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Autocompaixão na vida diária Um encontro gentil com você POR BEATRIZ GARCIA E BRUNA KRUG LIMA Me lembro que quando eu era criança eu adorava plantar feijões. Acho que toda criança curiosa e encantada com os fenômenos naturais gosta de plantar feijões, pois eles cres- cem rápido, assim como rapidamente nossos olhos brilham ao contemplar as folhinhas verdes surgindo. Há um ano, a minha cachorra, que era chamada de olhos de jabuticaba, morreu. Pensei em plantar uma jabuticabeira no local onde ela foi enterrada, mas desisti da ideia quando descobri que demoraria cerca de 11 anos para ela dar frutos e eu final- mente conseguir homenageá-la. Dizem que para ter uma vida bem vivida, temos que es- crever um livro, plantar uma árvore e ter um filho. Não fiz nada disso, ainda, mas tive e tenho alunas. E todo professor já sentiu a satisfação que sinto agora de ver uma semente que foi plantada dar um fruto tão especial. A Beatriz e a Bruna não são sementes de feijão, tampouco de uma jabuticabeira. São sementes de uma árvore que dá frutos no tempo certo, que é o tempo da dedicação a um estudo aprofundado sobre autocompaixão e, principalmen- te, da prática pessoal. Nesse e-book, o leitor começará a compreender o que é e o que não é a autocompaixão, experimentando, por meio de práticas simples e diárias, o quanto essa habilidade pode nos trazer mais bem-estar e uma vida mais significativa. Um convite delicado para umas das coisas mais desafiado- ras para o ser humano: a consciência do seu sofrimento e o cuidado consigo. Prefácio POR ERIKA LEONARDO DE SOUZA Psicóloga clinica. Dra em Ciências. Certified Teacher do programa de Mindfulness e AutocompaixÃO (MSC) pela Universidade da Califórnia San Diego e líder desse programa no Brasil @erikaleonardodesouza Nós nunca poderemos avaliar a extensão dos benefícios gerados por um encontro humano. Assim é com esse e-book produzido pelo encontro da Bia e da Bruna. Que essas práticas possam abrir o coração de muitas pessoas para o poder da autocompaixão assim como abriu o delas. Assim como abriu o meu. Muito obrigada a Bia e a Bruna pela companhia nessa aventura. Quando dedicamos compaixão a nós mesmos, estamos motivados a aliviar o nosso sofrimento, a nos dar o apoio que precisamos em um momento difícil e sermos gentis e aco- lhedores conosco, como seríamos com um cachorrinho ou com uma criança que chora. Essa motivação é capaz de nos dar um porto seguro quando não estamos vendo saída. É uma forma de estarmos sempre acompanhados de nossos desejos mais profundos de bem querer. Para começar a entender mais, vamos voltar um pou- quinho na história. A pesquisadora Kristin Neff foi a respon- sável por operacionalizar o conceito de autocompaixão. Com seus estudos, ela entendeu que quando estamos em um momento de sofrimento, podemos recorrer a três elemen- tos principais: mindfulness, humanidade compartilhada e autobondade . A partir desses componentes podemos aces- De maneira simples podemos definir autocompaixão da seguinte forma: Nesse ebook nós queremos te propor uma nova aven- tura! Saborear a vida através dos olhos da autocompaixão. Essas páginas transbordam nossos desejos de que a auto- compaixão possa mudar a sua vida como vem mudando a nossa. O QUE VOCÊ DIRIA PARA UMA PESSOA QUERIDA EM UM MOMENTO DE SOFRIMENTO? Introdução - Kristin Neff “Autocompaixão significa tratar a si mesmo com a mesma gentileza e cuidado com que você trataria um amigo” sar a autocompaixão, essa motivação genuína para aliviar e previnir nossa dor e sofrimento. Hoje existem diversas pesquisas (visite para saber mais https://self-compassion.org/) sendo feitas pelo mundo a fora sobre autocompaixão, comprovando seus benefícios para saúde em diversas áreas, como por exemplo redução de sin- tomas depressivos, altos níveis de ansiedade e melhor regu- lação emocional. Como falamos sobre a definição de autocompaixão, que tal entender um pouquinho melhor sobre esses três compo- nentes? Sabe aquele abraço apertado que você ouve o coração do outro bater? Ou aquele geladinho no pé que a gente sen- te no corpo todo quando pisamos na beira do mar? Ou então aquele momento em que você está mais ansiosa e conse- gue não julgar a sua emoção? Isso é Mindfulness (atenção plena)! Estar presentes e conectados com todos os nossos sentidos. Mindfulness (atenção plena) é um componente muito importante da autocompaixão porque, nos possibilita reco- nhecer o nosso sofrimento, para podermos nos dar apoio e gentileza. Se não deixarmos as emoções entrarem, a men- sagem de que estamos precisando de atenção e cuidado não chega até nós e dessa forma não conseguimos nos dar compaixão. O contrário de Mindfulness é a sobre-identificação com nossos processos internos (emoções, pensamentos e sen- sações). A sobre-identificação seria por exemplo, falar uma palavra errada ou inadequada em uma reunião, começar a sentir-se ansiosa com isso e se identificar 100% com essa emoção, como se ela fosse a única coisa que você vai sentir pelo resto da vida. Nesse exemplo a pessoa sentiria que se “torna” a emoção e isso pode acontecer com os pensamen- tos e sensações corporais também. Além disso, a pessoa aca- ba se julgando por sentir dessa forma. MINDFULNESS (ATENÇÃO PLENA): estar consciente mo- mento a momento da realidade tal como ela é. Tornando possível que pensamentos, sensações e sentimentos estejam presentes sem julgamento. Mindfulness 1. - Jon Kabat-Zinn “Mindfulness significa prestar atenção de uma certa maneira: de propósito, no momento pre- sente e sem julgamentos” Sugestão de exercício: Mindfulness na natureza Separe 15 minutos por dia para estar em contato com a natu- reza. Pode ser a praia, o céu, um jardim ou mesmo um vaso com plantas. O que importa aqui é treinar o olhar curioso! Que cor tem? Quais formatos? Texturas? Tem algum aroma? O que chama atenção do meu olhar? Experimente a natu- reza como se fosse a primeira vez. Sabe aqueles dias que estamos chateados porque algo deu errado? Cometemos uma falha, brigamos com alguém ou tivemos um plano frustrado? Acompanhado desses mo- mentos difíceis, geralmente temos pensamentos como: “nossa, tudo de errado acontece comigo” ou “eu sou um fracasso, como pude deixar isso acontecer?” E são nesses exatos momentos que precisamos lembrar da humanidade compartilhada. Vamos pensar juntos: Será que ninguém mais no mundo já passou por essa situação? Será que essa pessoa estaria se sentindo muito di- ferente de como você se sentiu? A humanidade compartilhada nos lembra que a falha é inerente à condição humana. Se não fossemos imperfeitos seríamos de outra espécie (robôs ainda nem inventados, tal- vez?) porque a perfeição não existe. Nesse momento pode- mos nos sentir mais conectados como comunidade e parar de ser tão críticos e julgadores com nós mesmos, porque afinal, se o sofrimento faz parte da vida de todos, por que não posso aceitá-lo e tentar acalmar a minha dor? O contrário da humanidade compartilhada é o isola- mento. Ele acontece quando nos criticamos por nos sen- tir de determinada maneira ou por alguma situação. Um exemplo seria uma pessoa que fica nervosa para fazer uma HUMANIDADE COMPARTILHADA: reconhecer que todas as pesso- as falham e que a imperfeição faz parte da humanidade. Um olhar autocompassivo entende que o sofrimento faz parte da vida. Humanidade Compartilhada 2. “Quando nos lembramos de que a dor faz parte da experiência humana compartilhada, cada momento de sofrimento é transformado em um momento de conexão com os outros.” - Kristin Neff e Chris Germer apresentação em uma aula e se julga por sentir o que sente, achando que outras pessoas lidam melhor com o que sen- tem do que ela. Ou uma pessoa que está presa no trânsito e começa a brigar com aquela situação alimentando pensa- mentos do tipo “isso só acontece comigo”, “tudo dá errado pra mim”. A humanidade compartilhada abre portas para um senso deconexão e amorosidade com nós mesmos, e va- mos ver isso no nosso terceiro componente. Sugestão de exercício: Pense em uma situação desafiadora de nível leve à modera- do. Agora pergunte-se: Como se sentiria uma pessoa que estivesse passando pela mesma situação? Será que essa é uma situação que só aconteceu/acontece comigo ou uma situação provável de acontecer com outras pessoas também? Todos nós sofremos e eventualmente, enquanto isso acon- tece, acabamos nos isolando na nossa dor e esquecendo que o sofrimento faz parte. Quando perceber seu sofrimen- to, lembre-se de que outras pessoas também podem estar passando por algo semelhante. “Gentileza gera gentileza dentro de você” - Beatriz Garcia É aqui que percebemos que a grande maioria das pesso- as consegue ter compaixão pelos outros, mas não por si. Em um momento de sofrimento tendemos a ser compreensivos e amorosos com quem amamos, mas para nós, reservamos todas as nossas críticas mais cruéis. A autobondade é que nos faz redirecionar essas atitudes gentis para nós mesmos. Per- ceba, essa bondade amorosa já está em você. Você sabe como ser acolhedor, já deve ter sido alguma vez com seus familiares ou amigos. Só precisa praticar desta maneira também com você. Somos seres humanos e estamos sofrendo, todos nós merecemos apoio e afeto, independente de qualquer coisa. O oposto da autobondade é a autocrítica. Isso acontece quando nos repreendemos de forma agressiva e até nos puni- mos por sentir algo ou por alguma atitude. Um exemplo pode ser quando cometemos algum equí- voco em uma roda de conversa e começamos a pensar coisas do tipo “ninguém vai gostar de ter esse tipo de companhia” ou “eu devo ser uma pessoa horrível por ter falado isso”. AUTOBONDADE: ser bondoso e compreensivo consigo ao invés de autocrítico e julgador, tendo uma postura de apoio e cuidado de si. Autobondade 3. Pause por um momento e rastreie pontos de tensão ou do- res no seu corpo. Em seguida dê a essa parte do corpo al- gum conforto, como por exemplo um alongamento, toque ou carinho. Dê ao seu corpo nesse momento uma presença amorosa e conectada. Lembrete: a intenção não é se livrar das dores, e sim confortar-se da melhor maneira possível. Sugestão de exercício: Quando falamos de Autocompaixão é comum encon- trarmos vários mitos sobre a temática. Precisamos entender e combater esses mitos para que possamos viver a Auto- compaixão plenamente. Do contrário, corremos o risco de ficarmos presos em ideias distorcidas do que é a Autocom- paixão. Mito 1: Autocompaixão é uma forma de autopiedade. Muitas pessoas tendem a pensar que Autocompaixão é uma forma de se vitimizar frente aos problemas. Na verdade, a Autocompaixão nos motiva a soltar o discurso queixoso e buscar fazer o que precisa ser feito para nos aproximar do bem-estar. Imagine que você precisa finalizar um relatório até sex- ta-feira e está se sentindo desmotivado para fazer esse tra- balho. Ter Autocompaixão não significa que você, desmoti- vado e sofrendo, vai ficar parado lamentando ter que fazer esse relatório. Autocompaixão vai te ajudar a encarar a reali- dade como ela é e te conduzir a fazer o que precisa ser feito, entendendo os seus limites de forma amorosa e te forne- cendo apoio ao longo do caminho, afinal de contas finalizar esse trabalho é importante para você. “Pesquisas mostram que pessoas compassivas são me- nos propensas a serem engolidas por pensamentos de autopiedade pelo o quanto as coisas são ruins. Essa é uma das razões pelas quais as pessoas autocompassi- vas têm melhor saúde mental” - Kristin Neff Mitos sobre a autocompaixão 4. Mito 2: Autocompaixão significa fraqueza. Autocompaixão é fonte de ternura e fonte de força. Chama- mos isso de yin e yang da Autocompaixão. Muitas pessoas con- fundem ser autocompassivo com ser frágil. Ao cultivarmos a Autocompaixão podemos sim nos beneficiar com a parte mais amorosa, mas também podemos e devemos nos beneficiar de sua parte de força e bravura. Para nos oferecermos Autocom- paixão, precisamos antes entrar em contato com o sofrimento. Quer maior sinal de força do que conseguir entrar em conta- to com o sofrimento e reconhecer que a vida pode ser difícil? Quer sinal maior de força do que se fornecer Autocompaixão quando as coisas não vão bem ou não saem como o esperado? “Ao invés de ser uma fraqueza, os pesquisadores estão des- cobrindo que a autocompaixão é uma das fontes mais pode- rosas de enfrentamento e resiliência que dispomos. Quando passamos por grandes crises de vida, a autocompaixão pa- rece fazer toda a diferença na nossa capacidade de sobrevi- ver e até mesmo de prosperar” - Kristin Neff Mito 3: Autocompaixão vai me tornar complacente. Autocompaixão é uma fonte de motivação mais efetiva que a autocrítica ou autopunição. Quando somos duros conosco, a tendência é que nos sintamos ainda mais paralisados por vergonha e medo de falhar. A autocompaixão nos convida a ir além e tentar novamente, afinal de contas as falhas são hu- manas e esperadas ao longo da vida. Ela nos impulsiona a ir ao encontro do que importa. Pen- se em uma pessoa que você ama muito e que de repente te diz que agora vai “chutar o balde”, não ir mais trabalhar, rom- per seus laços e fazer o que estiver com vontade de fazer. Seria compassivo escutar isso e não se preocupar com o bem-estar dessa pessoa? Será mesmo que você conseguiria concordar sem alertar que ela pode se arrepender de apenas escolher o prazer imediato? Autocompaixão te dá esse sinal de alerta. Ela te mostra que escolher o que é importante ao invés de ir pelo caminho mais fácil significa cuidar bem de você. Mito 4: Autocompaixão é narcisismo. Autocompaixão nos convida a olhar para nossa humanida- de compartilhada, reconhecendo e aceitando nossas falhas e imperfeições. Ela tem os mesmos benefícios positivos da autoestima, mas sem a fragilidade e a necessidade (ilusória) de se sentir acima da média o tempo todo, visto que isso não é possível. Não existe possibilidade de todos estarmos acima da média em tudo. Imagine alguém que tem a necessidade de ser o melhor sempre. Essa pessoa eventualmente vai se frus- trar ao perceber que não existe chances de sempre ganhar. Autocompaixão nos lembra disso e nos ensina que nosso va- lor está em sermos nós mesmos e não em sermos os “melho- res”. Mito 5: Autocompaixão é egoísta. A autocompaixão também fortalece nossos vínculos. Quan- do estamos nos fornecendo o que precisamos, por exemplo, saímos do isolamento e passamos a nos colocar nas relações de forma mais aberta. Isso nos permite uma entrega e tam- bém nos permite estar junto com o outro compassivamente. Quando passamos a olhar de forma mais compassiva para nosso sofrimento, também conseguimos reconhecer e nos conectar de forma mais compassiva com o sofrimento alheio. “Um corpo crescente de pesquisas indica que a autocompaixão ajuda as pessoas a manterem uma atitude de cuidado com os outros” - Kristin Neff e reflita:Agora pare um pouco Quais são minhas apreensões sobre a Autocompaixão? Se tenho apreensões, será que são minhas mesmo? Muitas vezes podemos ter moldado uma ideia sobre autocompai- xão em cima do que outras pessoas pensam ou em cima do que acreditamos que a sociedade pensa. Para seguirmos, pedimos que vocês investiguem isso com curiosidade. Por exemplo Joana é uma mulher de 40 anos. Advogada, casada e com um filho de 6 anos. Joana pensa que ser mais auto- compassiva vai fazer dela uma mãe muito “mole” e uma profissional sem responsabilidade. Joana sofre com crises de ansiedade há dois anos, quando começou em uma nova empresa com outros colegas. Ela se cobra para ser uma ex- celente profissional, ser uma ótima mãe e uma esposa nota 10. Recentemente Joana tem se sentido perdida em todos os papéis da sua vida e se questionado se é digna de ter uma família e um emprego, visto que não tem conseguido atingir os altos padrões que colocou para si. Os mitos da Autocompaixão que mais atrapalhavamJoana eram de que ela se tornaria uma pessoa fraca e pre- guiçosa. Joana buscou terapia e sua psicóloga a ajudou a quebrar esses mitos, então ela percebeu que ser autocom- passiva fazia ela educar seu filho com limites amorosos e ser mais flexível e competente no trabalho. Umpensamento comum que autocompaixão é perigo- sa e vai afastar as pessoas do que importa. É quase como se a gente só se motivasse a partir da autocrítica. E com isso acabamos vivendo em pé de guerra conosco. Com a Autocompaixão, buscamos aliviar o sofrimento. Todos nós queremos nos sentir bem e felizes. A Autocom- paixão pode ser como aquela mãe ou aquele pai, que ao ver que o filho tirou uma nota baixa, vai dizer: “Meu amor, você deve estar triste. Venha aqui, deixa eu te abraçar. Quero te ajudar a estudar mais para que você possa tirar uma boa nota e entrar na faculdade que é seu sonho. Tem algo que eu possa fazer para te ajudar com isso?” Quando estamos constantemente nos criticando, rea- lizar alguma coisa parece ser algo muito assustador. A dor de falhar pode ser tão grande que nos domina, a ponto de perdermos a vontade de tentar. A Autocompaixão nos motiva, através da humanidade compartilhada, nos ajudando a entender que errar faz parte de ser humano e que podemos nos arriscar, porque todos estamos em um processo de aprendizado na vida. Afinal de contas se cairmos, podemos nós mesmos cuidar do machu- cado com carinho. Quando não temos Autocompaixão, pioramos nossa si- tuação nos motivando através da autocrítica. Por exemplo “se eu não der conta de tudo hoje sou um fracasso”. Uma postura autocompassiva inclui reconhecer o sofrimento e se fornecer o apoio necessário. Por exemplo “isso é realmente difícil, mas vou fazer o possível hoje entendendo quais são os meus limites”. Motivação autocompassiva 5. “A motivação da autocompaixão se origina no amor, enquanto a autocrítica se origina do medo. O amor é mais poderoso que o medo.” - Kristin Neff e Chris Germer “Quando temos dificuldades, damos a nós mesmos compaixão não para nos sentirmos melhor, mas porque nos sentimos mal.” - Kristin Neff e Chris Germer Sugerimos que você comece seu cultivo de Autocompai- xão devagar, colocando uma intenção genuína de se cuidar quando for tomar banho, se alimentar, pentear os cabelos ou escovar os dentes. Pode parecer pouco, mas podemos estar a todo tempo nos cuidando e amparando. Podemos estar to- mando um chá como algo da rotina e sem uma intenção de cuidado. Ou podemos preparar esse mesmo chá com a inten- ção de estarmos cuidando de nós mesmos em um momento de sofrimento. Esse chá vai ter um “sabor” diferente se estiver- mos ativamente buscando nosso próprio bem-estar. A intenção é a chave 6. Sugestão de exercício: Autocompaixão é ativa e não passiva. Então, selecione atividades rotineiras e experimente encará-las como sua prá- tica de autocompaixão diária, como uma atitude de apoio a si mesmo. Perceba como se relacionou com essa experiência. Como eu trato um amigo? Pense em alguma situação desafia- dora que você tenha vivido, tente lembrar como você se tratou naquele momento. Agora experimente mudar de lugar. Busque imaginar um ami- go querido te contando essa mesma situação. Imagine que esse amigo está sofrendo e se criticando por viver isso. Agora pense: O que você diria para esse amigo? Quais palavras você escolheria para acolher a dor dele? Que tom de voz usaria? Quais gestos gostaria de fazer? E sua expressão facial como seria? Notou alguma diferença? Muitas pessoas se assustam ao per- ceber o quanto se tratam de forma mais hostil do que tratam pessoas queridas ao seu redor. Se esse foi o seu caso, bem-vin- do à experiência humana. Você não precisa se criticar por isso também. Apenas se parabenize por ter tirado esse tempo para perceber. Esse já é um passo muito importante. Nas próximas vezes que você se perceber sendo grosseiro com você mesmo, quem sabe você pode lembrar desse exercí- cio? Quem sabe você pode tentar se tratar com a mesma gen- tileza e doçura que trataria uma pessoa querida passando pela mesma situação? Mas não apresse seu processo caso seja difícil direcionar essa amorosidade para você. No começo isso pode ser mais desafiador e aos poucos essa sementinha vai criando raízes no nosso coração. Respeite seu tempo e use esse e-book como lembrete para regar as sementinhas. Exercício: (Exercício inspirado no livro Manual de Mindfulness e Autocompaixão - um Guia para construir forças internas e prosperar na arte de ser seu melhor ami- go, capítulo 1 página 9) Se tem algo que podemos prever, é que a mudança fará parte de nossos dias. E algo importante de se aprender é o desapego, para lidar com a impermanência da vida. Quando temos uma postura de aceitação diante das situações, mes- mo que as coisas não aconteçam como gostaríamos, reco- nhecemos que aquilo já está ali ao invés de travar uma bata- lha com a vida tendo pensamentos como “isso não deveria ser assim” e tentativas de ter o controle. Receber a realida- de sem julgamentos, permite uma expansão de visão, para que possamos agir com consciência no momento presente e nos oferecer o cuidado que precisamos. Imagine que você planejou uma viagem de férias para uma praia maravilhosa, fez diversos planos de relaxar sob as palmeiras e um Sol brilhante. Mas, infelizmente o Sol não veio e as nuvens escuras parecem exatamente com o que você sente em seu coração. Se deixar absorver com pensa- mentos como “eu deveria ter checado melhor o tempo” ou “joguei minhas férias no lixo”, provavelmente fará com que você fique mergulhado em emoções desconfortáveis e de fato perca todas as suas férias. Sofrimento faz parte da vida 7. Uma postura de aceitação seria perceber a dor de ter tido seus planos frustrados e perguntar-se “o que eu pre- ciso agora para lidar com essa frustração?”. Em um movi- mento de expansão de visão, podemos tirar a frustração de uma perspectiva central, e nos perguntar “o que mais tem aqui?”. Você pode se surpreender ao perceber que mesmo na chuva, é possível ter um momentinho de qualidade com você ou uma pessoa querida, e encontrar outras formas de satisfação naquele momento. Podemos nos relacionar dessa forma também com o sofrimento - o sofrimento faz parte da vida - entender isso nos aproxima de aceitar a realidade tal como ela é. Negar a existência de experiências desagradáveis não faz com que elas parem de aparecer, muito pelo contrário, nos afoga em insatisfação e inércia - afinal, como vou me dar o que preciso se não me abro para experiência, mesmo que desagradável, do meu sentir? A Autocompaixão quer acolher nosso sofrimento e en- tender a nossa dor. Se o sofrimento faz parte da vida, a auto- compaixão também deve fazer, trazendo uma resposta ati- va, calorosa e gentil para tolerarmos o que nos machuca. Para experimentar se relacionar de forma gentil com o sofrimento, sugerimos que você escolha uma situação que perceba um mal estar de leve a médio – ao começar a expe- rimentar autocompaixão não queremos que você se sobre- carregue. Agora que você escolheu a sua situação de desconforto repita para si: “Esse é um momento de sofrimento. O sofri- mento faz parte da vida.” com a voz mais acolhedora que conseguir, podendo repetir algumas vezes até achar o tom. Nesse momento perceba se é possível acolher a si mes- mo de alguma forma. Fazendo algumas respirações mais profundas onde você possa repousar sua atenção, ou algum toque suave, como juntar as duas mãos, colocando sua aten- ção na sensação desse toque e na intenção de cuidar-se. Lembre-se, não estamos tentando fazer com que a dor vá embora, e sim trazendo a esse momento de desconforto uma sensação de apoio e segurança. “Perceber com clareza o que está acontecendo dentro de nós e encarar o que vemos com nosso coração aberto, gentil e amoroso é o que chamo de Aceitação Radical.” - Tara Brach Exercício: Respondendo ao mal estar Autoapreciação8. Como é o seu olhar para você? Muitas pessoas conse- guem apreciar as qualidades dos outros, mas não as próprias. Isso diversas vezes vem de ideias distorcidas que nós temos como “posso parecer arrogante se reconhecer minhas quali- dades” ou “se eu assumir que sou bom em algo terei que ser o melhor sempre”. A verdade é que o ser humano é compos- to de qualidades e defeitos e por isso devemos ter o cuidado de não focar em apenas um deles, mas reconhecer a nossa humanidade como um todo. Se nos apegarmos apenas nas nossas boas qualidades, podemos correr o risco de cair na armadilha da presunção. E por outro lado, não reconhecer nada de bom em nós mesmos, pode nos levar a um sofri- mento intenso. A chave é entender que todos somos bons em alguma coisa e temos potencialidades. E nossas limitações não sig- nificam fraqueza. Tome como exemplo o caso de Guilher- me: Guilherme tem sua própria confeitaria. Apesar de rece- ber diversos elogios pelos seus doces, Guilherme constan- temente olhava só para o que faltava. Ele pensava coisas do tipo “as pessoas só me elogiam por educação”e “nada que eu faço está bom o bastante”. Ele era incapaz de reconhecer o próprio talento e o sucesso da confeitaria. Após fazer o cur- so de 8 semanas de Mindfulness e Autocompaixão (MSC), ele percebeu que focava demais em suas faltas e compro- meteu-se a se autoapreciar mais. Guilherme entendeu que o sucesso vinha da sua dedicação e passou a se comparar menos com outros confeiteiros. Embora ele saiba que tem receitas que ainda não consegue fazer, agora ele não se de- fine por isso e vê a realidade de forma mais clara. (Exercício inspirado no livro Manual de Mindfulness e Autocompaixão - um Guia para construir forças internas e prosperar na arte de ser seu melhor amigo, ca- pítulo 4 página 32) Como você recebe os elogios que ganha? Quão confortável você se sente ao reconhecer suas boas qualidades? Quão apegado você é às suas limitações? “É importante valorizarmos nossos pontos fortes, as- sim como termos compaixão por nossos pontos fra- cos, para que possamos nos aceitar integralmente, exatamente como somos.” - Kristin Neff e Chris Germer Convite para reflexão: Você está fazendo o seu melhor todos os dias, encaran- do suas dificuldades e sendo você mesmo no mundo! Mui- tas vezes deixamos de nos parabenizar e reconhecer. Então hoje o convite é se recompensar por ser exatamente do jeiti- nho que você é, imperfeito e ainda assim digno de amor, res- peito e um verdadeiro batalhador! O que você faz por você apenas em ocasiões especiais? Faça hoje! Porque especial é todo dia que estamos conectados com nós mesmos e com a vida! - Fica aqui nossa sugestão: se envie flores, faça um jantar para você com sua refeição preferida ou se dê um dia de folga! Exercício: Que você possa se recompensar por ser quem você é! A Autocompaixão é um processo e ele não é linear. Em alguns momentos pode se parecer com uma montanha- -russa. Podemos perceber o esforço e a busca por “fazer cer- to” tomar conta de nós e acabar nos distanciando da experi- ência e da conexão com nós mesmos. Isso acontece porque esse esforço é uma forma de resistir ao sofrimento ao invés de estar com essa dor no momento presente de forma amo- rosa e conectada. O cultivo da Autocompaixão não funciona como uma poção mágica onde vamos tomar algo e instantaneamente parar de sofrer. Se a Autocompaixão se torna apenas mais uma “técnica”, a tendência é que a gente se sinta desiludido por ela nem sempre “funcionar”. É por isso que precisamos cultivar a aceitação radical olhando para o sofrimento como ele é e parando de lutar e resistir. Assim, a Autocompaixão pode estar mais relacionada à intenção de cuidarmos da nossa dor e sermos amorosos conosco enquanto sofremos. Autocompaixão como um processo “Ainda podemos ser loucos depois de todos esses anos. Ainda podemos ser raivosos depois de todos esses anos. Ainda podemos ser tímidos ou ciumentos ou cheios de sentimentos de desvalorização. A questão é… não tentar nos jogarmos fora e nos tornarmos alguma coisa melhor. É sobre sermos amigos de quem já somos.” - Pema Chodron Chegando ao final desse ebook nós queremos fazer um convite muito especial. Quando foi a última vez que você escreveu uma carta? E quanto foi a última vez que você es- creveu uma carta para você? Vamos experimentar? Agora que você já leu um pouco mais sobre Autocompaixão e essa sementinha está plantada em cima do seu coração, escre- ver uma carta pode ser algo para regar essa semente. Pedi- mos então que você leia as instruções em um momento de abertura, quietude e tempo, para que você possa sentar e escrever. Essa carta vai ser uma carta para você e você pode escrever como se estivesse escrevendo para uma melhor amiga. Escreva com ternura e busque palavras gentis para usar. Desejamos que esse momento de escrita seja a opor- tunidade de mais um encontro seu com você. Um encontro seguro, quentinho e amoroso. Vamos inserir aqui algumas instruções para guiar essa atividade, mas não fique presa em regras. Abra espaço para também notar o que você pre- cisa e o que pode fazer para tornar esse momento um mo- mento agradável. Carta compassiva 10. Por exemplo De tempos em tempos tente reescrever essa carta au- tocompassiva. Esse é um convite que podemos nos fazer vá- rias vezes. - Separe uma folha de papel e lápis ou caneta; - Encontre um lugar silencioso e seguro, onde você se sinta livre para entrar em contato com suas emoções; - Escolha escrever essa carta quando você tiver tempo para viver esse momento. Não faça isso com pressa; - Separe um chazinho, uma cobertinha, coloque um cheiri- nho gostoso. Busque tornar esse ambiente o mais confortá- vel possível; - Escreva uma carta para você ler em momentos difíceis. Uma carta gentil que vai te lembrar do que você precisa ou- vir quando está sofrendo. O que você diria para você? O que será que você precisa ouvir? Escreva cada linha tentando in- serir palavras de cuidado e conforto; - Se acolha durante essa experiência; - Ao final, guarde essa carta em um lugar onde você possa acessar facilmente; - Agora chegou a hora de marcar o próximo encontro. Mar- que no seu celular, agenda ou calendário uma data daqui a dois meses para reler essa carta. Por vezes a vida acontece depressa e nos perdemos nos nossos dias. E por isso esque- cemos de alimentar nosso lado compassivo. Esse encontro marcado será um lembrete de se reconectar com você; Por exemplo “Querida (o/e) desejo que você possa ser feliz e não so- frer, sei que alguns momentos são difíceis mas quero que saiba que você tem meu apoio e é forte por estar tentan- do(...) assinado: sua voz autocompassiva” (Exercício inspirado no livro Manual de Mindfulness e Autocompaixão - um Guia para construir forças internas e prosperar na arte de ser seu melhor amigo) Exercício: “Quando você cometer um erro Não se abandone Quando você se sentir insegura Não se abandone Quando você se sentir insuficiente Não se abandone Quando você falhar Não se abandone Quando o fracasso bater na sua porta Não se abandone Quando você se frustrar Não se abandone Quando você se sentir a pior Não se abandone Você é um ser humano Não se abandone por ser Apenas seja” Bruna Krug Lima Beatriz: Meu nome é Beatriz Garcia, @beatrizgarciapsi, e mi- nha atuação clínica reflete o que eu experimentei na vida pra aliviar meu sofrimento e senti vontade de dividir com outras pessoas; sou psicóloga formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e atuo como psicoterapeuta com a Terapia Cognitivo Comportamental e a Terapia do Esque- ma, com jovens e adultos. Desde que comecei a vivenciar o mindfulness e a autocompaixão percebi que não poderia ser algo pra ficar guardado só pra mim; eu queria passar adian- te; semear. Hoje, alinhada com esse propósito, faço parte do Núcleo de Disfunções Sexuais no IPUB/UFRJ e estou por lá trabalhando para ampliar as pesquisas em autocompaixão no Brasil.Nessa aventura que é mergulhar na autocompaixão, encon- trei a Bruna, e decidimos nos unir para fazer com muito ca- rinho esse e-book pra vocês! Que você possa experimentar a autocompaixão florescer! Apresentações pessoais Bruna: Eu sou a Bruna, sou psicóloga do @psicofoadacaixa lá no Instagram e estou agora na minha segunda especializa- ção. Tenho aquela sensação de que encontrei algo dentro da Psicologia que fez e faz tanto sentido pra mim que eu preciso transbordar isso para outras pessoas. Esse material aqui junto com a Bia é um dos meus transbordamentos. Me formei na Universidade Feevale em 2018 e hoje atuo com a clínica de adultos apenas na modalidade on-line. Além disso, curto pra caramba trabalhar com grupos dando palestras e workshops. Meus valores de vida são: autenticidade, liberda- de, conexão, humor, compaixão e abertura. Esse é o plano de fundo para tudo que faço e espero que tenha conseguido transmitir um pouco disso aqui. Brach, Tara (2021). Aceitação Radical. Rio de Janeiro: Sextante. Neff, K. D. (2011). Self-Compassion, Self-Esteem, and Well-Being. Social and Personality Psychology Com- pass, 5, 1–12. https://doi.org/10.1111/j. 1751-9004.2010.00330.x Neff, K. D. (2017). Autocompaixão: Pare de se torturar e deixe a insegurança para trás. Teresópolis: Lúcida Letra. Neff, K. D., Germer, C. (2019). Manual de Mindfulness e autocompaixão: um guia para construir forças internas e prospe- rar na arte de ser seu melhor amigo. Porto Alegre: Artmed CHWYL, C.; CHEN, P.; ZAKI, J. Beliefs About Self-Compassion: Implications for Coping and Self-Improvement. Persona- lity and Social Psychology Bulletin, v. 47, n. 9, p. 1327–1342, 2021. Referências: