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<p>História do Pensamento</p><p>Econômico</p><p>Material Teórico</p><p>Responsável pelo Conteúdo:</p><p>Prof. Ms. Luiz Paulo Ribeiro Siqueira</p><p>Revisão Textual:</p><p>Profa. Ms. Selma Aparecida Cesarin</p><p>Introdução ao estudo da História do Pensamento Econômico</p><p>5</p><p>•	 Introdução</p><p>•	 A	Economia	Pré-Capitalista</p><p>•	 O	Crescimento	do	Comércio	de	Longa	Distância,	o	Nascimento	da</p><p>Indústria	Capitalista	e	a	queda	do	Feudalismo</p><p>•	 A	Fase	Inicial	do	Capitalismo	–	O	Mercantilismo</p><p>•	 Os	Fisiocratas</p><p>· Apresentar as principais características do sistema capitalista;</p><p>· Avaliar as características da economia pré-capitalista, ou seja, o feudalismo;</p><p>· Discutir a importância que o crescimento do comércio de longa distância teve</p><p>para o fortalecimento da indústria capitalista e para a queda do Feudalismo;</p><p>· Introduzir as ideias relacionadas ao Mercantilismo – fase inicial do capitalismo;</p><p>· Apresentar o pensamento dos Fisiocratas, considerada a primeira escola de</p><p>pensamento econômico.</p><p>Prezado(a) aluno(a)</p><p>Leia com bastante atenção o conteúdo desta Unidade, visto que antes de iniciarmos</p><p>nossas discussões sobre as ideias dos principais economistas clássicos nas próximas Unidades</p><p>é fundamental que você compreenda as características básicas do Capitalismo, como esse</p><p>sistema surgiu e porque o sistema anterior, o Feudalismo, sucumbiu.</p><p>Esta primeira Unidade, além de lançar as bases para nossas discussões posteriores, é</p><p>também rica em informações históricas a respeito de importantes acontecimentos, seja de</p><p>ordem econômica, seja social e também religiosa.</p><p>Você também encontrará uma atividade composta por questões de múltipla escolha,</p><p>relacionadas ao conteúdo estudado. Além disso, terá a oportunidade de trocar conhecimentos</p><p>e debater questões no fórum de discussão.</p><p>É extremante importante que você consulte os materiais complementares, pois são ricos</p><p>em informações, possibilitando o aprofundamento de seus estudos.</p><p>Introdução ao estudo da História do</p><p>Pensamento Econômico</p><p>6</p><p>Unidade: Introdução ao estudo da história do pensamento econômico</p><p>Contextualização</p><p>Para iniciarmos esta Unidade, convido você a assistir um clássico trecho do filme Tempos</p><p>Modernos, que foi estrelado e produzido por Charles Chaplin.</p><p>Embora seja uma paródia, este filme, ainda em 1936, demonstrou como poucos as principais</p><p>características da organização da produção em uma fábrica tipicamente capitalista, sobretudo</p><p>o rígido controle da produção.</p><p>Para um economista, é essencial o pleno conhecimento da economia capitalista e sua</p><p>importância para o desenvolvimento da sociedade tal como a conhecemos hoje.</p><p>Assim, antes de discutirmos as características do sistema que precedeu o capitalismo, como</p><p>ocorreu a transição e as razões que motivaram o seu desenvolvimento tal como ele é hoje,</p><p>nada melhor do que um pequeno trecho desse clássico filme, disponível em:</p><p>Vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=4PaGw4ZRmWY</p><p>7</p><p>Introdução</p><p>O	Capitalismo	e	a	História	do	Pensamento	Econômico</p><p>Quando pretendemos construir a história do pensamento econômico, ou seja, como as</p><p>ideias sobre o funcionamento da Economia evoluíram ao longo do tempo, seria impossível não</p><p>pensar no Capitalismo e sua evolução histórica.</p><p>O Capitalismo é o modo de produção de riquezas pelo qual a sociedade se organiza, mais</p><p>marcadamente, a partir século XVI e que pôde ser caracterizado ao longo do tempo por</p><p>quatro características fundamentais:</p><p>•	 Produção de mercadorias orientadas para o mercado;</p><p>•	 Propriedade privada dos meios de produção;</p><p>•	 A maior parcela da população recebe salário em troca do seu trabalho;</p><p>•	 Os indivíduos e as empresas têm comportamento individualista e maximizador, isto é,</p><p>procuram sempre o máximo a custo do mínimo.</p><p>Vamos contextualizar agora essas quatro características</p><p>A primeira característica diz respeito ao fato de que praticamente todas as mercadorias</p><p>produzidas em uma economia capitalista tem como destino o mercado, ou seja, são produzidas</p><p>para serem comercializadas. As mercadorias, por sua vez, apenas são comercializadas se</p><p>possuírem duas características distintas:</p><p>Valor de</p><p>USO</p><p>As mercadorias precisam possuir características físicas particulares por meio das quais se</p><p>tornam utilizáveis e satisfazem as necessidades das pessoas. Assim, todas as mercadorias, em</p><p>maior ou menor medida, têm valor de uso;</p><p>Valor de</p><p>TROCA</p><p>Uma mercadoria apenas possui valor de troca na medida em que pode ser vendida no mercado</p><p>em troca de dinheiro.</p><p>Vamos refletir agora sobre as características das mercadorias e porque elas são uma das</p><p>bases do sistema capitalista.</p><p>Voltando ao passado, na época das sociedades mais primitivas (a exemplo de algumas das</p><p>tribos indígenas pré-colombianas), como não existia o dinheiro, as trocas só eram feitas se os</p><p>produtos trocados satisfizessem às necessidades individuais de ambas as partes envolvidas, isto</p><p>é, um indígena só conseguiria trocar flechas por peixes se suas flechas fossem úteis a uma</p><p>pessoa que possuísse peixes.</p><p>Assim, as mercadorias, no período mais primitivo da sociedade, possuíam apenas valor de</p><p>uso, visto que o valor de troca apenas existe se a mercadoria pode ser trocada por dinheiro.</p><p>8</p><p>Unidade: Introdução ao estudo da história do pensamento econômico</p><p>Vamos refletir agora sobre o porquê da acumulação de riquezas nessa época ser tão pequena.</p><p>Em nossa mesma tribo, suponha que um dos índios saiba fazer vasilhames de barro.</p><p>Qual seria o estímulo, ou o benefício, que ele teria para produzir vasilhames em série, se</p><p>esses não pudessem ser trocados por dinheiro?</p><p>Nenhum.</p><p>Ele fabricaria apenas os vasilhames necessários para trocar por outros produtos, de acordo</p><p>com suas necessidades.</p><p>Desta forma, devemos destacar que o processo de acumulação de riquezas mais consistente,</p><p>embora não exclusivo do Capitalismo, só foi possível a partir do momento em que moedas</p><p>passaram a circular, fazendo, então, com que as mercadorias tivessem valor de troca.</p><p>Uma vez que as mercadorias poderiam ser trocadas por moeda, e essa moeda por outras</p><p>mercadorias diferentes, houve um grande estímulo à produção de um excedente de mercadorias</p><p>para venda no mercado.</p><p>Assim, a produção passou a ser orientada não apenas para a satisfação de necessidades</p><p>básicas individuais dos artesões, pescadores e demais profissionais que predominavam na</p><p>época, mas principalmente para o mercado.</p><p>A segunda característica que define o Capitalismo é a propriedade privada dos meios</p><p>de produção. Isto se refere ao fato de que a sociedade dá a certas pessoas, no geral a uma</p><p>minoria – os Capitalistas – o direito de determinar como matérias-primas quais ferramentas,</p><p>maquinaria e edifícios destinados à produção podem ser usados (HUNT, 1981).</p><p>Veja, em uma economia capitalista não devem existir fábricas públicas, nas quais qualquer</p><p>pessoa poderia entrar e junto com outras produzir mercadorias sem qualquer tipo de controle.</p><p>A terceira característica definidora do Capitalismo está diretamente relacionada à</p><p>segunda. Como apenas uma minoria detêm os meios de produção, existe uma numerosa</p><p>classe trabalhadora que não tem qualquer controle sobre os meios de produção.</p><p>Essa classe entra no mercado possuindo apenas sua força de trabalho (sua mão de obra),</p><p>que é vendida ao capitalista por um preço – o salário. Observe que o Capitalismo faz da força</p><p>produtiva humana uma mercadoria.</p><p>A quarta e última característica é a de que, em uma sociedade capitalista, as pessoas, no</p><p>geral, possuem um comportamento individualista, aquisitivo e maximizador. Essa característica</p><p>diz respeito, por exemplo, à contínua busca por grande parte dos trabalhadores de melhores</p><p>empregos, que paguem salários maiores e elevem seu padrão de vida. O mesmo ocorre</p><p>também com os Capitalistas que estão sempre em busca de novas tecnologias de produção</p><p>que possibilitem o aumento de seus lucros e sua permanência por um maior tempo nos</p><p>mercados, que no geral são competitivos.</p><p>O Capitalismo, com suas características que acabamos de analisar, contudo, não foi o único</p><p>modo de produção</p><p>em torno do qual a sociedade como um todo se organizou.</p><p>Durante muitos séculos, o modo de produção dominante foi o Feudalismo. Assim, não</p><p>há como esboçar a evolução histórica do Capitalismo sem falar sobre o Feudalismo, sistema</p><p>econômico que antecedeu o Capitalismo e vigorou principalmente na Europa Ocidental, após</p><p>a queda do Império Romano.</p><p>9</p><p>A Economia Pré-Capitalista</p><p>Embora existissem muitas cidades na Europa da Idade Média, a instituição básica da vida</p><p>medieval eram as áreas rurais chamadas de feudos.</p><p>No sistema econômico feudal, o Feudalismo, os feudos eram as terras concedidas pelos</p><p>senhores feudais aos seus servos, também chamados de camponeses, em troca de pagamentos</p><p>em moeda (tal como se fosse um imposto), trabalho (a esposa do servo, por exemplo, poderia</p><p>trabalhar na casa ou castelo do senhor feudal), ou fidelidade militar (o servo e sua família, em</p><p>caso de conflito, lutariam a favor do senhor feudal). Como contrapartida, os senhores feudais</p><p>ofereciam aos seus servos proteção e administravam a Justiça, principalmente.</p><p>Os costumes e a tradição da época são fundamentais para a compreensão das relações no</p><p>meio feudal. Ao invés de leis e contratos, tal como conhecemos hoje, o que governava eram</p><p>os costumes vigentes nos feudos.</p><p>A Organização medieval se baseava em um sistema de serviços e obrigações mútuas,</p><p>envolvendo toda a hierarquia feudal: camponeses, vassalos, suseranos, clero e os nobres.</p><p>Os conflitos e disputas entre os servos eram resolvidos na “corte do senhor feudal”, de</p><p>acordo, principalmente, com os costumes do feudo para cada caso, o que poderia incluir, por</p><p>exemplo, punições severas como a decapitação.</p><p>Os servos não eram escravos; assim, não podiam ser separados de sua família; entretanto,</p><p>também não podiam ser considerados livres, pois eram explorados ao extremo e, no geral, só</p><p>passariam a servir outro senhor se a posse de seu feudo fosse transferida para outro nobre.</p><p>Fonte: haikudeck.com</p><p>10</p><p>Unidade: Introdução ao estudo da história do pensamento econômico</p><p>No período feudal, a Igreja Católica de Roma teve papel muito importante para a sociedade</p><p>como um todo, principalmente por causa do ensino religioso que, nesse período, exerceu</p><p>influência fortíssima sobre os costumes da época.</p><p>Assim, durante todo o período feudal, que se estendeu por quase 1000 anos, a Igreja de</p><p>Roma, principalmente na Europa, foi a instituição que mais se aproximou de um Governo,</p><p>após a queda do Império Romano.</p><p>Embora a sociedade feudal fosse tipicamente rural, tal como já destacamos, existiam</p><p>à época grandes cidades, não só na Europa medieval, mas em quase todas as partes do</p><p>mundo, que eram importantes centros de comércio e manufatura, como Florença, na Itália,</p><p>ou Constantinopla, na Turquia – atual Istambul.</p><p>Os bens manufaturados (ferramentas, móveis, utensílios domésticos etc.), em sua grande</p><p>maioria, eram fabricados nas cidades e vendidos aos feudos ou, algumas vezes, trocados no</p><p>comércio distante.</p><p>Nas cidades, as instituições econômicas responsáveis pela quase totalidade desse comércio</p><p>eram as chamadas corporações de ofício – associações formadas por diversos tipos de</p><p>profissionais e artesões, que regulavam não apenas a produção e venda de mercadorias, como</p><p>também a vida espiritual de seus membros (SWEEZY et al., 1989).</p><p>Um dos fatores que marcam o início da dissolução do Feudalismo refere-se ao aumento</p><p>da produção agrícola. A “grande revolução tecnológica” que levou ao aumento substancial da</p><p>produção agrícola foi propiciada, principalmente, pela substituição do chamado sistema de</p><p>plantio de dois campos para o sistema de três campos.</p><p>No sistema de plantação em dois campos, a terra da propriedade agrícola era dividida em</p><p>duas partes iguais, sendo que metade da terra era sempre deixada ociosa, para se recuperar</p><p>do plantio anterior.</p><p>Já no sistema de três campos, por exemplo, no primeiro ano cultiva-se a cevada no campo</p><p>I, o trigo no campo II e deixava-se o campo III em repouso. Assim, um dado trecho de terra</p><p>teria uma cultura de outono em num ano, de primavera no ano seguinte e descansaria no</p><p>terceiro, tal como demonstra o quadro a seguir.</p><p>SISTEMA DE PLANTIO EM TRÊS CAMPOS</p><p>CAMPO Primeiro Ano Segundo Ano Terceiro Ano</p><p>I Plantação de ceveda Campo em repouso Plantação de trigo</p><p>II Plantação de trigo Plantação de ceveda Campo em repouso</p><p>III Campo em repouso Plantação de trigo Plantação de ceveda</p><p>Esta mudança, relativamente simples, se pensarmos como hoje, aumentou a área cultivada</p><p>da época em 50% (HUNT 1981, apud WHITE, 1962).</p><p>Esse aumento da produção agrícola possibilitou a colheita em maior quantidade de aveia</p><p>e forragem, que constituíam a alimentação básica dos cavalos, nesse período, o melhor que</p><p>se tinha para ajudar o homem na produção agrícola (puxar arados e carroças, por exemplo).</p><p>11</p><p>Destaca-se aqui que, até o início da produção em três campos, o uso de bois predominava</p><p>na agricultura, visto que não era possível alimentar e criar grande quantidade de cavalos para</p><p>uso no campo.</p><p>A partir desse momento, entretanto, os cavalos passaram a substituir os bois como fonte</p><p>de energia na agricultura. Como são mais rápidos e ágeis que os bois, a utilização de cavalos</p><p>possibilitou o aumento das áreas agrícolas cultivadas e, consequentemente, o aumento da</p><p>produção, o que permitiu o envio de mais alimentos para as áreas urbanas, fomentando seu</p><p>crescimento.</p><p>É importante destacar nesse ponto que até então a qualidade de vida no campo era muito</p><p>superior a das cidades, onde as condições de vida eram precárias para a grande maioria de</p><p>seus habitantes.</p><p>Além disso, o uso de cavalos junto com carroças de quatro rodas (substituindo as de duas</p><p>rodas) tornou o transporte de mercadorias mais eficiente (transportava-se mais e mais rápido).</p><p>Reflita</p><p>Você já havia vislumbrado o quão importante os cavalos</p><p>foram para o desenvolvimento da Economia?</p><p>Fonte: iStock/Getty Images</p><p>As melhorias na agricultura e no transporte contribuíram de forma vital para o crescimento</p><p>da população, principalmente nas cidades, o que conduziu ao crescimento da especialização</p><p>do comércio rural-urbano e do comércio inter-regional e de longa distância.</p><p>12</p><p>Unidade: Introdução ao estudo da história do pensamento econômico</p><p>O Crescimento do Comércio de Longa Distância, o Nascimento da</p><p>Indústria Capitalista e a queda do Feudalismo</p><p>A produção agrícola dos feudos era vendida, ou trocada, quase que exclusivamente com as</p><p>corporações de ofício e seus comerciantes estabelecidos nas cidades.</p><p>Esses, por sua vez, comercializam uma parte dessas mercadorias em sua própria cidade e</p><p>vendiam o excedente para outras cidades da região e feudos.</p><p>O aumento desses excedentes, por conta da maior produção agrícola, ocasionou o</p><p>crescimento do comércio regional e de longa distância, favorecendo o estabelecimento de</p><p>cidades industriais e comerciais (DOBB, 1987).</p><p>Diálogo com o Autor</p><p>Como não era possível viajar longas distâncias com uma carroça sem fazer</p><p>paradas, os comerciantes ao longo do trajeto entre duas cidades importantes</p><p>da época faziam diversas paradas em cidades menores, também chamadas</p><p>de Burgos, ou pontos de descanso (como pousadas e tabernas), a princípio,</p><p>para descansar, mas acabavam também transacionando mercadorias</p><p>com outros comerciantes no local. O crescimento do comércio de longa</p><p>distância, assim sendo, contribuiu sobremaneira para o desenvolvimento</p><p>comercial e industrial de muitas cidades, bem como para a criação de</p><p>outras, principalmente, as que possuíam localização privilegiada, como em</p><p>entroncamentos de estradas e à margem de rios.</p><p>O desenvolvimento do comércio, principalmente com os árabes e os vikings, levou ao</p><p>crescimento da produção para a exportação e a criação das primeiras grandes feiras comerciais,</p><p>entre os séculos XII e XIV, que eram realizadas nas grandes cidades comerciais europeias,</p><p>como Veneza.</p><p>O aumento do comércio nas cidades ocasionou, ainda, o desenvolvimento de sistemas mais</p><p>complexos de pagamento e compensação</p><p>(como as cartas de crédito), além do estabelecimento</p><p>de leis comerciais que davam suporte a contratos, negociação de títulos e representação</p><p>comercial (HUNT; SHERMAN, 2001).</p><p>Na medida em que o comércio prosperava e se expandia, a necessidade de produção de</p><p>mais produtos manufaturados induzia a um crescente controle do processo produtivo pelo</p><p>“capitalista” comerciante.</p><p>Já no século XVI, a produção tipicamente artesanal, na qual o artesão era proprietário de</p><p>suas ferramentas e matérias-primas, tinha sido substituída nas indústrias de exportação pelo</p><p>trabalho doméstico.</p><p>O comerciante contratava os trabalhadores para usar as ferramentas, fornecia as matérias-</p><p>primas, recebia o produto e, em contrapartida, pagava salários. Essa primeira forma de</p><p>organização de produção tipicamente capitalista ocorreu principalmente no segmento têxtil</p><p>de confecção, no qual o sistema de trabalho doméstico se desenvolveu (DOBB, 1987).</p><p>13</p><p>O desenvolvimento da indústria têxtil, em particular, colaborou com o processo de expulsão</p><p>dos camponeses dos feudos. A crescente demanda por lã, por conta do aumento da população,</p><p>fez com que os nobres iniciassem um movimento de cercamento de suas terras.</p><p>As terras que antes eram utilizadas para pasto comum e cultivo agrícola passaram a ser</p><p>utilizadas, exclusivamente, como pasto de ovelhas, para satisfazer a demanda por lã. Como a</p><p>criação de ovelhas para extração de lã exige um mínimo de trabalho nas pastagens, estima-se que</p><p>esse processo tenha expulsado do campo algo em torno de 75% dos habitantes (HUNT, 1981).</p><p>A expulsão da população do campo por conta dos cercamentos e o crescimento populacional</p><p>foram vitais para o rompimento dos últimos laços do feudalismo que ainda existiam. A partir</p><p>desse momento, criava-se uma grande e nova força de trabalho que não possuía terra, matéria-</p><p>prima e tão pouco ferramentas para produzir, ou seja, que possuía apenas sua força de trabalho</p><p>para vender, no geral, em troca de um salário.</p><p>A criação dessa grande força de trabalho e o desenvolvimento da classe comerciante</p><p>“capitalista” que controlava o processo de produção marcou o surgimento do sistema</p><p>econômico capitalista. A força dos mercados e a busca pelo lucro passaram a substituir os</p><p>costumes e a tradição feudal na determinação de quem executaria certa tarefa, como seria</p><p>executada e se os trabalhadores poderiam ou não encontrar trabalho para o seu sustento.</p><p>Quando isso ocorreu, o sistema capitalista foi criado (DOBB, 1987).</p><p>Tal como pontuam Sweezy e outros (1989), a transição do feudalismo para o capitalismo,</p><p>todavia, não foi um processo natural e pacífico, muito pelo contrário.</p><p>O rompimento do sistema feudal, além do que já comentamos, originou-se também de uma</p><p>série de catástrofes entre os séculos XIV e XV, como a guerra dos Cem anos, envolvendo</p><p>França e Inglaterra e a peste negra.</p><p>Fonte: iStock/Getty Images</p><p>14</p><p>Unidade: Introdução ao estudo da história do pensamento econômico</p><p>A expressiva redução da população por conta de guerras e da peste negra (estima-se</p><p>que aproximadamente 30% da população europeia tenha sido dizimada nesse período)</p><p>ocasionou falta de mão de obra para as atividades de manufatura, o que acabou elevando os</p><p>salários dos trabalhadores.</p><p>A elevação dos salários, com consequente queda nos lucros dos comerciantes capitalistas,</p><p>fez com que grande parcela da nobreza feudal tentasse reestabelecer à força os serviços</p><p>obrigatórios dos servos e camponeses. Tais tentativas geraram uma série de sangrentas revoltas</p><p>de camponeses entre os séculos XV e XVI em diversos países da Europa.</p><p>Reflita</p><p>O apontamento desses conflitos e revoltas serve para ilustrar o fato</p><p>geralmente observado de que mudanças fundamentais da estrutura política</p><p>e econômica só são conseguidas após conflitos violentos e traumatizantes.</p><p>Pense: se um processo de separação de uma região de um país já é</p><p>traumático e sangrento, a exemplo da situação envolvendo a região da</p><p>Criméia na Ucrânia, imagine quão conturbada foi a transição de um</p><p>sistema econômico (Feudalismo) para outro (Capitalismo), principalmente</p><p>na Europa, berço desse processo.</p><p>15</p><p>A Fase Inicial do Capitalismo – O Mercantilismo</p><p>O Mercantilismo, como fase inicial do Capitalismo, originou-se no período em que a Europa</p><p>passava por uma grande escassez de ouro e prata, não tendo, portanto, dinheiro suficiente</p><p>para atender o crescente comércio (HUNT; SHERMAN, 2001).</p><p>Como o ouro e a prata eram limitados, grande parte dos países adotaram políticas que</p><p>visavam a atrair e manter o ouro e a prata internamente, o que possibilitaria a manutenção no</p><p>nível do comércio interno, principalmente.</p><p>Essas políticas, chamadas também de bulionistas, só foram “relaxadas” a partir do final do</p><p>século XV e início do século XVI, com o descobrimento das Américas. Daí em diante, houve uma</p><p>entrada tão grande de ouro e prata vindos das Américas, que a Europa experimentou o aumento</p><p>generalizado de preços (inflação) mais rápido e duradouro de sua história (HUNT, 1981).</p><p>Após o período bulionista, a vontade dos “mercantilistas” de maximizar o ouro e a prata</p><p>dentro de um país assumiu a forma de tentativas dos governos para conseguir um saldo</p><p>favorável na balança comercial, ou seja, mais exportações do que importações (DOBB, 1987).</p><p>Para alcançar esses objetivos, a principal política adotada foi a de criação de monopólios</p><p>comercias. A ideia dos monopólios comerciais era a de que, se apenas uma instituição, ou</p><p>mercador, por exemplo, vendesse tecidos em nome da Inglaterra inteira, e apenas um mercador</p><p>comprasse tabaco para todo país, seria possível obter preços menores para a compra e maiores</p><p>para a venda, aumentando o saldo da balança comercial.</p><p>Junto com o estabelecimento dos monopólios comerciais, diversas outras políticas foram</p><p>colocadas em prática pelos países para restringir as importações e as exportações, a exemplo</p><p>da imposição de taxas sobre produtos, ou mesmo a própria proibição do comércio externo de</p><p>determinadas mercadorias.</p><p>Além destas restrições ao comércio exterior, havia também um extenso conjunto de restrições</p><p>e regulamentos impostos pelos governos destinados ao controle da produção interna das</p><p>mercadorias. Nesse período, a imposição de técnicas de produção e treinamentos específicos,</p><p>por exemplo, tornaram-se obrigatórios e controlados pelo governo em muitos países.</p><p>Embora o pensamento mercantilista tenha levado a um expressivo aumento da participação</p><p>do estado na Economia, com o intuito de assegurar saldos positivos na balança comercial.</p><p>Nesta Disciplina, nosso interesse recai sobremaneira sobre as ideias mercantilistas</p><p>relacionadas à natureza e à origem dos lucros. Tais ideias motivaram o desenvolvimento dos</p><p>primeiros textos relacionados à análise da Economia, como abordaremos em sequência.</p><p>16</p><p>Unidade: Introdução ao estudo da história do pensamento econômico</p><p>Primeiros	registros	escritos	mercantilistas	sobre	valor	e	lucro</p><p>Pensando de forma bem simples, um mercador obtinha lucro quando o preço pelo qual ele</p><p>vendia uma mercadoria era alto o bastante para cobrir o preço pago por ela, mais as despesas</p><p>com transporte, armazenagem e ainda gerar um excedente para ele – os lucros.</p><p>Para os mercantilistas, o valor dos produtos derivava de seu valor de uso e os lucros eram</p><p>originados do ato da troca. Os lucros na época desses escritos, ainda, eram vistos como</p><p>provenientes de duas fontes principais, tal como pontuou.</p><p>A primeira era por conta da inflação que ocorreu ao longo dos séculos XVI e XVII, visto</p><p>que entre a data em que as mercadorias eram compradas e a data na qual eram vendidas, o</p><p>aumento dos preços gerava lucros inesperados.</p><p>Em segundo lugar, e mais importante, o lucro dava-se pelas diferentes condições de produção</p><p>em várias regiões. Como a mobilidade de recursos (tecnologia e mão de obra, por exemplo)</p><p>entre as regiões era muito baixa, o preço das mercadorias variava muito de região para região</p><p>(HUNT; SHERMAN, 2001).</p><p>Assim, parcela importante dos lucros era obtida pela compra</p><p>de mercadorias em uma</p><p>região ou em um país em que ela fosse relativamente barata e a venda em uma região ou país</p><p>em que ela fosse relativamente cara.</p><p>Reflita</p><p>A prática dos comerciantes, principalmente do Sul do Brasil,</p><p>que vem até São Paulo comprar peças de vestuário na região</p><p>Central da cidade é um bom exemplo atual de obtenção de</p><p>lucros com base na diferença regional de preços.</p><p>Os pensadores relacionados ao Mercantilismo foram, também, os primeiros que começaram</p><p>a considerar as questões sobre a oferta dos produtos e sua influência sobre o preço e os lucros.</p><p>Nessa época, já era observado e compreendido que se uma grande quantidade de mercadores</p><p>levasse produtos de uma região onde a produção era mais barata para onde a produção era</p><p>mais cara, os preços do produto na região destino diminuíram e, consequentemente, os lucros</p><p>se tornariam menores.</p><p>Assim, os primeiros mercantilistas achavam que o controle das condições que afetavam a</p><p>oferta de mercadorias era o principal meio pelo qual poderiam ser conseguidos e mantidos os</p><p>altos lucros. Daí surgia mais um motivo para a defesa destes a favor dos monopólios.</p><p>A difusão contínua do comércio e o aumento da concorrência, entretanto, foram de forma</p><p>contínua diminuindo as diferenças relativas de preços entre as diversas regiões e nações e</p><p>dificultando o estabelecimento de monopólios.</p><p>Na medida em que os lucros foram sendo reduzidos, todavia, passou-se a impor um controle</p><p>cada vez mais rigoroso sobre os processos de produção, no intuito de manter o nível de lucros</p><p>por meio da diminuição dos desperdícios, aperfeiçoamento dos produtos e de suas qualidades.</p><p>Nesse processo, os mestres artesões transformaram-se cada vez mais em organizadores da</p><p>produção, de forma similar aos gerentes de uma fábrica, hoje em dia.</p><p>17</p><p>Como destacou Hunt:</p><p>Esse processo de maior controle sobre a produção, aos poucos,</p><p>ocasionou uma mudança da interpretação de que os preços e os</p><p>lucros eram determinados basicamente pelas forças da oferta e da</p><p>procura e, em particular, pela utilidade, para a interpretação de que</p><p>os preços eram determinados pelas condições de produção e os</p><p>lucros eram originários do processo produtivo (HUNT, 1981, p.49).</p><p>Tal pensamento foi uma das sementes para a formulação de uma nova filosofia do</p><p>individualismo, segundo a qual o indivíduo deveria ser independente, dirigir-se a si mesmo, ser</p><p>autônomo e livre (HUNT, 1981).</p><p>Assim sendo, a busca desse lucro só poderia ser eficaz numa sociedade baseada na proteção</p><p>aos direitos de propriedade e na certeza do cumprimento dos compromissos contratuais</p><p>impessoais entre os indivíduos.</p><p>Diante deste cenário, o protestantismo religioso passou a ganhar força, pois a Igreja</p><p>Católica, já enfraquecida por conta do aumento do poder dos estados, ainda condenava a</p><p>busca incessante por lucros.</p><p>Você sabia?</p><p>Os puritanos, uma das religiões protestantes, acreditam que</p><p>“Deus criou o mercado e a troca”, de forma que nada haveria de</p><p>mal na busca por lucros.</p><p>Este “novo” individualismo ocasionou inúmeros protestos contra a subordinação dos</p><p>assuntos econômicos à vontade do Estado. Os monopólios passaram a ser cada vez mais</p><p>condenados e ganhava força a ideia de quem, em um mercado mais competitivo, com o preço</p><p>flutuando livremente, na sociedade, lucraria mais (HUNT; SHERMAN, 2001).</p><p>Passou-se a defender, também, a ideia de que a ambição, o egoísmo e o comportamento</p><p>aquisitivo tenderiam a contribuir para a industrialização e para uma economia progressista.</p><p>Desta forma, o que antes era visto como vício pelos moralistas medievais e, sobremaneira,</p><p>pela Igreja Católica, eram as próprias forças motivadoras que impulsionavam o novo sistema</p><p>capitalista (DOBB, 1987).</p><p>Durante o período Mercantilista e de transição entre este e o Capitalismo, principalmente</p><p>de forma dispersa, diversos trabalhos contendo explicações sobre fenômenos ocorridos nos</p><p>mercados e na economia dos países foram lançados.</p><p>Contudo, é apenas na França, já na segunda metade do século XVIII, que é possível afirmar</p><p>que tenha surgido a primeira escola de Economia, os Fisiocratas.</p><p>18</p><p>Unidade: Introdução ao estudo da história do pensamento econômico</p><p>Os Fisiocratas</p><p>A escola Fisiocrata, ou a fisiocracia (fisio = natureza, cracia = governo), é considerada a</p><p>primeira escola de Economia. Os fisiocratas eram um grupo de reformadores sociais franceses,</p><p>discípulos intelectuais de François Quesnay (1694-1774).</p><p>O principal interesse desses pensadores era a reforma da França, que estava passando</p><p>por desordens econômicas e sociais, que culminariam, em 1789, com a Revolução Francesa</p><p>(HUNT, 1981).</p><p>Neste contexto, a pedido do então Rei da França, Luís XV, François Quesnay, em 1758,</p><p>elaborou um modelo econômico que representava o funcionamento da economia francesa. Tal</p><p>obra, denominada Tableau Économique (algo como “Tabela Econômica”, em uma tradução</p><p>livre do francês), constituiu-se a principal obra segundo a qual orbitava o pensamento fisiocrata.</p><p>Os fisiocratas achavam que as sociedades eram governadas por uma “lei natural” e que os</p><p>problemas da França eram devidos à incapacidade de seus dirigentes compreenderem esta lei</p><p>natural, não ordenando, assim, a produção e o comércio de acordo com ela.</p><p>Na visão dos fisiocratas, a lei natural controlaria o comportamento econômico e seria guiada</p><p>principalmente pelas atividades agrárias.</p><p>Você sabia?</p><p>A ideia de lei natural advém do pensamento fisiocrata de</p><p>que a sociedade seria semelhante a um organismo humano,</p><p>sendo que a circulação de riqueza e bens na economia era</p><p>como a circulação do sangue no corpo. Ambos estavam</p><p>de acordo com a ordem natural e ambos poderiam ser</p><p>compreendidos por meio de uma análise cuidadosa.</p><p>Os fisiocratas achavam que só por meio do contato direto com a natureza, na produção</p><p>extrativa ou agrícola, é que o trabalho humano poderia produzir algum tipo de excedente.</p><p>Os agricultores, portanto, seriam a classe produtiva, enquanto os produtores de</p><p>mercadorias industrializadas seriam chamados de classe estéril, pois o valor do que produziam</p><p>era, invariavelmente, igual aos custos necessários de matérias-primas mais os “salários” de</p><p>subsistência dos produtores (HUNT, 1981).</p><p>Os fisiocratas tinham em mente a ideia que da atividade industrial não poderia gerar qualquer</p><p>excedente ou lucro.</p><p>Em linha com as ideias relacionadas ao individualismo, a fisiocracia defendia, ainda, a</p><p>reforma política do sistema da época, a abolição das corporações de ofício e a remoção de</p><p>todas as tarifas, impostos, subsídios, restrições e regulamentações existentes que prejudicassem</p><p>a indústria e o comércio.</p><p>19</p><p>Você sabia?</p><p>A proposta de reforma mais notória e polêmica dos fisiocratas,</p><p>entretanto, foi a proposição de que toda a renda do Governo</p><p>fosse obtida por meio de um único imposto, para todo o país,</p><p>apenas sobre as atividades agrícolas.</p><p>Embora o conteúdo dos escritos fisiocratas seja vasto, sua influência como um todo se deu</p><p>muito mais no âmbito intelectual do que na política de fato. Algumas das ideias expressas</p><p>no Tableau Économique de Quesnay seriam, depois, muito importantes para a literatura</p><p>econômica, entre as quais merecem destaque:</p><p>1 - A noção de trabalho produtivo e improdutivo e de excedente econômico;</p><p>2 - A interdependência mútua dos processos de produção;</p><p>3 - Os fluxos circulares da moeda e das mercadorias e as crises econômicas que podem ser</p><p>causadas pelo entesouramento do dinheiro.</p><p>Embora possa ser visto como curiosidade literária, o Tableau constituiu-se na mais profunda</p><p>e ousada obra do pensamento econômico até então apresentada. Assim, os fisiocratas</p><p>destacam-se em um seleto grupo de economistas anteriores a Adam Smith que apresentaram</p><p>análises bem elaboradas dos processos econômicos do Capitalismo, em uma época na qual a</p><p>sociedade ainda dividia traços do Feudalismo e do Capitalismo.</p><p>Situação diversa dos próximos autores estudados, visto que, em fins do século XVIII, as</p><p>características mais gerais do Capitalismo já se tinham tornado</p><p>muito mais visíveis.</p><p>20</p><p>Unidade: Introdução ao estudo da história do pensamento econômico</p><p>Material Complementar</p><p>Para complementar os conhecimentos adquiridos nesta Unidade, leia as seguintes obras:</p><p>Livros:</p><p>História do pensamento econômico – (Introdução e capítulo 2), de Emery Kay Hunt,</p><p>é o principal manual utilizado nas universidades brasileiras para aprendizagem de HPE;</p><p>A transição do feudalismo para o capitalismo: um debate. Este livro é composto</p><p>de textos de diversos historiadores famosos e seus pontos de vista a respeito da transição</p><p>do feudalismo para o capitalismo. Em especial, recomendamos a leitura do texto de Eric</p><p>Hobsbawm, entre as páginas 201 e 209.</p><p>Ambos enriquecerão sua compreensão sobre os assuntos tratados nesta Unidade.</p><p>21</p><p>Referências</p><p>DOBB, M. H. A Evolução do Capitalismo. São Paulo: Nova Cultural, 1987.</p><p>HUNT, E. K. História do Pensamento Econômico. 7.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 1981.</p><p>HUNT, E. K; SHERMAN, H. J. História do Pensamento Econômico. Petrópolis:</p><p>Vozes, 2001.</p><p>SWEEZY, P. M. et al. A transição do feudalismo para o capitalismo. 4.ed. Rio de</p><p>Janeiro: Paz e Terra, 1989.</p><p>22</p><p>Unidade: Introdução ao estudo da história do pensamento econômico</p><p>Anotações</p>

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