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- -1 Taxonomia do Direito Tributário Lucas Gomes da Silva Introdução Você já ouviu alguém dizendo que paga tributos ao Estado de bom grado? Já ouviu alguém reclamando da carga tributária brasileira? Se ninguém gosta de tributos, por que pagamos tantos no Brasil? Isso é o que descobriremos neste tema. Dentro da dicotomia histórica entre Direito Público e Direito Privado, veremos que o Direito Tributário está ligado ao ramo do Direito Público, então, estudaremos todas as implicações decorrentes dessa classificação, bem como a importância do Direito Tributário para que o Estado possa, através da arrecadação dos tributos, manter a sua estrutura funcionando e cumprir o seu papel social na realização do que podemos denominar justiça fiscal, em sentido amplo, oferecendo ao cidadão e aos governos mecanismos essenciais à criação de uma sociedade mais digna e justa. Ao final desta aula, você será capaz de: • identificar as duas grandes taxonomias jurídicas (Direito Público e Direito Privado) reconhecendo o Direito Privado dentro do Direito Público. As duas grandes taxonomias jurídicas: Direito Público e Privado Taxonomia, segundo Mazza (2017, p. 43), “é a definição da natureza jurídica de determinado instituto, ou seja, o processo técnico por meio do qual se investiga o enquadramento do objeto dentro das grandes categorias da ciência do direito”. No entendimento da doutrina majoritária, definir a taxonomia de um ramo jurídico consiste, precisamente, em classificá-lo como sendo pertencente ao Direito Público ou ao Direito Privado (MAZZA, 2017). Como é possível de se deduzir, os ramos do Direito Privado são aqueles voltados à disciplina jurídica das atividades privadas, • SAIBA MAIS O “Dicionário Jurídico da Academia Brasileira de Letras Jurídicas”, de Sidou (2016), define taxonomia jurídica como a ordenação dos ramos do conhecimento do Direito. Consulte a obra e conheça o significado de mais termos jurídicos costumeiramente utilizados e que são fundamentais na atuação profissional. - -2 de se deduzir, os ramos do Direito Privado são aqueles voltados à disciplina jurídica das atividades privadas, realizadas entre particulares, como, por exemplo, o Direito Civil e o Direito Empresarial. Por sua vez, os ramos de Direito Público, conforme ensina Mazza (2017, p. 43), “dirigem-se à regulação das atuações estatais, como ocorre com o Direito Constitucional, o Direito Administrativo, o Direito Penal, o Direito Processual Civil, entre tantos outros”. Perante essa dicotomia, ao se analisar as definições de Direito Público e Direito Privado, fica fácil concluir que o Direito Tributário se classifica como ramo do direito público, “isso porque as três atividades que pertencem ao seu objeto de estudos (criação, cobrança e fiscalização de tributos) são atividades que o ordenamento jurídico pátrio define como próprias do Estado” (MAZZA, 2017, p. 43). Além disso, por estabelecer uma disciplina de natureza substancial, e não adjetiva ou formal, o Direito Tributário é um ramo de direito material (MAZZA, 2017). Então, conforme ensina Moraes (1987, p. 38), o Direito Tributário apresenta-se também como um “ordenamento de direito obrigacional, vez que se estrutura a partir da ideia de uma relação jurídica obrigacional ligando o Fisco e o contribuinte”. Portanto, seguindo o raciocínio de Mazza (2017, p. 44), “pode-se falar em uma quádrupla natureza jurídica do Direito Tributário”. Analise a figura a seguir e entenda quais são os elementos que compõem essa natureza. Figura 1 - Composição da natureza jurídica do Direito Tributário Fonte: Elaborada pelo autor, 2019. Ainda com base no pensamento de Mazza (2017, p. 46), diferentemente do tributo, “cuja razão de existir é propiciar a obtenção de recursos financeiros para custeio do Estado, a finalidade do Direito Tributário é delimitar o poder de tributar evitando abusos no exercício das atividades do Fisco em prejuízo dos contribuintes”. As limitações ao poder de tributar estão dispostas na Constituição Federal, conforme o artigo 150. FIQUE ATENTO É importante destacar que a jurisprudência brasileira, com frequência, refere-se ao Direito Tributário como sendo um direito comum, pois se dá no sentido de ser um ramo aplicável à generalidade das pessoas, e não um ramo especial ou excepcional (MAZZA, 2017). - -3 Com base no que vimos, é importante atentar às diferenças que Mazza (2017) apresenta: · Direito Tributário é o ramo do Direito Público que estuda princípios e normas reguladores das atividades estatais de instituição, cobrança e fiscalização de tributos. Seu objeto de atuação finaliza com o ingresso nos cofres públicos do dinheiro pago pelo contribuinte. Dessa forma, o estudo da destinação da receita arrecadada pelo fisco cabe ao Direito Financeiro. · Direito Financeiro é o ramo do Direito Público que tem como objeto a disciplina jurídica das atividades financeiras do Estado, exceto as de natureza tributária. Perceba que essa exceção é relevante porque as atividades de criação, cobrança e fiscalização de tributos também são atividades financeiras do Estado, mas, por pertencerem especificamente ao Direito Tributário, foram excluídas do domínio do Direito Financeiro. · Direito Econômico é o ramo do Direito Público que estuda a disciplina jurídica da atividade econômica do Estado e dos particulares relativamente à produção, distribuição, circulação e consumo de riquezas. · Política Fiscal consiste nos planejamentos, decisões e medidas do governo sobre o conjunto de receitas e gastos públicos. · Política Tributária relaciona-se somente aos planejamentos, decisões e medidas do governo em matéria de tributação. FIQUE ATENTO São frequentes as confusões envolvendo os conceitos de Direito Tributário, Financeiro, Econômico, Política Fiscal e Política Tributária. É importante aprofundar o conhecimento acerca do assunto, bem como buscar identificar as especificidades de cada instituto para não incorrer em equívocos ao se deparar com o assunto. - -4 Quadro 1 - Comparativo entre Direito Tributário e Direito Financeiro Fonte: Elaborado pelo autor com base em Sabbag, 2017. Agora que entendemos a distinção entre Direito Público e Direito Privado, vamos estudar especificamente o Direito Tributário como ramo do Direito Público. O Direito Tributário como ramo do Direito Público Como vimos anteriormente, o Direito Tributário pode ser classificado como ramo jurídico pertencente ao Direito Público, considerando-se o Estado sempre presente em um dos polos da relação jurídica, “e sempre em situação de superioridade jurídica perante o particular, haja vista o interesse tutelado ser socialmente coletivo (o interesse público), o que dota suas normas jurídicas de compulsoriedade” (SABBAG, 2017, p. 44). - -5 Segundo Amaro (2008, p. 5), “a preponderância do interesse coletivo no direito dos tributos é evidente, daí derivando o caráter cogente de suas normas, inderrogáveis pela vontade dos sujeitos da relação jurídico- tributária”. Nessas circunstâncias, esclarece Sabbag (2017, p. 44) que fica evidente a noção de verticalidade, “desigualdade jurídica”, que caracteriza as relações de Direito Público, contrariamente à horizontalidade, relativa à “igualdade jurídica”, que há entre as partes que compõem a relação jurídica de Direito Privado. “Desse modo, é fácil perceber que o interesse público deve prevalecer sobre o interesse particular, na seara da tributação, desde que se respeitem os direitos e garantias individuais”. O binômio classificatório “direito público-direito privado”, segundo Mazza (2017), indica, na verdade, que a norma tributária, sendo pública, possui certas características que se sobressaem à luz de dados critérios. Figura 2 - Norma tributária constituindo-se como Direito Público Fonte: Elaborada pelo autor com base em Sabbag, 2017. Pode-se acrescentar, ainda, segundo ensina Sabbag (2017), que o Direito Tributário é um direito obrigacional, afinal, vincula o Estado ao contribuinte, em uma relação de índole obrigacional. Trata-se de um liame estabelecidoa partir da presença de partes (sujeito ativo e sujeito passivo), de prestação (objeto) e de vínculo jurídico (causa), como elementos estruturais da obrigação tributária. EXEMPLO Um exemplo da supremacia do Direito Tributário sobre o interesse particular ou privado é o fato de o cidadão não poder se negar a pagar um tributo. Se ocorreu o fato estipulado em lei, descrito como gerador do tributo, este será devido, independentemente da vontade do contribuinte. Imagine um cidadão que possui um imóvel situado na zona urbana de uma cidade. Apesar de qualquer circunstância, querendo ou não, terá de pagar o tributo oriundo do fato descrito em lei que o gerou. - -6 Figura 3 - Obrigatoriedade de o contribuinte transferir parte do seu capital ao Estado Fonte: ChiccoDodiFC, Shutterstock, 2019. Como vimos anteriormente, o Direito Financeiro e o Direito Tributário consistem em especialidades jurídicas que se comunicam, mas não se confundem. Na realidade, o Direito Financeiro deu origem ao Direito Tributário e, segundo Abraham (2018, p. 43), “tal como no relato bíblico se diz que Eva foi criada a partir de uma costela de Adão. Apesar de ambos serem especialidades jurídicas interdependentes, cada um deles possui sua identidade como disciplina jurídica autônoma”. Fechamento Neste tema, estudamos que o Direito Tributário é um ramo do Direito Público e que não se confunde com o Direito Financeiro. Por se tratar de Direito Público, significa que o Estado é parte da relação jurídico-tributária e que a norma jurídica possui em seu conteúdo imperatividade própria das normas cogentes, em decorrência de o interesse público estar presente. Dessa forma, sobressai ao interesse particular do contribuinte. Estudamos que as normas de Direito Tributário gozam de obrigatoriedade e compulsoriedade, prerrogativas fundamentais, pois, do contrário, dificilmente a obrigação de recolher o tributo seria cumprida sem sanção. Nesta aula, você teve a oportunidade de: • identificar as duas grandes taxonomias jurídicas (Direito Público e Direito Privado) reconhecendo o Direito Privado dentro do Direito Público. Referências ABRAHAM, M. . Rio de Janeiro: Forense, 2018.Curso de direito tributário brasileiro AMARO, L. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.Direito tributário brasileiro. MAZZA, A. . 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.Manual de direito tributário MORAES, B. R. de. . São Paulo: Forense, 1987.Compêndio de Direito Tributário SIDOU, J. M. O. : Academia Brasileira de Letras Jurídicas. 11. ed., rev. e atual. Rio de Janeiro: Dicionário Jurídico • - -7 SIDOU, J. M. O. : Academia Brasileira de Letras Jurídicas. 11. ed., rev. e atual. Rio de Janeiro: Dicionário Jurídico Forense, 2016. SABBAG, E. de M. . 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.Manual de Direito Tributário Introdução As duas grandes taxonomias jurídicas: Direito Público e Privado Composição da natureza jurídica do Direito Tributário Comparativo entre Direito Tributário e Direito Financeiro O Direito Tributário como ramo do Direito Público Norma tributária constituindo-se como Direito Público Obrigatoriedade de o contribuinte transferir parte do seu capital ao Estado Fechamento Referências