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XXII Encontro Nacional de Ensino de Química ENEQ - UFPA XXII Encontro Nacional de Ensino de Química - ENEQ Belém/PA – 09 a 12 de setembro de 2024 Área do trabalho EA Uma Unidade de Ensino Potencialmente Significativa com a temática automedicação para o ensino de funções orgânicas nitrogenadas Danielle Prazeres Reppold (PG), Ellen Rosa Vasconcellos (IC), Daniele Trajano Raupp (PQ)daniele.raupp@ufrgs.br. Instituto de Química, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Av. Bento Gonçalves, 9500, Agronomia, Porto Alegre, RS. Palavras-Chave: Aprendizagem Significativa, Sequência didática, Funções Orgânicas. O presente trabalho apresenta um relato de experiência da implementação de uma Unidade de Ensino Potencialmente Significativa (UEPS), que foi aplicada durante Estágio de Docência em Ensino de Química, em uma escola pública da região metropolitana de Porto Alegre – RS. Partindo dos pressupostos da Teoria da Aprendizagem Significativa de Ausubel e da proposta de UEPS´s de Moreira, considera-se que o papel do professor é apresentar situações-problema cuidadosamente selecionadas para que ocorra a captação de significados por parte dos aprendizes. Por isso, uma das atividades da UEPS foi um júri simulado sobre a comercialização da dipirona, medicamento mais popular no país para tratamento de dores e febre. O foco foi proporcionar o estabelecimento de relações entre princípios ativos de fármacos e funções orgânicas nitrogenadas, como resultado observou-se um espaço de reflexão sobre a automedicação e suas consequências e a conexão do fator social com os conhecimentos da área de orgânica. INTRODUÇÃO Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) revelam que, em todo o mundo, mais de 50% de todos os medicamentos receitados são dispensáveis ou vendidos de forma inadequada. Cerca de 1/3 da população mundial tem carência no acesso a remédios essenciais e metade dos pacientes tomam medicamentos de forma inadequada. Atualmente temos facilitado a fármacos que têm múltiplas potencialidades: desde o rejuvenescimento ao combate da dor. “No Brasil e no mundo a prática da automedicação tem se tornado bastante comum, na expectativa de trazer a si o alívio de dores e desconfortos, sem que as consequências ao próprio corpo, de tomar um remédio sem prescrição médica, pode ter efeitos leves, moderados e mesmo graves.” (De Oliveira Rezende, 2023, p.2). No Brasil são comercializados medicamentos sob prescrição médica e os isentos de prescrição (Huertas; Hurdan, 2004). Em território nacional, há pouca vigilância em relação à compra e consumo de medicamentos isentos de prescrição – MIPs. Mesmo com a RDC1 20/2011 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, que dispõe sobre o controle de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos, de uso sob prescrição, isoladas ou em associação. (Brasil, 2011). O uso indiscriminado de antibióticos, por exemplo, é UM problema de saúde pública. As intoxicações e a resistência microbiana a diversos antibióticos atualmente utilizados, é uma das consequências da prática da automedicação (Calixto; Cavalheiro, 2012). A automedicação é caracterizada como a busca espontânea por medicamentos para 1 RDC - Resolução da Diretoria Colegiada São normas regulamentares cujo objetivo é atribuir responsabilidades a empresas e profissionais a fim de garantir as Boas Práticas mantendo os padrões de qualidade dos produtos e serviços destinados à saúde da população. XXII Encontro Nacional de Ensino de Química ENEQ - UFPA XXII Encontro Nacional de Ensino de Química - ENEQ Belém/PA – 09 a 12 de setembro de 2024 Área do trabalho EA resolver algum problema de saúde, sem prescrição por profissional mediante avaliação clínica. No Brasil destaca-se , especialmente o consumo dos medicamentos isentos de prescrição, como por exemplos analgésicos, anti-inflamatórios e antipiréticos (Brito et al, 2024). De acordo com a ANVISA a automedicação principalmente durante a pandemia de Covid-19, aumentou ainda mais as preocupações das autoridades sanitárias, já que não havia farmacoterapia para a prevenção ou tratamento da doença. A população precisou de maior conscientização sobre os riscos que a prática da automedicação pode causar para a saúde diante de suas reações adversas, inclusive óbito. (D’Ávila; Andrade, 2023). Conceitualmente, moléculas orgânicas polifuncionais com funções nitrogenadas são típicas dos princípios ativos dos medicamentos e por isso são um bom exemplo para estabelecer uma relação lógica entre a temática e os conhecimentos químicos relacionados às funções orgânicas (Figura 1). Figura 1: Princípios ativos de medicamentos isentos de prescrição e os grupos funcionais Considerando as pesquisas identificam a química orgânica como uma área de difícil compreensão para os alunos, bem como a extensa literatura relativa aos fatores que contribuem para tais dificuldades que apontam a compreensão sobre a classificação dos compostos orgânicos como uma das principais dificuldades (O'Dwyer, Childs, 2017), buscou-se criar e aplicar uma sequência didática contextualizando os princípios ativos de medicamentos isentos de prescrição e os conceitos básicos de funções orgânicas nitrogenadas. REFERENCIAL TEÓRICO A Teoria da Aprendizagem Significativa, de David Ausubel, foca na aquisição de conhecimento e na construção da estrutura cognitiva. Para Ausubel, a aprendizagem envolve a interação de novas informações com o conhecimento prévio do indivíduo, de forma não literal e arbitrária. A aprendizagem mecânica, baseada na memorização sem conexão com conhecimentos anteriores, tende a ser menos duradoura na estrutura cognitiva. A aprendizagem significativa ocorre quando a nova informação se conecta ao XXII Encontro Nacional de Ensino de Química ENEQ - UFPA XXII Encontro Nacional de Ensino de Química - ENEQ Belém/PA – 09 a 12 de setembro de 2024 Área do trabalho EA conhecimento prévio, resultando na construção de significados pessoais. Essa interação não deve ser com qualquer ideia prévia, mas com conhecimento relevante já existente na estrutura cognitiva, chamado de subsunçor (Ausubel, 2012; Moreira, 2011;Tavares, 2004). As atividades de ensino devem facilitar a construção de relações lógicas, partindo de conceitos básicos para os mais específicos e depois retornando aos conhecimentos mais amplos (diferenciação progressiva e reconciliação integrativa, respectivamente). Isso implica na reorganização das relações conceituais devido à incorporação de novos conceitos à estrutura cognitiva (Konflanz et al, 2020). As Unidades de Ensino Potencialmente Significativas (UEPS ́s) são propostas didáticas que objetivam a aprendizagem significativa e existem em oposição à aprendizagem mecânica, a qual é puramente memorística. Esse tipo de proposta didática tem como argumento principal a contribuição para romper com uma proposta de ensino na memorização de conteúdo, proporcionando apenas a aprendizagem mecânica (Moreira, 2011). As UEPS são organizadas em etapas que compreendem basicamente: Situação inicial – para compreender os conhecimentos prévios dos estudantes; Situação-problema inicial – com nível introdutório que visa dar um sentido ao conceito; Aprofundamento do conhecimento – abordagem a partir da diferenciação progressiva; Nova situação- problema – questionamentos com um nível de profundidade maior, evidenciando as correspondências e entre os conceitos; Avaliação somativa individual – de caráter processual, comparando as situações problemas, evidenciando a captação de significados; Aula integradora final – com uma ótica integradora, busca a reconciliação integrativa entre os conceitos; Avaliação da aprendizagem – deve-se buscar evidências de compreensão de significados e capacidade de utilizaçãodo conhecimento para diferentes situações ao longo da implementação da UEPS (avaliação processual), privilegiando as atividades colaborativas, e finalizando a mesma com uma avaliação somativa individual; Avaliação da própria UEPS – A fim de aprimorar as estratégias de ensino, realizar uma avaliação da perspectiva dos estudantes.(Trajano Raupp et al, 2023). METODOLOGIA A UEPS foi desenvolvida e aplicada durante o Estágio de Docência em Química II, do Curso de Licenciatura em Química da UFRGS em 2 turmas de uma escola técnica da rede pública de ensino do Rio Grande do Sul, na disciplina de Química Orgânica I. As atividades ocorreram no primeiro semestre de 2020. A UEPS contou com atividades para 12 aulas de 50 minutos cada, conforme Quadro 1. Quadro 1: Detalhamento da Unidade de Ensino Potencialmente Significativa AULA ETAPA DA UEPS ESTRATÉGIA/RECURSO OBJETIVO AULA 1 Apresentação da Proposta de UEPS 1. Apresentação inicial e intenção da UEPS; 2. Orientações de como criar um mapa conceitual; 3. Criação Individual do mapa conceitual sobre medicamento; Identificar conhecimentos prévios XXII Encontro Nacional de Ensino de Química ENEQ - UFPA XXII Encontro Nacional de Ensino de Química - ENEQ Belém/PA – 09 a 12 de setembro de 2024 Área do trabalho EA Situação Inicial 4. Leitura e interpretação de dois poemas; 5. Apresentação de dados estatísticos sobre automedicação. diferenciação progressiva AULA 2 Aprofundamento do Conhecimento Situação Problema – Inicial Aprofundamento do Conhecimento 1. Diferenciações Farmacológicas; 2. “Que medicamentos você utiliza quando sente mal-estar?” – com dinâmica da coleta de medicamentos; 3. Efeitos da automedicação e interações medicamentosas; 4. Apresentação e diferenciação das estruturas moleculares de medicamentos selecionados; 5. Introdução às funções nitrogenadas. situação- problema de nível introdutório diferenciação progressiva AULA 3 à 8 Aprofundamento do Conhecimento AMINAS, AMIDAS E FUNÇÕES NITRO diferenciação progressiva AULA 9 e 10 Nova Situação – Problema Aula Integradora Final 1. TRIBUNAL SIMULADO 2. Solicitação de um mapa conceitual individual com prazo de entrega para última aula situação- problema de nível complexo reconciliação integradora AULA 11 Avaliação Somativa Individual ATIVIDADE AVALIATIVA avaliação somativa AULA 12 Avaliação da Aprendizagem na UEPS Avaliação da UEPS Avaliação da UEPS através do Google Forms® e análise das atividades avaliativas formativas e somativa. evidência de aprendizagem significativa Abordando especificamente a atividade do jurí simulado, essa foi a proposta de uma nova situação problema com maior nível de complexidade envolvendo uma atividade colaborativa, que estimula os alunos a interagirem socialmente, negociando significados, utilizando todos os conceitos adquiridos ao longo da UEPS, tendo o professor como mediador. Tal atividade é um meio para contextualizar uma problemática (real ou simulada), uma vez que incentiva e mobiliza diferentes conhecimentos e, por isso, pode ter potencial para a aprendizagem de conceitos científicos, uma vez que os estudantes compreendam melhor as aplicações dos conceitos científicos (Veiga; Fonseca, 2018; De Souza et al, 2019). A turma foi dividida em duas equipes: metade pertencia aos advogados do caso e a outra metade compôs o júri popular. Aqueles que estiverem na atividade jurídica de acusação e defesa, decompuseram em quatro grupos menores: ¼ assumiu a Promotoria (P1) do acusado 1, ¼ Defesa 1(D1) do acusado 1, ¼ Promotoria 2 (P2) do acusado 2, ¼ XXII Encontro Nacional de Ensino de Química ENEQ - UFPA XXII Encontro Nacional de Ensino de Química - ENEQ Belém/PA – 09 a 12 de setembro de 2024 Área do trabalho EA Defesa 2 (D2) do acusado 2. Essa proposta teve a duração de uma aula (aproximadamente 50 min) para cada caso em pauta. Na Figura 2 há a esquematização da distribuição e designação dos papéis dos alunos em grupos. Como foi aplicado em ensino remoto, estes dois encontros ocorreram de forma síncrona via Google Meet. Figura 2: Esquema do Tribunal O tribunal versava sobre a comercialização da Dipirona no Brasil. Criou-se um caso hipotético ( Figura 3) para que os alunos pudessem debater e refletir sobre os efeitos colaterais de medicamentos isentos de prescrição, como o caso da Dipirona - um medicamento proibido de ser comercializado em 33 países por suspeita de causar problemas sanguíneos. Figura 3: O caso a ser julgado O caso começava com o relato da Joana de Albuquerque e Silva: uma mulher que, diante do estresse do cotidiano, fazia consumo de Dipirona para aliviar dores de cabeça recorrentes. Porém, após alguns exames de rotina, foi diagnosticada com XXII Encontro Nacional de Ensino de Química ENEQ - UFPA XXII Encontro Nacional de Ensino de Química - ENEQ Belém/PA – 09 a 12 de setembro de 2024 Área do trabalho EA agranulocitose - uma das doenças que pode ter sua origem no consumo de dipirona sódica. Joana, então, moveu uma ação judicial contra a ANVISA, acusando o órgão de permitir a venda do medicamento potencialmente perigoso - pelo desenvolvimento de enfermidades devido ao seu consumo - sem prescrição médica. A ANVISA, por sua vez, defendeu-se afirmando que o medicamento é vendido juntamente com a bula, onde consta os possíveis efeitos colaterais da ingestão do medicamento. Desse modo, houve negligência da Joana em consumir o medicamento de forma pouco controlada e, além disso, não ter buscado auxílio médico no tratamento de suas dores. A sequência de explanações segue com a: (1) promotoria da Joana, apontando os erros cometidos pela ANVISA; (2) defensoria da ANVISA; sob seu direito de resposta sobre as acusações anteriores; (3) promotoria da ANVISA; acusando as irresponsabilidades praticadas pela Joana e, por fim, (4) a defensoria da Joana, resguardando sua cliente das acusações mencionadas pela ANVISA. Antes do início da sessão no tribunal, solicitou-se a entrega de um trabalho redigido pelo grupo de acusadores e defensores, através do Google Classroom, constando os argumentos que seriam levantados durante o debate. Posterior a finalização da sessão, requisitou-se que os alunos participantes do júri popular conversassem entre si - em um espaço reservado -, buscando um veredicto sobre o caso. Tiveram até a próxima aula conseguinte para entregar o manuscrito redigido sobre a decisão acordada entre eles. Os argumentos que seriam explanados ao longo da sessão de julgamento foram entregues antes do início do júri, de forma redigida, para que a professora pudesse acompanhar os tópicos apontados e defendidos por cada aluno e, também, pudesse dimensionar a capacidade de articulação entre as acusações levadas a debate. Posterior ao encerramento do julgamento, os alunos constituintes do júri popular reuniram-se em sala virtual para discussão entre eles a fim de deliberar uma decisão acerca do caso. Também foi permitido que se reunissem em outros momentos, conforme houvesse necessidade, para definir alguns tópicos que justificassem a decisão. Dentro do prazo de dois dias, entregaram a decisão de cada aluno sobre o caso e o veredicto final, acordado entre eles. RESULTADOS No Júri simulado buscou-se analisar a descrição da resolução dos casos e argumentação utilizada pelos alunos, considerando que: [...] novas situações-problema devem ser propostas e trabalhadas em nível mais alto de complexidade em relação às situações anteriores, essas situações devem ser resolvidas em atividades colaborativas e depois apresentadas e/ou discutidas em grande grupo, sempre com a mediação do professor (Schittler; Moreira, 2014, p. 265). O corpo jurídico formado, ao total, por 16 alunos na turmado turno e distribuídos em grupos de 4 alunos: (1) promotoria da Joana, apontando os erros cometidos pela ANVISA; (2) defensoria da ANVISA; sob seu direito de resposta sobre 43 as acusações anteriores; (3) promotoria da ANVISA; acusando as irresponsabilidades praticadas pela Joana e, por fim, (4) a defensoria da Joana, resguardando sua cliente das acusações mencionadas pela ANVISA. A seguir trechos extraídos dos textos dos alunos que tinham o papel de jurados no júri popular. JURADO A: No papel do júri, cabe a mim julgar o caso dentro da legislação vigente no país, o que seria “ético” ou “moral” não cabe em minha decisão. Por tanto, XXII Encontro Nacional de Ensino de Química ENEQ - UFPA XXII Encontro Nacional de Ensino de Química - ENEQ Belém/PA – 09 a 12 de setembro de 2024 Área do trabalho EA visto que a Anvisa cumpriu com seus deveres perante a lei, e os pedidos vindos da defesa de Joana são completamente incabíveis, declaro o caso encerrado e a ANVISA INOCENTE dos crimes a ela atribuídos durante o julgamento. A Anvisa deverá iniciar uma campanha nos principais meios de comunicação como televisores, rádio e redes sociais para conscientizar as pessoas sobre a importância de ler a bula. JURADO C: Depois de muito analisar ambos os argumentos, cheguei à conclusão de que Joana está sim errada: deveria ter lido a bula, pois ali contém todas as informações sobre o remédio que está sendo consumindo e também não tendo provas que comprovem que o que causa a tal doença em Joana foi o uso exagerado (que foi por vontade própria), minha consideração final é que Joana é quem está errada nesse caso.[INOCENTE] JURADO E: Depois de ter ouvido ambos os lados, declaro que os promotores de Joana argumentaram de forma limpa e clara, principalmente quando citaram a falta de novos estudos sobre os efeitos colaterais deste fármaco, deixando assim clara a irresponsabilidade da ANVISA de não ter estudado o remédio o suficiente e mesmo assim comercializam o mesmo. A ANVISA merece uma punição [CULPADA] para que isso não aconteça novamente. JURADO K: Considerando o lado do consumidor não instruído e não alfabetizado, além daqueles que, devido às propagandas do medicamento, o consideram inofensivo, eu, como júri, admito a população estar errada, porém sem maneira de se instruir. Nem caso ensinassem a ler bulas nas instituições de ensino, quase metade da população não há ensino fundamental completo, quem dirá ensino médio. Com o objetivo de evitar problemas para a população e para a Anvisa, eu defendo que o fármaco em questão, dipirona, deveria, ao menos, receber tarja. Em síntese, a promotoria e defensoria da Joana acusaram a ANVISA de comercializar a Dipirona em território brasileiro. Alegaram que a taxa de fatalidade em torno de 6-10% daqueles que desenvolvem a agranulocitose foi um dos motivos para a retirada da comercialização da dipirona de muitos países. Apesar da agranulocitose ser uma doença rara, a mesma pode ser fatal. Além desta doença, outros efeitos colaterais podem se manifestar em quem o consome, como: choques anafiláticos, distúrbios renais, urinários, vasculares e distúrbios do sangue, sistema linfático, pele e tecido subcutâneo. Frisam que a principal função da ANVISA é a promoção da saúde da população, atuando no controle sanitário de diversos produtos, tais como medicamentos, alimentos e cosméticos. Dentre as outras funções, pode-se destacar o controle e fiscalização de produtos, como medicamentos, e a proibição da fabricação e distribuição de produtos que possam causar danos à saúde. Por isso, exigiram que a ANVISA deve, no mínimo, modificar a tarja de liberação para comercialização do medicamento para vermelha, pois esta indica que o remédio apresenta algum risco à saúde, ainda que pequeno, e deve ser vendido com prescrição médica. A defensoria e a promotoria da ANVISA acusaram a Joana de automedicação irresponsável. Defendem-se informando que o medicamento é vendido juntamente com a bula, onde consta os possíveis efeitos colaterais da ingestão do medicamento. Desse modo, houve negligência da Joana em consumir o medicamento de forma pouco controlada e, além disso, não ter buscado auxílio médico no tratamento de suas dores - pois, conforme o relatório do caso, as dores eram frequentes e, portanto, necessitava de tratamento e acompanhamento médico. Ao final da atividade, foi possível identificar, conforme apontado por Veiga e Fonseca (2018) a mobilização de diferentes conhecimentos para a elaboração do veredicto, uma vez que os estudantes elencaram pontos como: importância da leitura da bula dos medicamentos, o papel dos meios de comunicação, o consumo consciente, os XXII Encontro Nacional de Ensino de Química ENEQ - UFPA XXII Encontro Nacional de Ensino de Química - ENEQ Belém/PA – 09 a 12 de setembro de 2024 Área do trabalho EA perigos da automedicação. Tais discussão encontram respaldo em trabalhos da área da saúde, como afirmam D’Ávila e Andrade (2023, p.9449): A indústria farmacêutica, percebeu a oportunidade de aumentar seus lucros através de comercias de fármacos isentos de prescrição. Há uma gama de propagandas tendenciosas que são elaboradas com afirmações aparentemente inofensivas, que aumentam vendas, mas podem configurar publicidade enganosa ou abusiva. A mídia se mostra como potencial influenciadora da prática automedicação, sendo um veículo de informação importante, porém possivelmente irresponsável sendo extremamente importante o cuidado diante das propagações de informação sobre medicamentos e seu uso. Concluindo as atividades da UEPS proposta , foi enviado um questionário no qual os alunos deveriam manifestar seu grau de concordância, com uma escala tipo Likert, com as afirmações para avaliação da UEPS. Na questão específica sobre o júri simulado (Figura 4), 27 dos 36 alunos que responderam manifestaram-se positivamente à afirmação, e apenas 5 discordam. . Figura 4: Questão do formulário sobre Júri Simulado Considerando os alunos que concordaram, ao serem questionados especificamente sobre os pontos positivos da UEPS destacam a atividade do júri simulado: “Acho que o júri foi o mais interessante da Unidade de Ensino.” (Estudante A) e “A metodologia utilizada me ajudou a compreender com facilidade tanto o conteúdo de química orgânica quanto outros aspectos da vida real, como a automedicação e o júri simulado.” (Estudante B). Tal resultado corrobora com as ideias expostas por Veiga e Fonseca (2018) ao afirmar que o uso de metodologias ativas tem o potencial de facilitar a compreensão acerca das aplicações dos conceitos científicos. No entanto, outros estudantes não conseguiram estabelecer uma relação de aplicação com a atividade, conforme relatam: “O Júri Simulado apesar de ter sido interessante eu não vi tanta ligação com o conteúdo de orgânica que vínhamos" (Estudante C). E ainda “O júri eu achei legal, mas não aprendi nada do conteúdo então não sei seria uma boa maneira de aprendizagem” (Estudante D). Essa falta de relação entre a atividade proposta e os conhecimentos específicos de funções orgânicas, pode estar relacionada com a afirmação de Graulich (2015) ao discutir que estudantes ainda dependem excessivamente da memorização e de exercícios, e que uma combinação de XXII Encontro Nacional de Ensino de Química ENEQ - UFPA XXII Encontro Nacional de Ensino de Química - ENEQ Belém/PA – 09 a 12 de setembro de 2024 Área do trabalho EA estratégias apropriadas e a avaliação correspondente é necessária para mudar essa percepção a longo prazo. CONSIDERAÇÕES FINAIS A UEPS com a temática automedicação, em especial a atividade de júri simulado, utilizando um caso relacionado aos conhecimentos prévios dos estudantes demonstrou não só a importância da utilização de uma proposta didática alicerçada em teorias de aprendizagem cognitivistas, comotambém a relevância de introduzir questões do cotidiano nas discussões em sala de aula de forma aprofundada. Percebeu-se engajamento da turma, o que pode ser uma contribuição para um ensino de química mais significativo ao propor como uma alternativa às estratégias que envolvem apenas uma aprendizagem memorística das funções orgânicas A simples exemplificação pode não ser suficiente para abordar temas relevantes para a formação de cidadãos críticos ou para estimular os alunos a buscarem conhecimentos científicos. A compreensão das diferentes abordagens de questões socioambientais vai além de simplesmente identificar fenômenos científicos em seu dia a dia. A experiência docente durante o estágio permitiu compreender que é possível utilizar os conhecimentos dos estudantes e construir não apenas conhecimentos científicos, mas atitudes e valores que envolvem a compreensão, e não apenas identificação, das questões científicas em nossa vida. REFERÊNCIAS AUSUBEL, David Paul. The acquisition and retention of knowledge: A cognitive view. Springer Science & Business Media, 2012. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução de Diretoria Colegiada RDC nº 20, de 05 de maio de 2011. Dispõe sobre o controle de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos, de uso sob prescrição, isolado ou em associação. Diário Oficial da União, [S.l.], 9 mai. 2011a. Disponível em: BRITO, Giselle Fernandes Resende et al. A PRÁTICA DA AUTOMEDICAÇÃO NO BRASIL– PREVALÊNCIA E FATORES ASSOCIADOS. E-RACE-REVISTA DA REUNIÃO ANUAL DE CIÊNCIA E EXTENSÃO, v. 12, n. 12, 2024. 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