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Autoras: Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano Profa. Marília Tavares Coutinho da Costa Patrão Colaboradoras: Profa. Cristiane Furlaneto Profa. Christiane Mazur Doi Reprodução Assistida Professoras conteudistas: Laura Cristina da Cruz Dominciano / Marília Tavares Coutinho da Costa Patrão Laura Cristina da Cruz Dominciano Possui doutorado em Ciências pela Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos de Pirassununga – USP (2015), mestrado em Biologia Comparada pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto – USP (2001) e graduação em Ciências Biológicas pela Uniararas (1995). Leciona na Universidade Paulista – UNIP, campus de São José do Rio Pardo, desde 2002, nos cursos de Enfermagem, Medicina e Nutrição nas disciplinas de Biologia Celular e Anatomia, além de ser coordenadora auxiliar e docente do curso de Ciências Biológicas da UNIP, campus Vargas, Ribeirão Preto, desde 2012. Nas pesquisas científicas, atuou no mestrado com bioecologia de crustáceos ermitões, publicando artigos científicos sobre o padrão de ocupação e seleção de conchas pelos ermitões Paguristes tortugae, Pagurus criniticornis e Pagurus brevidactylus do litoral norte paulista. No doutorado, desenvolveu pesquisas sobre os efeitos antimicrobianos da oleuropeína individual e combinada a outros sanitizantes químicos contra biofilmes de Escherichia coli, Staphylococcus aureus e Listeria monocytogenes da indústria de alimentos, a fim de diminuir os biofilmes causadores de doenças aos seres humanos. Marília Tavares Coutinho da Costa Patrão Graduada em 2002 pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) em Ciências Biológicas – Modalidade Médica. Mestre (2005) e doutora (2009) em Ciências, com ênfase em Farmacologia, pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e licenciada em Química pelas Faculdades Oswaldo Cruz (2011). É professora titular da UNIP desde 2010, onde leciona as disciplinas de Análise Físico-Química, Bases Analíticas do Laboratório Clínico, Embriologia e Reprodução Humana e Farmacologia, entre outras, para os cursos de Biomedicina, Enfermagem e Nutrição. Também ministrou a disciplina de Farmacologia para o curso de Medicina do Centro Universitário São Camilo (2010-2011). É coordenadora auxiliar do curso de Biomedicina da UNIP desde 2011. Na mesma instituição, foi membro do Comitê de Ética no período de 2011 a 017 e, desde 2012, atua na Comissão de Qualificação das Avaliações (CQA). © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) D671r Dominciano, Laura Cristina da Cruz. Reprodução Assistida / Laura Cristina da Cruz Dominciano; Marília Tavares Coutinho da Costa Patrão. – São Paulo: Editora Sol, 2024. 128 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Anatomofisiologia. 2. Reprodução. 3. Tratamento. I. Patrão, Marília Tavares Coutinho da Costa. II. Título. CDU 612.613 U519.74 – 24 Profa. Sandra Miessa Reitora Profa. Dra. Marilia Ancona Lopez Vice-Reitora de Graduação Profa. Dra. Marina Ancona Lopez Soligo Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Claudia Meucci Andreatini Vice-Reitora de Administração e Finanças Prof. Dr. Paschoal Laercio Armonia Vice-Reitor de Extensão Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora das Unidades Universitárias Profa. Silvia Gomes Miessa Vice-Reitora de Recursos Humanos e de Pessoal Profa. Laura Ancona Lee Vice-Reitora de Relações Internacionais Prof. Marcus Vinícius Mathias Vice-Reitor de Assuntos da Comunidade Universitária UNIP EaD Profa. Elisabete Brihy Profa. M. Isabel Cristina Satie Yoshida Tonetto Prof. M. Ivan Daliberto Frugoli Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Material Didático Comissão editorial: Profa. Dra. Christiane Mazur Doi Profa. Dra. Ronilda Ribeiro Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista Profa. M. Deise Alcantara Carreiro Profa. Ana Paula Tôrres de Novaes Menezes Projeto gráfico: Revisão: Prof. Alexandre Ponzetto Kleber Souza Luiza Gomyde Vitor Andrade Sumário Reprodução Assistida APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................8 Unidade I 1 DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO E DIFERENCIAÇÃO GONADAL...............................................9 1.1 Determinação do sexo ........................................................................................................................ 12 1.2 Gametogênese ....................................................................................................................................... 12 1.2.1 Gametogênese masculina ................................................................................................................... 12 1.2.2 Gametogênese feminina ...................................................................................................................... 13 2 ANATOMOFISIOLOGIA DO SISTEMA REPRODUTOR MASCULINO ................................................. 16 2.1 Espermatogênese ................................................................................................................................. 19 2.1.1 Espermatocitogênese e espermatidogênese ............................................................................... 22 2.1.2 Espermiogênese ....................................................................................................................................... 24 2.2 Maturação do espermatozoide no epidídimo .......................................................................... 25 2.3 Ereção ........................................................................................................................................................ 26 2.4 Ejaculação ............................................................................................................................................... 28 2.4.1 Emissão ....................................................................................................................................................... 28 2.4.2 Expulsão ...................................................................................................................................................... 29 2.5 Hormônios masculinos e o controle da fertilidade ................................................................ 30 3 ANATOMOFISIOLOGIA DO SISTEMA REPRODUTOR FEMININO ..................................................... 34 3.1 Ovogênese ............................................................................................................................................... 37 3.2 Foliculogênese ....................................................................................................................................... 40 3.3 Ciclo sexual feminino: ciclo ovariano e menstrual ................................................................ 43 3.3.1 Fase folicular: a primeira fase do ciclo sexual ............................................................................ 45 3.3.2 Ovulação ..................................................................................................................................................... 46 3.3.3 Fase lútea: a segunda fase do ciclo sexual ................................................................................... 46 3.4 Métodos de contracepção ................................................................................................................achatadas, constituindo uma estrutura denominada folículo primordial. Na puberdade, os ovários apresentam cerca de 300 mil ovócitos primários, pois a maioria dessas células sofreu o processo de atresia. Lembrete Atresia é a degeneração dos ovócitos e das demais células dos folículos ovarianos, por apoptose, e pode ocorrer durante qualquer estágio do desenvolvimento folicular. A fase de maturação ocorre a partir da puberdade, com a menarca, e refere-se à maturação do folículo ovariano, processo que culmina com a ovulação. Durante a vida reprodutiva da mulher, apenas 350 a 400 ovócitos primários completarão a fase de maturação, um a cada ciclo ovariano/menstrual. A cada ciclo ovariano, alguns ovócitos primários retomam o processo de meiose, que foi interrompido na prófase I durante a vida embrionária. A primeira divisão meiótica é completada e inicia-se a meiose II, porém é interrompida na metáfase II. A célula resultante é o ovócito secundário, que já apresenta conjunto haploide de cromossomos. Durante a meiose do gameta masculino, a meiose I origina duas células-filhas haploides, denominadas espermatócitos secundários. Por outro lado, durante a meiose I do gameta feminino, há a formação de apenas um ovócito secundário. Isso ocorre porque a divisão meiótica no sexo feminino é desigual: durante a citocinese que encerra a meiose I, a maior parte do citoplasma é direcionado a somente uma das células-filhas, o ovócito secundário. A outra célula-filha passa a ser denominada primeiro corpúsculo polar, que apresenta conteúdo citoplasmático muito reduzido e permanece na periferia do ovócito secundário. É o ovócito secundário que sofre o processo de ovulação. 39 REPRODUÇÃO ASSISTIDA A meiose II, pausada na metáfase II, apenas será completada no momento da fecundação. Portanto, é somente neste momento que é originado o óvulo, com o segundo corpúsculo polar. Assim, ao final da meiose, cada ovogônia terá originado um ovócito e dois corpúsculos polares. Observação A nomenclatura correta do gameta feminino é ovócito secundário, e não óvulo. O óvulo é uma estrutura formada somente após a fecundação. A figura a seguir resume as etapas da ovogênese. A B 2n 2n n n n n C D E F G H I Figura 20 – Etapas da ovogênese. A ovogônia (A), diploide (2n), entra em meiose (B), originando um ovócito primário (C), cuja divisão meiótica é interrompida na prófase I. Por consequência, essa célula ainda é diploide. Durante a ovulação, a meiose I (D) é completada, originando um ovócito secundário (E), haploide (n), e o primeiro corpúsculo polar (F). No ovócito secundário, a meiose progride até a metáfase II e é novamente interrompida. No momento da fecundação, completa-se a meiose II, o que gera o óvulo (H) e o segundo corpúsculo polar (I) Disponível em: http://tinyurl.com/2h887ebp. Acesso em: 23 jan. 2024. Em relação às modificações morfológicas que são características dos gametas femininos, destaca- se a formação da zona pelúcida, uma camada glicoproteica que envolve toda a célula e constitui uma barreira à entrada dos espermatozoides. A formação da zona pelúcida será abordada em detalhes durante o estudo da foliculogênese. Você percebeu que, embora tanto o espermatozoide quanto o ovócito sejam originados da meiose de células progenitoras, existem várias diferenças entre esses dois processos? Vamos revisá-las no quadro a seguir. 40 Unidade I Quadro 1 – Principais diferenças entre a espermatogênese e a ovogênese Espermatogênese Ovogênese Meiose Ocorre continuamente (sem pausas) a partir da puberdade até o final da vida. Cada ciclo dura cerca de 74 dias Longo processo (com pausas) iniciado na vida embrionária e finalizado no momento da fecundação. O processo de meiose em uma única célula dura décadas Fase de multiplicação O aumento da população de espermatogônias, por mitoses sucessivas, ocorre desde a puberdade até o final da vida O aumento da população de ovogônias é restrito à vida embrionária Tamanho dos gametas Não é observado aumento do tamanho do espermatozoide em relação às células progenitoras Ocorre grande aumento do volume do ovócito em relação às células progenitoras Número de gametas Cada espermatogônia origina 4 espermatozoides idênticos Cada ovogônia origina um único ovócito secundário, que se transformará em óvulo durante a fecundação Cromossomos Haploides; podem carregar os cromossomos sexuais X ou Y (n = 23, X ou n = 23, Y) Haploides; carregam somente o cromossomo sexual X (n = 23, X) Outras modificações Ocorre a formação do acrossomo e do flagelo Ocorre formação da zona pelúcida 3.2 Foliculogênese Os folículos ovarianos correspondem ao ovócito rodeado de células foliculares, também chamadas de células da granulosa. Essas estruturas são encontradas no córtex ovariano e surgem ainda durante a vida embrionária, quando os ovócitos primários são rodeados por uma única camada de células foliculares achatadas (folículo primordial). Ao nascimento, as células foliculares tornam-se cúbicas (folículo primário) e, a partir da puberdade, ocorre o crescimento dessa estrutura, processo que envolve a proliferação das células foliculares à medida que a meiose evolui da prófase I para a metáfase II no ovócito. A cada dia, a partir da puberdade, alguns folículos iniciam o processo de crescimento, estimulados pelo hormônio folículo estimulante (FSH), liberado pela hipófise. Observação O aumento nos níveis plasmáticos de FSH ocorre a partir da puberdade, o que permite que haja o crescimento folicular e, consequentemente, a ovulação. Em resposta à estimulação pelo FSH, ocorre a proliferação das células foliculares, que é concomitante à retomada do processo de meiose pelo ovócito primário. Em um determinado momento, um folículo torna-se dominante sobre os demais: é esse folículo que romperá durante a ovulação, liberando o ovócito secundário. Os folículos que se encontram em estágios intermediários de crescimento acabam por sofrer atresia, e o ciclo ovariano é reiniciado. 41 REPRODUÇÃO ASSISTIDA O crescimento folicular está representado na figura a seguir. A) Folículo primordial Ovócito Estroma Antro Teca interna Teca externa Células da granulosa Teca externa Teca interna Teca interna Antro Células da granulosa Células da granulosa Corona radiata Cumulus oophorus Células foliculares Zona pelúcida Zona pelúcida Lâmina basal C) Folículo antral D) Folículo maduro (de Graaf) B) Folículos primários Unilaminar Multilaminar Figura 21 – Etapas do crescimento folicular Fonte: Junqueira e Carneiro (2004, p. 434). O início do crescimento folicular é marcado pelas alterações do ovócito, cujo tamanho aumenta e as organelas redistribuem-se. Concomitantemente, ocorre proliferação das células foliculares, que passam a formar várias camadas, característica morfológica mais marcante do folículo primário multilaminar. Tais células foliculares passam a ser denominadas células da granulosa. As células da granulosa promovem a nutrição do ovócito e impedem que essas células completem a meiose antes do tempo. No folículo primário multilaminar, ocorre ainda a diferenciação das células do estroma circundante em células da teca interna. A teca interna é responsável pela produção da progesterona, da testosterona e da androstenodiona, a molécula precursora da testosterona. Esses hormônios, ao serem transportados para as células da granulosa, são convertidas, respectivamente, nos hormônios estrogênicos estrona, estradiol e estriol. 42 Unidade I Observação A designação estrógeno se refere ao conjunto dos três hormônios sintetizados pela aromatase nas células da granulosa: a estrona, o estradiol e o estriol. Portanto, podemos dizer que os estrógenos são resultado da ação conjunta das células da teca e das células da granulosa do folículo ovariano. A formação da zona pelúcida, camada de glicoproteínas que revestem o ovócito, é outro evento que marca o desenvolvimento do folículo primáriomultilaminar. Essa estrutura é compreendida por três glicoproteínas principais, denominadas ZP1, ZP2 e ZP3, que constituem uma barreira que garante que somente espermatozoides da mesma espécie do ovócito realizem a fecundação e protege o ovócito, e mais tarde o pré-embrião, do sistema imunológico da mãe. As células da granulosa secretam quantidade significativa de líquido, rico em glicosaminoglicanos, proteínas e hormônios estrogênicos. Esse líquido se acumula ao redor do ovócito e forma o antro, característico do folículo antral. No folículo antral também é possível observar o desenvolvimento da teca externa, uma cápsula altamente vascularizada que envolve a teca interna. Os capilares sanguíneos que irrigam a teca externa coletam os hormônios produzidos no folículo ovariano para que sejam distribuídos por todo o organismo. À medida que a quantidade de líquidos no antro aumenta, ocorre sua expansão e algumas células da granulosa formam um pedículo que sustenta o ovócito, denominado cumulus oophorus. Além disso, uma camada de células reveste externamente o gameta, formando a corona radiata. O folículo que apresenta essas estruturas é denominado folículo maduro ou folículo de Graaf. O ovócito já atingiu a metáfase II da meiose e, portanto, está pronto para a ovulação. Observação O folículo maduro apresenta cerca de 2,5 cm de diâmetro e é visível nos exames de ultrassom. A figura a seguir mostra um corte histológico de ovário, no qual pode ser observado um folículo maduro e suas estruturas, além de alguns folículos em estágios anteriores da maturação. 43 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Teca interna Líquido folicular Corona radiata Cumulus oophorus Folículo primordial Células da granulosa Teca externa Folículo primário Figura 22 – Corte histológico de ovário, evidenciando um folículo maduro (folículo de Graaf) Disponível em: http://tinyurl.com/2p8uz922: Acesso em: 23 jan. 2024. A ovulação é o rompimento das paredes do folículo ovariano e a consequente liberação do ovócito secundário em direção às tubas uterinas, local onde ocorre a fecundação. A partir da ovulação, as células da granulosa e da teca do folículo ovariano rompido passam a constituir o corpo lúteo, estrutura importante para a manutenção da gestação. 3.3 Ciclo sexual feminino: ciclo ovariano e menstrual Os hormônios femininos (estrógenos e progesterona) são sintetizados nos ovários em resposta aos hormônios hipofisários LH e FSH. Na mulher, o mecanismo de feedback negativo controla a secreção dos hormônios sexuais de maneira semelhante à observada no homem. No entanto, a secreção dos hormônios hipofisários e gonadais não ocorre como nos homens, continuamente, mas sim de maneira cíclica. O ciclo sexual feminino, que engloba o ciclo ovariano e o ciclo menstrual, é a consequência dessa liberação cíclica de hormônios sexuais. A figura a seguir ilustra o eixo hipotálamo-hipófise-ovário, a partir do qual discutiremos a regulação do ciclo sexual feminino. 44 Unidade I Fases do ciclo ovariano Fase folicular Fase lútea Níveis de gonadotrofinas Ciclo ovariano Níveis dos hormônios ovarianos Ciclo uterino Fases do ciclo uterino Menstruação Fase proliferativa Fase secretora Temperatura corporal basal Dias (ºC) 36,4 28/0 7 14 21 28/0 Ovulação LH FSH Folículo terciário Folículo dominante Formação do corpo lúteo Corpo lúteo maduro Antro Estrogênio Inibina Progesterona OvulaçãoOvulação 36,7 Figura 23 – Ciclo ovariano e ciclo menstrual Fonte: Silverthorn (2017, p. 821). Na mulher, durante o período fértil, a secreção dos hormônios LH, FSH, estrógenos e progesterona varia continuamente em um intervalo de cerca de 28 dias, que caracteriza o ciclo sexual feminino. 45 REPRODUÇÃO ASSISTIDA O ciclo sexual é dividido em ciclo ovariano e ciclo menstrual, uma vez que as principais alterações são referentes à maturação do folículo ovariano e à preparação do revestimento interno do útero, o endométrio, para uma possível gestação. O início da puberdade, na mulher, é marcado pelo aumento das secreções de FSH e LH pela hipófise. Esse evento culmina na menarca, a primeira menstruação. A partir desse evento, a secreção cíclica desses hormônios continuará até a menopausa. O padrão de secreção dos hormônios hipofisários varia durante o ciclo sexual: durante a primeira metade do ciclo, predomina a secreção de FSH e, durante a segunda fase, a secreção de LH. 3.3.1 Fase folicular: a primeira fase do ciclo sexual O dia zero do ciclo sexual feminino é o primeiro dia da menstruação. A partir dele, a secreção de FSH e de LH aumentam, porém a concentração de FSH é aproximadamente o dobro da de LH. Durante essa fase, ocorre o crescimento do folículo ovariano, conforme descrito anteriormente. Como consequência, os níveis plasmáticos de estrógenos aumentam significativamente – afinal, são as células da granulosa as responsáveis pela produção desse hormônio. O crescimento folicular se completa no 14º dia do ciclo sexual, momento no qual ocorre a ovulação. Durante a fase folicular, são observadas as seguintes alterações: • Crescimento do folículo ovariano, em resposta principalmente ao aumento da secreção de FSH, mas também de LH. Cerca de 6 a 12 folículos iniciam o crescimento por ciclo, porém somente um se tornará dominante. • Aumento da secreção de estrógenos, resultado da proliferação das células da granulosa. Os estrógenos, uma vez na circulação, atingem o útero e promovem o crescimento do endométrio, essencial para garantir a implantação do embrião, além de modular positivamente a libido e promover aumento da lubrificação vaginal. Conforme já visto, quando mencionamos o estrógeno, estamos na verdade nos referindo ao conjunto dos três hormônios que são sintetizados pela enzima aromatase presente nas células da granulosa: a estrona, o estradiol e o estriol. Eles têm, na mulher, várias funções: • Originam o aparecimento de características sexuais secundárias femininas (alargamento dos quadris, aparecimento de pelos pubianos e de mamas etc.). • Induzem a proliferação das células uterinas, (miométrio e endométrio) e de vários outros tecidos. • Estimulam o crescimento rápido de todos os ossos logo após a puberdade, porém promovem o rápido fechamento das epífises, o que resulta em término do crescimento depois dos primeiros anos da puberdade. • Modulam o comportamento sexual feminino. 46 Unidade I Observação O aumento da sinalização mediada pelos estrógenos está relacionado com o aparecimento de diversos tipos de câncer, incluindo o câncer de mama. O estradiol é o principal hormônio liberado na primeira fase do ciclo menstrual. A sua produção começa na adolescência e continua até a menopausa. É ele o hormônio responsável pelo feedback negativo sobre a produção de FSH na primeira fase do ciclo, mecanismo essencial para manter níveis adequados desse hormônio na circulação. 3.3.2 Ovulação À medida que o ciclo se aproxima do momento da ovulação, o mecanismo de feedback negativo do estradiol sobre os hormônios hipofisários é inibido, e passa a ser observado feedback positivo, no qual as concentrações crescentes de estradiol estimulam secreção cada vez maior de FSH e LH. Como consequência, por volta do 14º dia, são observados picos de FSH e de LH. O pico de LH é muito maior do que o de FSH (a concentração de LH aumenta cerca de 10 vezes, enquanto a de FSH sobe de duas a três vezes apenas) e, por esse motivo, é denominado “surto” de LH. O LH é um hormônio importante durante a fase final do crescimento folicular e durante a ovulação. Com o FSH, esse hormônio promove o aumento da secreção de líquidos no folículo maduro e a produção, pelas células da teca, de enzimas proteolíticas que digerirão a membrana basal do folículo. Esses eventos culminam com o rompimento do folículo e a expulsão do ovócito secundário. Durante esse evento, o ovócito desliga-se do cumulus oophorus e é liberado, com as células da corona radiata, para a cavidade abdominal, a partir daqual é captada pelas tubas uterinas. Além disso, sob ação do LH, os ovários passam a produzir mais progesterona, e a secreção de estrógenos diminui. A progesterona é um hormônio essencial durante a segunda fase do ciclo sexual feminino. 3.3.3 Fase lútea: a segunda fase do ciclo sexual No início da fase lútea, as células da granulosa que constituíam o folículo ovariano rompido diferenciam-se em células luteínicas e passam a constituir uma estrutura denominada corpo amarelo ou corpo lúteo. O corpo lúteo, sob ação do LH que predomina durante essa fase, secreta altas concentrações de progesterona, hormônio essencial para a manutenção do endométrio, que proliferou intensamente durante a primeira fase. O corpo lúteo também secreta estrógenos, todavia em menor concentração. Com a progressão da fase lútea, os estrógenos e a progesterona produzidos pelo corpo lúteo exercem feedback negativo sobre a secreção de LH e FSH e, como consequência, a secreção desses hormônios diminui progressivamente. Há ainda secreção de pequenas quantidades de inibina pelas células luteínicas, o que intensifica o mecanismo de feedback negativo. 47 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Com a queda dos níveis de LH no sangue, a manutenção do corpo lúteo é impossibilitada. A partir desse momento, que ocorre cerca de 14 dias após a ovulação, são possíveis dois cenários: • Se não houver implantação de um embrião no útero, ocorre atrofia do corpo lúteo, que forma uma cicatriz denominada corpo albicans. Como consequência, a secreção de progesterona diminui e o endométrio descama, o que marca o início do período menstrual. • Se houver implantação de um embrião no útero, a síntese de gonadotrofina coriônica humana (hCG) é iniciada, o que possibilita a manutenção do corpo lúteo e, consequentemente, da secreção de progesterona por essa estrutura. A progesterona apresenta como principais funções a indução da secreção e decidualização do endométrio, a manutenção da gestação, a inibição das contrações uterinas e o desenvolvimento glandular das mamas. As concentrações plasmáticas dos hormônios hipofisários e ovarianos durante o ciclo sexual feminino estão representadas na figura a seguir. 0 0 200 400 600 800 0 0 200 400 600 800 8 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 Dias do ciclo sexual feminino FS H e LH (n g/ m L) Es tr ad io l ( pg /m L) Pr og es te ro na (n g/ m L) Progesterona LH FSH M en st ru aç ão Ov ul aç ão Es tra dio l Ov ul aç ão Figura 24 – Variações nos níveis circulantes de hormônios femininos durante o ciclo sexual Fonte: Guyton (2006, p. 787). 48 Unidade I 3.4 Métodos de contracepção A concepção ocorre quando um espermatozoide encontra e fertiliza um ovócito secundário nas tubas uterinas. Existem vários métodos que visam a impedir esse evento e, portanto, diminuem a chance de uma gestação indesejada. Os contraceptivos podem ser divididos em duas classes: os métodos de barreira e os métodos hormonais. A eficácia dos métodos contraceptivos varia amplamente e, por esse motivo, recomenda-se que mais de um método seja associado. A principal associação envolve o uso de um contraceptivo hormonal e preservativo, masculino ou feminino, pois somente esses dois últimos também protegem contra infecções sexualmente transmissíveis (ISTs). 3.4.1 Métodos de barreira Os métodos de barreira são removíveis e atuam impedindo a entrada dos espermatozoides no útero. Os principais são: • Preservativo masculino e preservativo feminino (camisinha masculina e feminina): são confeccionados com látex e, além de impedir a concepção, protegem contra ISTs. • Diafragma: dispositivo de silicone, em forma de cúpula, que é posicionado no colo uterino, de modo a formar uma barreira para a entrada dos espermatozoides no útero. Geralmente, é utilizado com um gel espermicida. • Géis espermicidas: são géis que devem ser inseridos na vagina cerca de 15 minutos antes da relação sexual. Inviabilizam os espermatozoides e devem ser associados a outro método contraceptivo. • Dispositivo intrauterino (DIU): trata-se de um objeto flexível, em forma de T, que é inserido no útero. É o único método de barreira que permanece no organismo feminino continuamente, e deve ser inserido por um médico. 3.4.2 Métodos hormonais Os métodos hormonais alteram o balanço hormonal existente no organismo feminino e, assim, impedem a ovulação. São constituídos de derivados do estrógeno e da progesterona que, ao atingirem a circulação sistêmica, potencializam o mecanismo de feedback negativo sobre o eixo hipotálamo- hipófise-ovários. Como consequência, não há produção de FSH e de LH suficientes para que haja o crescimento folicular e a ovulação. Os principais são: 49 REPRODUÇÃO ASSISTIDA • Contraceptivo oral combinado (pílula combinada): é constituído de um derivado estrogênico e de um derivado progestagênico. Devem ser tomados diariamente, por via oral, no mesmo horário, para que a contracepção seja efetiva. • Contraceptivo hormonal injetável: os hormônios derivados do estrógeno e da progesterona (ou somente um derivado progestagênico) são administrados por via intramuscular, mensal ou trimestralmente, dependendo da formulação. É uma alternativa para as mulheres que se esquecem de tomar o contraceptivo oral diariamente. • Adesivo hormonal transdérmico: uma alternativa de administração aos derivados do estrógeno e da progesterona. Esses hormônios ficam impregnados em um adesivo que é posicionado na pele, e são liberados continuamente durante o ciclo. • Anel vaginal: é um anel fino e flexível que deve ser colocado na vagina, também contém derivados do estrógeno e da progesterona que impedem a ovulação pelo mecanismo anteriormente detalhado. • Contraceptivo hormonal de emergência (pílula do dia seguinte): é constituído de altas doses de um derivado da progesterona que, além de inibir a ovulação, torna o muco cervical inviável para a passagem do espermatozoide. Deve ser utilizado após o ato sexual, nas vezes em que a contracepção inicial falhou. Saiba mais O Ministério da Saúde disponibiliza, em seu site, apostilas que detalham as vantagens e desvantagens dos principais métodos anticoncepcionais. Consulte-as! Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br. Acesso em: 23 jan. 2024. 50 Unidade I Região determinante do sexo no cromossomo Y nas células germinativas embrionárias (gene SRY) Proteína determinante dos testículos — SRY Múltiplas proteínas que levam à diferenciação da medula da gônada em testículo Células de Sertoli Células intersticiais Testosterona Hormônio anti-mülleriano secretam Regressão dos ductos de Müller – Desenvolvimento dos ductos de Wolff em estruturas acessórias – Desenvolvimento da genitália externa masculina (via DHT) produz inicia a produção de que têm secretam secretam controla causa Figura 25 – Desenvolvimento embrionário masculino. O gene SRY determina o desenvolvimento masculino Fonte: Silverthorn (2017, p. 845). Saiba mais Tradicionalmente, a determinação do sexo se baseia na aparência da genitália externa ao nascimento, mas a ideia de permitir que os indivíduos escolham seu sexo quando se tornarem capazes de decidir está ganhando terreno. A identificação sexual de cada pessoa é chamada de identidade de gênero. Leia e aprenda mais sobre os critérios atuais utilizados para decidir o sexo das crianças com genitália ambígua na seguinte declaração: AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS. Avaliação de neonatos com anomalia de desenvolvimento na genitália externa. Pediatrics, v. 106, n. 1, p. 138-142, jul. 2000. 51 REPRODUÇÃO ASSISTIDA 4 INFERTILIDADE E SUAS CAUSAS Para que ocorra fertilização, é necessário que o casal seja fértil. Um homem é fértil quando ele é capaz de engravidar uma mulher. A mulher, por sua vez, é fértil quando é capaz de engravidar e gerar filhos. É esperado que, se um casal é fértil e tem relações sexuais periódicas sem usar nenhum tipo de contracepção, a gestação da mulher ocorra atéum ano a partir da primeira tentativa. Portanto, a infertilidade pode ser definida como a incapacidade de um casal alcançar a concepção ou levar uma concepção a termo após um ano ou mais de relações sexuais regulares, sem proteção contraceptiva. O conceito engloba tanto a falha na fertilização quanto a impossibilidade de levar a gestação até o final. A infertilidade vem aumentando nos tempos modernos, por vários motivos: • Muitos casais estão optando por ter filhos mais tarde, e é sabido que a fertilidade, principalmente a feminina, decai significativamente a partir dos 35 anos. • O estilo de vida moderno, que inclui, muitas vezes, uma rotina estressante, pode causar diminuição da fertilidade. Altos níveis plasmáticos de cortisol, o “hormônio do estresse”, já foram relacionados com a infertilidade. Entramos em contato, diariamente, com uma série de substâncias que apresentam efeitos deletérios sobre a fertilidade, como, por exemplo, os disruptores endócrinos, capazes de alterar a secreção de hormônios sexuais e, assim, a função reprodutiva. O aumento do número de parceiros sexuais e a falha no uso de preservativos, o que predispõe os indivíduos a infecções sexualmente transmissíveis que, muitas vezes, causam infertilidade. A infertilidade pode ser classificada em primária e secundária. A primária é a incapacidade fisiológica de uma primeira gestação; e a secundária, ocorre quando o casal encontra dificuldades de conceber uma gestação, ainda que já tenha conseguido pelo menos uma em conjunto. A infertilidade primária é mais prevalente entre mulheres jovens (20 a 24 anos), enquanto a fertilidade secundária está fortemente relacionada com a idade materna, podendo atingir 27,1% das mulheres entre 40 e 44 anos (Mascarenhas et al., 2012). A prevalência da infertilidade também varia quando países desenvolvidos e subdesenvolvidos são comparados. Nos primeiros, varia de 3,5 a 16,7% dos casais, e se deve principalmente à idade da mulher; nos países subdesenvolvidos, varia de 6,9 a 9,3% e tem como importante fator as infecções sexualmente transmissíveis e as sequelas de abortos inseguros. No Brasil, estima-se que mais de 278 mil casais tenham dificuldade para gerar um filho em algum momento de sua idade fértil (Brasil, 2011). 52 Unidade I Observação A Política Nacional de Atenção Integral em Reprodução Humana Assistida (Portaria n. 426/GM, de 2005) oferece diagnóstico e tratamento da infertilidade no âmbito do SUS. O estudo de Basu (2011) exibiu uma pesquisa da Organização Mundial de Saúde (OMS), com 7273 casais inférteis e mostrou que 24% dos casos de infertilidade foram devidos somente a fatores masculinos; 41%, a fatores femininos, isoladamente; e 24%, a fatores femininos e masculinos combinados. Quando não se consegue diagnosticar as causas da infertilidade de um casal, dizemos que a infertilidade é idiopática (sem causa conhecida). Os casos de infertilidade idiopática corresponderam a 11% do total. 4.1 Principais causas da infertilidade masculina As principais causas da infertilidade masculina são: • Ausência total (azoospermia) ou parcial (oligozoospermia) de espermatozoides, por falha na espermatogênese ou por obstrução nas vias espermáticas. • Alterações na motilidade (astenozoospermia) e no formato (teratozoospermia) dos espermatozoides. • Desenvolvimento de resposta imunológica contra os espermatozoides, o que envolve a produção de anticorpos antiespermatozoide. • Infecções (epididimites, prostatites, uretrites e infecções urinárias). • Criptorquidia (testículos que não desceram para o escroto durante o período fetal). • Varicocele, que é a dilatação das veias do cordão espermático. • O consumo de tabaco e de etanol, entre outras substâncias. • O aumento da temperatura na região dos testículos, causado pelo uso de calças apertadas ou de dispositivos eletrônicos no colo (por exemplo, laptops). • A alteração dos níveis plasmáticos de testosterona, FSH e LH. A infertilidade pode ser decorrente de níveis insuficientes de testosterona para sustentar a espermatogênese. Os níveis plasmáticos desse hormônio variam durante a vida do homem. Durante o período fetal, mais especificamente no 3º e 6º meses de gestação, são observados dois picos na secreção de testosterona, importantes para promover o desenvolvimento dos órgãos sexuais e estabelecer o padrão comportamental masculino. Os níveis de testosterona então caem e permanecem 53 REPRODUÇÃO ASSISTIDA indetectáveis até a puberdade, a partir da qual aumentam gradativamente até atingir os níveis observados no adulto (aproximadamente 500 ng/dL), permanecendo nesse patamar até a senescência, quando começam a decair. Portanto, podemos dizer que a fertilidade masculina também diminui com a idade, embora esse efeito seja mais sutil do que o observado nas mulheres. As principais infecções genitais masculinas estão associadas à manipulação do trato urinário e à doença prostática. Alguns exemplos de infecções que alteram a fertilidade são o tracoma, a gonorreia, a tuberculose e a varíola. Na vigência de uma infecção, pode-se observar um grande aumento de leucócitos no sêmen em pacientes com processo infeccioso ou inflamatório. É necessário realizar a cultura do sêmen e o antibiograma, a fim de avaliar qual o melhor antibiótico para tratar o caso. A criptorquidia é o quadro relacionado com a não descida dos testículos para o escroto durante o período fetal. Esse quadro está ligado à infertilidade pois, para que ocorra a espermatogênese, a temperatura dos testículos precisa ser aproximadamente 2 °C menor que a temperatura corporal (ou seja, em torno dos 35 °C). É por esse motivo que o escroto se localiza fora do abdome e da pelve. O processo de descida testicular ocorre em duas fases distintas e sequenciais: a fase intra-abdominal e a fase inguinoescrotal. Embora o controle hormonal da descida testicular não seja ainda completamente compreendido, andrógenos e hormônios pituitários claramente desempenham papéis essenciais na mediação do segundo estágio da descida. Na ausência de testosterona produzida pelas células de Leydig, ou no caso de receptores de andrógenos não funcionais ou ausentes, a descida testicular é retida na fase inguinoescrotal. As células de Leydig produzem um fator denominado fator semelhante à insulina 3 (Insl3) ou à relaxina. Hormônios esteroides como estradiol e dietilestilbestrol podem regular negativamente a expressão de Insl3 nas células de Leydig, proporcionando, assim, uma explicação do motivo pelo qual a exposição excessiva no útero de embriões masculinos a andrógenos provoca criptorquidia. Criptorquidia é a falha de ambos ou de um único testículo em descer para o escroto. Embora muitas crianças possam ser criptorquídicas ao nascimento, na maioria das vezes os testículos descem espontaneamente até os 3 meses de idade. A criptorquidia é muito comum, com incidência de 1% a 4% entre os nascidos vivos do sexo masculino. Se um testículo não desce até 4 a 6 meses, ele é trazido para baixo cirurgicamente (orquidopexia). Os pacientes com testículos criptorquídicos têm risco aumentado de desenvolver câncer de testículo e de tornarem-se irreversivelmente inférteis. Como o ambiente testicular masculino normal é geralmente 3 a 5 graus mais frio do que a temperatura abdominal, a temperatura abdominal mais alta reduz o número de espermatogônias adultas tipo A disponíveis para espermatogênese e promove a transformação de células germinativas em células carcinomatosas se a descida for adiada para além de 1 a 2 anos de idade. Aumento da temperatura dos testículos, decorrente do uso de calças apertadas ou do uso de aparelhos eletrônicos no colo, também impede a espermatogênese. 54 Unidade I Outra alteração anatômica dos testículos que causa diminuição da fertilidade é a varicocele. Ela é decorrente da dilatação das veias do plexo pampiniforme do escroto, e causa diminuição do tamanho dos testículos, aumento da temperatura (por crescimento do fluxo sanguíneo),elevação da produção de radicais livres e disfunção hormonal, entre outros. É a causa mais comum de infertilidade adquirida, e pode ser corrigida cirurgicamente. Normal Varicocele Figura 26 – Imagem mostrando a varicocele, com dilatação das veias no escroto Disponível em: http://tinyurl.com/4xbp9baz. Acesso em: 23 jan. 2024. Em relação ao uso de substâncias, existem trabalhos que correlacionam o consumo excessivo de tabaco com a diminuição da contagem de espermatozoides e com alterações na integridade do DNA dessas células. Outras substâncias que podem, efetivamente, resultar em danos na função testicular são o etanol, a maconha e a cafeína em excesso. Saiba mais Com o objetivo de aprender mais sobre a infertilidade masculina, leia a seguinte obra: ROSENBLATT, C. et al. Infertilidade masculina: novos conceitos. Prática Hospitalar, ano XII, n. 71, 2010. 55 REPRODUÇÃO ASSISTIDA 4.2 Anormalidades do espermatozoide Erros na espermatogênese ou na espermiogênese são comuns. O exame de uma amostra de esperma revelará espermatozoides com anormalidades, como cabeças pequenas, estreitas ou piriformes (forma de pera), cabeças duplas ou triplas, defeitos acrossômicos e caudas duplas. Se pelo menos 50% dos espermatozoides em um ejaculado tiverem morfologia normal, não é esperado que a fertilidade seja prejudicada. Se tiverem um número maior de espermatozoides anormais (chamado de teratospermia se for excessivo), poderá haver infertilidade. Espermatozoides com cabeça oval constituem 30% no organismo do homem e precisam ter essa forma normal para que exista a fecundação. Para os casos em que o acrossomo apresenta defeitos (condensação) ou até mesmo é ausente, a penetração torna-se impossível. Alguns espermatozoides terão defeitos na cabeça, sendo por exemplo a cabeça pequena com pouca propulsão da calda, onde sai desorientado e o material genético presente, fica comprometido ou com poucas enzimas, o que impediria que ele penetrasse o óvulo, mesmo que conseguisse encontrá-lo. Espermatozoides da cabeça grande se tornam pesados e, portanto, ocorre dificuldade de locomoção, podendo não passar da entrada do colo do útero. Aqueles com a cabeça dupla, se mexem, mas não conseguem sair do lugar e, além de não alcançarem o óvulo, atrapalham a movimentação dos demais que estão tentando passar. Quando os defeitos são na cauda, como, por exemplo, a cauda bífida ou dupla, não há sincronia no movimento, já que cada uma empurra para um lado e acabam não indo a lugar nenhum. Por conta do excesso de esforço, espermatozoides com cauda bífida acabam morrendo antes e os espermatozoides com cauda curta não conseguem ter velocidade suficiente para “nadar” ao encontro do óvulo e morrem de exaustão. Espermatozoide normal com medidas Defeitos de cabeça Defeitos de peça intermediária Defeitos de cauda Cabeça 2,5 a 3,5 µm Cabeça 5,0 a 6,0 µm 45 µm Peça intermediária 1,5 vez a cabeça Cauda 1) Fusiforme 1) Cauda curta 1) Peça dobrada 2) Cauda dobrada 2) Inserção anômala 3) Cauda enrolada 3) Peça grossa 4) Peça fina 5) Excesso de citoplasma residual 2) Piriforme 3) Cabeça redonda 4) Cabeça amorfa 6) Macrocefálico5) Vacuolado 7) Microcefálico Globozoospermia Acrossomo pequeno Figura 27 – Imagem ilustrativa de algumas alterações morfológicas dos espermatozoides Fonte: Feijó et al. (2012, p. 50). 56 Unidade I 4.3 Espermograma O espermograma é o exame solicitado pelo médico para avaliar a fertilidade masculina, sendo a capacidade funcional do espermatozoide o preditor do prognóstico de fertilidade e não sua quantidade ou número absoluto. Para esse exame, o paciente precisa ter abstinência sexual de 48 a 72 horas e a amostra deverá ser realizada por masturbação, em um local apropriado da clínica. O espermograma será repetido entre 15 e 90 dias para comparar alguns parâmetros, como o volume ejaculado, a motilidade do espermatozoide e o grau de excitabilidade no ato da coleta. Saiba mais As principais técnicas de análise do sêmen estão descritas em: WORLD HEALTH ORGANIZATION. WHO laboratory manual for the examination and processing of human semen. 5. ed. 2010. Disponível em: http://tinyurl.com/mr377x4e. Acesso em: 23 jan. 2024. A) B) D) C) Figura 28 – Câmaras de contagem utilizadas para análise da motilidade espermática: A) câmara de Makler; B) Microcell; C) Horwell; D) Câmara de Neubauer modificada (à esquerda). No centro, ilustração representando seu retículo central, que contém 25 quadrados subdivididos em 16 quadrados menores. À direita, fotomicrografia mostrando um dos 25 quadrados do retículo central da câmara, delimitado por linhas triplas e contendo 16 quadrados menores, nos quais se observam os espermatozoides Fonte: Feijó et al. (2012, p. 49). 4.3.1 Motilidade espermática A motilidade é avaliada em categorias, pela movimentação dos espermatozoides (como mostrado anteriormente), sendo: • A: rápido e linear. • B: lento, linear ou não linear. 57 REPRODUÇÃO ASSISTIDA • C: não progressivo. • D: imóveis. A Organização Mundial de Saúde (2018) publicou que as categorias A + B, consideradas normais, devem ser superiores a 32% no resultado do espermograma. Uma ejaculação é considerada normal para a quantidade de mais de 100 milhões de espermatozoides por mililitro de sêmen, com alta probabilidade de fertilidade quando 50% deles continuam móveis após 2 horas da ejaculação e alguns devem estar móveis após 24 horas. Também há probabilidade de fertilidade quando houver uma ejaculação entre 20 e 50 milhões de espermatozoides por mililitro de sêmen. Uma amostra é considerada como menos provável de ser fértil quando há menos de 10 milhões de espermatozoides por mililitro de sêmen, especialmente quando a amostra contém espermatozoides imóveis e defeituosos. 4.4 Principais causas da infertilidade feminina A infertilidade feminina tem íntima relação com a idade da mulher. É observada queda significativa da fertilidade à medida que a mulher se aproxima do climatério, período cerca de 10 anos antes da menopausa. Uma vez que a menopausa, na maioria das mulheres, se estabelece ao redor dos 50 anos, o climatério tem início aos 40 anos. Observação Com a idade, a redução da fertilidade feminina é tão significativa que, a partir dos 35 anos, deve-se considerar tratamento após seis meses de tentativas de engravidar. De acordo com Passos, Almeida e Fagundes (2007), os principais fatores relacionados à diminuição da fertilidade feminina são a redução da reserva ovariana; o envelhecimento dos ovócitos que ainda não sofreram ovulação; o aumento das anormalidades cromossômicas nos ovócitos; o crescimento da probabilidade de desenvolver endometriose, infecções pélvicas, o decréscimo da libido e, consequentemente, da frequência das relações sexuais. Além da idade, os principais fatores que estão relacionados com a infertilidade feminina são: • Disfunção tubária, causada pela obstrução da tuba uterina ou pela alteração nas células do epitélio do órgão. • História prévia de oligomenorreia (diminuição da frequência menstrual) e também de outras disfunções menstruais. • Presença de endométrio fora da cavidade uterina (endometriose). 58 Unidade I • Síndrome dos ovários policísticos. • Muco cervical incompetente, que não permite capacitação do espermatozoide e seu deslocamento até as tubas uterinas. • Doença inflamatória pélvica. • Abortamentos de repetição. • Presença de autoanticorpos. • Exposição ao tabaco, às bebidas alcóolicas e a outras drogas. • Exposição a poluentes ambientais conhecidos como disruptores endócrinos. 4.4.1 Anomalias relacionadas à infertilidade feminina O número dos ovócitos, assim como sua qualidade, começam a diminuir aos 30 anos em média e essa queda acelera após os 40 anos. Isso pode ser acompanhado através de exames de sangue para verificar os níveis dos hormônios relacionados à liberação de ovócitos. Também podem ser vistos e contados os números de folículos, através de ultrassonografiados ovários. Outra causa da redução de ovócitos. está relacionada a anomalias nos ovários, chamada de insuficiência ovariana (menopausa precoce), reduzindo o número de ovócitos de forma precoce, sendo uma das causas de menstruações irregulares ou falta de menstruação, que também podem ser detectadas por exame de sangue, quando é medida a concentração do hormônio foliculoestimulante e do estrogênio e ultrassonografia. Estão comumente relacionadas em mulheres acima de 35 anos, ou que passaram por cirurgia de ovário ou que responderam mal a medicamentos para fertilidade (gonadotrofina) estimuladores de liberação e amadurecimento de ovócitos. Problemas nos ovócitos geralmente resultam em elevação nos níveis do hormônio foliculoestimulante e redução nos níveis de estrogênio no início do ciclo menstrual. Lembrete A mulher pode ter infertilidade se o número de ovócitos nos ovários for baixo ou se os ovócitos não estiverem funcionando bem. A tuba uterina também pode apresentar problemas que virão a bloquear a passagem de espermatozoides. As causas são várias, tais como endometriose, cirurgia de pelve ou de abdome, gravidez ectópica, inflamação bacteriana, podendo causar danos permanentes ao órgão. Daí a grande importância de exames preventivos de rotina para se detectar infecções sexualmente transmissíveis. 59 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Observação Na endometriose, o tecido endometrial se implanta fora da cavidade uterina. Esse tecido permanece funcional, ou seja, responde aos hormônios femininos. Como resultado, ocorre proliferação dessas células em resposta ao estrógeno secretado na primeira fase do ciclo sexual feminino e descamação como consequência da queda dos níveis de progesterona ao final da segunda fase do ciclo. As consequências da endometriose variam de acordo com o tecido afetado e, se ocorrer implantação no tecido dos ovários ou nas tubas uterinas, pode haver infertilidade. A oligomenorreia é uma disfunção menstrual que se caracteriza pelo aumento da duração do ciclo menstrual para 35 dias ou mais. Pode ser uma manifestação da anovulação crônica decorrente de disfunções no eixo hipotálamo-ovários. Portanto, os níveis desses hormônios em diferentes etapas do ciclo sexual devem ser avaliados. Atualmente, sabe-se que não apenas a oligomenorreia, mas outras disfunções, estão relacionadas com a infertilidade. Entre elas, estão a hipermenorreia (sangramento menstrual dura mais de 8 dias), a hipomenorreia (sangramento menstrual dura 3 dias ou menos), polimenorreia (ciclo menstrual com duração inferior a 24 dias), a metrorragia (sangramento uterino fora do período menstrual) e a menometrorragia (sangramento que ocorre durante o período menstrual e fora dele). A síndrome dos ovários policísticos, ou SOP, acomete de 5 a 10% das mulheres na idade reprodutiva ao redor do mundo e é caracterizada pelos seguintes fatores: irregularidade menstrual, anovulação crônica e hiperandrogenismo clínico. É responsável por quase metade dos casos de infertilidade feminina. Figura 29 – Síndrome do ovário policístico do lado direito Disponível em: http://tinyurl.com/bdzdbx9h. Acesso em: 23 jan. 2024. 60 Unidade I Essa doença é causada por alterações no mecanismo de feedback negativo do eixo hipotálamo-hipófise-ovários, em decorrência do aumento na secreção de GnRH pelo hipotálamo. Como consequência, observa-se elevação da relação entre os níveis plasmáticos de LH e FSH, o que faz com que a produção de hormônios androgênicos pelos folículos em maturação aumente e ocorra falência na ovulação. Na ausência de ovulação, os folículos em maturação não sofrem atresia, e continuam secretando hormônios sexuais femininos e masculinos em excesso, principalmente os últimos. Ao exame de ultrassonografia, esses folículos são percebidos como cistos, daí o nome da síndrome. Na SOP, a exposição a altos níveis dos hormônios sexuais pode causar amadurecimento sexual precoce, obesidade, resistência insulínica, aparecimento de acne, hirsutismo, amenorreia primária associada à obesidade, irregularidades menstruais, consumo folicular e diminuição da reserva ovariana. Saiba mais O seguinte artigo discute as alterações metabólicas envolvidas na SOP: ÁVILA, M. et al. Síndrome dos ovários policísticos: implicações da disfunção metabólica. Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, v. 41, n. 2, p. 106-111, 2014. Disponível em: http://tinyurl.com/akc8wk5k. Acesso em: 23 jan. 2024. O muco cervical é espesso e se encontra na parte inferior do útero que se abre para dentro da vagina, sendo secretado pelas glândulas no colo do útero. Antes da ovulação o espermatozoide não consegue penetrar o muco, então quando o ovócito for liberado este muco se tornará claro e elástico devido à concentração de estrogênio e aí o espermatozoide se movimentará em busca da fecundação de forma mais facilitada. O muco cervical, quando anômalo, pode impedir a entrada dos espermatozoides no útero, porém não é a principal causa de infertilidade, mas em mulheres que apresentam infecção cervical ou estenose cervical, esse pode ser um problema de infertilidade. Com isso, quando há o muco anômalo após ocorrer a ovulação, ele pode não mudar e continuar espesso, dificultando a gravidez ou facilitando a entrada de bactérias que habitam a vagina e o útero, podendo causar infecções (cervicite) e matar os espermatozoides. Os disruptores endócrinos são substâncias químicas, naturais ou sintéticas, que estão presentes na composição de plásticos e de outros derivados do petróleo e em alguns fungicidas, pesticidas e inseticidas, entre outros. Essas substâncias apresentam ação antiandrogênica e estrogênica e, por esse motivo, são capazes de alterar a regulação da função reprodutiva feminina e masculina (Lara; Duarte; Reis, 2011). 61 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Alguns desses compostos têm a capacidade de permanecer no meio ambiente por um longo período e, uma vez que entram em contato com o organismo, tendem a se acumular nele. Como resultado, são observadas alterações da função sexual e reprodutiva mesmo muito tempo após a exposição. De acordo com Lara, Duarte e Reis (2011), diversos estudos, realizados em animais e em seres humanos, mostram que a exposição crônica aos disruptores endócrinos leva à diminuição da taxa de fecundidade. A exposição durante a vida embrionária e fetal pode, inclusive, causar uma série de alterações, como malformações anatomia da genitália externa. O bisfenol A, por exemplo, é um disruptor endócrino presente em alguns tipos de plástico utilizados para armazenar alimentos, garrafas de água e de refrigerantes, latas de alimentos em conserva, brinquedos, cosméticos e no papel térmico, aquele utilizado em extratos de bancos. Quando um recipiente contendo bisfenol A entra em contato com alimentos muito quentes, ou é colocado no micro-ondas, essa substância contamina o alimento e acaba sendo consumida, o que pode levar à diminuição da contagem de espermatozoides, ao aumento da incidência de abortos e aos cânceres de mama e próstata. Nos últimos anos, tem-se discutido o uso, por lactentes, de mamadeiras contendo bisfenol A, pois esse disruptor endócrino tem o potencial de causar problemas reprodutivos futuros a partir da exposição na infância. Para identificar produtos que contenham bisfenol A, deve-se observar, nas embalagens, a presença dos números 3 ou 7 no símbolo de reciclagem do plástico. 4.5 Diagnóstico da infertilidade feminina A avaliação da fertilidade feminina é feita por ultrassonografia transvaginal, dosagens hormonais, investigação de infecções sexualmente transmissíveis, análise do muco cervical e por outros métodos de imagem (laparoscopia e ressonância magnética pélvica). A ultrassonografia é um exame que se baseia na emissão de ondas sonoras de alta frequência que, ao atravessar o corpo e atingir as estruturas internas, as ondas ultrassônicas retornam para o transdutor como um eco, o que permite determinar a localização, o tamanho e a textura dessas estruturas.De acordo com a composição do tecido a ser analisado, ele pode ser percebido como imagens claras ou escuras. Estruturas preenchidas de líquidos, por exemplo, são visualizadas em preto. A ultrassonografia é o exame de escolha para acompanhar o desenvolvimento do embrião e do feto durante a gestação e é o primeiro exame a ser solicitado no diagnóstico da infertilidade. A partir da ultrassonografia transvaginal, é possível avaliar se há alguma anormalidade na estrutura das tubas uterinas e do útero, detectar a presença de miomas e de pólipos, medir a espessura do endométrio e diagnosticar a síndrome dos ovários policísticos. Na síndrome dos ovários policísticos, as imagens ultrassonográficas mostram a presença de 12 ou mais folículos periféricos, medindo entre 2 e 9 mm de diâmetro médio e volume ovariano de 10 cm3 ou mais. 62 Unidade I A avaliação morfológica do útero e das tubas pode também ser realizada por laparoscopia, na qual uma câmera é inserida na cavidade uterina, e as imagens de vídeo são analisadas em uma tela. O exame permite detectar aderências, miomas, pólipos, cistos e obstruções tubárias. O teste pós-coito ou teste de penetração em muco cervical é realizado no período fértil da mulher (período ovulatório), onde o casal deve ter relação sexual ao menos 4 horas antes do exame, onde deverá ser aspirado uma gota de muco cervical em uma lâmina e avaliar no microscópio a presença de ao menos 20 espermatozoides por campo, no qual se faz a leitura de associação da concentração de esperma maior que 20 milhões/ml, para verificar a receptividade do muco cervical, sua capacidade de penetração no muco cervical, a motilidade no muco e a sobrevida dos espermatozoides. Várias alterações hormonais têm relação com o estabelecimento da fertilidade feminina. Por esse motivo, dosagens dos hormônios tireoidianos, hipofisários, adrenais e ovarianos são realizados rotineiramente na investigação da infertilidade. Observação O hipotireoidismo é uma condição muito relacionada à infertilidade, pois aumenta o risco de abortamentos e pode causar falência ovariana. As dosagens de FSH são importantes para avaliação da função reprodutiva feminina. Com a idade, os níveis de FSH, hormônio responsável pela maturação do folículo ovariano, aumentam. O aumento dos níveis de FSH está intimamente ligado à diminuição da efetividade do mecanismo de feedback negativo sobre a secreção de FSH pela hipófise, que ocorre naturalmente com o avançar da idade. São considerados normais níveis plasmáticos de FSH abaixo de 12 mUI/mL, quando esse hormônio é avaliado no terceiro dia do ciclo ovariano. Outras alterações hormonais que podem indicar redução da fertilidade são: • Diminuição ou aumento dos níveis plasmáticos de estradiol (concentrações plasmáticas menores do que 20 pg/mL ou maiores que 80 pg/mL são indicativos de diminuição da função ovariana). • Diminuição das concentrações de inibina no sangue (lembre-se que esse hormônio participa do feedback negativo sobre a secreção de FSH e, portanto, a redução dos seus níveis plasmáticos é responsável por elevar a liberação desse hormônio hipofisário). • Diminuição da secreção de hormônio antimülleriano (ele é produzido pelas células da granulosa do folículo ovariano, e a queda nos seus níveis plasmáticos é um dos indicativos mais precoces da falência ovariana). O teste pós-coito ou teste de penetração em muco cervical é realizado no período fértil da mulher (período ovulatório), quando o casal deve ter relação sexual ao menos 4 horas antes do exame, devendo ser aspirada uma gota de muco cervical em uma lâmina e avaliada no microscópio a presença de ao menos 63 REPRODUÇÃO ASSISTIDA 20 espermatozoides por campo, no qual se faz a leitura de associação da concentração de esperma maior que 20 milhões/ml, para verificar a receptividade do muco cervical, sua capacidade de penetração no muco cervical, a motilidade no muco e a sobrevida dos espermatozoides. 4.5.1 Cariótipo Caso não seja identificada nenhuma anormalidade aparente da função reprodutiva, deve-se realizar o cariótipo de ambos os membros do casal. O cariótipo é a análise do conjunto diploide de cromossomos das células somáticas de um organismo. A partir dessa análise, é possível avaliar a presença de alterações no número e na estrutura dos cromossomos, e sua relação com a infertilidade e os casos de abortos de repetição. Para a realização do cariótipo, os leucócitos do sangue são isolados e mantidos na etapa da metáfase da mitose. Os cromossomos presentes no núcleo, cada um contendo uma cromátide-irmã, são isolados e corados, o que permite a identificação de cada par cromossômico. A técnica mais utilizada para a coloração dos cromossomos é bandeamento G. De acordo com o padrão de bandas observado após a coloração, é feito o pareamento de todos os cromossomos, o que permite sua análise detalhada. A figura a seguir mostra um cariograma, o resultado de um cariótipo. X/Y 18 5 12 15 3 8 22 17 4 11 14 2 7 21 16 109 13 1 6 2019 Figura 30 – Cariótipo normal de um indivíduo do sexo masculino normal, indicando os 22 pares de autossomos e os cromossomos sexuais, X e Y. Alterações n padrão de bandeamento e no número de cromossomos são causa frequente de infertilidade Disponível em: http://tinyurl.com/6dxvdxhs. Acesso em: 23 jan. 2024. Exemplos de alterações no cariótipo relacionados com a infertilidade são a trissomia do cromossomo X em mulheres, e a síndrome do X frágil em homens. A síndrome do triplo X acomete 1 a cada 1000 mulheres nascidas vivas, portanto não é muito rara. Essa aneuploidia cromossômica é pouco diagnosticada, ou seja, algumas mulheres são portadoras 64 Unidade I dessa condição, tendo como característica uma estatura maior comparada à normalidade, apresentam problemas mentais e atraso na fala, além de falência ovariana prematura. A síndrome do X-frágil (FXS ou SXF) é uma alteração genética e hereditária, em que ocorre alteração do gene FRM1, presente em uma falha do cromossomo X que reduz a síntese da proteína FMRP, causando transtornos neurais. As mulheres são portadoras, mas os homens são acometidos por terem apenas um cromossomo X, levando à infertilidade. Lembrete Trissomia é a condição na qual existem três cópias de determinado cromossomo no núcleo da célula. 4.6 Tratamento da infertilidade O tratamento da infertilidade pode ser realizado por meio da administração de medicamentos, de tratamentos cirúrgicos e da aplicação das técnicas de reprodução humana assistida. Esses tratamentos podem ou não ser associados entre si de acordo com as características clínicas de cada paciente. A seguir, os principais tratamentos, dentro de cada uma das categorias, serão abordados. Lembrete A infertilidade costuma ser definida como sendo a incapacidade de engravidar após ter praticado relações sexuais regularmente por um ano sem contracepção. 4.6.1 Tratamento farmacológico O tratamento farmacológico das principais condições clínicas que afetam a fertilidade será apresentado a seguir. Os fármacos indicados para cada caso podem ter origem hormonal e não hormonal, e atuam direta e/ou indiretamente na regulação da espermatogênese e do ciclo menstrual e ovariano. 4.6.1.1 Tratamento farmacológico da infertilidade masculina O uso de suplementos alimentares contendo antioxidantes (ácido fólico, vitamina E, zinco e selênio) por homens melhora a qualidade do sêmen e aumenta as taxas de gravidez espontânea. Os baixos níveis de testosterona, que resultam na queda da espermatogênese, podem ser tratados com citrato de clomifeno ou com tamoxifeno. Esses fármacos são antagonistas do receptor de estrógeno e, assim, impedem que o estradiol promova o feedback negativo sobre a secreção hipofisária de FSH e LH. Como consequência, os níveis de LH são aumentados, o que resulta no estímulo da síntese de testosterona pelos testículos e na normalização dos níveis plasmáticos desse hormônio (Jungwirth et al., 2012). 65 REPRODUÇÃOASSISTIDA Observação No homem, o estrógeno é sintetizado pela aromatase, a partir da testosterona. Altos níveis de estrógeno estão relacionados à inibição do eixo hipotálamo-hipófise-testículo, pelo mecanismo de feedback negativo. Os análogos do GnRH, quando administrados de maneira pulsátil, estimulam diretamente a hipófise, o que resulta na no aumento dos níveis de FSH e LH. Esse tratamento é útil nos casos de hipogonadismo hipogonadotrófico. A gonadotrofina coriônica humana (hCG) é o fármaco de escolha para estimular a espermatogênese. Esse hormônio apresenta similaridade biológica com o LH, e sua administração ocasiona aumento da produção de testosterona pelos testículos. O tratamento é complementado pela administração de FSH, que sustenta a espermatogênese. Observação Na mulher, o hCG é produzido pelas células do blastocisto a partir da sua implantação no endométrio. Os testes de gravidez se baseiam na detecção desse hormônio. O FSH tem duas formas de apresentação, a isolada (recombinante) e o composto de hMG (gonadotrofina menopáusica humana), que contém LH e FSH. É importante ressaltar que o tratamento da infertilidade com hormônios resulta na produção de espermatozoides em menor número e de pior qualidade do que o normal. Assim, na maioria das vezes, o casal necessitará de terapia auxiliar para que haja concepção. 4.6.1.2 Tratamento farmacológico da infertilidade feminina A síndrome dos ovários policísticos é uma síndrome anovulatória complexa causada pela presença de folículos ovarianos em estágios intermediários de maturação. Ela está relacionada com o aumento dos níveis de hormônios androgênicos e constitui uma das principais causas da infertilidade feminina. Observação Você sabia que o mês mundial da conscientização da infertilidade é junho? Ele foi estabelecido pela OMS para concentrar mais conscientização e orientação, inclusive pelo fato de muitas vezes poder ser reversível. 66 Unidade I O tratamento de primeira escolha dessa síndrome envolve o uso de contraceptivo oral combinado (pílula anticoncepcional). Os derivados estrogênicos e progestagênicos contidos nos contraceptivos são responsáveis por promover o mecanismo de feedback negativo sobre o eixo hipotálamo-hipófise-ovários, o que diminui os níveis de GnRH, FSH e LH. Como resultado, os folículos ovarianos em estágios intermediários do crescimento, que constituem os cistos ovarianos, não são estimulados e atrofiam. Os contraceptivos hormonais inibem a ovulação e, logicamente, não podem ser utilizados pelas mulheres que estão tentando engravidar. Essas mulheres podem se beneficiar do uso da metformina, fármaco usado no tratamento da diabetes tipo II. A síndrome dos ovários policísticos apresenta estreita relação com a resistência insulínica e com a hiperinsulinemia, uma vez que a sinalização mediada pela insulina está envolvida no estímulo da liberação de LH e no aumento da síntese de andrógenos pelo folículo ovariano. Por esse motivo, a metformina é útil na reversão do quadro. Bons resultados são obtidos com o uso de espironolactona, um antidiurético antagonista dos receptores de aldosterona que apresenta efeito antiandrogênico. Porém, esse medicamento não deve ser utilizado pelas pacientes que estão tentando engravidar, pois é teratogênico. Lembrete Substâncias teratogênicas são aquelas capazes de causar malformações no embrião. Observação Muitas vezes, as portadoras da síndrome dos ovários policísticos precisam estimular a ovulação utilizando clomifeno, mesmo após realizar o tratamento previamente descrito. A indução da ovulação é feita a partir da administração de citrato clomifeno, de letrozol, de análogos do GnRH ou de gonadotrofina coriônica humana. O citrato de clomifeno, conforme discutido anteriormente, é um antagonista dos receptores de estrógeno que atua inibindo o mecanismo de feedback negativo sobre a hipófise. Como resultado, a secreção de LH aumenta e atinge os valores necessários para que haja indução da ovulação. O letrozol é um inibidor da aromatase utilizado no tratamento do câncer de mama, cujo mecanismo de inibição da ovulação ainda não é completamente conhecido. Seu uso causa menos efeitos adversos do que o uso de clomifeno e, portanto, vem sendo cada vez mais empregado. 67 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Os análogos de GnRH, quando utilizados de maneira pulsátil, promovem a estimulação da hipófise, o que eleva os níveis de LH e estimula a ovulação. Devido à sua semelhança com o LH, a gonadotrofina coriônica humana (hCG) é utilizada para induzir a ovulação após a maturação do folículo (Cambiaghi, s.d.). Saiba mais A indução da ovulação ocorre a partir do pico de LH que acontece na metade do ciclo ovariano, para compreender melhor, acesse. CAMBIAGHI, A. S. Medicamentos utilizados nos tratamentos de infertilidade. IPGO, [s.d.]. Disponível em: http://tinyurl.com/4xw563fk. Acesso em: 23 jan. 2024. Após a indução da ovulação, muitas vezes é necessário realizar suporte hormonal para que haja a correta manutenção do endométrio. Para esse fim, são utilizados a progesterona injetável, que impede a descamação do endométrio, e os derivados estrogênicos, que melhoram a qualidade desse tecido. A indução da ovulação pode resultar em gravidez múltipla, devido à hiperestimulação ovariana e ruptura simultânea de mais de um folículo. Outros efeitos adversos incluem agitação, mudanças de humor, depressão, inchaço abdominal e distúrbios visuais. Portanto, deve-se evitar a realização de muitos ciclos de indução seguidos. 4.6.2 Técnicas cirúrgicas A cirurgia é indicada na reversão da vasectomia e da ligadura das tubas uterinas, na excisão dos cistos ovarianos em casos de síndrome dos ovários policísticos severa e na ressecção dos focos de endometriose. Geralmente, as cirurgias são realizadas por videolaparoscopia, que é um procedimento endoscópico no qual se insere uma câmera de vídeo na cavidade abdominal por meio de orifícios, o que permite visualizar os órgãos internos em uma tela e realizar as manipulações necessárias. Muitas vezes, pacientes que se submeteram à vasectomia e à ligadura das tubas uterinas como método contraceptivo desejam reverter a cirurgia a fim de ter filhos. A vasectomia consiste na secção dos ductos deferentes do homem, o que impede que os espermatozoides sejam conduzidos para o meio externo durante a ejaculação. Sua reversão é realizada com o auxílio de um microscópio e, durante o procedimento, é feita uma incisão no escroto, seguida da reconexão dos ductos deferentes. A taxa de sucesso dessa cirurgia varia entre 20% e 80%. 68 Unidade I A ligadura das tubas uterinas, também conhecida como laqueadura das trompas, é realizada a partir do corte e/ou ligamento cirúrgico dessas estruturas. A reversão da laqueadura é possível em cerca de 80% dos casos. 4.7 Consequências do tratamento da infertilidade Uma das consequências do tratamento da infertilidade é a maior probabilidade de gestação de múltiplos conceptos. As gestações múltiplas trazem riscos maiores de anomalias cromossômicas e morbidade fetal do que as gestações simples. Os riscos são progressivamente maiores com o aumento do número de fetos. O maior acesso a tratamentos de fertilidade tem como consequência o aumento de gravidezes múltiplas, incluindo indução da ovulação, que ocorre quando gonadotrofinas exógenas são administradas na mulher que não ovula e nas que estão fazendo tratamento para infertilidade por tecnologias de reprodução assistida. De acordo com Moore e Persaud (2008), o estudo de gêmeos é muito importante para a genética humana porque serve como comparativo dos efeitos dos genes e do meio ambiente sobre o desenvolvimento do feto. Os gêmeos podem ser monozigóticos (MZ), popularmente conhecidos como idênticos e oriundos de um zigoto, ou dizigóticos (DZ), também chamados de fraternos e originados de dois zigotos. Os gêmeos MZ são do mesmo sexo e muito semelhantes no aspecto físico, posto que os fatores ambientais podemtrazer algumas diferenças físicas (por exemplo, anastomose de vasos placentários). A formação desses gêmeos se inicia no estágio de blastocisto, resultando na divisão do embrioblasto em duas partes, originadas a partir da mesma célula duas crianças com a mesma genética (mesmo DNA). Esses dois embriões terão seus sacos amnióticos individuais, mas a gestação ocorre no mesmo saco coriônico e partilha a mesma placenta (monocoriônica-diamniótica). Por resultarem da fecundação de dois ovócitos, os gêmeos DZ se desenvolvem a partir de dois zigotos e podem ser do mesmo sexo ou de sexos diferentes, por não serem geneticamente idênticos/semelhantes. Seus córions e placentas são diferentes, mas em alguns casos podem estar fundidos. 69 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Zigoto Anastomose de vasos placentários e comunicação arteriovenosa entre os sistemas circulatórios dos gêmeos Estágio de duas células Dois embrioblastos Dois âmnios Placenta única Uma placenta Um saco coriônico Dois sacos amnióticos Figura 31 – Formação de gêmeos monozigóticos. Cerca de 65% dos gêmeos monozigóticos se formam de um zigoto pela divisão do embrioblasto (massa celular interna) do blastocisto. Esses gêmeos sempre têm âmnios separados, um único saco coriônico e uma placenta comum. Quando há anastomose dos vasos placentários, um dos gêmeos pode receber a maior parte da nutrição da placenta Fonte: Moore e Persaud (2008, p. 140). 70 Unidade I Dois zigotos Estágio de duas células Estágio de blastocisto Implantação dos blastocistos Implantação dos blastocistos um junto ao outro Dois córions Dois córions (fundidos) Dois âmnios Dois âmnios Placentas separadas Placentas fundidas Sacos coriônicos separados Sacos coriônicos fundidos A) B) Figura 32 – Formação de gêmeos dizigóticos a partir de dois zigotos. Em A, os blastocistos se implantam separadamente e em B, os blastocistos se implantam próximos um do outro. Em ambos os casos, há dois âmnios e dois córions. Usualmente, as placentas estão fundidas quando a implantação é próxima Fonte: Moore e Persaud (2008, p. 139). Observação A síndrome da transfusão entre gêmeos ocorre em mais de 30% dos gêmeos MZ monocoriônicos-diamnióticos. Há passagem direta de sangue arterial de um gêmeo para a circulação venosa do outro através de anastomoses arteriovenosas. O gêmeo doador é pequeno, pálido e anêmico, enquanto o receptor é grande e policitêmico e apresenta aumento no número de hemácias acima do normal. A placenta exibe anormalidades semelhantes; a parte dela que supre o gêmeo anêmico é pálida, enquanto a que supre o gêmeo policitêmico é vermelho-escura. Em casos letais, a morte resulta da anemia do gêmeo doador e da insuficiência cardíaca congestiva do receptor. 71 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Figura 33 – (A) Imagem por ultrassom de gêmeos (MZ) discordantes (24 semanas de gestação), síndrome da transfusão entre gêmeos. (B) Gêmeos monozigóticos, monocoriônicos e diamnióticos, mostrando grande discrepância de tamanho resultante de anastomose arteriovenosa não compensada dos vasos placentários. O sangue foi desviado do gêmeo menor para o maior, estabelecendo a síndrome da transfusão entre gêmeos Fonte: Moore e Persaud (2008, p. 141). 72 Unidade I Resumo Vimos nesta unidade que os critérios que determinam o sexo de um indivíduo são genéticos, cromossômicos, gonadais, morfológicos e psicológicos. Ao nascimento, o sistema reprodutor já está formado, estando presentes as gônadas e a genitália externa e a partir daí temos biologicamente a determinação sexual do indivíduo, sendo XY o que potencializa a estrutura a formar testículo e XX, e o zigoto terá potencial para formar os ovários. Na puberdade, o período nos primeiros anos da adolescência quando as gônadas amadurecem, a mitose das células germinativas é retomada. Na adolescência, o ovário libera o ovócito maduro durante um processo chamado de ovulação. Se o ovócito não for fertilizado, a meiose nunca será completada e o ovócito degenera. Como resultado da meiose, cada ovócito primário dá origem a somente um ovo. A gametogênese em homens e em mulheres está sob o controle de hormônios provenientes do encéfalo e das células endócrinas das gônadas. O controle hormonal da reprodução em ambos os sexos segue o padrão básico hipotálamo-hipófise anterior e o trato reprodutor masculino tem como funções a produção do hormônio masculino testosterona e a produção, maturação e transporte dos espermatozoides. É constituído anatomicamente por um par de testículos, localizados no escroto; pela próstata, vesículas seminais e glândulas bulbouretrais, situados no interior da pelve e pelo pênis, de localização externa. Esses órgãos exercem um papel importante na manutenção das características masculinas e na reprodução. Os hormônios hipofisários, ou gonadotrofinas, atuam sobre as células testiculares, onde o LH estimula a produção de testosterona pelas células de Leydig e o FSH, com a testosterona recém-produzida, são responsáveis pela espermatogênese. Acentuamos que a testosterona controla o processo de meiose, ao atuar diretamente sobre as espermatogônias. O FSH, por sua vez, atua sobre as células de Sertoli, regulando a espermiogênese. A secreção de FSH, LH e testosterona é controlada pelo mecanismo de retroalimentação negativa (feedback negativo). Além da espermatogênese, a testosterona é responsável pelo desenvolvimento dos órgãos sexuais masculinos durante o período embrionário; pelo desenvolvimento das características sexuais masculinas que surgem durante a puberdade com o aumento do pênis, aparecimento dos pelos corporais, engrossamento da voz, aumento da oleosidade da pele, hipertrofia muscular, estirão de crescimento e pela manutenção da libido. Já no sistema reprodutor feminino as glândulas mamárias fazem parte do sistema exócrino e são glândulas sudoríparas apócrinas modificadas. Elas têm uma estrutura dinâmica, modificando-se com o decorrer da idade da mulher, sendo ativas com produção de leite, 73 REPRODUÇÃO ASSISTIDA estimulada por hormônio prolactina; após o parto e fora desse período, são preenchidas por tecido adiposo. Anatomicamente, são constituídas de dois ovários, duas tubas uterinas, útero, vagina e vulva. A ovogênese é a produção do gameta feminino, o ovócito, a partir de células precursoras denominadas ovogônias. Esse processo ocorre nos ovários. Durante a meiose I do gameta feminino, há a formação de apenas um ovócito secundário. Isso ocorre porque a divisão meiótica no sexo feminino é desigual: durante a citocinese que encerra a meiose I, a maior parte do citoplasma é direcionado a apenas uma das células-filhas, o ovócito secundário. A outra célula-filha passa a ser denominada primeiro corpúsculo polar, que apresenta conteúdo citoplasmático muito reduzido e permanece na periferia do ovócito secundário. A meiose II, pausada na metáfase II, só será completada no momento da fecundação. Assim, ao final da meiose, cada ovogônia terá originado um ovócito e dois corpúsculos polares. A cada dia, a partir da puberdade, alguns folículos iniciam o processo de crescimento, estimulados pelo hormônio FSH, liberado pela hipófise. A ovulação é o rompimento das paredes do folículo ovariano e a consequente liberação do ovócito secundário em direção às tubas uterinas, local onde ocorre a fecundação. A partir da ovulação, as células da granulosa e da teca do folículo ovariano rompido passam a constituir o corpo lúteo, estrutura importante para a manutenção da gestação. Os hormônios femininos (estrógenos e progesterona) são sintetizados nos ovários em resposta aos hormônios hipofisários LH e FSH. A concepção ocorre quando um espermatozoide encontra e fertiliza um ovócito secundário nas tubas uterinas. Existem vários métodos que visam impedir esse evento e, portanto, diminuem a chance de uma gestação indesejada. Os métodos hormonais alteram o balanço hormonal existente no organismo feminino e, assim, impedem a ovulação.São constituídos de derivados do estrógeno e da progesterona, que, ao atingirem a circulação sistêmica, potencializam o mecanismo de feedback negativo sobre o eixo hipotálamo-hipófise-ovários. Como consequência, não há produção de FSH e de LH suficientes para que haja o crescimento folicular e a ovulação. Temos o contraceptivo oral combinado, hormonal injetável, hormonal transdérmico, anel vaginal e hormonal de emergência. Tanto os homens quanto as mulheres podem também lançar mão do cariótipo para avaliar a presença de anormalidades cromossômicas que inviabilizem a concepção. O número dos óvulos começa a diminuir em média aos 30 anos, assim como sua qualidade, e essa queda acelera após os 40 anos. Isso pode ser acompanhado através de exames de sangue para verificar os níveis dos hormônios relacionados à liberação de óvulos. Também podem ser vistos e contados os números de folículos por meio de ultrassonografia dos ovários. 74 Unidade I Outra causa da redução de óvulos está relacionada a anomalias nos ovários, chamada de insuficiência ovariana (menopausa precoce), reduzindo o número de óvulos de forma precoce, sendo uma das causas de menstruações irregulares ou falta de menstruação, que também podem ser detectadas por exame de sangue, o qual mede a concentração do hormônio foliculoestimulante e do estrogênio, assim como por meio de ultrassonografia. Estão comumente relacionadas em mulheres acima de 35 anos, ou que passaram por cirurgia de ovário ou que responderam mal a medicamentos para fertilidade (gonadotrofina), como estimuladores de liberação e amadurecimento de óvulos. Por fim, destacamos que o tratamento da infertilidade pode ser realizado por meio da administração de medicamentos, de tratamentos cirúrgicos e da aplicação das técnicas de reprodução humana assistida. Esses tratamentos podem ou não ser associados entre si, de acordo com as características clínicas do paciente. 75 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Exercícios Questão 1. O aparelho reprodutor masculino participa da produção e da maturação dos espermatozoides. Além disso, é responsável pela ejaculação desses gametas no interior do aparelho reprodutor feminino e pela produção de considerável quantidade de testosterona. A respeito do aparelho reprodutor masculino e de suas funções, avalie as afirmativas. I – O epidídimo é um órgão em forma de vírgula, dividido em cabeça, corpo e cauda, revestido por cápsula delgada e tecido frouxo intersticial. Suas funções são a produção, o armazenamento e a capacitação dos espermatozoides. II – As vesículas seminais produzem o líquido seminal, viscoso e ácido, responsável por nutrir e facilitar a motilidade dos espermatozoides, graças à glicose presente em sua constituição. III – No homem, a testosterona pode ser convertida em di-hidrotestosterona, por ação da enzima 5-alfa redutase, e em estrógeno, por ação da enzima aromatase. IV – Os testículos possuem diferentes tipos celulares, responsáveis pela produção de espermatozoides (espermatogônias), pela sustentação e nutrição dos espermatozoides (células de Sertoli) e pela síntese e secreção de testosterona (células de Leydig). É correto apenas o que se afirma em: A) I e III. B) II e IV. C) I, II e IV. D) III e IV. E) II, III e IV. Resposta correta: alternativa D. Análise das afirmativas I – Afirmativa incorreta. Justificativa: o epidídimo não participa da produção dos espermatozoides (que acontece nos testículos) nem da sua capacitação (que ocorre no trato reprodutor feminino). 76 Unidade I II – Afirmativa incorreta. Justificativa: o líquido seminal é alcalino e rico em frutose. III – Afirmativa correta. Justificativa: a di-hidrotestosterona (DHT) é um hormônio produzido a partir da testosterona pela ação da 5-alfa redutase. Esse hormônio participa da diferenciação dos órgãos sexuais femininos durante a embriogênese; da maturação dos órgãos sexuais externos durante a puberdade; do crescimento do cabelo facial, corporal e púbico; da produção de sebo; e da manutenção das funções da próstata. O estrógeno, por sua vez, é produzido em pequenas quantidades no homem por ação da enzima aromatase. Ele mantém a função óssea, os níveis lipídicos e a libido. IV – Afirmativa correta. Justificativa: as espermatogônias são as células-tronco da linhagem espermatogênica, presentes na base dos túbulos seminífero, a partir das quais são produzidos os espermatozoides. As células de Sertoli estão presentes no túbulo seminífero, e as junções ocludentes entre essas células garantem proteção e nutrição para as células da linhagem espermatogênica, durante o processo de meiose. As células de Leydig estão presentes no interstício do testículo e são responsáveis pela produção e secreção de testosterona, a partir do estímulo do LH (hormônio luteinizante). Questão 2. O aparelho reprodutor feminino tem, como principais funções, a produção e a maturação dos gametas femininos, a produção de estrógeno e progesterona, a ovulação, a fertilização do ovócito, a gestação e o parto. A respeito do aparelho reprodutor feminino e de suas funções, assinale a alternativa correta. A) As ovogônias e os ovócitos são células ovarianas produzidas, na mulher, a partir da puberdade. B) A luz das tubas uterinas é revestida de epitélio ciliado, importante para promover o transporte do pré-embrião para o útero. C) O útero é revestido internamente por endométrio, que prolifera em resposta às altas concentrações de progesterona durante a primeira fase do ciclo menstrual. D) A região da medula do ovário é responsável pela produção de estrógeno e de progesterona. E) A capacitação dos espermatozoides ocorre nas tubas uterinas e possibilita a aquisição da hipermotilidade e a realização da reação acrossômica. Resposta correta: alternativa B. 77 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Análise das alternativas A) Alternativa incorreta. Justificativa: as ovogônias e os ovócitos são produzidos na vida intrauterina, durante o período fetal. B) Alternativa correta. Justificativa: as tubas uterinas são dotadas de epitélio ciliado, cujo movimento contínuo impulsiona o ovócito, ou até mesmo o pré-embrião, em direção ao útero. As tubas uterinas apresentam forma de funil e é na região da ampola, mais dilatada, que ocorre a fecundação. C) Alternativa incorreta. Justificativa: o útero é revestido internamente por endométrio, que prolifera em resposta às altas concentrações de estrógeno durante a primeira fase do ciclo menstrual. D) Alternativa incorreta. Justificativa: a produção de estrógeno e de progesterona ocorre nas células foliculares do córtex ovariano, e não na medula do ovário. A medula do ovário é composta principalmente de tecido conjuntivo e vasos sanguíneos. E) Alternativa incorreta. Justificativa: a capacitação dos espermatozoides ocorre durante sua passagem pelo colo uterino e possibilita a aquisição da hipermotilidade e a realização da reação acrossômica.48 3.4.1 Métodos de barreira............................................................................................................................... 48 3.4.2 Métodos hormonais ............................................................................................................................... 48 4 INFERTILIDADE E SUAS CAUSAS ............................................................................................................... 51 4.1 Principais causas da infertilidade masculina ............................................................................ 52 4.2 Anormalidades do espermatozoide .............................................................................................. 55 4.3 Espermograma ....................................................................................................................................... 56 4.3.1 Motilidade espermática ........................................................................................................................ 56 4.4 Principais causas da infertilidade feminina ............................................................................... 57 4.4.1 Anomalias relacionadas à infertilidade feminina ...................................................................... 58 4.5 Diagnóstico da infertilidade feminina ......................................................................................... 61 4.5.1 Cariótipo ..................................................................................................................................................... 63 4.6 Tratamento da infertilidade ............................................................................................................. 64 4.6.1 Tratamento farmacológico ................................................................................................................. 64 4.6.2 Técnicas cirúrgicas .................................................................................................................................. 67 4.7 Consequências do tratamento da infertilidade ....................................................................... 68 Unidade II 5 REPRODUÇÃO ASSISTIDA E SUA HISTÓRIA .......................................................................................... 78 5.1 História da reprodução assistida no mundo e no Brasil ....................................................... 79 5.2 Uso de material genético de terceiros ......................................................................................... 80 5.3 Importância da fertilidade em tempos modernos .................................................................. 81 6 ASPECTOS ÉTICOS DA REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA .......................................................... 82 6.1 Resolução n. 2.320 de 2022 sobre doação de gametas ....................................................... 83 6.2 Resolução n. 2320/2022 para pacientes das técnicas de reprodução assistida ......... 86 6.3 Resolução n. 2320/2022 para a cessão temporária do útero ............................................ 88 6.4 Resolução n. 2320/2022 sobre o diagnóstico genético pré-implantacional ............... 90 6.5 Resolução n. 2.320/2022 sobre a criopreservação de gametas ou embriões .............. 92 6.6 Resolução n. 2.320/2022 referente a clínicas, centros ou serviços que aplicam técnicas de reprodução assistida ........................................................................................................... 93 6.7 Lei da Biossegurança (n. 11.105/2005) ........................................................................................ 94 7 TÉCNICAS DE REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA ........................................................................... 97 7.1 Relação programada ........................................................................................................................... 98 7.1.1 Inseminação intrauterina .................................................................................................................... 99 7.2 Fertilização in vitro ............................................................................................................................101 7.3 Injeção intracitoplasmática de espermatozoides ..................................................................105 7.4 Criopreservação de gametas e de embriões ............................................................................108 7.5 Doação de gametas ...........................................................................................................................109 7.6 Diagnóstico genético pré-implantacional ...............................................................................110 7.7 Atuação do biólogo na área de reprodução assistida .........................................................112 8 ACONSELHAMENTO GENÉTICO ................................................................................................................113 8.1 Indicações para o aconselhamento genético .........................................................................113 8.2 Protocolo do aconselhamento genético ...................................................................................114 8.3 Aspectos emocionais da reprodução assistida .......................................................................117 7 APRESENTAÇÃO Caro(a) aluno(a), O curso de Ciências Biológicas propicia nesta disciplina o conhecimento das técnicas de reprodução assistida utilizadas na medicina. Entre as carreiras profissionais que o estudante de biologia pode seguir após sua formação consta o trabalho em laboratório em clínicas especializadas em fertilização ou reprodução, a fim de trazer qualidade de vida e conforto a quem sofre com infertilidade em suas variadas formas, para atender à realização do desejo pessoal de cada um, sendo uma demanda que não para de crescer no Brasil e no mundo. Após esse aprendizado, que iniciará agora e acrescentará ao conhecimento que já obteve nas disciplinas de Biologia Celular, Embriologia, Genética e Anatomofisiologia, você estará apto e capacitado a adquirir conhecimento em relação a todos os procedimentos, protocolos e legislação relacionados às técnicas de reprodução assistida em humanos. São consideradas técnicas de reprodução assistida todos os procedimentos clínicos e laboratoriais que visam obter uma gestação, substituindo ou facilitando etapas deficientes do processo reprodutivo natural. Com isso, você terá subsídios e preparo para executar as partes que lhe compete dessas técnicas em sua vida profissional. Bons estudos! 8 INTRODUÇÃO A formação do biólogo consiste em unir os conhecimentos de diferentes disciplinas essenciais que se complementam para ajudar em pesquisas e na aplicação das técnicas criadas de reprodução humana assistida, ao longo das últimas décadas, para ajudar um amplo espectro de pessoas com dificuldades de reprodução em suas variadas formas. Na unidade I relacionaremos a anatomia e a fisiologia dos sistemas reprodutor masculino e feminino com a fertilidade e o desenvolvimento embrionário e as possíveis anormalidades das estruturas fundamentais para a reprodução humana para entender a infertilidade. Trataremos das principais causas da infertilidade masculina e feminina e seus possíveis tratamentos. Na unidade II, mostraremos o histórico da reprodução assistida no Brasil e no mundo, como tudo começou, desde o primeiro bebê de proveta até os dias atuais. Nos aspectos éticos, trataremos das implicações na sociedade. Atualmente, não existem leis federais específicas voltadas para a reprodução assistida, com isso, a Resolução n. 2.168/2017 do Conselho Federal de Medicina é a norma que determina as regras dos procedimentos em questão. A princípio, o limite para gestação por técnicas de reprodução assistida é 50 anos para as mulheres. No entanto, a resolução permite que as técnicas sejam aplicadas em mulheres acima desta idade, desdeque haja posicionamento médico. Além disso, é importante conhecer as tecnologias utilizadas no diagnóstico da infertilidade, que englobam desde simples dosagens hormonais até estudos moleculares mais complexos. O tratamento da fertilidade, baseado principalmente nas técnicas de reprodução assistida, também vem evoluindo desde meados do século passado, a partir da aplicação de diferentes protocolos que visam ao aumento do número de gestações bem-sucedidas. Serão descritas as técnicas e os procedimentos do tratamento com sêmen de doador e doação de óvulos, tais como inseminação intrauterina, fertilização in vitro e injeção intracitoplasmática de espermatozoide. Por último, falaremos de aconselhamento genético em doenças genéticas ou preexistentes. 9 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Unidade I 1 DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO E DIFERENCIAÇÃO GONADAL Quando os meninos e as meninas nascem apresentam o sistema reprodutor formado, estando presentes as gônadas e a genitália externa e a partir daí temos biologicamente a determinação sexual do indivíduo, porém os testículos e ovários começam a se formar na fecundação, onde ocorre a determinação cromossômica do sexo. No caso de ser um espermatozoide que contenha o cromossomo Y, o zigoto (XY) terá potencial para formar a estrutura dos testículos. Caso o espermatozoide contenha o cromossomo X, o zigoto (XX) terá potencial para formar os ovários. Embora o sexo dos embriões seja determinado geneticamente durante a fecundação, as gônadas começam a se formar entre a 5ª e a 6ª semanas após a fecundação. Tanto os embriões masculinos como os femininos apresentam gônadas morfologicamente idênticas no início do desenvolvimento, denominadas gônadas indiferenciadas. Na gônada indiferenciada não é possível identificar se ela é testículo ou ovário. São formadas por cordões sexuais primitivos, derivados das células somáticas e pelas células germinativas, as quais originarão espermatogônias ou ovogônias. A estrutura básica de um testículo é microscopicamente reconhecível nos embriões a partir da 7ª semana de desenvolvimento intrauterino. Já a estrutura de um ovário somente será reconhecida por volta da 8ª ou 9ª semana de desenvolvimento. O sexo do embrião é determinado na fertilização, mas as pregas genitais não se diferenciam em testículos ou ovários antes da 8ª semana de gestação. Assim, a formação do testículo no sexo masculino reterá os ductos mesonéfricos para o transporte do esperma e a diferenciação das gônadas em ovários reterá os ductos paramesonéfricos para o transporte dos óvulos e nutrição do feto. Lembrete Gônada deriva do grego gónus, e que significa “origem”, “geração” e “procriação”. Essa palavra grega é a raiz da palavra gônada, que corresponde à glândula sexual, onde são produzidos os gametas e os hormônios sexuais masculinos ou femininos. A gônada masculina é o testículo e a feminina é o ovário. 10 Unidade I A proteína SRY no embrião masculino determina que a medula de gônada bipotencial se desenvolva e forme o testículo A testosterona produzida no testículo converte o ducto de Wolff em vesícula seminal, ducto deferente e epidídimo. A DTH controla o desenvolvimento da próstata 1 3 O hormônio anti-mülleriano liberado pelo testículo causa a degeneração dos ductos de Müller 2 Ducto de Wolff Ducto de Müller Tuba uterina (a partir do ducto de Müller) Ovário Útero Vagina Próstata Vesícula seminal Ducto deferente Testículo Epidídimo Útero Ducto de Müller Gônada (bipotencial) Rim Estágio bipotencial: feto de 6 semanas Os órgão reprodutivos internos têm potencial para se desenvolver e formar estruturas masculinas ou femininas Estágio bipotencial (feto de 6 semanas) Na mulher O córtex gonadal forma o ovário A medula gonadal regride O ducto de Wolff regride (ausência de testosterona) O ducto de Müller diferencia-se em tuba uterina, útero, colo do útero e parte superior da vagina (AMH ausente) No homem O córtex gonadal regride A medula gonadal forma o testículo O ducto de Wolff forma o epidídimo, o ducto deferente e a vesícula seminal (presença de testosterona) O ducto de Müller regride (presença de AMH) Mulher Homem 10 semanas 10 semanas Ao nascimento Ao nascimento O córtex gonadal diferencia-se, formando o ovário na ausência da proteína SRY e sob a influência de genes específicos femininos A ausência do hormônio anti-mülleriano permite que o ducto de Müller forme as tubas uterinas, o útero e a parte superior da vagina A ausência de testosterona causa a degeneração do ducto de Wolff 1 3 2 Testículo Ducto de Wolff Figura 1 – Desenvolvimento sexual no embrião humano entre a 6ª e 10ª semana de gestação Fonte: Silverthorn (2017, p. 843). A medula das gônadas originará os túbulos seminíferos, onde os ductos mesonéfricos formarão o epidídimo e o ducto deferente na formação do órgão masculino e ocorrerá a degeneração dos ductos paramesonéfricos. Na formação dos órgãos sexuais femininos, o córtex das gônadas se tornará o local de produção de óvulos e, portanto, os ductos mesonéfricos se degeneram. Os ductos paramesonéfricos formam o útero, a vagina e as tubas uterinas. 11 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Na mulher O tubérculo genital forma o clitóris As pregas e os sulcos uretrais formam os lábios menores, os óstios da vagina e da uretra A eminência labioscrotal forma os lábios maiores No homem O tubérculo genital forma a glande do pênis As pregas e os sulcos uretrais formam o corpo do pênis As eminências labioscrotais formam o corpo do pênis e o escroto HomemMulher Estágio bipotencial: a genitália externa de um embrião de 6 semanas não pode ser visualmente identificada como masculina ou feminina Estágio bipotencial (feto de 6 semanas) 10 semanas10 semanas Ao nascimento Ao nascimento Ânus Ânus Ânus Ânus Ânus Óstio vaginal Óstio da uretra Prega uretral Sulco uretral Tubérculo genital Prega uretral Eminência labioscrotal Eminência labioscrotal Clitóris Clitóris Pênis Glande do pênisLábios maiores Lábios menores Corpo do pênis Escroto Prega uretral Eminência labioscrotal A DHT induz o desenvolvimento da genitália externa masculina 1 Na ausência de androgênios, a genitália externa é feminilizada 1 Os testículos descem da cavidade abdominal para o escroto 2 Figura 2 – Desenvolvimento da genitália externa Fonte: Silverthorn (2017, p. 844). Observação Célula somática, tem na palavra somática sua origem do grego sōmatikós, que significa corpo. Ou seja, célula que forma todos os tecidos, órgãos e sistemas orgânicos. Células germinativa têm na palavra germinativa sua origem do latim gérmen, que significa princípio ou origem. Ou seja, célula que formará os gametas masculinos ou femininos. Portanto, são células presentes apenas nos testículos ou ovários. 12 Unidade I 1.1 Determinação do sexo Os critérios que determinam o sexo de um indivíduo são vários, sendo eles genéticos, cromossômicos, gonadais, morfológicos e psicológicos. Geralmente os pais têm como primeira curiosidade se seu filho será menino ou menina. Nem sempre essa resposta é evidente, uma vez que em aproximadamente 1 em cada 3 mil nascimentos o sexo da criança não pode ser facilmente determinado. Vários critérios podem ser utilizados para estabelecer o sexo de um indivíduo: genético, cromossômico, gonadal, morfológico ou até mesmo características psicológicas. Por exemplo, a presença de um cromossomo Y com um gene SRY funcional poderia ser um critério para definir a masculinidade. Entretanto, é possível que um bebê tenha o cromossomo Y e não apresente aparência masculina devido a um defeito em algum aspecto do desenvolvimento. 1.2 Gametogênese Em ambos os sexos, as células germinativas das gônadas embrionárias primeiramente sofrem uma série de divisões mitóticas que aumentam o seu número a fim de assim estarem prontas para sofrer meiose, o processo de divisão celular que forma os gametas. No primeiro passo da meiose, oDNA das células germinativas (2n) é replicado até que cada cromossomo seja duplicado (46 cromossomos duplicados, gerando 92 cromossomos). A célula, agora chamada de espermatócito primário ou ovócito primário, contém duas vezes a quantidade normal de DNA (4n). Entretanto, a divisão da célula e dos cromossomos não ocorre como na mitose. Em vez disso, cada cromossomo duplicado forma duas cromátides-irmãs idênticas, unidas em uma região conhecida como centrômero. Os gametas primários, então, estão prontos para sofrer divisões meióticas e dar origem às células haploides. Na primeira divisão meiótica, um gameta primário se divide em dois gametas secundários (espermatócito secundário ou ovócito secundário). Cada gameta secundário recebe uma cópia de todo autossomo duplicado mais um cromossomo sexual (2n). Na segunda divisão meiótica, as cromátides-irmãs se separam. Nos homens, as células se dividem durante a segunda divisão meiótica, originando dois espermatozoides haploides (1n) a partir de cada espermatócito secundário. Nas mulheres, a segunda divisão meiótica dá origem a um ovócito e a uma pequena célula, chamada de corpúsculo polar. O que acontece depois depende de se o ovócito é fertilizado ou não. O momento das divisões mitótica e meiótica é bastante diferente em homens e mulheres. 1.2.1 Gametogênese masculina Ao nascimento, os testículos de um menino recém-nascido não progrediram além da mitose e contêm somente células germinativas imaturas. Após o nascimento, as gônadas se tornam quiescentes (relativamente inativas) até a puberdade, o período nos primeiros anos da adolescência quando as gônadas amadurecem. Na puberdade, a mitose das células germinativas é retomada. Deste ponto em diante, as células germinativas, conhecidas como espermatogônias, possuem dois diferentes destinos. Algumas continuam a sofrer mitose ao longo de toda a vida reprodutiva do homem. Outras são destinadas a iniciar a meiose e dar origem aos espermatócitos primários. Cada espermatócito primário dá origem a quatro espermatozoides. Na primeira divisão meiótica, um espermatócito primário (4n) se divide em dois espermatócitos secundários (2n). Na segunda divisão meiótica, cada espermatócito secundário se 13 REPRODUÇÃO ASSISTIDA divide em duas espermátides. Cada espermátide possui 23 cromossomos simples (não duplicados), o número haploide (1n) característico de um gameta. As espermátides, então, amadurecem, formando espermatozoides. A maior parte da testosterona é secretada pelos testículos, mas cerca de 5% vêm do córtex da glândula suprarrenal. A testosterona é convertida nos tecidos periféricos no seu derivado mais potente, DHT. Alguns dos efeitos fisiológicos atribuídos à testosterona são, na verdade, resultado da atividade da DHT. Os homens sintetizam alguns estrogênios, mas os efeitos feminilizantes desses compostos, em geral, não são evidentes nos homens. Testículos e ovários possuem a enzima aromatase, que converte androgênios em estrogênios, os hormônios sexuais femininos. Uma pequena quantidade de estrogênio também é formada nos tecidos periféricos. 1.2.2 Gametogênese feminina Nas mulheres, as células germinativas das gônadas embrionárias primeiro sofrem uma série de divisões mitóticas que aumentam o seu número para assim estarem prontas para sofrer meiose, o processo de divisão celular que forma os gametas. No primeiro passo da meiose, o DNA das células germinativas (2n) é replicado até que cada cromossomo seja duplicado (46 cromossomos duplicados gerando 92 cromossomos). A célula, agora chamada de ovócito primário, contém duas vezes a quantidade normal de DNA (4n). Cada cromossomo duplicado forma duas cromátides-irmãs idênticas, unidas em uma região conhecida como centrômero. Os gametas primários, então, estão prontos para sofrer divisões meióticas e dar origem às células haploides. Na primeira divisão meiótica, um gameta primário se divide em dois ovócitos secundários e recebem uma cópia de cada autossomo duplicado mais um cromossomo sexual (2n). Na segunda divisão meiótica, as cromátides-irmãs se separam dando origem a um ovócito e a uma pequena célula, chamada de corpúsculo polar. O que acontece depois depende de se o ovócito é fertilizado ou não. No ovário embrionário, as células germinativas são chamadas de ovogônias. A ovogônia completa a mitose e o estágio de duplicação do DNA da meiose no quinto mês de desenvolvimento fetal, dando origem aos ovócitos primários (4n). Ao nascimento, cada ovário contém cerca de meio milhão de ovócitos primários. As melhores evidências indicam que, neste momento, a mitose das células germinativas cessa e nenhum ovócito adicional pode ser formado. No ovário, a meiose não é retomada até a puberdade. Se um ovócito primário se desenvolve, ele divide-se em duas células, um grande ovo (ovócito secundário) e um pequeno primeiro corpúsculo polar. Apesar da diferença de tamanho, tanto o ovócito secundário como o corpúsculo polar contêm 23 cromossomos duplicados (2n). O primeiro corpúsculo polar degenera. Se o ovócito secundário é selecionado para a ovulação, a segunda divisão meiótica ocorre imediatamente antes de o ovócito ser liberado do ovário. As cromátides-irmãs se separam, mas a meiose é interrompida mais uma vez. A etapa final da meiose, na qual cada cromátide-irmã vai para células separadas, não ocorre se o ovócito não for fertilizado. O ovário libera o ovócito maduro durante um processo chamado de ovulação. Se o ovócito não for fertilizado, a meiose nunca será completada, e o ovócito degenera. Se houver a fertilização por um espermatozoide, o passo final da meiose ocorre. 14 Unidade I Metade das cromátides-irmãs permanece no ovo fertilizado (zigoto), ao passo que a outra metade é liberada no segundo corpúsculo polar (1n). O segundo corpúsculo polar, assim como o primeiro, degenera. Como resultado da meiose, cada ovócito primário dá origem a somente um ovo. A gametogênese em homens e em mulheres está sob o controle de hormônios provenientes do encéfalo e das células endócrinas das gônadas. Alguns desses hormônios são idênticos em homens e mulheres, mas outros são diferentes. Mulher HomemEstágio da divisão celular MitoseCélula germinativa: ovogônia Célula germinativa: espermatogônia Meiose Primeira divisão meiótica Segunda divisão meiótica Ovogônia Proliferação das células germinativas 46 cromossomos por célula (somente 2 mostrados aqui) 46 cromossomos duplicados (4n) 23 cromossomos duplicados (2n) O gameta primário divide-se em 2 gametas secundários 46 (2n) Em br iã o Em brião Adulto no período reprodutivo O DNA é replicado, mas não ocorre divisão celularOvócito primário (4n) Espermatócito primário (4n) Espermatócitos secundários (2n) Espermátides Espermatozoides (1n) Um espermatócito primário origina 4 espermatozoides Cromátides-irmãs Espermatogônias Ovócito secundário (2n) Primeiro corpúsculo polar Degenera Ovócito liberado do ovário na ovulação Um ovócito primário dá origem a um ovócito secundário O ovócito não fertilizado degenera O segundo corpúsculo polar degenera Zigoto Fertilização Os gametas secundários dividem-se 23 cromossomos (haploides, 1n) Ad ul to n o pe río do re pr od ut iv o Cromátides-irmãs Início da meiose Início da meiose 6 4 3 2 1 5 desenvolvem-se em Figura 3 – Comparação dos padrões masculino e feminino da gametogênese. As células germinativas primeiramente são duplicadas por mitose. Depois, por meio da meiose, elas formam gametas com um cromossomo de cada par. Para simplificar, a figura mostra somente um dos 22 pares de autossomos de cada célula Fonte: Silverthorn (2017, p. 847). 15 REPRODUÇÃO ASSISTIDA O ovário produz estrogênios (especialmente estradiol e estrona) e progestogênios, particularmente progesterona. O ovário e o córtex da glândula suprarrenal produzem pequenas quantidades de androgênios. O controle hormonal da reprodução em ambos os sexos segue o padrão básicohipotálamo-hipófise anterior (adeno-hipófise) glândula periférica. O hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH, do inglês, gonadotropin releasing hormone) liberado pelo hipotálamo controla a secreção de duas gonadotrofinas da adeno-hipófise: hormônio folículo. Observação O GnRH é, por vezes, chamado de hormônio liberador do hormônio luteinizante (LHRH, do inglês, luteinizing hormone-releasing hormone), pois inicialmente se pensou que ele exercesse seu efeito primário sobre o LH. SNC Hipotálamo Adeno- -hipófise GnRH FSHLH Células endócrinas Hormônios esteroides e peptídicos Produção de gametas Gônadas (ovários ou testículos) Estímulo GnRH = Hormônio liberador de gonadotrofinas LH = Hormônio luteinizante FSH = Hormônio foliculoestimulante A) Em ambos os sexos, o encéfalo controla a reprodução via secreção de GnRH e de gonadotrofinas hipofisárias (LH e FSH) B) Efeitos da retroalimentação dos hormônios esteroides sobre a liberação das gonadotrofinas Centro integrador Via eferente Alvo (efetor) Resposta tecidual Legenda A retroalimentação de alça longa pode ser negativa ou positiva Estímulos internos ou ambientais Hormônio esteroide Efeito Nível de gonadotrofinas Estrogênio ou androgênio baixos Ausência de retroalimentação negativa Aumenta Estrogênio ou androgênio moderados Retroalimentação negativa Diminui Androgênio alto Retroalimentação negativa Diminui Estrogênio alto sustentado Retroalimentação positiva Aumenta Somente em mulheres Figura 4 – Controle hormonal da reprodução Fonte: Silverthorn (2017, p. 848). 16 Unidade I 2 ANATOMOFISIOLOGIA DO SISTEMA REPRODUTOR MASCULINO O trato reprodutor masculino tem como funções a produção do hormônio masculino testosterona e a produção, maturação e transporte dos espermatozoides. Ele é constituído por um par de testículos, localizados no escroto; pela próstata, vesículas seminais e glândulas bulbouretrais, situados no interior da pelve; e pelo pênis, de localização externa. Além dos órgãos citados, um sistema de ductos e canais é responsável pelo transporte do espermatozoide dos testículos para o pênis, no momento da ejaculação. Esse sistema inclui a rede testicular, os dúctulos eferentes, o epidídimo, os ductos deferentes e a uretra. Esta última estrutura também faz parte do sistema urinário. Estas glândulas acessórias contribuem com secreções para o sêmen Pênis Uretra Reto Ducto ejaculatório Ducto deferente Sínfise pública (cartilagem) O testículo é o local da produção de espermatozoides e de hormônios Glândula bulbouretral Vesícula seminal Próstata Ureter Epidídimo Escroto Bexiga urinária Figura 5 – Representação esquemática do trato reprodutor masculino e localização dos órgãos em relação à bexiga urinária Fonte: Silverthorn (2017, p. 842). Esses órgãos exercem um papel importante na manutenção das características masculinas e na reprodução. Relembraremos a seguir as principais funções de cada um deles: • Testículos: localizados no escroto, apresentam forma ovoide e são constituídos de túbulos seminíferos envolvidos por estroma. Externamente revestidos por uma cápsula de tecido conjuntivo, denominada túnica albugínea, os testículos são responsáveis pela produção de espermatozoides e do hormônio masculino testosterona. 17 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Observação O escroto mantém os testículos a uma temperatura inferior à do resto do corpo (34,4 °C), o que é essencial para que ocorra a produção de espermatozoides e esse resfriamento os impede de morrer. • Dúctulos eferentes: são túbulos que conectam a rede testicular (resultado da anastomose dos túbulos seminíferos) ao epidídimo. Neles, ocorre a concentração do fluido testicular a partir da reabsorção de água. • Epidídimo: é um órgão constituído de um túbulo único, altamente enovelado, que conecta os dúctulos eferentes ao ducto deferente. Está localizado no escroto e, na espécie humana, apresenta comprimento médio de 8 metros. Trata-se do responsável pela maturação dos espermatozoides, processo que inclui a aquisição da motilidade e da fertilidade pelo gameta. • Ductos deferentes: são ductos de 30 a 40 cm que saem do escroto em direção à pelve. Sendo responsáveis pela propulsão dos espermatozoides durante a ejaculação, que ocorre a partir da contração da musculatura lisa que envolve os ductos. Observação A vasectomia, processo de esterilização realizado em homens, é feita a partir da excisão dos ductos deferentes, o que impede que os espermatozoides continuem seu percurso em direção à uretra, porém esse procedimento cirúrgico não afeta a produção de espermatozoides e nem reduz o orgasmo masculino. Osso (sínfise) público Vesícula seminal Próstata Vasectomia Epidídimo Testículo Escroto Uretra esponjosa Canal deferente Bexiga Pênis Figura 6 – Vasectomia Disponível em: http://tinyurl.com/ywafvnbm. Acesso em: 23 jan. 2024. 18 Unidade I • Vesículas seminais: produzem o líquido seminal, líquido viscoso e alcalino responsável por nutrir e facilitar a motilidade dos espermatozoides graças à frutose presente em sua constituição. O líquido seminal constitui aproximadamente 60% do sêmen. • Próstata: produz o fluido seminal, que constitui cerca de 30% do sêmen e, devido ao seu pH alcalino, é responsável por diminuir a acidez vaginal, aumentar o tempo de vida dos espermatozoides e manter sua motilidade. Além disso, a secreção prostática mantém a fluidez do sêmen e nutre os espermatozoides. • Glândulas bulbouretrais: localizadas abaixo da próstata, produzem o fluido pré-ejaculatório, líquido viscoso que lubrifica o pênis e limpa a uretra evitando, assim, a contaminação do sêmen. O fluido pré-ejaculatório constitui cerca de 5% do sêmen. • Uretra: a uretra inicia-se na próstata, a partir da junção dos dois ductos deferentes, e continua em direção ao pênis. É responsável pelo transporte dos espermatozoides até o meio externo, na ejaculação. Ela também participa da micção. • Pênis: de formato cilíndrico e constituído de dois corpos cavernosos e de um corpo esponjoso, que se enchem de sangue durante a excitação sexual, é responsável pela transmissão do espermatozoide à fêmea. Saiba mais A fisiologia e a regulação do trato reprodutor masculino podem ser exploradas na seguinte obra: HALL, J. E. Guyton & Hall: tratado de fisiologia médica. 12. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. Vejamos na sequência como funciona a anatomia do pênis. 19 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Ureter Vesícula seminal O ducto deferente transporta espermatozoides dos testículos até a uretraUretra Glândula bulbouretral Pênis Testículo O escroto mantém os testículos fora da cavidade abdominal, a fim de mantê-los em temperatura inferior à temperatura corporal Corpo esponjoso Corpos cavernosos Glande do pênis Prepúcio do pênis Bexiga urinária A glândula prostática circunda a uretra Uretra Corpo esponjoso Artéria central Corpo cavernoso Vasos sanguíneos dorsais Abertura do ducto ejaculatório Figura 7 – Anatomia do pênis Fonte: Silverthorn (2017, p. 842). 2.1 Espermatogênese Espermatogênese é a produção dos espermatozoides a partir das células germinativas masculinas. Esse processo é iniciado na puberdade, em que ocorre aumento da produção de testosterona, hormônio relacionado não apenas à espermatogênese, mas a vários outros aspectos do desenvolvimento sexual. Os testículos contêm uma série de estruturas denominadas túbulos seminíferos, que apresentam diversos tipos celulares: espermatogônias, espermatócitos, espermátides, espermatozoides e células de Sertoli. As espermatogônias estão presentes na base dos túbulos seminíferos, em contato com lâmina basal. Ao sofrer meiose, essas células diploides têm seu material genético diminuído pela metade, originando os espermatozoides, haploides. O processo da meiose ocorre em diversas etapas, durante as quais são geradas células intermediárias – os espermatócitos e as espermátides. À medida que são formadas,as células da linhagem germinativa nascente se encaminham para a luz dos túbulos seminíferos, onde irão compor o fluido seminal. 20 Unidade I As células de Sertoli são as responsáveis pelo controle e pela proteção das células da linhagem germinativa. Na figura a seguir é possível observar que as células de Sertoli têm a função de envolver essas células e, assim, promover uma barreira contra o meio externo (barreira hematotesticular). A barreira hematotesticular refere-se às junções ocludentes que conectam duas células de Sertoli adjacentes. As espermatogônias encontram-se em um compartimento basal situado abaixo da barreira e, por esse motivo, têm livre acesso aos componentes do sangue. As células das etapas mais avançadas da linhagem espermatogênica, por outro lado, permanecem no compartimento adluminal, acima das junções ocludentes, e não acessam os componentes do sangue, o que confere proteção a elas. Observação Constituem danos na barreira hematotesticular, por exemplo, traumas, cirurgias etc. Ao entrar em contato com a circulação sanguínea, há o desencadeamento de uma resposta autoimune, caracterizada pela ligação de anticorpos antiespermatozoide à superfície dessas células. Como resultado, pode haver diminuição da capacidade de fertilização. Por esse motivo, um dos exames realizados durante a investigação das causas da infertilidade masculina é a avaliação da presença de anticorpos antiespermatozoides no plasma. Cabeça do epidídimo Túbulo seminífero Cavidade escrotal Espermatozoide maduro Espermatozoides Espermátide Células germinativas Capilar As células intersticiais secretam testosterona Tecido intersticial Fibroblasto Lâmina basal Junção oclusiva entre as células de Sertoli As células de Sertoli secretam proteínas para dar suporte à produção de espermatozoides O líquido luminal possui alta concentração de K+ de hormônios esteroides Espermatogônia Espermatócito primário Espermatócito secundário Ducto deferente Epidídimo Espermatogônia Capilar Célula intersticial Célula de Sertolil Lúmen Lúmen do túbulo seminífero Figura 8 – Representação esquemática de uma secção do túbulo seminífero e suas principais estruturas Fonte: Silverthorn (2017, p. 842). 21 REPRODUÇÃO ASSISTIDA O zigoto, estrutura gerada no momento da fecundação, herda metade de seu material genético da mãe e metade do pai. Portanto, as espermatogônias, assim como as ovogônias (células precursoras dos gametas femininos), precisam passar por um processo de meiose para garantir que cada espermatozoide e óvulo apresente somente uma cópia de cada cromossomo, isto é, seja haploide. O sexo do embrião é determinado pelo espermatozoide. Os cromossomos X e Y determinam o sexo. Cada ovócito produzido por uma mulher (XX) possui um cromossomo X. O espermatozoide produzido pelo homem (XY) possui ou um cromossomo X ou um cromossomo Y, conforme ilustrado na figura a seguir. Mãe Filha Espermatozoides Filho Ovócitos Pai XX XX X X XY XY X Y Figura 9 Fonte: Silverthorn (2017, p. 832). Durante a meiose, são geradas, a partir das espermatogônias, as seguintes células: espermatócitos (primário e secundário), espermátides (iniciais e alongadas) e espermatozoides. Quanto mais avançada na espermatogênese, mais próxima da luz do túbulo seminífero a célula se encontra. A espermatogênese é dividida nas seguintes etapas: • Espermatocitogênese: processo marcado pelo aumento da população de espermatogônias a partir de mitoses sucessivas. • Espermatidogênese: caracterizada pela diferenciação das espermatogônias em espermatócitos primários e pela meiose dessas células, originando as espermátides iniciais. • Espermiogênese: processo que acarreta a formação do acrossomo e do flagelo nas espermátides, dando origem aos espermatozoides. 22 Unidade I Saiba mais Os processos de mitose e meiose podem ser melhor compreendidos em: JUNQUEIRA, L. C.; CARNEIRO, J. Biologia celular e molecular. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015. 2.1.1 Espermatocitogênese e espermatidogênese No início da puberdade, as espermatogônias presentes na base dos túbulos seminíferos sofrem sucessivas mitoses. Como resultado, o número dessas células aumenta exponencialmente. As espermatogônias, assim como as demais células somáticas humanas, apresentam 23 pares de cromossomos. São, portanto, diploides (2n = 46). A mitose gera células-filhas diploides idênticas à original. A partir do processo de mitose, observa-se duas populações de espermatogônias, ambas ainda diploides, porém com padrões de expressão gênica distintos: as espermatogônias tipo A e as espermatogônias tipo B. • As espermatogônias tipo A continuam a se dividir por mitoses durante toda a vida do indivíduo, e constituem a reserva de gônias, prontas para se diferenciarem em espermatogônias tipo B. • As espermatogônias tipo B se diferenciam em espermatócitos primários que, por sua vez, iniciam o processo de meiose. Inicialmente, os espermatócitos primários estão na interfase. Cada um dos 46 cromossomos encontra-se duplicado, ou seja, constituído de duas cromátides-irmãs unidas por um centrômero. Essas células logo entram na prófase I da meiose, processo que se estende por aproximadamente 22 dias. Após esse período, completam a meiose I, que gera duas células-filhas denominadas espermatócitos secundários. Observação Durante a prófase I, ocorre a permuta gênica ou crossing over, na qual fragmentos de DNA são trocados entre cromátides-irmãs homólogas. Esse mecanismo garante a variabilidade gênica entre os gametas. Cada espermatócito secundário tem apenas 23 cromossomos, porém cada cromossomo ainda é constituído de duas cromátides-irmãs unidas pelo centrômero. A meiose II, que se sucede, é responsável por gerar duas células-filhas a partir de cada espermatócito secundário. Essas células-filhas passam a se chamar espermátides iniciais e são haploides, ou seja, 23 REPRODUÇÃO ASSISTIDA apresentam 23 cromossomos, e cada cromossomo é constituído de apenas uma cromátide. Com isso, o processo de meiose é finalizado. Portanto, podemos afirmar que, de cada espermatócito primário, foram geradas 4 espermátides iniciais. Nascimento 12-14 anos Entra no testículo Célula germinativa primordial Espermatogônia Espermatócito primário Espermatócitos secundários Espermatozoide maduro Puberdade 25 dias 9 dias 19 dias Espermátides ^Diferenciação Divisão meiótica II 1 1 Divisão meiótica Ide um centríolo que passou por diferenciação e adquiriu o formato de uma cauda. Ele é responsável pela movimentação do espermatozoide. A energia necessária para a movimentação provém do ATP produzido pelas mitocôndrias localizadas na porção inicial do flagelo. Centríolos são organelas constituídas de microtúbulos agrupados em círculos. Participam da divisão e da organização celular e podem se diferenciar em cílios e flagelos. São três as etapas da espermiogênese: a etapa do complexo de Golgi, a etapa do acrossomo e a etapa da maturação. Durante a etapa do complexo de Golgi, ocorre o acúmulo de grânulos pró-acrossômicos no complexo de Golgi das espermátides iniciais. Essas vesículas se fundem e geram um grânulo acrossômico único, delimitado por membrana, denominado vesícula acrossômica. Além da formação da vesícula acrossômica, inicia-se a formação, a partir de um centríolo, do axonema, estrutura contrátil do flagelo. Durante a etapa do acrossomo, o núcleo torna-se mais alongado e condensado, e a vesícula acrossômica envolve sua metade superior, como se fosse um capuz; a partir desse momento, ela passa a ser denominada acrossomo. Além da formação do acrossomo, ocorre a finalização do flagelo. Sua porção inicial, denominada peça intermediária, é circundada de mitocôndrias, o que garante a energia necessária para que haja movimentação do espermatozoide. As dineínas acopladas aos microtúbulos do flagelo são capazes de quebrar o ATP e utilizar a energia liberada para promover a movimentação dessa estrutura. 25 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Ao final dessa etapa, o gameta masculino recebe o nome de espermátide alongada. Durante a maturação, uma parte do citoplasma da espermátide alongada desprende-se. Como resultado, surge o espermatozoide. As etapas da espermiogênese estão resumidas na figura a seguir. Região do Golgi Acrossoma Acrossoma Citoplasma residual Mitocôndria Centríolos Bainha mitocondrial Núcleo Núcleo Figura 11 – Esquema ilustrando as etapas da espermiogênese. A espermátide arredondada é transformada em um espermatozoide alongado. Note a perda do citoplasma, o desenvolvimento da cauda e a formação do acrossomo Fonte: Moore e Persaud (2008, p. 20). 2.2 Maturação do espermatozoide no epidídimo Ao final da espermiogênese, os espermatozoides são liberados na luz do túbulo seminífero e encaminhados, com um fluido rico em hormônios esteroidais, íons e outras moléculas, para a rede testicular e, de lá, alcançam os dúctulos eferentes. A principal função dos dúctulos eferentes é promover a reabsorção de água presente no fluido testicular e, assim, concentrar os espermatozoides. Dos dúctulos eferentes, os espermatozoides atingem o epidídimo. É lá que os gametas masculinos adquirem a capacidade de se movimentar para frente e de fertilizar o ovócito. Isso é possível graças à secreção de diversas proteínas pelas células do epitélio do ducto epididimário. Tais proteínas são incorporadas pelo espermatozoide e, então, suas características finais são adquiridas. 26 Unidade I Acrossoma Cabeça Colo Núcleo coberto pelo acrossoma Peça intermediária da cauda Bainha mitocondrial Peça principal da cauda Peça terminal da cauda Figura 12 – Esquema mostrando as partes do espermatozoide humano Fonte: Moore e Persaud (2008, p. 20). O epidídimo é um túbulo único, altamente enovelado, cujo epitélio, em contato com a luz tubular, apresenta diferentes tipos celulares envolvidos com a secreção de uma diversidade de proteínas. Esse túbulo é revestido externamente por células musculares lisas que garantem a propulsão dos espermatozoides ao longo do túbulo. Tal propulsão é fundamental, uma vez que a motilidade espermática, embora seja adquirida neste órgão, é ativada somente no momento da ejaculação. O órgão é dividido em três regiões, denominadas cabeça, corpo e cauda, sendo a cabeça adjacente aos dúctulos eferentes, e a cauda, ao ducto deferente. Ao chegar na cauda do epidídimo, os espermatozoides ficam armazenados até o momento da ejaculação. Observação Segundo Hall (2017), os seres humanos produzem aproximadamente 120 milhões de espermatozoides por dia. A espermatogênese dura 74 dias e a maturação, no epidídimo, cerca de 10 dias. 2.3 Ereção A ereção é resultante de uma interação complexa que envolve fatores psicológicos, neurais, vasculares e exócrinos, associada a uma atração sexual e excitação. As artérias se dilatam e os corpos cavernosos se enchem de sangue. Os músculos comprimem as veias, restringindo a saída e circulação desse sangue. O sistema nervoso autônomo comanda essa ereção, iniciada pela fase parassimpática, que terá a liberação da acetilcolina, que por sua vez libera óxido nítrico das células endoteliais nas artérias trabeculares. O óxido 27 REPRODUÇÃO ASSISTIDA nítrico atua como agente vasodilatador. No corpo esponjoso (localizado abaixo do corpo cavernoso), o sêmen passará durante a ejaculação. O prepúcio se retrai gradualmente e expõe a glande. Flácido: visão lateral Flácido: visão transversalVênulas penianas (não compactadas) Veia dorsal profunda Corpos cavernosos Artérias cavernosas Uretra esponjosa Corpo esponjoso Prepúcio Ereto: visão lateral Ereto: visão transversal Artérias cavernosas dilatam, enchendo o tecido corporal com sangue Ingurgitar faz com que o tecido corporal inche, erigindo o pênis Tecido corporal ingurgitando comprime veias e vênulas, mantendo a ereção 1 2 3 Figura 13 – Esquema do pênis flácido mostrando suas partes e ereto, com a descrição da dilatação das artérias Disponível em: http://tinyurl.com/2p8yx6vt. Acesso em: 23 jan. 2024. O pênis é recoberto por pele delgada com epitélio estratificado pavimentoso pouco queratinizado, mas mais pigmentado que o do resto do corpo. A glande é revestida por epitélio estratificado pavimentoso, não queratinizado. O tecido conjuntivo da pele é bastante frouxo, o que permite o seu movimento durante a relação sexual. A riqueza em fibras elásticas no tecido conjuntivo do prepúcio contribui para a sua retração, expondo a glande. O pênis é ricamente inervado com muitos fascículos nervosos e receptores sensoriais. A uretra não se fecha durante a ereção, permitindo a passagem do sêmen, porque a cápsula de conjuntivo ao redor do corpo esponjoso é bem mais delgada e com mais fibras elásticas do que a túnica albugínea em torno dos corpos cavernosos, além do ingurgitamento do corpo esponjoso ser menor. 28 Unidade I 2.4 Ejaculação Os espermatozoides permanecem na cauda do epidídimo até que ocorra a ejaculação. Durante esse processo, os gametas masculinos são conduzidos, com o fluido seminal, para fora do organismo. A ejaculação apresenta duas etapas: a emissão e a expulsão. 2.4.1 Emissão Durante esta etapa ocorre a estimulação do nervo pudendo, pertencente ao sistema nervoso simpático. Como consequência, há contração da musculatura lisa das cápsulas dos testículos, do epidídimo, do ducto deferente e do ducto ejaculatório. O espermatozoide é impulsionado em direção à uretra e recebe as secreções da vesícula seminal e da próstata, que também se contraem. Lembrete O sistema nervoso parassimpático participa da ereção. Os nervos eretores induzem vasodilatação e armazenamento de sangue nos corpos esponjosos e cavernosos do pênis. O fluido seminal, produzido nas vesículas seminais, é a maior parte do sêmen (aproximadamente 60% do volume). É um fluido alcalino, o que ajuda a neutralizar a acidez da vagina, resultando no aumento do tempo de vida do espermatozoide. É constituído de semenogelina (responsável pela viscosidade do sêmen), proteínas, enzimas, muco, ácido ascórbico, flavinas, fosfocolinas, prostaglandinas e frutose. Esta última é responsável por prover energia para a formação de ATP nas mitocôndrias. As prostaglandinas, por sua vez, parecem ser essenciais para promover a contração do trato reprodutor feminino e o consequente transporte dos espermatozoides em direção às tubas uterinas, local onde ocorre a fecundação.O fluido prostático constitui cerca de 10% do sêmen e contém íons, principalmente cálcio e zinco, ácido cítrico, enzimas proteolíticas, albumina e antígeno prostático específico (PSA, Prostate-Specific Antigen). As enzimas proteolíticas e o PSA são responsáveis por manter o sêmen mais líquido e, assim, possibilitar a livre movimentação dos espermatozoides. 29 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Saiba mais O câncer prostático é o segundo tipo de câncer mais frequente nos homens. Segundo o Inca (Instituto Nacional do Câncer), em 2018 foram diagnosticados 68.220 novos casos no Brasil, o que corresponde a um risco estimado de 66,12 casos a cada 100 mil homens. Níveis plasmáticos elevados de PSA sugerem câncer de próstata. Uma vez que existem outras condições que também podem levar à alteração desse marcador, indica-se que também seja feito o exame do toque retal para o rastreamento câncer prostático. Caso seja observada alguma condição sugestiva, deve-se realizar uma biópsia para confirmação do quadro. Segundo a Organização Mundial de Saúde, não há necessidade de realizar os exames de toque retal e a dosagem do PSA na ausência de sintomas sugestivos de câncer prostático, que incluem dificuldade de urinar, diminuição do jato de urina, sangue na urina etc. Mesmo assim, muitos médicos recomendam a realização desses exames a partir dos 45 anos de idade, como prevenção. Disponível em: https://shre.ink/rbSe. Acesso em: 29 jul. 2023. 2.4.2 Expulsão Quando o sêmen atinge a uretra masculina, ocorre contração do esfíncter interno dessa estrutura, o que impede a entrada do ejaculado na bexiga. Falhas nesse processo caracterizam a ejaculação retrógrada, na qual o sêmen mistura-se à urina, e é uma das causas da infertilidade masculina. Em resposta à estimulação do sistema nervoso simpático, os músculos bulbocavernoso e bulboesponjoso, localizados na região pélvica, contraem involuntariamente e de maneira ritmada, o que direciona o sêmen em direção ao esfíncter externo da uretra. Essa estrutura, por sua vez, abre e fecha em conjunção com as contrações dos músculos pélvicos, o que resulta na expulsão do sêmen em jorros sucessivos. 30 Unidade I 2.5 Hormônios masculinos e o controle da fertilidade Na puberdade, o eixo hipotálamo-hipófise-testículo torna-se ativo. O hipotálamo, estrutura do sistema nervoso central, inicia a secreção pulsátil de GnRH (hormônio liberador das gonadotrofinas). Esse hormônio atua sobre a hipófise, onde induz a produção de LH (hormônio luteinizante) e de FSH (hormônio folículo-estimulante). Os hormônios hipofisários, ou gonadotrofinas, atuam sobre as células testiculares desta forma: o LH estimula a produção de testosterona pelas células de Leydig e o FSH, com a testosterona recém-produzida, são responsáveis pela espermatogênese. Portanto, podemos dizer que a espermatogênese é dependente de dois hormônios: a testosterona e o FSH. A testosterona controla o processo de meiose, ao atuar diretamente sobre as espermatogônias. O FSH, por sua vez, age sobre as células de Sertoli, regulando a espermiogênese. A secreção de FSH, LH e testosterona é controlada pelo mecanismo de retroalimentação negativa (feedback negativo). A testosterona, quando atinge determinada concentração no plasma, é capaz de inibir a secreção das gonadotrofinas. Assim, à medida que a testosterona é produzida e cai na corrente sanguínea, ela reduz os níveis de FSH e de LH, o que diminui o estímulo sobre as células de Leydig e, portanto, a produção de mais testosterona. De maneira semelhante, as células de Sertoli produzem um hormônio denominado inibina sob ação do FSH; esse hormônio também é capaz de inibir a hipófise. O mecanismo de feedback negativo garante que a concentração de testosterona no plasma não ultrapasse a necessária para que ocorram seus efeitos fisiológicos. O excesso de testosterona pode resultar em efeitos potencialmente danosos, como, por exemplo, alteração da função hepática, hipertrofia e câncer prostático, perda da libido e infertilidade. 31 REPRODUÇÃO ASSISTIDA SNC Efeitos comportamentais Hipotálamo Hipófise anterior GnRH LH FSH Inibina Testosterona Efeitos virilizantes Espermatogênese Testículo Célula de Leydig Célula de Sertoli Figura 14 – Regulação por feedback negativo do eixo hipotálamo-hipófise-testículo nos homens. Efeitos estimulatórios são representados por (+) e efeitos inibitórios por feedback negativo são representados por (-). FSH, hormônio folículo-estimulante; GnRH, hormônio liberador de gonadotrofina; LH, hormônio luteinizante Fonte: Hall (2011, p. 1036). 32 Unidade I Além da espermatogênese, a testosterona é responsável pelo desenvolvimento dos órgãos sexuais masculinos durante o período embrionário, bem como das características sexuais masculinas que surgem durante a puberdade (aumento do pênis, aparecimento dos pelos corporais, engrossamento da voz, crescimento da oleosidade da pele, hipertrofia muscular, estirão de crescimento etc.), e pela manutenção da libido. A testosterona pode ainda ser convertida em outros hormônios, o estradiol e a di-hidrotestosterona (DHT), a partir da ação de enzimas específicas. Esses hormônios também são fundamentais para a manutenção da fisiologia masculina. Exemplo de aplicação Você já ouviu falar nas recentes pesquisas acerca do desenvolvimento de um anticoncepcional hormonal masculino? Trata-se de uma estratégia que objetiva a potencialização do mecanismo de feedback negativo detalhado anteriormente. Ensaios clínicos estão sendo realizados para avaliar o efeito do undecanoato de nandrolona, um derivado sintético da testosterona, sobre a espermatogênese. Os estudos iniciais mostram que o uso contínuo desse esteroide sintético é capaz de cessar a produção de espermatozoides e, portanto, atuar como anticoncepcional. No entanto, ainda se discute os seus efeitos em longo prazo, que podem, potencialmente, ser semelhantes aos observados com o uso de esteroides anabolizantes. A fim de evitar esses efeitos adversos, também estão sendo estudados métodos contraceptivos não hormonais, que atuariam em etapas da maturação do espermatozoide que não são dependentes de hormônios. O estradiol é um derivado estrogênico produzido em pequenas quantidades nos indivíduos do sexo masculino. É responsável pela regulação do metabolismo de carboidratos e de gorduras, pela saúde dos ossos (a osteoporose masculina pode ser tratada com estradiol) e, com a testosterona, pela regulação da libido. No homem, altas concentrações de estradiol estão relacionadas com o aparecimento de características femininas como, por exemplo, o aparecimento de mamas. Saiba mais Com o objetivo de conhecer mais sobre o tema, leia a revisão bibliográfica sobre contracepção masculina em: AMORY, J. K. Male contraception. Fertility and Sterility, v. 106, n. 6, p. 1303-1309, nov. 2016. Disponível em: http://tinyurl.com/yk6dbvdb. Acesso em: 23 jan. 2024. A DHT é um hormônio produzido em alguns órgãos (próstata, pele, folículos pilosos, sistema nervoso central e fígado) a partir da ação da enzima 5-alfa redutase sobre a testosterona. Esse hormônio participa, 33 REPRODUÇÃO ASSISTIDA com a testosterona, da diferenciação sexual masculina durante a vida intrauterina, da maturação do pênis e do escroto, do crescimento do cabelo facial e dos pelos corporais, da produção de sebo pela pele e do desenvolvimento e manutenção da próstata. O excesso de DHT está relacionado com o aparecimento de acne e seborreia, calvície, hirsutismo, hiperplasia e câncer prostático. O tratamento dessas condições é feito com fármacos inibidores da enzima 5-alfa redutase, como, por exemplo, a finasterida. Outros andrógenos, precursores da testosterona e menos potentes, também podem ser detectados no sangue. São eles: a dehidroepiandrosterona, a dehidroepiandrosterona-sulfato e a androstenediona. Mesmo durante a vida fetal, os testículos são estimulados pela gonadotrofina coriônica, proveniente da placenta, a produzirquantidades moderadas de testosterona por todo o período de desenvolvimento fetal e por 10 semanas ou mais após o nascimento; portanto, praticamente não é produzida testosterona durante a infância, até cerca da idade de 10 a 13 anos. Então, a produção de testosterona aumenta rapidamente sob estímulo dos hormônios gonadotrópicos da hipófise anterior, no início da puberdade, permanecendo assim pela maior parte do resto da vida, como mostrado na figura a seguir, diminuindo rapidamente após os 50 anos e caindo para 20% a 50% dos valores máximos, aos 80 anos. 5,0 2,5 1º Trimestre da gestação Te st os te ro na p la sm át ic a (n g/ m L) Testosterona plasmática (ng/mL) Fetal Neonatal Pubertal Adulto Senil Produção de esperm a (% m áxim o) Produção de esperma (% máximo) Nascimento Anos 2º 3º 1 10 17 40 60 80 50 100 Figura 15 – Os diferentes estágios da função sexual masculina, refletidos pelas concentrações médias de testosterona plasmática (linha vermelha) e pela produção de espermatozoides (linha azul) em diferentes idades Fonte: Hall (2011, p. 1033). 34 Unidade I 3 ANATOMOFISIOLOGIA DO SISTEMA REPRODUTOR FEMININO De acordo com Hall (2017), o trato reprodutor feminino tem como principais funções a produção e a maturação dos gametas femininos; a produção dos hormônios femininos (estrógenos e progesterona); a ovulação; a fertilização do ovócito; a gestação; e o parto. É constituído por dois ovários, duas tubas uterinas, um útero, uma vagina e uma vulva. Todos os órgãos encontram-se no interior da cavidade pélvica, à exceção da vulva. Tubas uterinas Ovários Útero Vagina Vulva Cérvix Figura 16 – Representação esquemática do trato reprodutor feminino e localização dos órgãos em relação à bacia Disponível em: http://tinyurl.com/ywy55nv4. Acesso em: 23 jan. 2024. Observação As mamas, responsáveis pela nutrição do concepto, pertencem ao sistema exócrino, e não ao sistema reprodutor. Entretanto, sua atividade também é modulada pelos hormônios sexuais. O sistema reprodutor feminino é bastante complexo. As glândulas mamárias fazem parte do sistema endócrino e são glândulas sudoríparas apócrinas modificadas. Possuem uma estrutura dinâmica, modificando-se com o decorrer da idade da mulher, sendo ativas com produção de leite, estimulada por hormônio prolactina para produzir leite, após o parto (período puerperal). Fora desse período são preenchidas por tecido adiposo. 35 REPRODUÇÃO ASSISTIDA Glândulas mamárias Cavidade uterina Canal cervical Vagina Colo do útero (cérvice) Tuba uterina Ovário Fímbrias Útero Figura 17 – Glândulas mamárias e o sistema reprodutivo interno com seus órgãos Fonte: Silverthorn (2017, p. 818). A seguir, as principais funções de cada órgão serão revisadas. • Ovários: são duas glândulas de forma amendoada, localizadas próximas às paredes laterais da pelve, uma de cada lado do útero. São responsáveis pela produção de ovogônias e ovócitos durante o período embrionário; pelo processo de foliculogênese, que nada mais é do que a maturação do folículo ovariano que antecede a ovulação; e pela produção dos hormônios femininos, progesterona e estrógenos. • Tubas uterinas: conectam os ovários ao útero. São dotadas de epitélio ciliado, cujo movimento contínuo impulsiona o ovócito, ou até mesmo o pré-embrião, em direção ao útero. As tubas uterinas apresentam forma de funil e é na região da ampola, mais dilatada, que ocorre a fecundação. Observação Eventualmente o embrião pode permanecer nas tubas uterinas, sem atingir o útero. Nesses casos, dizemos que ocorreu gravidez tubária, condição que inviabiliza a gestação. • Útero: é um órgão muscular oco, em forma de pera. Trata-se do local onde o embrião e o feto se desenvolvem. Sendo dividido em fundo, corpo, istmo e cérvix ou colo uterino. É constituído de miométrio (musculatura lisa) e revestido internamente por endométrio (epitélio glandular) que tem como funções a implantação e a nutrição inicial do embrião. 36 Unidade I • Vagina: é um órgão músculo-membranáceo distensível, formado por uma túnica mucosa, uma muscular e uma adventícia. Conecta o colo uterino ao óstio da vagina, próximo à uretra. Apresenta células ricas em glicogênio, que é fermentado pela microbiota local, o que confere caráter ácido à secreção vaginal. Está envolvida no escoamento do sangue menstrual e na concepção, a partir da penetração do pênis. • Vulva: refere-se à genitália externa, constituída pelo monte púbico, pelos lábios maiores e lábios menores, pelo vestíbulo da vagina, pelo clitóris e pelas glândulas acessórias (glândulas de Skene e de Bartholin), responsáveis pela lubrificação do local. Esta é a visão de um profissional da saúde enquanto realiza um exame pélvico (ginecológico) Clitóris Lábio menor Vagina Hímen (estirado) Óstio da uretra Ânus Lábio maior Figura 18 – Genitália externa feminina, mostrando a vagina, os lábios maiores e menores, o clitóris e os pelos púbicos Fonte: Silverthorn (2017, p. 818). Saiba mais A fim de compreender melhor a respeito da fisiologia e da regulação do trato reprodutor feminino, leia a seguinte obra: RIZZO, D. C. Fundamentos de anatomia e fisiologia. São Paulo: Cengage Learning, 2012. 37 REPRODUÇÃO ASSISTIDA 3.1 Ovogênese A ovogênese é a produção do gameta feminino, o ovócito, a partir de células precursoras denominadas ovogônias. Esse processo ocorre nos ovários. Os ovários são órgãos localizados na cavidade pélvica, um a cada lado do útero. De acordo com os tipos celulares, o ovário é dividido nas seguintes camadas, da mais externa para a mais interna: epitélio germinativo, túnica albugínea, córtex e medula. Estroma Folículo dominante Ovócito Folículo terciário inicial Folículo secundário Folículos primários Veia Artéria Corpo lúteo Corpo lúteo regredindo Ovócito ovulado Folículo rompido Figura 19 – Representação esquemática do ovário de uma mulher em idade reprodutiva, mostrando seus principais componentes Fonte: Silverthorn (2017, p. 818). O epitélio germinativo é constituído de epitélio pavimentoso ou cúbico simples. Inicialmente se pensava que as células da linhagem germinativa eram originadas desse epitélio, o que não é verdade, pois ela se origina no córtex do ovário. A túnica albugínea é uma camada de tecido conjuntivo denso não modelado, rico em colágeno. É menos espessa do que a túnica albugínea dos testículos. No córtex predominam os ovócitos rodeados por células foliculares, em uma estrutura denominada folículo ovariano. Os folículos ovarianos são a unidade básica do sistema reprodutor feminino, sendo responsáveis por promover as condições ideais para que haja a maturação do ovócito e, consequentemente, a ovulação. A medula é constituída de tecido conjuntivo frouxo e uma rede vascular. O sangue que atinge os ovários pela região do hilo, pertencente à medula, permite que os hormônios hipofisários atinjam o órgão e que os hormônios produzidos nos próprios ovários sejam distribuídos pelo organismo. 38 Unidade I A ovogênese é dividida em três etapas: a fase de multiplicação, a fase de crescimento e a fase de maturação. A fase de multiplicação ocorre a partir do primeiro mês da vida embrionária. Durante essa etapa, as células germinativas primordiais diferenciam-se em ovogônias. O número de ovogônias aumenta exponencialmente, em resposta às sucessivas mitoses que ocorrem nessas células. Como resultado, ao quinto mês de vida intrauterina, cada ovário tem milhões de ovogônias. A fase de crescimento também ocorre durante a vida embrionária, até o sétimo mês de desenvolvimento intrauterino. As ovogônias entram em meiose, que é interrompida precocemente, durante a prófase I. Observa-se, então, aumento do citoplasma dessas células, que passa a acumular substâncias nutritivas (vitelo). Essas células passam a ser chamadas de ovócitos primários, ainda são diploides e permanecerão em estado quiescente até a puberdade. Elas são rodeadas de células foliculares