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<p>XVII - QUÍMICA DOS SOLOS ÁCIDOS Antônio Carlos Vargas & Vander de Freitas 1/ Departamento de Solos e Engenharia Agrícola, Universidade Federal do Paraná. Rua dos Funcionários, 1.540, 80035-050, Curitiba (PR). mottaacv@ufpr.br; vanderfm@ufpr.br Conteúdo INTRODUÇÃO 313 COMPONENTES DA ACIDEZ (H e 315 Sistemas Puros 316 Sistemas Mistos: Variações Conforme Intemperismo e a Profundidade do Solo 328 DETERMINAÇÃO DA ACIDEZ DO SOLO 329 Acidez Ativa 329 Acidez Potencial ou Poder-Tampão do Solo 333 RELAÇÃO ENTRE INTEMPERISMO, MINERALOGIA E ACIDEZ DO SOLO 357 AGRADECIMENTOS 371 LITERATURA CITADA 371 INTRODUÇÃO Por estar situado na região tropical e subtropical, Brasil possui extensa área de solos ácidos, não adequados para O estabelecimento de culturas comerciais. Os vários tipos de vegetação naturais, como campos nativos, cerrados e florestas tropicais e subtropicais, sofreram longo processo de adaptação, ocasião em que acúmulo de resíduos orgânicos e as ciclagens de nutrientes permitiram crescimento das plantas em ritmo compatível com a acidez elevada dos solos. O cultivo itinerante nesses ambientes pelos indígenas brasileiros, com produtividade limitada, ocorreu graças à queimada da vegetação nativa e plantio por curto período utilizando nutrientes disponibilizados nas cinzas, com seu efeito alcalinizante, e a reserva acumulada no solo durante O período de pousio. Nestes dois contextos, a acidez do solo tem papel secundário. A introdução de plantas exóticas, muitas das quais sensíveis à acidez, ou mesmo O cultivo de espécies nativas por longo período na mesma área, vem ocorrendo desde O início SBCS, 2009. Química e Mineralogia do Solo, Parte II, 685p. (eds. Vander de Freitas Melo e Luís Reynaldo Alleoni).</p><p>314 ANTÔNIO CARLOS VARGAS MOTTA & VANDER DE FREITAS MELO da colonização brasileira, potencializando a influência negativa da acidez no crescimento e desenvolvimento das culturas. Mais recentemente, os cultivares tradicionais foram trocados por outros selecionados geneticamente para atender à demanda de produtividade e qualidade. Por diversas a opção mais comum no plantio comercial foi selecionar plantas de crescimento rápido e alta produtividade em condições adequadas de fertilidade e de baixa acidez com a aplicação de adubos e corretivos. Todavia, algumas culturas mantiveram resistência à acidez, mesmo após a seleção para os fins desejados, destacando-se a cana-de-acúcar (Rossetto et al., 2004), alguns cultivares de pastagem (Luz et al., 2000), mandioca e erva-mate (Reissmann et al., 1997; Reissmann & Carneiro, 2004). Mesmo sob condição de elevada acidez, tais culturas, geralmente, não respondem ao uso de corretivo ou exigem pequenas doses, principalmente quando existem quantidades mínimas de nutrientes para crescimento das plantas (Macedo et al., 1979; Gatiboni et al., 2000). A importância dos estudos da acidez não se limita apenas aos solos naturalmente ácidos, mas também acidificados por ação Como exemplo, tem-se efeito da poluição atmosférica causando chuva ácida em áreas de floresta na Europa (Alewell, 2003). A acidificação de solos neutros ou próximos à neutralidade com cultivo é amplamente discutida por Edmeades & Ridley (2003), Bolan & Hedley (2003) e Tang & Rengel (2003). A intensificação de uso de adubos nitrogenados na forma de amônio ou amida acelera processo de acidificação (Price et al., 1941). Sanchez & Logan (1992) indicaram que 1/3 dos solos tropicais apresentavam problemas com acidez, com elevada saturação por (m > Do total de 518 amostras representativas das áreas de Cerrado do Brasil, Lopes (1984) observou que apresentaram acidez elevada (pH</p><p>XVII Química dos Solos Ácidos 315 grandes generalizações normalmente empregadas a solos tropicais, do tipo: "os solos altamente intemperizados são muito ácidos", "elevação da saturação por bases a um valor preestabelecido sem considerar a mineralogia da argila", etc. COMPONENTES DA ACIDEZ (H e O primeiro passo é entender a contribuição dos componentes do solo que atuam na acidez do solo: silicatos cristalinos e amorfos, óxidos cristalinos e amorfos e matéria orgânica. Dada a natureza multifásica do solo, é necessário estudar a ação de dois ou mais desses componentes; nos horizontes subsuperficiais, a interação mais significativa é dos componentes minerais, enquanto, no horizonte A, a matéria orgânica é de primordial importância. Para detalhamento das características estruturais, físico-químicas e da ocorrência dos principais componentes da fração coloidal dos solos, recomenda-se a leitura de capítulos específicos deste livro: minerais silicatados 2:1 veja capítulo minerais silicatados 1:1 veja capítulo VII; óxidos de Fe veja capítulo VIII; óxidos de Al veja capítulo IX; matéria orgânica veja capítulo XI. A utilização de diferentes métodos na determinação de propriedades da acidez dificulta a interpretação e a comparação dos resultados entre trabalhos científicos. Contudo, levantamentos de solos realizados nas mais diversas regiões brasileiras foram iniciados na década de 70 e perduraram por mais de duas décadas, acumulando grande volume de informações sobre propriedades químicas, físicas e mineralógicas dos solos. As análises de solos foram realizadas de modo centralizado, no laboratório do Serviço Nacional de Levantamento e Classificação de Solos da Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa), no Rio de Janeiro, com método único, qual tem sido empregado até hoje na maioria dos trabalhos científicos da área de pedologia. Foram avaliados propriedades da acidez, bases trocáveis, teor de matéria orgânica e granulometria, além dos índices Ki (1,7 e Kr [1,7 X + (0,64 associados ao grau de intemperismo do solo. Três componentes da acidez são apresentados nos manuais de levantamento de solos da EMBRAPA: pH em H,O, e (H + O pH em (relação solo/água 1:2,5) representa a atividade de H+ em solução em equilíbrio com a fase sólida do solo; O adsorvido é deslocado do complexo sortivo com K+ (solução extratora KCI 1 mol e determinado pela hidrólise do quando da elevação do pH da solução por titulação com solução de NaOH; O (H + é obtido pela soma da quantidade de H+ na solução mais aquele dissociado dos grupos -OH da superfície de minerais e da fração húmica e pela hidrólise do pela elevação do pH até 7,0, em solução tamponada de acetato de Ca 0,5 mol (Vettori, 1969). Esse banco de dados dos levantamentos de solos de vários Estados do Brasil foi a base para estabelecer as relações entre os componentes da acidez, O grau de intemperismo e a mineralogia da fração argila, como se verifica a seguir. E MINERALOGIA DO SOLO</p><p>316 ANTÔNIO VARGAS MOTTA & VANDER DE FREITAS MELO Sistemas Puros Silicatos As argilas silicatadas cristalinas podem ser divididas em minerais de baixa e alta atividade [limite estabelecido pela CTC da argila a pH 7,0 (sem correção de carbono orgânico) 270 Embrapa, 2006], de acordo com a capacidade de troca de cátions (CTC). Em geral, somatório de três a cinco tipos de argilas mais abundantes no solo representam mais de 90 % da massa total dessa fração (Peixoto, 1995), tendo como mineral mais abundante, nas mais diversas condições, os de baixa atividade, geralmente caulinita (Curi & Franzmeier, 1984; Juo, 1985; Singh & Gilkes, 1992; Melo et al., 2001a). A ocorrência de argilas silicatadas de alta atividade em solos ácidos é limitada pela baixa estabilidade desses minerais. Porém, muito mais comum é a coexistência de minerais 2:1 com entrecamadas (2:1 HE) com caulinita e gibbsita (veja capítulo VI). A baixa estabilidade das argilas de alta atividade em ambiente ácido foi amplamente discutida por Thomas & Hargrove (1984). Os minerais 2:1, quando incubados em ambiente muito ácido, com os pontos de troca artificialmente saturados com H+, sofrem rápida solubilização parcial e liberação de das lâminas octaédricas, que, além de saturar complexo sortivo com elemento, pode dar origem aos 2:1 HE (Thomas & Hargrove, 1984). Turner & Brydon (1967) indicaram que a bentonita (material sedimentar rico em montmorilonita, formado a partir do acúmulo e alteração de materiais vulcânicos) apresentou alta capacidade de adsorção de e que a formação da gibbsita ocorreu quando teor deste elemento atingiu níveis superiores a CTC dos minerais 2:1. Porém, menores teores de são necessários para a formação de gibbsita em sistemas com ilita e caulinita (Turner & Brydon, 1967). Colemam et al. (1964) constataram grande decréscimo na CTC efetiva de minerais 2:1, determinada por sorção de MgCl, e deslocamento por mediante a adição de Al e Fe à bentonita, especialmente em baixo pH. Contudo, após titulação com base, os valores de CTC foram restabelecidos, graças ao tamponamento e dissolução das ilhas de hidróxi entrecamadas. Maior força de adsorção de pela vermiculita em relação à montmorilonita foi demonstrada por Juo & Kamprath (1979), que pode favorecer a formação do 2:1 HE. Dessa forma, minerais silicatados de alta atividade podem liberar quantidade elevadas de Al ao solo em ambientes ácidos pelo intemperismo, bem como tamponar esse elemento por processos de adsorção e, ou, formação de entrecamadas. Teores de trocável superiores a 500 mmol de mineral 2:1 puro foram obtidos em condição de laboratório, mediante acidificação do meio (McLean et al., 1958; Lin & Coleman, 1960; Frink & Peech, 1963; Turner & Brydon, 1966, 1967; Juo & Kamprat, 1979). Os componentes. da acidez dos minerais 2:1 estão relacionados com as cargas permanentes e dependentes de pH. As dependentes de pH ocorrem em menor número, representando cerca de 5 a do total das cargas, formadas pelos radicais QUÍMICA E MINERALOGIA DO SOLO</p><p>XVII Química dos Solos Ácidos 317 (-SiOH) e aluminol (-A1OH) nas arestas do mineral. Os radicais -SiOH dissociam em pH muito baixo, em decorrência do forte caráter ácido; O PCZ está em torno de 2,0 (veja capítulo XII). Logo, radical silanol tem pouca possibilidade de atuar na acidez do solo, pois, acima de pH 2,0 (quase totalidade dos solos), a hidroxila desse grupo já estará dissociada (Bolland et al., 1976). Assim, apenas os radicais das arestas dos minerais silicatados poderiam atuar na acidez do solo (PCZ em torno de 7 a 8). Alguns solos brasileiros com ocorrência de minerais 2:1, principalmente na região sul, apresentam teores elevados de (extraído por KCI 1 mol L-1). Almeida et al. (1999) encontraram teores de médios de 42 mmol kg-1, com variações de 11 a 99 mmol para 48 amostras da camada superficial de solos com elevado poder tampão da Região Sul. Como as amostras foram tomadas na camada superficial, não se pode afirmar que tais teores de estejam predominantemente associados aos minerais 2:1, dada a presença da matéria orgânica. A seleção de perfis de solos com argila de alta atividade, definida como valor 270 do levantamento de solos de diferentes regiões do Brasil e os dados apresentados por Lima et al. (2006) mostram também valores elevados de (máximo de para os horizontes subsuperficiais, onde a influência da matéria orgânica é baixa (Quadro 1). Além da atividade da fração argila, valores elevados de CTC a pH 7 e de Ki indicam a ocorrência de minerais 2:1. Os teores do nas camadas mais profundas são muito superiores aos teores de H extraído com acetato de Ca pH 7,0 (relação / H Quadro 1). A CTC efetiva encontra-se próxima a CTC pH nos horizontes subsuperficiais, confirmando pequeno número de cargas dependentes de pH (entre pH do solo e Logo, principal componente da acidez deste tipo de argila é adsorvido às cargas permanentes ou dependentes de pH, principalmente aquelas de caráter ácido forte (grupo silanol). Considerando a baixa estabilidade de argilas de alta atividade, é provável que os elevados teores de estejam associados à liberação do elemento pelo intemperismo parcial das lâminas octaédricas (mineral 2:1 Vale lembrar que, mesmos nos solos apresentados no quadro 1, a caulinita é mineral predominante, mas a existência de pequena proporção de mineral 2:1 pode garantir sua maior participação na geração de cargas e na acidez. Isto porque, na maioria dos casos, a CTC máxima da caulinita situa-se entre 25 e 100 enquanto a dos minerais 2:1 ultrapassa facilmente 800 mmol Lin & Coleman (1960) também constataram teores elevados de extraídos com mol (maiores que 200 mmol próximos aos valores da CTC efetiva + Mg2+ + em solos com minerais 2:1. Melo et al. (2009) estudaram a mineralogia da fração argila de dois perfis de solos formados de argilito na Bacia Sedimentar de Curitiba até à profundidade de 4,5 m e identificaram 2:1 HE nos horizontes superiores (A, B e C1) e esmectita nos horizontes C2, C3 e C4. Com testes específicos (saturação com Li), os autores determinaram que a estrutura básica 2:1 era constituída de montmorilonita e beidelita, ambas esmectitas dioctaedrais. Os perfis analisados por Melo et al. (2009) pertencem a mesma unidade pedológica, com mesmo material de origem, do perfil 72 (Quadro 1), reforçando a hipótese da participação de minerais 2:1 na acidez do solo. QUÍMICA E MINERALOGIA DO SOLO</p><p>Quadro 1. Resultados de análises químicas de solos com argila de alta atividade em horizontes subsuperficiais com valor T igual ou superior a 270 mmol solos ácidos selecionados dos manuais de levantamento de solos do Brasil e dados de trabalho CTC CTC pH efetiva pH 7,0 Argila T Ki Kr CO Horizonte H2O g g kg-1 Rubrozem - Perfil 72 (Curitiba PR) (Embrapa, 1984b) A1 4,9 3,8 66 95 215 560 2,12 1,73 0,6 23,9 A3 4,9 3,8 70 80 195 570 2,05 1,63 0,6 20,0 B1t 4,9 3,8 81 91 154 620 2,08 1,66 1,3 10,6 B2t 5,0 3,8 103 111 155 640 2,38 1,91 2,3 5,6 C 5,0 3,6 142 247 286 740 386 2,82 2,25 3,6 1,1 Podzólico Bruno Avermelhado laterítico - Perfil 154 (Carlos Barbosa - RS) (Embrapa, 1973) A11 4,9 3,9 14 76 124 300 2,92 1,73 0,3 12,3 A12 5,3 4,2 8 91 124 410 2,44 1,61 0,2 7,0 B2 4,7 3,8 87 127 170 600 283 2,04 1,53 2,0 6,1 C 4,4 3,8 172 193 220 300 733 2,32 1,73 6,4 2,4 Podzólico Vermelho-Amarelo plintico - Perfil 4 - PA) (Embrapa, 1984a) A 4,7 4,0 12 16 40 170 2,21 1,62 0,7 8,2 Bit 4,8 3,7 77 99 136 500 272 2,27 2,12 2,7 7,2 II B21tp1 4,9 3,6 112 129 161 650 2,50 1,92 4,0 4,3 II B22tp1 5,0 3,6 159 169 182 680 270 2,69 2,16 13,0 3,2 Podzólico Vermelho Amarelo plíntico - amostra extra 16 (Boa Vista - RR) (Embrapa, 1982) A 4,6 3,9 13 33 69 120 3,2 2,3 0,4 10,2 Bit 5,0 4,0 26 39 64 140 458 3,0 2,3 1,0 5,2 II B21t 4,9 3,8 43 54 71 160 444 2,9 2,2 2,5 3,7 II B22tp1 5,0 3,5 213 246 284 310 916 3,1 2,4 5,9 3,5 Plintossolo Argilúvico alumínico abrúptico - (Benjamin Constant - AM) (Lima et al., 2006) A 4,9 4,0 12 30 84 180 nd nd 0,2 21,0 Bt 5,0 3,5 114 124 160 520 300 nd nd 3,3 nd C 5,1 3,5 173 185 222 nd nd nd nd 4,7 2,0 (1) T (atividade da fração argila) = [CTC pH 7,0 / teor de argila (g kg-1)] X 1000 (Embrapa, 2006); Ki = 1,7 X (g (g kg-1); Kr = 1,7 X (g (g + (0,64 X (g Teores de Si, Al e Fe obtidos após extração com ácido sulfúrico concentrado; CO - carbono orgânico.</p><p>XVII Química dos Solos Ácidos 319 Os elevados teores de (Quadro 1) não podem ser diretamente relacionados com a presença de 2:1 HE. A participação do na forma de hidróxi entrecamadas tamponamento do solo é uma incerteza, considerando os diferentes graus de solubilidade no e de preenchimento das entrecamadas (Kirkland & Hajek, 1972). Uma estrutura em anel com seis membros, tem sido proposta para O material entrecamadas nestes minerais (Hsu & Rich, 1960). O aumento da liberação de K de minerais 2:1 HE, determinado por eletroultrafiltragem, após a calagem em solos do sul do Brasil, indica que pelo menos parte deste Al poderá ser liberada em curto prazo com a elevação do pH (Nemeth, 1982). Mas, como será visto a seguir, a extração por KCI 1 L-i tem baixo poder de troca, envolvendo a liberação apenas do retido com baixo grau de energia. A presença de pode dar estabilidade aos minerais 2:1, termodinamicamente instáveis nas condições do meio. Em condições ácidas, a formação desses polímeros estabiliza minerais 2:1, que estariam instáveis em relação à caulinita (Barnhisel & Bertsch, 1989). Nos sistemas naturais, caulinita, gibbsita e 2:1 HE são encontrados juntos na fração argila de solos (Harris et al., 1988). A estabilidade do 2:1 HE será maior ou menor que a caulinita, dependendo do grau de ocupação pelos polímeros de Diferentemente dos minerais 2:1, a caulinita é virtualmente ausente em cargas estruturais. As cargas são formadas principalmente nos radicais silanol e aluminol. A hidratação da superfície da caulinita pode levar à formação de diferentes espécies, tais como, grupos na superfície da lâmina gibbsítica terminal (superfície grupos Al-OH (grupos aluminol) nas bordas quebradas das lâminas octaédricas e Si-OH (grupo silanol) na borda quebrada da lâmina tetraédrica terminal (superfície grupos siloxana). Shoval et al. (1999) observaram, por técnicas de infravermelho, quatro tipos de hidroxilas superficiais na caulinita. Graças a baixa acidez do grupo aluminol (PCZ entre 7 e 8), a OH ligada ao Al na coordenação octaédrica torna-se fonte potencial de H dos solos. (acidez potencial não trocável) até valores altos de pH (7 a 8), O que compreende à maioria Três diferenças básicas podem ser destacadas na estrutura das argilas 1:1 (caulinita) em relação às argilas 2:1: i) a proporção de cargas formadas por substituição isomórfica é praticamente nula; ii) a maioria das cargas é formada por desprotonação do H, ou seja, dependente do pH; iii) grupo aluminol, por ter menor caráter ácido que O grupo silanol da e proporcionalmente por estar em maior número nos minerais 1:1, atua no tamponamento acidez do solo a maiores valores de pH. Assim, diferentemente dos solos com ocorrência de argila de alta atividade, os valores da CTC efetiva apresentam-se muito inferiores valores da CTC a pH 7,0 para solos cauliníticos e sem a ocorrência de 2:1 (Quadro aos 2). Como O teor de depende da CTC efetiva, mesmo com m% (m = CTC efetiva) igual a O teor de nas camadas inferiores do solo (menor influência matéria orgânica) é, geralmente, inferior ao teor de H não-trocável ou covalente, da determina baixa relação No horizonte B dos solos do quadro 2, a atividade que da fração argila (valor T) oscila de 32 a 115 compatível com a CTC da caulinita. Como conclusão, ao contrário dos solos ácidos com argila 2:1, onde é principal componente da acidez, os solos cauliníticos ácidos têm como componente principal H das cargas dependentes de pH. QUÍMICA E MINERALOGIA DO SOLO</p><p>Quadro 2. Resultados de análises químicas de solos com argila de baixa atividade em horizontes subsuperficiais com valor T menor que 270 mmol solos ácidos selecionados dos manuais de levantamentos de solo do Brasil e dados de trabalhos científicos pH CTC CTC efetiva pH 7,0 Argila T Ki Kr CO Horizonte H2O KCI g g Latossolo Vermelho Amarelo distrófico - Perfil 10 (Linhares - ES) (Embrapa, 1978) A1 3,8 3,2 9 20 71 110 2,1 1,80 0,2 15,4 B1 4,3 3,8 13 20 42 450 93 1,93 1,69 0,6 5,1 B21 4,6 3,8 7 18 38 480 79 1,93 1,69 0,4 4,0 B23 4,6 3,9 6 12 26 450 58 1,91 1,67 0,4 2,6 Latossolo Vermelho Amarelo distrófico - Perfil 85 (Nova Venécia - ES) (Embrapa, 1978) A1 5,0 3,9 7 31 88 310 1,98 1,72 0,1 15,0 B1 4,5 3,9 16 20 63 550 115 1,84 1,66 0,4 6,0 B22 5,0 4,1 7 14 33 570 58 1,85 1,66 0,4 3,6 B32 5,1 4,3 3 10 28 500 56 1,93 1,73 0,2 2,8 Argissolo Amarelo distrófico latossólico (Eunápolis e Itagimirim - BA) (Moreau et al., 2006) A 4,8 3,7 5 35 71 260 2,03 1,89 0,1 19,0 AB 4,5 3,5 6 16 47 290 2,00 1,84 0,2 1,0 BA 4,3 3,6 10 14 33 430 1,97 1,81 0,5 6,0 4,3 3,7 9 10 29 470 59 1,80 1,66 0,5 5,0 Bt2 4,2 3,8 9 9 20 490 41 1,73 1,59 0,8 3,0 Bw 4,4 3,9 8 9 17 520 32 1,77 1,63 1,0 2,0 Latossolo Amarelo distrófico (Apiaú - RR) (Melo et al., 2006) A1 4,3 3,6 5 17 120 380 1,44 nd 0,0 28,8 AB 4,2 3,8 5 9 69 400 0,98 nd 0,1 16,4 BA 5,9 3,9 5 7 54 410 1,11 nd 0,1 13,5 Bw1 4,7 3,9 5 6 46 460 100 1,52 nd 0,1 10,1 Bw2 5,5 4,1 3 4 36 510 71 1,54 nd 0,1 8,2</p><p>XVII Química dos Solos Acidos 321 Óxidos A ocorrência de grandes teores de óxidos de Fe a de Al na fração argila geralmente está relacionada com ambientes de elevado grau de intemperismo, ou seja, em solos oxídicos. Além disso, os óxidos de Fe e Al podem recobrir parte das argilas silicatadas, potencializando efeito desses óxidos sobre as características dos solos. Os principais componentes ácidos dos óxidos são os grupos OH das superfícies dos minerais: M-OH, sendo M um metal, que, em geral, é representado por Al (gibbsita) ou Fe (hematita e goethita). Parfitt (1978) destaca que os grupos OH dos óxidos podem apresentar uma (M-OH), duas (M,-OH) e, ou, três coordenações com O metal. O mesmo autor indica que a coordenação M-OH é a mais comum e ativa. Diferentemente das argilas silicatadas, os óxidos não têm grupos OH ligados a elementos tetravalentes grupos de caráter ácido forte. O comportamento ácido muito fraco pode ser comprovado pelo alto valor de PCZ dos principais óxidos de Fe e Al dos solos: gibbsita entre 7 e 8 e goethita e hematita entre 8 e 9. O grupo ferrol (-FeOH) apresenta menor caráter ácido (veja capítulo XII). Em virtude do elevado PCZ, esses minerais são importantes na dinâmica da acidez potencial dos solos (H não-trocável), uma vez que, na faixa normal de pH dos solos brasileiros (3,5 a 6,5), os grupos de superfície estarão, predominantemente, protonados (pH CTC) das amostras, com base nas seguintes propriedades: CTC efetiva 5,0 ou A pH (pH em KCI positivo ou nulo. Os elevados valores de PCZ dos óxidos de de Fe e Al foram responsáveis pelos baixos valores de atividade da fração argila dos horizontes subsuperficiais (valor T Quadro 3). Sanchez & Logan (1992) estimaram que os solos com CTC efetiva muito reduzida perfazem apenas dos solos tropicais, representados pelos solos arenosos e grupo dos solos ácricos. Além do baixo valor de CTC efetiva, as camadas inferiores apresentaram pH relativamente elevado e ausência de (Quadro 3). Os prováveis motivos são discutidos nas próximas seções. Por isso, os solos altamente intemperizados são, em sua maioria, distróficos, e as relações H são baixas ou nulas. Assim, principal componente da acidez em solos com elevados graus de intemperismo são os grupos aluminol e ferrol (H não-trocável). Em suma, a importância do em relação ao -OH (liberação de H) na acidez dos solos decresce com aumento do grau de intemperismo, sendo maior em solo com argila 2:1 (esmectitíticos) do que 1:1 (cauliníticos) e esta, por sua vez, maior que solos com predomínio de óxidos de Fe e (oxídicos e ácricos). Nos solos oxídicos O principal limitante ao crescimento de raízes no horizonte B pode não ser O mas, sim, baixo teor de normalmente menor que 5 considerado, por muitos pesquisadores, limite superior para surgimento de carência nutricional. QUÍMICA E MINERALOGIA DO SOLO</p><p>Quadro 3. Análises químicas de solos com argila de baixa atividade em horizontes subsuperficiais com valor T menor que 270 mmol kg-1 solos oxídicos e ácidos selecionados dos manuais de levantamentos de solo do Brasil pH CTC CTC efetiva pH 7,0 Argila T Ki Kr CO Horizonte H2O KCI g kg-1 g kg-1 Latossolo Vermelho-Escuro distrófico - Perfil 10 (Pires do - (Embrapa, 1983) A1 5,2 4,4 4 11 60 600 0,62 0,43 0,1 15,7 B1 5,0 5,0 0 3 20 640 31 0,64 0,45 0,0 7,0 B21 5,0 5,7 0 2 14 630 22 0,62 0,43 0,0 4,8 B22 5,1 5,9 0 3 12 650 18 0,62 0,43 0,0 3,3 Latossolo Vermelho-Escuro distrófico - Perfil 2 (Formosa - GO) (Embrapa, 1983) A1 5,2 4,3 5 8 84 720 0,59 0,46 0,1 21,9 B1 5,4 4,7 1 3 55 770 71 0,55 0,43 0,0 14,0 B21 5,5 5,0 0 1 45 770 58 0,56 0,44 0,0 10,5 B23 6,2 6,2 0 1 9 810 11 0,47 0,37 0,0 5,7 Latossolo Bruno distrófico - Perfil 36 (Guarapuava - PR) (Embrapa, 1984b) A21 4,7 4,0 18 36 167 740 0,85 0,61 0,1 31,1 A33 4,5 4,1 11 18 106 750 0,77 0,56 0,1 16,7 B1 4,7 4,5 3 9 83 750 111 0,73 0,54 0,0 14,2 B22 4,8 5,4 0 4 35 760 46 0,88 0,63 0,0 3,6 B3 4,6 5,5 0 5 34 730 47 0,77 0,55 0,0 3,1 Latossolo Roxo distrófico - Perfil 21 (Canápolis - MG) (Embrapa, 1982b) A1 6,2 5,6 0 105 184 520 0,73 0,46 0,0 35,9 A3 5,8 4,9 2 35 120 590 0,78 0,50 0,0 21,6 B1 6,0 5,2 0 21 80 630 126 0,79 0,47 0,0 13,9 B22 6,6 6,2 0 5 22 730 30 0,71 0,47 0,0 5,9 B23 6,7 6,3 0 4 17 620 27 0,83 0,46 0,0 3,9 Latossolo Distrófico cambissólico - Perfil 63 (Divino de São Lourenço - ES) (Embrapa, 1978) A1 4,8 4,2 12 20 133 290 0,42 0,32 0,1 27,6 B21 5,2 4,8 2 5 63 400 157 0,38 0,28 0,0 12,2 B22 5,3 5,1 1 4 44 360 122 0,31 0,24 0,0 8,8 B3 5,4 5,4 0 3 24 270 89 0,24 0,19 0,0 4,9 C 5,6 5,8 0 3 18 200 90 0,18 0,15 0,0 2,9</p><p>XVII Química dos Solos Ácidos 323 Aluminossilicatos Amorfos (Alofanas e Imogolitas) Solos com predomínio de silicatos de Al amorfos, principalmente alofana e imogolita, são raros no Brasil. Todavia, regiões de origem vulcânica recente podem representar parcelas significativas de Andossolos (do japonês "Ando" = escuro) (FAO, 2006). Esses aluminossilicatos amorfos apresentam morfologia e composição química muito variável. Normalmente, adota-se a seguinte nomenclatura (Dahlgreen, 1994): imogolita morfologia tubular e alta relação molar Al/Si (2:1); Al-alofana composição similar a imogolita, mas com morfologia diferente; Si-alofana material com menor relação Al/Si (1:1). Simas et al. (2006) obtiveram amplitude maior que os valores sugeridos por Dahlgreen (1994) na relação molar Al/Si (0,9 a 5,3) em minerais aluminossilicatos amorfos (alofanas e imogolitas) da fração argila de Criossolos da Ilha do Rei George, Antártica. Os sítios apresentaram altos teores desses minerais (máximo de 517 g de argila). Dada a baixa cristalinidade, os aluminossilicatos amorfos apresentam elevada área superficial específica (ASE), com exposição de grande número de sítios reativos (Theng et al., 1982; Wada, 1989) e com diferentes níveis de acidez (aluminol e silanol Figura 1). De forma similar aos óxidos de Fe e Al, as cargas da alofana e imogolita são exclusivamente dependentes de pH, O que confere ao horizonte B dos Andossolos grande diferença entre os valores de CTC efetiva e CTC pH 7,0 (Quadro 4 4). Contudo, diferentementemente dos óxidos de Fe e de Al cristalinos, as alofanas e as imogolitas apresentam elevada CTC, nos mesmos níveis dos minerais 2:1, graças à elevada ASE e presença de grupos silanol (baixo PCZ) (observar os valores de atividade da fração argila (T) do quadro 4). Os aluminossilicatos amorfos podem ser eficientes na manutenção dos dois componentes da acidez do solo: liberação de Al da estrutura, facilitada pela baixa cristalinidade, e de H (acidez potencial das hidroxilas de superfície, principalmente ligadas ao Al (grupo aluminol). Em Criossolos da Antártica, ricos em alofanas e imogolitas, Simas et al. (2007) obtiveram teores altos de (H + com valor máximo de 434 mmol = 104 mmol kg-1). Mesmo com altos teores de a acidez potencial não trocável dos Andossolos é mais expressiva (baixa relação (Quadro 4), graças à grande ocorrência de radicais Os grupos OH de superfície podem ser deslocados com solução de NaF 0,85 mol e determinados por titulação (Perrott et al., 1976), visto que O F- é reconhecidamente retido com maior energia que os radicais O uso de tal técnica permitiu que Perrott et al. (1976) encontrassem teores de OH, na ordem de 12.080 mmol kg-1, para imogolita, e de 10.750 e 19.000 mmol para duas amostras de alofanas. Estes teores de OH são muito superiores aos observados para minerais comumente encontrados no solo, como montmorilonita (220 mmol ilita (170 mmol caulinita (120 mmol kg-1), gibbsita goethita (90 mmol kg-1) e hematita (140 mmol Perrott et al. (1976) verificaram, ainda, que a quantidade de OH liberada estava diretamente relacionada com teor total de dos solos, evidenciando a importância dos nas reações. QUÍMICA E MINERALOGIA DO SOLO</p><p>324 ANTÔNIO VARGAS MOTTA & VANDER DE FREITAS MELO (a) (b) OH Si Al Figura 1. Estrutura e radicais das alofanas e imogolitas, ricas em Si (a) ou em Al (b). Observar a grande exposição de grupos OH. Fonte: adaptada de Okada et al. (1975). Quadro 4. Análises químicas de solos ácidos com ocorrência de minerais aluminossilicatados amorfos (alofana e imogolita) pH CTC CTC Argila T CO Horizontes H2O efetiva pH 7,0 kg-1 Andossolo (Shoji & Ono, 1978) A11 4,4 47 92 254 364 0,3 107 A12 4,3 42 58 208 336 0,3 90 A13 4,6 39 50 194 254 0,3 70 IIBb 4,8 68 91 145 336 432 1,3 5 IICb 5,1 32 49 153 238 643 0,3 nd Andossolo (Shoji & Ono, 1978) A11 4,9 45 59 214 341 0,3 55 A12 5,2 35 44 214 327 0,2 50 A13 5,3 40 49 231 407 0,2 46 IIB1b 5,5 58 99 165 518 318 0,9 11 IIB3b 5,5 53 107 170 558 305 0,9 8 Andossolo (Shoji & Ono, 1978) A11 5,0 28 56 221 377 0,2 56 A12 5,1 23 39 192 392 0,2 32 IIB1b 5,5 35 83 170 546 311 0,4 11 IIB3b 5,5 37 86 172 555 309 0,4 6 Andossolo (Igue & Fuentes, 1972) A1 5,4 37 54 524 370 0,1 90 B2 5,4 9 29 416 570 729 0,0 53 Vitrandept (Igue & Fuentes, 1972) A1 4,8 63 95 320 740 0,3 126 B12 5,3 51 66 215 342 628 0,3 102 QUÍMICA E MINERALOGIA DO SOLO</p><p>XVII Química dos Solos Ácidos 325 A elevada quantidade de grupos OH é utilizada para estabelecer propriedades que auxiliam na classificação dos Andossolos, como a determinação do pH em NaF, neste caso, maior que 9,5 (FAO, 2006). Valores médios de pH em NaF 1 mol de 9,9 e 10 e `valores médios de pH em água de 5,8 e 6,2, para os horizontes A e B, respectivamente, foram observados para 12 de origem vulcânica da Europa (Rodeja et al., 2004). Shoji & Ono (1978) trabalharam com quatro Andossolos do Japão e verificaram valores de pH em NaF 1 mol (relação 1:50 segundo recomendações do National Soil Survey Center, 1996) entre 9,7 e 11,5. Matéria Orgânica A matéria orgânica tem importância significativa na acidez do solo e é considerada principal componente na determinação da necessidade de calagem, isoladamente ou com outras propriedades, como pH (Pionke et al., 1968). A matéria orgânica apresenta- se no solo comumente na forma de complexo organomineral, dificultando a avaliação isolada de seu efeito na acidez do solo, que, de certo modo, também seria pouco útil por não representar a condição de campo. As turfas, formadas geralmente em condições anaeróbias, são provavelmente as condições que mais se aproximam de um ambiente exclusivamente orgânico. Outro caso são os solos com teores muito baixos de argila, como acúmulo de matéria orgânica iluvial no horioznte Bh dos Espodossolos. A matéria orgânica caracteriza-se por polímeros de alto peso molecular, de composição e características químicas diferenciadas, com os grupos químicos funcionais distribuídos ao longo das cadeias (veja detalhes no capitulo XI). O uso de técnica espectrométrica auxilia na determinação e quantificação dos grupos funcionais na matéria orgânica (Wagner & Stevenson, 1965; Schnitzer, 1978). Existem dezenas de grupos funcionais com OH na matéria orgânica, passíveis de dissociação, sendo a maioria com caráter ácido fraco. Os principais grupos são os carboxílicos, fenólicos, enólicos e alcolônicos (Stevenson, 1982). Valores de pH de dissociação dos radicais orgânicos da matéria orgânica podem ser vistos na curva de titulação da figura 2. A determinação dos grupos com titulação é complexa, visto que existe sobreposição de dissociação entre eles e a dissociação é influenciada pela força da solução e pela presença de metais (Schnitzer, 1978; Steveson, 1982). Para simplificar, a caracterização da acidez da matéria orgânica é determinada a isto é, os radicais que se dissociam acima e abaixo deste valor de pH. Obtém-se O teor de H que é dissociável entre O pH na condição natural da amostra até pH 7,0 (meio neutro), sendo esta acidez normalmente chamada de carboxílica. Já a outra acidez, representada por H dissociável entre pH 7,0 e 8,2, é denominada acidez fenólica e enólica (Schnitzer & Gupta, O dos solos brasileiros é determinado até incluindo-se, assim, grande parte da acidez carboxílica. A camada superficial dos Organossolos (solos orgânicos) e horizonte Bh do Espodossolo (Podzol) (Quadro 5), mesmo com altos teores de apresentam grande diferença entre os valores de CTC efetiva e CTC Esse comportamento é atribuído aos teores muito superiores de H (baixa relação em que apenas uma fração de 15 a 24% das cargas foi dissociada entre pH 3,8 e 4,9 em água</p><p>326 ANTÔNIO VARGAS MOTTA & VANDER DE FREITAS MELO (natural) em relação ao pH 7,0 confirmando caráter preferencialmente de ácido fraco dos grupos funcionais. 10 A ácido húmico de turfa B ácido húmico de solo 9 8 7 A 6 5 B 4 3 0 0,04 0,08 0,12 0,16 0,20 0,24 NaOH, Figura 2. Curva de titulação de ácidos húmicos de turfa e de solo. Os traços pequenos na horizontal marcam os pontos finais de ionização dos grupos ácidos (fortes em baixo pH e fracos em pH mais próximos da neutralidade), com diferentes constantes de ionização, mas com faixas sobrepostas de dissociação. Fonte: Adaptada de Stevenson (1982) A matéria orgânica adsorve com diferentes energias, mas prevalecem ligações com elevado grau de estabilidade (Schnitzer, 1978; Steveson, 1982). De acordo com Bloom et al. (1979), a matéria orgânica é o principal componente no controle da atividade do em solução, e, por é determinante na dinâmica do Thomas (1975) constatou que acréscimo no teor de matéria orgânica no solo diminui teor de trocável, extraído por KCI 1 mol principalmente em pH baixo. Assim, a matéria orgânica é apontada como um dreno do Al liberado da dissolução dos minerais silicatados (Conyers, 1990). A capacidade de retenção do na matéria orgânica é tão elevada que pode ser medida pela relação molar Rodeja et al. (2004) obtiveram relação molar de de 45:1 em Andossolos. Os teores de em solos orgânicos devem ser avaliados com cautela, pois, como será visto a seguir, por problemas metodológicos, parte pode ser devida ao H. QUÍMICA E MINERALOGIA DO SOLO</p><p>Quadro 5. Análise química de solos ácidos com altos teores de matéria orgânica selecionados dos manuais de levantamentos de solo do Horizonte/ pH CTC CTC Argila Ki Kr CO camada efetiva pH 7,0 H2O mmole kg-1 g g kg-1 Solo Orgânico distrófico - Perfil 89 (Linhares - ES) (Embrapa, 1978) 1° cam. 4,9 3,8 25 191 820 nd nd nd 0,0 378 2° cam. 4,8 3,6 36 196 954 nd nd nd 0,1 442 IIC 4,8 3,6 25 41 108 760 1,80 1,53 0,4 15 Solo Orgânico distrófico - Perfil 66 (Mimoso do Sul - ES) (Embrapa, 1978) 1° cam. 4,0 3,6 83 134 707 nd nd nd 0,1 393 2° cam. 4,0 3,4 87 146 886 nd nd nd 0,1 455 3° cam. 3,5 3,1 146 292 394 nd nd nd 1,4 442 IIC 4,3 3,5 10 16 35 190 1,60 nd 0,5 5 Solo Orgânico distrófico - Perfil Gb46 (Rio de Janeiro - RJ) (Embrapa, 1980) Oap 4,5 3,6 45 173 809 nd nd nd 0,1 330 Oil 4,4 3,8 28 229 753 nd nd nd 0,1 318 5,0 3,9 18 111 218 450 1,87 1,81 0,2 23 Oi2 4,5 4,0 13 238 741 nd nd nd 0,0 307 Solo Orgânico distrófico. - Perfil 40 (Porto Caiuá - MT) (Embrapa, 1971) A1 4,6 3,8 57 100 668 nd nd nd 0,1 286 2° cam. 4,5 3,8 62 79 676 nd nd nd 0,1 278 3° cam. 4,7 3,9 58 69 566 nd nd nd 0,1 253 IIC1 4,9 4,0 27 31 192 140 3,06 2,8 0,2 52 IIC2 5,2 4,1 2 4 10 10 3,40 2,22 0,3 2 Solo Orgânicos álico - Perfil 79 (Piraquara - PR) (Embrapa, 1984b) A1 4,6 3,5 118 132 797 160 3,92 3,69 0,2 169 2° cam. 4,8 3,8 69 212 215 330 2,07 1,86 2,3 18 Podzol - Perfil 224 (Canavieiras - BA) (Embrapa, 1976) A1 3,9 2,5 19 33 167 60 nd nd 0,1 35 A21 4,6 3,4 0 1 10 10 nd nd 0,0 2 A22 5,7 4,3 0 1 1 10 nd nd nd 2 B21h 3,8 3,1 46 48 244 170 1,72 1,29 0,2 40 B22hir 4,0 3,5 93 94 530 200 1,71 1,65 0,2 83 (1) nd - não determinado.</p><p>328 ANTÔNIO MOTTA & VANDER DE FREITAS MELO Sistemas Mistos: Variações Conforme Intemperismo e a Profundidade do Solo Matéria Orgânica e Minerais Silicatados de Baixa (1:1) e Alta Atividade (2:1) Nos ambientes com predomínio de argila de alta atividade e matéria orgânica, pH encontra-se próximo ou acima da neutralidade, e os grupos fenólicos são os mais importantes para manter OH de superfície, uma vez que os grupos carboxílicos já estão dissociados. Em solos ácidos com Kr superior a 0,75, tem-se um sistema com predomínio de três componentes: argilas silicatadas de baixa e de alta atividade e matéria orgânica, os quais apresentam diferentes densidades de cargas elétricas negativas de superfície. Valores de CTC da matéria orgânica entre 1.310 e 2.990 mmol foram encontrados por Prata et al. (1996) e de 479 a 1.655 mmol por Peixoto (1995). Já as argilas de alta e baixa atividade têm CTC variando de 800 a 1.500 mmol e de 30 a 150 respectivamente (Grim, 1968; Bolland et al., 1976). A maior contribuição da matéria orgânica na acidez em relação aos minerais silicatados, principalmente os 1:1, pode ser visualizada no perfil do solo, de acordo com acréscimo do seu teor na superfície (Quadro 2). Solos com argila de alta atividade têm menor variação de CTC em profundidade, pois a redução dos teores de matéria orgânica é "compensada" pelo incremento nos teores de minerais 2:1 nas camadas subsuperficiais (Quadro 1). Considerando que acréscimo do não é acompanhado pelo decréscimo do pH em profundidade (Quadro 1), é bem provável que a matéria orgânica adsorva em ligações mais estáveis que a força de extração de KCI 1 mol (Thomas, 1975). O aumento na relação em profundidade suporta esta premissa (Quadro 1). As maiores variações entre CTC efetiva e CTC a pH 7,0 nas camadas superficiais é decorrência da grande densidade de cargas dependentes de pH na matéria orgânica. Matéria Orgânica, Minerais Silicatados de Baixa Atividade e Óxidos de Fe e Al O predomínio de caulinita e a grande ocorrência de óxidos de Fe e de Al representam a mineralogia mais comum da fração argila dos solos com elevado grau de Estes solos, além da ampla distribuição, são bastante utilizados na agricultura no Brasil. Em um extremo, existem os solos cauliníticos (Kr (Quadro 2) e, no outro, os oxídicos (Kr</p><p>XVII Química dos Solos Ácidos 329 cauliníticos (Quadro 2) e, principalmente, aos solos com argila de alta atividade (Quadro 1). Em muitos casos, verifica-se ausência de nos horizontes subsuperfiais (Quadro 3) e apenas pequena quantidade de H (deprotonação de grupos OH de superfície) como componente da acidez e de formação de carga. Os maiores teores de na superfície de solos oxídicos podem ser atribuídos à maior CTC efetiva e aos processos de complexação da matéria orgânica, que dificulta a formação e cristalização da gibbsita. Considerando os elevados valores de PCZ dos óxidos de Fe e Al, nos horizontes de textura média e argilosa, com baixos teores de matéria orgânica, a reduzida acidez [(H + é comparável à dos ambientes arenosos. Já em solos cauliníticos com altos teores de matéria os teores de mesmo baixos, tendem a ser mantidos em profundidade (Quadro 2), graças à maior CTC efetiva da caulinita pela dissociação de grupos -SiOH (baixo PCZ), mesmo em condições de solos ácidos. A ação combinada dos minerais silicatados de baixa atividade e óxidos de Fe e de Al ocorre com nos horizontes subsuperficiais de solos brasileiros. Este comportamento certamente é sistema mais comum nos solos tropicais, onde O principal componente da acidez é devido, provavelmente, ao equilíbrio com minerais de argila 1:1. Contudo, quando ocorre predomínio de óxidos de Fe e Al (Kr</p><p>330 ANTÔNIO CARLOS VARGAS MOTTA & VANDER DE FREITAS MELO 7 6 5 4 A B A B A B A B 1 2 3 4 Solos e Horizontes método a método b método C método d Figura 3. Valores de pH de equilíbrio do solo, avaliados por diferentes métodos: a) diluição da amostra em água (relação 1:1); b) solução do solo extraída da amostra com umidade de campo; c) solução do solo extraída de amostra com umidade de campo, após dois dias de incubação; d) solução do solo extraída após secagem da amostra, reumedecimento à umidade de campo e após dois dias de incubação. Solos 1 e 2 Typic Paleudults; solos 3 e 4 Humic Hapludults. Fonte: Elaborada a partir dos resultados de Qian & Wolt (1990). Duas condições básicas devem ser observadas na determinação do pH: a relação solo/solução e a natureza da solução de equilíbrio. As relações solo/solução mais utilizadas são 1:1 e 1:2,5. Em geral, aumento da relação determina maior valor de pH (Figura 4). Em solos com elevado tais decréscimos são menores do que em solos com baixo A agitação da suspensão solo / solução antes da leitura também reduz efeito da diluição sobre aumento do pH (Figura 4), por duas razões: i) a agitação facilita a difusão do H+ trocável do interior dos agregados; ii) aumento da pressão parcial de com a agitação reduz O pH do solo, de acordo com O equilíbrio: H2CO3 H+ + A maior pressão de na solução do solo em relação ao ar atmosférico faz com que as plantas no campo convivam com valores de pH inferiores aos determinados no laboratório após secagem das amostras de solo. Contudo, Suarez (1987) não observou diferenças nos valores de pH do solo em água nos tratamentos abertos e fechados submetidos a vácuo (retirada do Já a solução de equilíbrio tem efeito ainda maior no pH de equilíbrio: água purificada e solução salina em baixas e altas concentrações não tamponadas. Com exceção de horizontes subsuperficiais de solos ácricos, O pH determinado com solução salina concentrada (KCI 1 mol é inferior ao pH em água. A utilização de solução salina diluída (sais de Ca e Na, em concentrações entre 0,1 e 0,01 mol visa a simular a QUÍMICA E MINERALOGIA DO SOLO</p><p>XVII Química dos Solos Ácidos 331 concentração da solução solo sob condições de campo, onde a ocorrência da água pura inexiste. A solução de CaCl, 0,01 mol é a mais utilizada, provavelmente pela abundância de Ca nos pontos de troca e em solução. Contudo, acredita-se que tais concentrações possam estar acima da concentração salina da solução de solos tropicais com elevado grau de intemperismo. A redução do valor de pH com O aumento da concentração salina (força da solução) (Figura 5) pode ser interpretada pelo deslocamento de H+ da superfície dos e, ou, hidrólise do deslocado (Takachi & Pavan, 1995). Para uma mesma concentração salina da solução, tem-se efeito diferenciado do tipo de cátion sobre os valores de pH. Os cátions de maior carga e menor raio hidratado, portanto, com maior força trocadora, tendem a deslocar maior quantidade de H+ dos colóides e promover maior redução de pH. Takachi & Pavan (1995) obtiveram a seguinte nos valores de pH em função do cátion da solução salina: Ca</p><p>332 ANTÔNIO CARLOS VARGAS MOTTA & VANDER DE FREITAS MELO 4,4 DMS 0,005 4,3 NaCl 4,2 4,1 KCI 4,0 3,9 pH controle = 4,4 CaCl, 3,8 1 5 10 50 Força solução, mmol, Figura 5. Relação entre força e tipo de cátion e pH da solução do solo. Fonte: Takachi & Pavan (1995). Variações temporais no pH são expressivas em condição de campo (Collins et al., 1970). Variações sazonais (maio, junho, julho, agosto e setembro), com decréscimo durante O verão, foram encontradas em 11 de 19 casos, quando Collins et al. (1970) utilizaram amostras secas ao ar e com medição em água. No entanto, este número diminui para 10, quando pH foi determinado em CaCl, 0,01 mol As variações sazonais de pH mostraram-se dependentes da condutividade elétrica do solo, sendo menores para solos com maior concentração salina. Collins et al. (1970) também constataram O efeito do processo de secagem das amostras no pH em água, com a seguinte nos valores de pH: umidade de campo > seca ao > seca em estufa. A decomposição da matéria orgânica é um dos fatores responsáveis pelas variações sazonais de pH; em solos ácidos, normalmente tem-se aumento de pH, seguido de decréscimo e estabilização. O efeito da matéria orgânica sobre as oscilações do pH do solo é mais importante em ambientes com acúmulo de palha na superfície do solo, como em áreas de plantio direto (Franchini et al., 1999). Abordagem ampla sobre essas relações está disponível na revisão de Wong & Swift (2003). O uso de soluções com maior concentração salina, como 1 mol L-1, proporciona valores de pH ainda menores que em CaCl, 0,01 mol graças, provavelmente, à sua maior capacidade de deslocamento de Não se pode negligenciar O efeito de altas concentração de eletrólitos no aumento da força da solução: reduz a atividade de H+; induz a dessorção desse cátion para tentar restabelecer sua atividade na solução; reduz pH. O KCI 1 mol tem sido utilizado no estabelecimento do tipo de carga predominante no solo (negativa ou positiva). A variação do pH por esse método e a determinação em água (A pH) definem O predomínio de cargas do solo, indicando O deslocamento preferencial de íons determinantes de potencial (H+ e Quando pH em 1 mol é maior que O pH em significa que O ânion Cl deslocou maior QUÍMICA E MINERALOGIA DO SOLO</p>