Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.

Prévia do material em texto

<p>Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC</p><p>Centro de Ciências Humanas e da Educação - FAED</p><p>Departamento de História - História do Brasil III</p><p>Docente: Ana Luíza Mello Santiago de Andrade</p><p>Discente: Camila Thomazini de Oliveira</p><p>OModernismo visto pelas obras de Tarsila do Amaral</p><p>Enquanto a coroa e a espada saíam de moda no Brasil, no cenário urbano era visível o</p><p>alargamento de ruas e avenidas que seriam iluminadas para um convívio noturno mais</p><p>acentuado, a abertura de novos comércios, restaurantes e novos comportamentos eram</p><p>adotados - quando não impostos - pela população. Na cidade a cartola ganhava cada vez</p><p>mais seu espaço, assim como na Europa, enquanto às margens e nos sertões se instalavam os</p><p>que não detinham tal vestimenta, os que eram mal quistos na sociedade e até mesmo os que</p><p>foram enxotados de suas casas pela reurbanização, como mostra Schwarcz (2012) em seu</p><p>livro “A Abertura para o Mundo (1889 - 1930)”</p><p>Esse cenário seria, porém, convulsionado pela entrada dos racismos e das</p><p>teorias raciais de toda ordem, que impuseram novas divisões entre os grupos</p><p>humanos, agora justificadas por argumentos e teorias biológicas. O resultado</p><p>foi, na expressão de Leo Spitzer, em seu livro Vidas de entremeio, um novo</p><p>"embaraço da marginalização". (p.21)</p><p>Ainda na introdução, a autora sugere a existência de “dois Brasis” que na verdade seriam o</p><p>mesmo, a dualidade teria sido criada justamente pela diferenciação de quem poderia ocupar o</p><p>miolo das cidades e quem deveria conter-se somente nas beiradas.</p><p>É observando esse movimento que começa a efervescer uma nova ideia entre os</p><p>intelectuais da época, um incômodo com a reurbanização do país em nome de uma</p><p>comparação com o continente europeu que aflora ainda mais pós-primeira guerra mundial, já</p><p>que o cenário do conflito deixa o continente colonizador com as pernas bambas por um curto</p><p>espaço de tempo, faz com que tudo que vem da Europa passe a ser questionado por essa elite</p><p>letrada. Ainda que curto, o período da crise européia, é tempo suficiente para que esses</p><p>intelectuais entendam seus incômodos e estabeleçam suas novas metas.</p><p>Segundo Velloso (1993), em 1915, durante a conferência “A unidade da pátria”, é</p><p>sugerida por Afonso Arinos a criação de uma nação puramente brasileira, tornando-se essa a</p><p>palavra de ordem dali em diante. É a partir desse momento que os intelectuais já citados</p><p>anteriormente decidem que assumir a seguinte missão: “encontrar a identidade nacional,</p><p>rompendo com um passado de dependência cultural.” (VELLOSO, 1993. p.1) e assim a</p><p>literatura, as artes e os intelectuais de modo geral assumem um papel quase combativo, suas</p><p>criações deveriam falar do renascimento da nação, deixando de lado o que era de cunho</p><p>pessoal para os membros desse novo movimento.</p><p>Num primeiro momento chamado de “futuristas”, os maiores idealizadores</p><p>dividiam-se em duas perspectivas, um dos lados era composto principalmente por Mário e</p><p>Oswald de Andrade e os “Verde-amarelos” de outro, esse segundo sendo fundado por Menotti</p><p>del Picchia, Plínio Salgado e Cassiano Ricardo e tendo um cunho mais “conservador” sugeria</p><p>que o conceito de brasilidade deveria pautar-se no espaço para descobrirmos a nossa</p><p>singularidade, enquanto a perspectiva de Mário de Andrade ligava-se ao tempo, buscando</p><p>criar uma nova temporalidade, uma que contasse a nossa história e somente ela, sem</p><p>intermédio de outra qualquer.</p><p>Enquanto o Rio de Janeiro é o principal palco da reurbanização das cidades, o</p><p>movimento Modernista ter berço em São Paulo, o estado seria o único capaz de sediar tal</p><p>“revolução”, já que, segundo Velloso, seria lá que se experimentariam as maravilhas e as</p><p>crises da modernidade.</p><p>São Paulo, núcleo do progresso econômico e social, capaz, portanto, de</p><p>difundir o moderno pensamento brasileiro. Mais do que qualquer outra</p><p>região, o estado paulista vive diretamente os impactos da imigração européia,</p><p>com a expansão do café dando surgimento ao proletariado e subproletariado</p><p>urbano. Em meio a este clima de intensa agitação social, política e intelectual</p><p>nasce o movimento modernista, procurando expressar, simbolicamente, o</p><p>fluxo da vida moderna.14 Para os intelectuais que dele participam trata-se</p><p>naquele momento de fazer a "aprendizagem da modernidade" nos centros</p><p>civilizatórios, que é onde ela se manifesta. (VELLOSO, 1993. p. 4)</p><p>Como todo processo de mudança, até atingir a estabilidade, o modernismo passa por</p><p>diversos momentos de instabilidade e conflitos já que implica o rompimento com valores</p><p>tradicionais. Junto com a instabilidade surge também a euforia pelo “novo”, a cidade de São</p><p>Paulo cresce cada vez mais, se mostra cada vez mais dentro dos padrões europeus de</p><p>arquitetura e tem sua nova fachada exaltada pelos jornais. Para desespero dos modernistas,</p><p>mesmo com a Europa decaindo, os padrões seguidos ainda eram os advindos de lá.</p><p>O modernismo ainda teria que enfrentar alguns empecilhos a partir do momento em</p><p>que se anuncia, um deles é o conflito contra o Rio de Janeiro, que se estabelece quando o</p><p>estilo de vida carioca começa a ser comparado com o paulista e criticado pelos mesmos pela</p><p>“promiscuidade de suas praias, o aspecto anárquico de sua economia, a futilidade dos hábitos</p><p>cariocas e a violência e amoralidade do carnaval” (VELLOSO, 1993. p. 5) garantindo que</p><p>somente São Paulo poderia dar conta de promover a unificação de todo o território brasileiro.</p><p>O próximo passo seria estabelecer a sua estética na literatura</p><p>Os modernistas são unânimes no combate às estéticas parnasiana, realista e</p><p>romântica. O parnasianismo é descartado enquanto gênero literário</p><p>ultrapassado por aprisionar a linguagem nos cânones rígidos da métrica e da</p><p>rima. A liberdade de expressão é a bandeira de luta do movimento, que</p><p>reivindica a criação de uma nova linguagem, capaz de exprimir a</p><p>modernidade. Também o realismo é criticado, na medida em que incidiria</p><p>sobre valores tidos como retrógrados, tais como o cientificismo. (VELLOSO,</p><p>1993. p. 7)</p><p>o romantismo é ainda associado ao pessimismo e o romantismo ao sentimento, carregando</p><p>consigo a tristeza e a morbidez. Para o modernismo seria então necessário que os escritos</p><p>fossem pragmáticos, racionais e ligados de alguma forma ao capitalismo vigente. Para além</p><p>disso, ainda vigorava a discussão sobre regionalismos, onde, mais uma vez Mario de Andrade</p><p>e os verde-amarelos estavam de lado opostos. Para os mais conservadores, o regionalismo</p><p>deveria ser considerado e valorizado, já que poderiam ser estabelecidas algumas barreiras</p><p>linguísticas e de ambientação, já para a corrente de Andrade não se diz anti-regionalismo</p><p>(VELLOSO, 1993), mas sugere uma nova roupagem, um nacional-regionalismo, tornando o</p><p>termo mais maleável para se trabalhar e permitindo atualizações, coisa que seria estritamente</p><p>proibida no movimento verde-amarelo.</p><p>A literatura ainda enfrenta inúmeras questões para estabelecer o que seria moderno ou</p><p>deixaria de ser, possibilitando debates ainda maiores dos que os citados, contudo, o objetivo</p><p>deste escrito é evidenciar que, para além da literatura, outra forma de enxergarmos o mesmo</p><p>período é por intermédio da arte, mais especificamente pelas artistas Tarsila do Amaral e</p><p>Anita Malfatti, primeiras e principais artistas ligadas ao movimento.</p><p>Anita Malfatti, nascida em 2 de dezembro de 1889, filha de mãe norte americana e pai</p><p>italiano, com 13 anos Anita tenta suicidar-se em uma linha de trem</p><p>Eu tinha 13 anos, e sofria porque não sabia que rumo tomar na vida. Nada</p><p>ainda me revelara o fundo da minha sensibilidade[...]Resolvi, então, me</p><p>submeter a uma estranha experiência: sofrer a sensação absorvente da morte.</p><p>Achava que uma forte emoção, que me aproximasse violentamente do perigo,</p><p>me daria a decifração definitiva da minha personalidade. [...] Um dia saí de</p><p>casa, amarrei fortemente as minhas tranças de menina, deitei-me debaixo dos</p><p>dormentes e esperei o trem passar por cima de mim. Foi uma coisa horrível,</p><p>indescritível. O barulho ensurdecedor, a deslocação de ar, a temperatura</p><p>asfixiante deram-me uma impressão de delírio e de loucura. E eu via cores,</p><p>cores e cores riscando o espaço, cores que eu desejaria fixar para sempre na</p><p>retina assombrada. Foi a revelação: voltei decidida a me dedicar à pintura.</p><p>(GREGGIO, 2007. p. 18)</p><p>E assim o fez, tornando-se um dos maiores destaques modernistas, Malfatti estudou arte em</p><p>Berlim e nos EUA, trazendo consigo uma bagagem suficiente para colocá-la em exposição na</p><p>Semana de Arte Moderna de 1922. E foi graças a esse fatídico evento, realizado no Teatro</p><p>Municipal de São Paulo, que teve seu auge nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro (SANTOS,</p><p>2014) que o marco do modernismo brasileiro foi estabelecido, durante a semana - que</p><p>começou no dia 11 e seguiu até o dia 18 - os novos conceitos ficaram visíveis por meio de</p><p>poesias sendo declamadas, música com seus concertos acompanhados de orquestras e</p><p>também da arte, com suas telas, maquetes e esculturas com formas arrojadas e até ousadas.</p><p>É sabido que esse evento não passaria despercebido pela crítica, já que o moderno</p><p>ainda não era de total agrado da população. Malfatti acaba sendo uma das mais atingidas com</p><p>duras críticas após o evento, sendo a mais polêmica e dura delas a feita por Monteiro Lobato</p><p>Anita Malfatti sofreu também uma com a crítica que a assolou por muito</p><p>tempo, quem publicou foi o escritor Monteiro Lobato artigo intitulado</p><p>“Paranoia ou Mistificação?”, menosprezou de tal forma as obras da artista</p><p>que muitos compradores que leram o artigo feito por Monteiro Lobato</p><p>devolveram as obras [...]. (SANTOS, 2014. p. 38)</p><p>Durante a Semana de 22, Tarsila do Amaral estava em Paris, mas a sua não presença</p><p>no evento muda em nada a sua grande popularidade. Nascida em 1 de setembro de 1886, a</p><p>artista é, segundo Santos, rotulada como “branca, de elite, europeizada e companheira de um</p><p>grande homem, Oswald de Andrade”(p. 41) por diversos outros autores, por vezes assumindo</p><p>que seria somente por esses fatores que Tarsila angariou sua fama, e não por suas obras.</p><p>Outra questão levantada pela autora seria uma suposta competição entre Malfatti e Amaral</p><p>pelo posto de melhor artista feminina do período modernista, considerando que as duas tem</p><p>sua importância definida para o movimento, e para além disso, tratar-se de mulheres, que</p><p>constantemente precisavam - e ainda precisam - afirmar seus lugares dentro das artes,</p><p>torna-se desnecessário colocar as duas como rivais. O argumento utilizado por Santos é o de</p><p>que as obras de Anita foram consideradas expressionistas, mas ainda assim reforça a perda do</p><p>posto para Tarsila.</p><p>Voltemos às obras de Tarsila. Em 1923 nasce a primeira de três obras que demonstram</p><p>qual seria o objetivo da pintora em representar o modernismo, “A Negra” tornou-se a</p><p>primeira obra produzida por uma mulher a representar um negro (SANTOS, 2014), buscando</p><p>uma quebra com a tradição europeia e dando ao modernismo o que mais precisava,</p><p>representação do povo brasileiro sem basear-se no conceito europeu. é possível que a</p><p>personagem retratada seja uma ama, com seus membros deformados propositalmente para dar</p><p>destaque ao corpo forte e ágil dessas mulheres, além de seus lábios grossos e nariz triangular</p><p>destacados na configuração do rosto. (AVELINO, MORENO, GONÇALVES, 1999 apud</p><p>SANTOS, 1999)</p><p>Imagem 1: A Negra</p><p>Fonte:Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo</p><p>Em 1928, “Abaporu” busca resgatar a cultura indígena que teria sido apagada pelo</p><p>colonizador, a forma como a figura humana está pintada indicaria, além da miséria, os</p><p>principais elementos que caracterizariam a cultura nacional, que estaria representado pela</p><p>cabeça menor do que os outros membros e voltada para o abdômen “o sentido visceral da</p><p>emoção/razão, cultura/deglutinação, criação/ruminação” (AVELINO, MORENO,</p><p>GONÇALVES, 1999 apud SANTOS, 1999) , os membros hipertrofiados representariam a busca</p><p>pela essência escondida nas aparências do movimento modernista.</p><p>Figura 2: Abaporu</p><p>Fonte: Colección Costantini (Buenos Aires, Argentina)</p><p>Por fim, mas não menos importante, a obra que Tarsila presenteia seu</p><p>companheiro Oswald de Andrade em 1929, “Antropofagia” seria uma união das duas outras</p><p>obras citadas acima. O rosto das figuras e a cor da pele não são as mesmas, mas é perceptível</p><p>essa união pela forma como os corpos estão dispostos e dismórficos da mesma maneira das</p><p>pinturas anteriores. Outro elemento que torna visível essa análise é o fundo do quadro, o sol e</p><p>a fauna brasileira representada nas folhas de bananeira. (SANTOS, 2014). Uma possível</p><p>análise, partindo desses elementos, é a de que “Antropofagia” seria um retrato de uma parte</p><p>da população brasileira, que tanto era almejada pelos modernistas.</p><p>Figura 3: Antropofagia</p><p>Fonte: Acervo Fundação José e Paulina Nemirovsky (São Paulo, SP)</p><p>REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS</p><p>SCHWARCZ, Lilia. História do Brasil Nação: abertura para o mundo. Rio de Janeiro:</p><p>Editora Objetiva, 2012. p. 19-33</p><p>VELLOSO, Mônica Pimenta. A brasilidade verde-amarela: nacionalismo e regionalismo</p><p>paulista. Estudos Históricos, Rio de janeiro, vol 6, n. 11, 1993, p. 89-112.</p><p>SANTOS, Patrícia Maria. Tarsila do Amaral e o Movimento Modernista em São Paulo.</p><p>Revista Eletrônica Discente História.com. Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Vol.</p><p>2, n. 3, 2014.</p><p>GREGGIO. Luiza Portinari. Anita Malfatti: Tomei a Liberdade de Pintar a Meu Modo.</p><p>São Paulo: Folha de São Paulo, 2013.</p><p>OBRAS</p><p>AMARAL, Tarsila do. A Negra. 1923. óleo sobre tela, 100 cm x 81,3 cm.</p><p>AMARAL, Tarsila do. Abaporu. 1928. óleo sobre tela, 85 cm x 76 cm.</p><p>AMARAL, Tarsila do. Antropofagia. 1929. óleo sobre tela, 126 cm x 142 cm.</p>

Mais conteúdos dessa disciplina