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– 123 P O R T U G U ÊS 1. Terceira Geração (Condoreira – Poesia Social – Hugoana – Escola de Recife) � Castro Alves (1847-1871) Imbuído da concepção de poe ta mediúnico (que escreve em tran se, que se acredita instrumento me dia dor entre as forças superiores, Deus, o cosmos e os homens), colo cou sua poesia a serviço da reforma da sociedade e das grandes causas de seu tempo (Guerra do Paraguai, Abolição, República). Representa o segmento libe ral- pro gres sista da burguesia, que acre - dita no progresso, opondo-se à ten dência saudosista e regressiva, do - mi nante em nosso Romantismo. Os temas que versou com maior frequência foram: • a poesia da natureza, ex plo - rando o efeito plástico e suges tivo dos grandes planos (mar, infinito, ocea no, vastidão, águias e alba tro zes): Qual no fluxo e refluxo, o mar em vagas Leva a concha dourada... e traz das plagas Corais em turbilhão, A mente leva a prece a Deus — por pérolas E traz, volvendo após das praias cérulas1, — Um brilhante — o perdão! A alma fica melhor no descampado... O pensamento indômito, arrojado Galopa no sertão, Qual nos estepes o corcel fogoso Relincha e parte turbulento, estoso2, Solta a crina ao tufão. (Espumas Flutuantes) Vocabulário e Notas 1 – Cérulo: da cor do céu. 2 – Estoso: ardente, febril. • a poesia erótica, de sen sua li - dade forte e madura, viril, às vezes galhofeira, conciliando o exer cício poético com a prática do amor: ADORMECIDA Uma noite, eu me lembro... Ela dormia Numa rede encostada molemente... Quase aberto o roupão... solto o cabelo E o pé descalço do tapete rente. ‘Stava aberta a janela. Um cheiro agreste Exalavam as silvas1 da campina... E ao longe, num pedaço do horizonte, Via-se a noite plácida e divina. De um jasmineiro os galhos encurvados, Indiscretos entravam pela sala, E de leve oscilando ao tom das auras, Iam na face trêmulos — beijá-la. Era um quadro celeste!... A cada afago Mesmo em sonhos a moça estremecia... Quando ela serenava... a flor beijava-a... Quando ela ia beijar-lhe... a flor fugia... Dir-se-ia que naquele doce instante Brincavam duas cândidas crianças... A brisa, que agitava as folhas verdes, Fazia-lhe ondear as negras tranças!... E o ramo ora chegava, ora afastava-se... Mas quando a via despertada a meio, P’ra não zangá-la... sacudia alegre Uma chuva de pétalas no seio... Eu, fitando esta cena, repetia, Naquela noite lânguida e sentida: “Ó flor! — tu és a virgem das campinas! Virgem! — tu és a flor de minha vida!...” (Espumas Flutuantes) Vocabulário e Notas 1 – Silva: designação comum a diversas plantas da família das rosáceas; silveira, sarça. • a poesia lírico-amorosa do ciclo inspirado pela atriz Eugênia Câmara: O GONDOLEIRO DO AMOR DAMA NEGRA Teus olhos são negros, negros, Como as noites sem luar... São ardentes, são profundos, Como o negrume do mar; Sobre o barco dos amores, Da vida boiando à flor1, Douram2 teus olhos a fronte3 Do Gondoleiro do amor. Tua voz é a cavatina4 Dos palácios de Sorrento5, Quando a praia beija a vaga, Quando a vaga beija o vento. E como em noites de Itália Ama um canto o pescador, Bebe a harmonia em teus cantos O Gondoleiro do amor. Teu sorriso é uma aurora6 Que o horizonte enrubesceu7. — Rosa aberta com o biquinho Das aves rubras do céu; Nas tempestades da vida, Das rajadas8 no furor9, Foi-se a noite, tem auroras O Gondoleiro do amor. Teu seio é vaga dourada Ao tíbio10 clarão da lua, Que, ao murmúrio das volúpias11, Arqueja12, palpita nua; Como é doce, em pensamento, Do teu colo no langor13 Vogar14, naufragar, perder-se O Gondoleiro do amor!? Teu amor na treva é — um astro, No silêncio — uma canção, É brisa — nas calmarias15, É abrigo — no tufão; Por isso eu te amo, querida, Quer no prazer, quer na dor... Rosa! Canto! Sombra! Estrela! Do Gondoleiro do amor. (Espumas Flutuantes) Vocabulário e Notas 1 – À flor: à superfície, à tona. 2 – Dourar: iluminar. 3 – Fronte: rosto. 4 – Cavatina: pe que - na peça musical. 5 – Sorrento: cidade italiana da região de Nápoles. 6 – Aurora: alvorecer. 7 – Enrubescer: tornar rubro, vermelho. 8 – Rajada: vento intenso. 9 – Furor: força, intensidade. 10 – Tíbio: fraco. 11 – Volúpia: grande prazer sexual. 12 – Arquejar: respirar exaltadamente. 13 – Langor: sensualidade. 14 – Vogar: navegar. 15 – Calmaria: grande calor sem ventos. MÓDULO 16 Romantismo no Brasil (III): Poesia – Terceira Geração C1_3A_VERMELHO_2021_PORT_GK.qxp 22/09/2020 19:23 Página 123