefalite límbica paraneoplásica</p><p>Lúpus eritematoso sistêmico</p><p>Cerebrite associada a doenças imunes do colágeno</p><p>Doenças de depósito Leucodistrofia metacromática</p><p>Doença de Kufs</p><p>Doenças priônicas Doença de Creutzfeldt-Jakob</p><p>Insônia fatal</p><p>Doenças que podem se apresentar como demência pura:</p><p>Doenças que apresentam sintomas sensitivo-motores mais proeminentes associados à demência Doença de Parkinson</p><p>Paralisia supranuclear progressiva</p><p>Degeneração córtico-basal</p><p>Doença de Huntington</p><p>Doença de Wilson</p><p>Doença de Hallervoden-Spatz</p><p>Ataxia espino-cerebelar</p><p>Esclerose lateral amiotrófica</p><p>Esclerose múltipla</p><p>Doença de Gerstmann-Sträussler-Scheinker</p><p>Devemos suspeitar de quadro demencial quando o paciente apresentar alterações cognitivas (principalmente perda de memória), sintomas psiquiátricos, alterações de personalidade, mudanças no comportamento ou diminuição na capacidade de realizar atividades da vida diária.</p><p>Sinais e sintomas que podem indicar avaliação para quadro demencial:</p><p>Alterações cognitivas: diminuição de memória, dificuldade em compreender comunicação escrita ou verbal, dificuldade em encontrar as palavras, esquecimento de fatos de conhecimento comum (por exemplo, nome do presidente)</p><p>Sintomas psiquiátricos: apatia, depressão, ansiedade, insônia, desconfiança, delírios, paranóia, alucinações</p><p>Alterações de personalidade: comportamentos inapropriados, desinteresse, isolamento social, ataques explosivos, frustração excessiva</p><p>Mudanças no comportamento: agitação, inquietude, deambulação durante a noite</p><p>Diminuição de capacidade de realizar atividades da vida diária: dificuldade em dirigir, se perder constantemente, dificuldade em cozinhar, cuidado pessoal ruim, problemas com compras e no trabalho.</p><p>Interrogar familiares e amigos é importante, pois o paciente muitas vezes não tem percepção ou esconde suas dificuldades. Devem-se questionar alterações de memória, orientação, capacidade de realizar atividades diárias, incluindo trabalho, questões financeiras, compras e cuidados pessoais. Pesquisa de sintomas depressivos precedendo ou simultaneamente ao quadro cognitivo é fundamental, pois muitas vezes depressão pode simular quadros demenciais.</p><p>Testes padronizados para avaliar as diferentes funções cognitivas estão disponíveis e constituem bons métodos de rastreamento e acompanhamento de quadros demenciais. Apresentam algumas limitações, como o fato de serem influenciadas pela idade e escolaridade.</p><p>Na prática clínica, o teste mais utilizado é o Miniexame do Estado Mental (Mini-mental). Nesse exame é considerado um resultado normal um escore acima de 23, lembrando novamente que os resultados são influenciados pela idade e escolaridade. Se houver dúvida após avaliação clínica e Mini-mental pode-se solicitar uma avaliação neuropsicológica para um psicólogo especializado, o que ajudará a definir com precisão o tamanho do déficit e qual a função cognitiva com maior comprometimento.</p><p> Já fizemos o teste em sala.</p><p>Pesquisar com os familiares o tempo de evolução do declínio cognitivo, assim como sintomas associados, doenças clínicas ou neurológicas concomitantes, medicações utilizadas (muitas podem comprometer as funções cognitivas). Causas clínicas ou neurológicas tratáveis de demência devem ser ativamente pesquisadas.</p><p>Da mesma forma, o exame clínico e neurológico devem ser completos, mais uma vez, em busca da etiologia do quadro demencial e de causas tratáveis. Déficit neurológico focal associado a quadro demencial, por exemplo, pode sugerir DV.</p><p>No Brasil, os exames necessários para investigação de síndrome demencial em faixa etária senil são hemograma, função renal (dosagem de eletrólitos, uréia e creatinina), hepática e tiroidiana, dosagem sérica de vitamina B12 e ácido fólico, sorologia para sífilis, glicemia de jejum e exame de neuroimagem (tomografia computadorizada [TC] de crânio ou ressonância magnética [RM] de encéfalo).</p><p>A análise do líquido céfalo-raquidiano (LCR), sorologia para HIV e eletroencefalograma (EEG) são solicitados em casos de síndrome demencial em idade pré-senil ou com evolução atípica (por exemplo, demência rapidamente progressiva).</p><p>EXAMES COMPLEMENTARES:</p><p>Em casos em que o déficit cognitivo instalou-se de forma aguda, devemos pensar primeiramente em delirium(situação clínica em que há agudamente um déficit global da atenção, geralmente causado por doenças clínicas) e realizar exames para afastar problemas clínicos como infecção urinária (ou outras infecções), desidratação, isquemia miocárdica, hipóxia, distúrbios hidroeletrolíticos ou outros problemas clínicos, pois geralmente a alteração cognitiva é revertida com o tratamento adequado.</p><p>Doença de Alzheimer: A DA é a principal causa de demência, e é responsável por mais de 80% dos casos de demência após os 65 anos de idade. Descrita por Alois Alzheimer em 1906, representa atualmente a sétima causa de morte nos Estados Unidos. Era considerada uma forma rara de demência até</p><p>o início da década de 1970, por ser diagnosticada apenas em casos de demência pré-senis (antes dos 65 anos de idade). Atualmente sabemos que essa doença é mais frequente após os 65 anos e que o principal fator de risco é a idade.</p><p>DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL:</p><p>Em cerca de 5% dos casos, a doença tem herança autossômica dominante, sendo na maioria das vezes de ocorrência esporádica. Além da idade, outros fatores de risco para a DA são sexo feminino, história familiar de DA em parentes de primeiro grau, história de traumatismo cranioencefálico e presença do alelo E4 da apolipoproteína E.</p><p>O diagnóstico da DA é feito a partir de história clínica e exame neurológico sugestivos. Exames complementares devem ser solicitados conforme sugerido previamente, de forma a afastar causas de demência secundária a outras doenças clínicas ou neurológicas.</p><p>Os exames de neuroimagem estrutural (TC e RM) frequentemente são normais em estágios iniciais da doença.</p><p>A DA não tem tratamento específico. Os sintomas cognitivos são tratados com inibidores da acetilcolinesterase e memantina. Os inibidores da acetilcolinesterase (donepezil, galantamina e rivastigmina) constituem o tratamento inicial da doença. Representam a primeira linha terapêutica nos casos leves e moderados da doença.</p><p>Os sintomas neuropsiquiátricos são tratados inicialmente com medidas não farmacológicas. As medicações utilizadas para o tratamento desses sintomas são inibidores da acetilcolinesterase, antidepressivos, estabilizadores de humor ou neurolépticos, a depender da qualidade e gravidade. Todos os estudos publicados até o momento mostram eficácia mínima ou duvidosa para o tratamento desses sintomas.</p><p>Tratamento</p><p>A DV é a segunda causa de demência na população idosa. Os principais fatores de risco são hipertensão arterial sistêmica, diabetes e a presença do alelo E4 da apolipoproteína E. Em algumas populações orientais, a DV é a principal causa de demência.</p><p>A DV ocorre secundariamente a insultos vasculares ao sistema nervoso central e pode ser dividida em demência por múltiplos infartos, demência isquêmica subcortical e demência por infarto estratégico.</p><p>Demência Vascular:</p><p>A investigação do quadro demencial deve ser realizada da mesma forma que na DA. Nos quadros vasculares, a RM de encéfalo fornece informação melhor em relação à localização e à extensão das lesões. A etiologia das lesões vasculares deve ser pesquisada, da mesma forma que em outros casos de acidente vascular cerebral.</p><p>Tratamento: A heterogeneidade clínica dos casos de DV limita a generalização dos achados dos estudos clínicos. Esses estudos mostram que tanto os inibidores da acetilcolinesterase quanto a memantina pouco têm benefício para a cognição em pacientes com DV. Os casos devem ser estudados individualmente para a escolha terapêutica. A prevenção secundária de novos eventos vasculares deve ser realizada, como nos casos de acidente vascular cerebral.</p><p>A DCL é a segunda causa de demência degenerativa em idosos.</p><p>A DCL tem etiologia desconhecida. Sua característica anatomopatológica é a presença de corpos de Lewy com distribuição cortical predominante, podendo haver concomitância de alterações patológicas da DA. Os corpos de Lewy também são encontrados na substância negra, porém em menor intensidade do que na doença de Parkinson.</p><p>Demência com Corpos de Lewy:</p><p>A DCL é caracterizada por quadro demencial progressivo, com déficits atencionais, visoespaciais, e de funções executivas, e a presença de duas das seguintes características: 1) flutuação dos sintomas cognitivos com variação intensa na atenção e alerta; 2) alucinações visuais recorrentes, geralmente detalhadas e vívidas; 3) parkinsonismo.</p><p>Outras características clínicas comuns são quedas repetidas, síncope, delírios, alucinações não visuais, depressão, distúrbio do sono REM, e sensibilidade ao neuroléptico.</p><p>A investigação deve ser feita como nos casos de DA. O exame de imagem estrutural pode ser normal no início do quadro. A atrofia hipocampal é menos importante do que na DA. O SPECT mostra redução do fluxo sangüíneo nos lobos occipitais.</p><p>A demência frontotemporal (DFT) é uma das síndromes clínicas que compõem os quadros de degeneração lobar frontotemporal, juntamente com a afasia progressiva primária e a demência semântica. Discutiremos os aspectos clínicos da DFT apenas, por ser a mais frequente entre as três.</p><p>É uma doença degenerativa, geneticamente determinada na minoria dos casos. Não existe um fator etiológico determinado nos casos esporádicos da doença.</p><p>Demência Lobar Frontotemporal:</p><p>O diagnóstico diferencial da DFT envolve as outras causas de síndrome demencial apontadas e também doenças psiquiátricas que cursam com distúrbios de humor, distúrbios de ansiedade e psicoses tardias.</p><p>Não há tratamento específico para a DFT. Os sintomáticos mais utilizados são os antidepressivos e os neurolépticos.</p><p>É um declínio cognitivo que leva a um comprometimento funcional grave ou à morte em menos de 1 a 2 anos.</p><p>Alguns dos sintomas comuns nesses casos: alterações visuais, perda da coordenação e equilibrio, falta de força em um ou mais membros, rigidez muscular, crises convulsivas e alteração no comportamento com alucinações e delírios. Nas fases mais avançadas, pode ocorrer a perda do contato com meio, o coma e até a morte.</p><p>Demências Rapidamente</p><p>Progressivas:</p><p>Mesmo indivíduos jovens podem desenvolver uma doença que se manifeste como uma demência rapidamente progressiva.</p><p>Na dependência da causa encontrada, algumas podem ser completamente reversíveis enquanto outras evoluem para a falência orgânica. Diante da possibilidade de doenças infecciosas potencialmente transmissíveis como causa de DRP, o diagnóstico deve ser buscado inclusive para prevenir.</p><p>O comprometimento cognitivo leve (CCL) é definido como um declínio cognitivo, porém de intensidade insuficiente para a caracterização de quadro demencial. Portanto, trata-se de um estágio intermediário entre o estado cognitivo normal e a demência, principalmente a DA. O diagnóstico do CCL permite a identificação de indivíduos com alto risco de desenvolver demência, possibilitando intervenção clínica precoce, principalmente no controle de fatores de risco.</p><p>Existem três tipos de CCL: CCL amnéstico, CCL de múltiplos domínios e CCL domínio único não-amnéstico. O CCL amnéstico evolui, na maioria das vezes, para DA.</p><p>Comprometimento Cognitivo Leve:</p><p>Os casos de CCL devem ser investigados da mesma forma que os de demência. Fatores de risco para demência devem ser investigados, por exemplo, hipertensão arterial e diabetes, para que haja intervenção terapêutica precoce, diminuindo a chance de progressão para demência.</p><p>Diagnóstico Diferencial</p><p>O diagnóstico diferencial dos quadros de CCL engloba todas as etiologias de demência, uma vez que é um diagnóstico de uma condição clínica intermediária entre o normal e o quadro demencial.</p><p>Tratamento</p><p>O tratamento do CCL é dividido em tratamento dos fatores de risco e tratamento sintomático das alterações cognitivas. O tratamento dos fatores de risco deve ser priorizado, principalmente o tratamento de fatores de risco vasculares.</p><p>Em relação ao tratamento sintomático, alguns estudos com antidepressivos e com inibidores da acetilcolinesterase para os quadros de CCL amnéstico não mostraram eficácia satisfatória. Alguns estudiosos especialistas no assunto preconizam o uso de inibidores da acetilcolinesterase nos casos de CCL amnéstico, porém não há evidência em literatura médica disponível até o momento que aponte para uma eficácia inequívoca no tratamento medicamentoso do CCL.</p><p>FIM!</p><p>image1.jpeg</p>