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Q século XX se prepsrou n o su ce ssõo cada ve z m ois o e elerqdq dos inovoçóes técniccs- N ovos podróes de percepçoo e e xperièncio se produzirom e aíetarom diretum ente o s co rFos, o s reloçóes so cicis e toda a produç€o hum qne (oÉístico, subietivo, etc'). Floiq n c cuge desses processosr ü5 n o vcls descobertas parecem por yezes m ais obsÍor que viobilizor. Porque todos e sse s o co ntecim entos sóo sntes de tudo figuras de m utoçoes dc ccpitclÍsmo. N estas n ctos de fim de sêculo, aÍirmqmos que u m q, problem otizoção intronsigente de n o sso tem po é a vio paro co n seguir divissr o que ele n o s proporciono, É o , " .u ro dos ditum es do presente que n o s abre poro o utros tem pósn pcrq u rnü' tem Po- rslidqde crisdors. ïi:lvez e ntoo pudéssem os cpostar nq püssog€m poro o n o vo eéculo * de re sto u m m crco srbitrório * co mÊ u m o psssogem de foto, co m o sslto' r5}fie€J*. ${{slaer* *eín{à }*s ÊÊí6' * .TL"et?4 g wqt'i11Iiìii1Iiiïat,'3',: : ::lt;|.'€;. F:: !ì::r. l":.F-,;Ì,'t: '.a?i'::Tì:: F:n'(tg.:n.7Çv)i,nontt^nrÇxzt.Jp:ìnttlãzÍip lr-r,tt'-':.. f',/* i :Í f , ì r" I i I '. ) - -J :*. -a 4:. L- - " . I | ' - /' , 'r:- I r-' tZt', "t') ) [' 1 r - ! t.: / #,,::;; ''.fli .f1f'*ír"-&,@ ;' ,:.4:,1,?t v4,:'r' 't,ìq -: í I I { ! _l t lr r,r'r I I r;: )'J /r'l -ï't í-, I I ì e . / ' J r rl /' . -t. . I:'-i.ll'-t'. : f 'J'-t1l1> ':?';.; :: .:.? ,1;aa;::: ,|.::aa iËe*"u ü"gn& 9," 'eW 'i*,,ti],, W m ::.P;w co ng(óes Cruen, FAZER CRLAR Pur" u a rte e o pensam ento é preciso u1 lem po de re sso - ;ât.i^; Ú* pou*u pode produzir se u s efeitos a n o s depoìs i" Uao porqu" su a ação não se e sgota e não sa cia n o m o - *e *o a u teitura. D e fato, a rigor' i l"it"tu de u m a obra de a rte im pÌica abrigar a s repercussões que a poética vai pro' u o .r., u podem os dizer iiso para qualquer a rte' O Poem a u oltu'co*o u m a dádiva n u m lapso de tem po que pode co ' brir toda u m a vida. O pensam ento tam bém precisa de u m i"C" a . elaboração lpara o a utor e Para o leitor) que o tlìí;*p*tciu e u a "q''udo para e xpressar'?or isso a fi- gura da " *pr*" fiã u niversidade parece m :sm o se r' co m o ãi" O "t.lr"., o fim de toda pesquisi' O im ediatism o ditado pJo * "t."ao e a e xigência do a specto "aplicado" para o iaber vai co ntra o processo de criação n a a rte e n o Pensa- m e nto. Não que obias de a rte não Possam se r tam bém m e r- cad.orias co m práveis - e nquanto livros' discos o u telas - m a s utu, ui.r.rao ,u *pr" de óutra coisa que não se inscreverá n e sse eireuits e m e sm o trúa]hará co ntra ele' - - - úao e n a relação de co rsu m o que a a rte chega a se u des- tinatário. O que é co n su m ido co m o u m a m e rcadoria se e s- gota n o m o m e nto, m e sm o que Possa satisfazer' O proble' ïru é * * *o o fato de que satisÍaz' Beniam in observa que' diante de u m a pintura, o olhar "não co n segue se sa ciar"' O ra, é a sa ciedaàe que põe fim a o deseio' M as a obra de a rte , "Urf"" o deseio a o * "àlgu'nt coisa que alim enta co ntinua- ,:d - .:t'r ' ;:i.,1 r:,,1çr... lÍtì' ::E; $*4; :rlï-:: frtucr Cerern m e nte e sse desejo".l A a rte e o pensam ento se inscrevem n e sse tem po e m que o s efeitos não se e sgotam n o m o m e nto da sede, m a s vão repercutir m ais além e e m seguida, m uito depois, n u m lapso que é o dom ínio m e sm o da criação. O gesto técnico de abreviar (o click ve rsu s o s m o vim entos dos pincéis) por si m e sm o não destrói e sse lapso. A fotografia e n co ntraria u m a e xpressão criadora n u m a a rte do instante. Por o utro Ìado, claro que inovação técnica favorecia a rela- ção de co n su m o , co m o Benjarnin percebeu n o despontar m e sm o dessas m udanças. A reprodução técnica tendia a disponibilizar e m e xce sso , oferecer até a sa ciedade. M as o cinem a e a fotografia atíngem por se u s m eios u m a singula- ridade que não se e sgota n a relação precária do m o m e nto do co n su m o e só vive de su a s rePercussões. Barthes fala do punctum da foto, u m re ca nto da im agem que vai e xe rce r u m fascínio justamente por não se colar a n e nhum a e xplicação im ediata, vai prender o observador n u m a relação duradoura de fruição.z Serge D aney vai falar de u m sa u a e nir-éüan para u m film e, o m o m e nto e m que ele é forte porque produz u m a im agem desúadora da e siética dom ínante e que vai se r a m a rca "inesquecível" daçeÌe 61m e. São poéticas n a fotografia e n o cinem a que vão perdurar n a relação co m a s obras e n e ce ssa riam errte subtraí-las, n e sse s m o m e ntos, do circuito da sa ciedade e do e sgotaúento. D e fato, todas a s a rtes hoje têm que se haver co m e sse problem a. O que se instaura co m e ssa s inovações - e é isso, creio, que Benjamin a n u n cia * não é u m destino da técnica, m a s precisam ente u m n o vo problem a que caberá doravante à a rte e a o PeÍÌsa- m e nto re volver, deslocar. N ossa época é m a rcada por u m a valorização da dispo- nibilidade. A figura do banco de dados é e xe m plar desse processo. Tam bém o é o e n altecim ento das redes de infor- m ática n a m edida e m que elas n o s disponibilizariam "o m u ndo". Claro que n o s é dado e sPeÍar que algum a coisa t N osso sÉcuro Xll: N or.rs so u n r AR TE, rÉcucl E PoD ERËs valiosa possa n o s vir daí. A disponibilidade e m si, co ntudo, não garante e sse valor. Ao co ntrário, a ptofusão e stabelece a relação do co n su m o , a o preço do co m prom etim ento de u m a densidade firndam ental para a criação. Por o utro lado, é fato que e ssa inÍinita disponibilidade, n o que tange às re - des de inÍormática, vive n e ste m o m e nto m ais do a núncio do que de u m a e xistência efetiva. O infinito o u o u niversal e stá m e n o s n o que se pode co n cretam ente obter (bem longe de substituir, por e xe m plo, u m a visita a u m a biblioteca re al) do que n o s ca m inhos que se PercoÍrem n o s program as. Es- sa s direções parecem co nduzir m e n o s do que divertir de ícone a ícone o u de site a site, o que pode co n su m ir horas. M as a profusão persiste co m o e m blem a, a ssim co m o o co rre co m o s a núncios de televisão a cabo que e nfatizam a quan- tidade de opções e a s facilidades de adicionar m ais. Será se m pre co nEa a s dim ensões do u niversal que se co n seguirá traçar a linha singular da a rte e do pensam ento. O capitalism o vive m uito de provocar grandes disponibili- dades, se u s invesllm entos se rão cada ve z m ais do porte do u niversal. Interessa tam bém à su a a xiom ática3 que o s vín- culos sejam o s m ais precários, que se so rva o m áxim o n o e xce sso , que a sa ciedade im peça a duração. Um a aposta tal- ve z seja que se co n siga e stabeiecer aí m e sm o , n e sse s n o vo s circuitos, o utras reiações - m a s se rá se m pre co ntra a cre nça fácil de que a disponibilidade é e m si m e sm a Senerosa' A re sposta m uitas ve ze s a o e m udecim ento que aTgum as m ídias provocam , co m o a televisão por e xe m plo, é a "inte- ração". Essa se ria a n o va relação a se e stabelecer co m a in- form ação. A n o va o rganização co m u nicativa que a s redes de inform ática im plicam tam bérn tem co m o bandeira a in- teração, dessa ve z suPostam ente potenciada a o infinito' Aqui o tem po que sedespende às voltas co m a m ídia se ria qualitaüvam ente diferente do tem po de a ssistir televisão porque o u suário interage co m a m áquina' A interação vira 4;:::; i,rri:l :ì,'', :;.', :::, \ ì:.3'tíIrì:lriiìãí4ì{.l 26 fer.ncr Cruere e ntão u m m odo, u m desenlace gue vai afetar m e sm o a lite. ratura e o utras n a rrafivas. O s livros interativos para crian- ças já são u m a m trada do co m putador n a literatura. N eles a criança é cham ada a co m pletar a história e se a credita n a s virtudes pedagógicas disso. Ao invés de re ceber a história pÍonta, ela a criaria. O role playing gam e guarda o m e sm o a specto interativo. Trata-se de u m jogo e m que se incolpo- ra m personagens e vai-se criando a história a partir de indi- caçÕes já e sLipuladas, m a s se m pre e m interação. Com va - ri.ações, são todos e xe m plos da m e sm a postura diante do que é criar e Íazer criar. A interação co m eçou e nlre nós n o protÌama Você decíde, ainda n u m a Íorma precária. São grandes telas n a s praças de diversas cidades brasileiras co m m ultidões se e m pur- ra ndo para decidir algum a coisa co m a televisão. E é sobre- tudo a possibilidade de telefonar de ca sa re spondendo à pergunta, o u seja, dessa ve e interagindo, saindo da passivi- dade. Trata-se de u m e xe m plo m ais fraco, porque ali fica claro que não há decisão n e nhum a quando se tem que a s- su m ir o s pressupostos da televisão. A única decisão se ria re cu sa r a pergunta o u dar u m a re sposta a o utTa pergunta. M as e ssa cre nça de que algo de im portante se cria quando há interação (mesmo que o se u parceiro seja a televisão) pelpassa processos m ais aliciantes. Para alguns, ela é a gran- de virtude da Internet. É interessante e xa m inar u m a e ntra- da ainda m ais a rriscada desse n o vo m odo, o ca so dos livros interaüvos. Estam os se ndo passivos quando não "co m ple- tam os" u m a história, çando não retrucam os, por e xe m - plo, a D ostoievski? As grandes obras são n e ce ssa riam ente incom pletas, m a s não porque falte u m final que se ria preciso lhes fom ecer. É por não se e sgotarem n o m o m e nto de su a aparição, por não se darem n u n ca de u m a ve z por todas, que elas perduram e co ntinuam provocando re sso nâncias. õom pletàr é sa ciar- N osso sÉcur,o XXI: N oras so snE aR TE, TÉcMcA E poDEREs ,n se (em alguns ca so s, "decidir" u m a banalidade) e o proces- so ali se e sgota. É quando a idéia de inform ação e nquanto im plicando a disponibilidade e a sa ciedade pode se r, e m plena profusão, e m pobrecedora. Em "O n a rrador", Benja- m in diz que a n a rração e n volve se m pre u m a vo ntade de re co ntar a história. Cada história não se co m pleta n o m o - m e nto e m que é co ntada, porque o o u vinte vai querer re co ntá-la, fazendo-a perdurar. A Ìiteratura a ssu m e e sse a specto da n a rração que aparece n a tradição o ral. Ao co n - trário do ponto final, a n a rração vive de u m desejo de Sherazade. Em Ás m il e u m a n oites a s histórias se e nlaçam se m pre re m etendo a u m a o utra história. Aqui podem os pensar tam bém a a rte de o u vir, de ler o u de ve r. O grande n a rrador co n seguirá provocar e sse desejo de re co ntar n o o u vinte-leitor, inclinação a gue ele cederá "irresistivelm en- te". D a parte do o u vinte, a atitude se rá de "e squecer-se de si". O u seja, o u vir para re co ntar - para participar das re sso - nâncias da obra, para criar - im plica e ntregar-se, ingressar n a duração'ãa obra se m e sgotá-la. O co ntrário portanto de co n su m ir. Criar co m a obra é e xperim entar co m ela e sse processo de re sso nâncias. Não é o truque técnico de co m pletá-la. Pôr u m ponto Íinal é tudo o que u m a grande obra não precisa para repercutir n a vida-obra do leitor. Ao co nhário, é preciso e vitar "e xplicações". É a infor- m ação que se apóia n a e xplicação im ediata. A história do Egiio e scrita por H eródoto n ada e xplica, diz Benjamin. É por isso que ela "atndaêcapaz-rlepois de m itCnlos, desus- citar e spanto e reflexão".4 Trata-se de u m equívoco a ssu m iÍ que a atitude de re s- ponder a u m a história n o livro o u a u m a co nfiguração n a m áquina e m si m e sm a provoque a criação, m e sm o que a dim ensão dessa co n ve rsa seja im ensa o u que a s ligações sejam m últiplas e diretas. Essa m ultiplicação, inclusive, pode e star apenas participando do elogio da disponibilidade e - 28 |emcr Cerare não produzir de fato m ultiplicidade. Tudo vai depender da qualidade dessas relações. Fazer criar é im pulsionar n o pro- ce sso de duração e re sso nâncias. Seria preciso co n seguir e n sejar isso co m a interação. Um otim ism o não-crítico pode n o s im pedir de buscar a s n o va s e stratégias de que precisam os. Estratégias para a o m e sm o tem po fazer u m a crítica intransigente do capitalis- m o e viver a s n o vidades de n o ssa época n u m a intensidade e n u m a parcim ônia que não n o s subtraiam a dádiva da cria- ção. Poderíam os repensar tam bém , por e xe m plo, u m a o u - tra virlude a ssu m ida de n o ssa s n o va s m ídias. O a n o nim ato que é possível n a internet aparece m uitas ve ze s co m o posi- tivo. Um co rolário da situação de a n o nim ato é a a u sência de a utoria. A tendência se ria que o s textos n a vegassem se m a utores, disponíveis para o u so coletivo. Isso tam bém é vis- to co m o u m a virtude e é u m a specto que n o s in1s1s5s6 Ílis- cutir porque tam bém toca a questão da criação. Claro e stá que o a n olim ato pode provocar u m tipo de liberdade. Não m o strar-se, inventar personas etc. Contu- do, e sse a specto já e xiste de o utra form a e m o utras m ídias, co m o o telefone e o co rreio. As ca rtas a nônim as são o m ais das ve ze s a m e açantes, m a s podem trazer hom enagens. Com o teleÍone tem os o "trote", a ntigo e e n e ryante, m a s talvez tam bém co m su a s virfudes. M as e m todos o s ca so s há o a s- pecto da invasão. O a n o nim ato e n co raja a declarações o u - sadas. Para re cu sá-las, n o ca so do co rreio e do teleÍone, bas- ta ra sgar a ca rta o u desli gar. Já o tête-à1ête n viabiliza o a n o - nim ato e , e m ca so de ofensa, é possível afastar-se o u re vidar. Este é u m ponto im portante de se r pensado a re speito des- sa s n o va s co nfigurações da co m u nicação. Esse tipo e specí- fico de a n o nim ato traz tam bém u m a ca rga de violência. Está- se protegido pela possibilidade a m pliada agora de e sco n - der su a identidade e a o m e sm o tem po inserido n u rn e sque- m a de e scrita m uito m ais irnediato que a ca rta. N a ca rta, a N osso sÉcrno XXI: N orns so rn e AtrE, TÉc!ürcA E poDm Fs pausa e ntre a e scrita e o e n vio e talvez o defrontar_se co m a folha de papel participam da própria e n u n ciação que ali vai vigorar. A im agem da situação de e scre ve r u m a caúa é de alguém pensativo se ntado a u m a m e sa , talvez co m algu- m a s folhas a m a ssadas e m tom o (não ra ro re e scre ve m o s e ponderam os). N o ca so da rede, a s n o va s co ndições pare_ ce m co ntribuir para a franqueza e m e sm o para a agressão. A co m u nicação e m rede, co m a possibilidade a m pliada de a n o nim ato e a instantaneidade, parece criar u m a n o va for_ m a de interpelação e se m dúvida u m n o vo tipo de violên_ cia. As potencialidadescriadoras dessa n o va interpelação não parecem se m o strar de im ediato. A co nfiguração técni- ca dessa n o va form a de falar (com m uitos e n volvidos, co m e n vio im ediato da m e n sagem o u m e sm o e m tem po re al) por si m e sm a não dem onsha e ssa s potenciaiidades, co m o Lam bém não a s n ega. O bservar o s desdobram entos desses processos co m u m otim ism o crítico e xige que não o s credi_ tem os co m u uia virtude de a ntem ão. Tratalse de que n o vo s probÌemas por su a ve z aparecem , que deveriam n o s obri- gar a pensar. A questão da yiolência é u m deles. O trabalho co m a identidade poderia se r u m a perspecti- va interessante e ce rtam ente guarda u m a potência de cria- ção. N ovam ente, ele já e xistia e m o utras m ídias, e m bora agora apareça n a s redes co m ca ra cterísticas e specíficas e m uiüo rn aisr a m plitude. N + irtternet alguem podená-forjar totalm ente para si u m n o vo ro sto o u u m a história que não é a su a e a ssim se apresm tar àqueles co m quem interage n a rede. A idéia de incorporar personagens aparece de form a se m elhante n a rede e n a role playing gam e, a m bos são re ali- zações particulares do m e sm o e squem a de interação. e u al se rá a Íorça desses jogos, se rá que a interação n a rede tem o poder de fazer co m que n o s tom em os o utros, se rá que de. ve m o s tom ar a o pé da leha aqueles que dizem , ,viver,, e s- sa s personas? Com o é tudo m uito re ce nte, pouco e xiste que 30 : JAìIcE CAIAFA N oso sÉcuro XXI: N orls so sn r AR TE, TÉcMcA Ë PoD FR rs JL ve ze s tenta n o s co n ve n ce r de gue ela é tudo que e xiste ("tudo a ve r" etc.). É im portante observar que Por ve ze s a s afirm a- ções da m ídia e a s de u m ce rto tipo de crítica a ela a cabam por coincidir. Estranham ente, Parece que e sse s poderes p"ssu* a se alim m tar tam bém dessa denúncia.6 Tom em os co m o e xe m plo o cham ado co co o n e r da Internet' Esse term o referese a pessoas gue passariam m uito tem po de su a s vi- das "n a vegando", supostam ente e vitando safu e Perm ane- ce ndo n u m "ca sulo", e stabelecendo co ntato quase que e x- clusivam ente n a rede. Alguém que m a ntivesse e sse e sque- m a , supondo-se que tal figura e xista, se rá que "viveria" n u m u niverso de relações internacionais, n a diversidade do co n - tato co m o s países m ais distantes, línguas e strangeiras etc'? Não a credito que tais Processos tenham qualquer densida- de e xistencial para se substituírem às relações co n cretas dessas pessoas. O s co ntatos à distância são m ais inócuos' sejam eles interessantes o u banais' Tam pouco a credito que se ria possível e vitar o que se Passa e m torno - de fato e sse ca sulo não e xiste se m poros' Se fôssernos im aginar a s rela- ções de u m a -y'essoa n e ssa situação, elas se e stabeleceriam , suponham os, co m a fam ília, a e m pregada gue lhe haz co - m ida e tem u m salário x, o u co m se u irm ão que habita o quarto co ntíguo e ce rtanente co m u m a m áquina a que eie se a copla. Sua so ciedade induiria, por e xe m plo, o e ntregador de superm ercado e o s m e ndigos que e stão pela ru a , m e sm o que ele o s e vite à su a m a n eira' Não é que não se pudessesuPor qusoscorÌfdüos n a rede produzissem interferência n u m a vida, m a s não m uito m ais que o s telefonem as o u a s ca rtas podem produzir para al- guém que se dedica a eìes. lnclusive, o co rreio parece m ais eficaz co m o veiculador de e strangeirism os e interferências' Aí tem os a letra do re m etente, o e n velope que veio de fora, o selo que pode vir de países distantes' Há u m a m aior ca r- ga de alteridade n e sse ca so Para produzir rePelcussões já tenha sido dito para re sponder co m segurança a e ssa s perguntas, m a s elas e stão por aí a n o sso redor' n o s textos' n a m ídia, e m co n ve rsa s D e toda form a, não parece que até agora e ssa co m u nlca- ção tenha co n stituído u m a "so ciedade virtual"' o u pelo m e n o s não m ais do que poderíam os suPor Para o telefone e o co rreio. Poderíam os talvez dizer que a co m u nicação epistolar co n stitui n u m ce rto m o m e nto "uÍnn ssçiedade"' m a s o diríam os n u m se ntido bem re strito' devido à n afure' za das relações e stabelecidas' Isso vale para a co m u nicação n a s redes de co m putador' Aqui o s participantes' e m bora e m grande núm ero, co n stituem u m gruPo bem e specífico - não"se duvide de que a m aioria da população do planeta não é u suária da rãde e ' co m o o capitalism o se apóia n a . e xclusão, e sse u so poderá funcionar co m o m ais u m indica- dor de desigualdade (como de re sto o telefone ainda é n o Brasil, e m cãrta m edida)' Quanto à n atureza das relações' a *tuçao so cial im plica por definição alteridade e risco' Cla- ,o qL" * indivíãuo n o abrigo de u m torto fictício de u m a .uiu, rro a n o nim ato do trote o u n o sn o vo s "ca sulos" da rede (onde se e stá m uito m ais protegido e o nde pode haver m ais violência, co m o vim os), vive a ntes de ludo u m a fantasia se m a m e n o r força para se r tom ada co n cretam ente co m o vida so cial. Trata-se aPenas de u m iogo que' dos ca so s e xa - m inados, só n a rede parece não se co nfessar co m o tal' Tal- ve z-poÍque tal co nÍissão m o straria n o ssa s n o va s m ídias e m su a s va ntagens e su a s bobagens, co m o qualquer o utra' Está aí presente o m e sm o e xagero que afirm a que' a s transm issões n o tem Po viriam a substituir hoie a s relações e spaciais, o u que vivem os hoje n a sideração das n o va s tárologias. O utra m a n eira de form ular isso é dizer que o so cial n "ão passa de u m a aparência's Som os de fato atingi- dos e m cheio por e sse s Processos, m a s é duvidoso que se possa falar e m substituição' A televisão tam bém m uitas lì a 7) Jnurcr Cerere n u m a vida e criar relações. Enquanto que n a rede a tendên- cia é a u niform ização clo texto n o s e -m ails e n o s chats. Com a ca rta de papel tem os u m a inegularidade que a faz u m objeto heterogêneo, capaz de produzir atrito. Produz-se u m a ilegibilidade fundam ental para n o s trazer o e straúo e que, por su a ve z, a literatura co n segue por o utros m eios. Paie- ce que o a specto clesn da co m u ni.cação por co m putador tende a elim inar e ssa ilegibilidade. Não basta falar e m in- teração para garantir a alteridade n a co m u nicação por rede, é preciso e xa m inar a s co ndìções e m que a s relaçÕes se e s- tabelecem . N ovam ente há u m a superestim ação dos poderes dessa m ídia. A fuga à identidade não só é m uito local (embora alguns e ve ntos locais possam adguirir e m ce rto m o m e nto u m e n o n n e alcance), m a s sobretudo não parece ter m aiores repercussões n a produção subjetiva do que u m a fantasia pessoal e efêm era. O personalism o, aliás, é a m a rca dessas diversôes solitárias que a rigor não co n stituem n e nhum a relação so cial. A interação co m a m áquina ainda não n o s trouxe a so ciedade, a o co ntrário, e m alguns ca so s parece e n volver u m desejo de faz&la re cu a r, perm anecendo n a fan- tasia e n o "ca sulo". A vida so cial, o s e m bates hum anos co nti- n u a m se dando n o local: n a s cidades, n o s ônibus, n a s ca sa s, n a s ru a s, n a s a ulas. A técnica deve se r pensada n e sse co n - texto, co m o u mdos vetores desse jogo. A heteronínia, im plicando u m "tom ar-se o utro", é u m processo se m pre m ais sério e m e n o s inócuo. Não digo que não pudesse o coffer tam bém n a s redes de inform ática, m a s não o se ria co m e ssa superficialidade, n e m se daria pelo m e ro huque técnico de não re velar-se. As personas da co - m u nicação epistoiar jamais tiveram a pretensão de u m e xe r- cício efetivo da alterídade e jamais pensam os n a s brinca- deiras por telefone co m o u m a form a de n o s.transform ar- m o s. Precisaríam os perder a pom pa a o n o s referirm os a e s- N osso sÉcuro XXI N oras sogne e n rr, rÉcruc.l u ro oi*,rs JJ sa s n o va s brincadeiras que tem os agora, tanto para apro- veitá-las quanto para dispensá-las. Todos e sse s dispositivos prom ovem a desqualificação do co rpo e co n seqüentem ente a e vitação dos riscos que ca r- regar u m colpo gera. São o s diversos tipos de co ntágio n o co nfronto co m o heterogêneo - o nde circulam doenças, idéias, afetos. N a rede, o a specto da e vitação de úcos n a co m u nicação fantasm ática (que já o telefone, a s se cretárias eletrônicas, a televisão apresentam) aparece agravado. Com o virFos, a proteção que se co n sfitui ali para o e n u n cia- dor cria a o m e sm o tem po u m a franqueza e u m n o vo tipo de violência. Com isso fiìa ainda m at aifcit produzir o he- terogêneo e a m ultiplicação de parceiros não parece a rigor co n stituir m ultiplicidade. O parceiro tende a e star ali co m o disponibilidade e dificilm ente co m o o utro. N esse ca so , a interação co m o re sposfa a o m utism o do u suário não pro- duz alteridade. N a "literatura" interativa - o nde o leitor é tom ado co m o u suário - e sse equívoco parece querer desa- fiar a próp{aliteratura a o tentar im por-lhe a obsolescência. O s deviresz e m que poderíam os e ntrar co m a literatura vêm , a o co ntrário, das re sso nâncias que a s obras de aÉe provo- ca m a o perdurarem , a o não se e sgotarem n u m , ,fim ,, (in- ve ntado que seja pelo leitor) o u n u rn e spisódio de intera- ção. E n e sse processo de duração e repercussão que pode. m o s n o s transform ar. D eleuze e G uattari observam que Kafka u so rr xg r"a ring que e scre via para adiar o e n co ntro efetivo co m a s n a m o ra - das e a ssím e vitar o ca sa m e nto.S N as ca rtas, dizem o s a uto- re s, Kafka fez u m "u so perverso" da dualidade sujeito da e n u n ciação-suieito do e n u n ciado. Essa dualidade é m ais u m a "m áquina binária" co m que a lingüística habalha. O sujeito da e n u n ciação é aquele que fala e o sujeito do e n u n - ciado é o sujeito gram atical. N as ca rtas de Kafka, o sujeiüo do e n u n ciado a ssu m e o m o vim ento que o sujeito da e n u n - ciação não quer a ssu m ir - trata-se de , ,u m m o vim ento de papel". As ca rtas vão para que Kafka não vá e co ntinue às voltas co m su a m áquina de e xpressão. porque Kafka , ,opu- nha ca sa r a e scre ve r" e se se rvia desse veículo fantasm ático para persistir n a e scritura. A produção m e sm a da obra e ra se u m o vim ento "se m sair do lugar". Essa brincadeira de KaÍka se rvia-lhe indusive para fazer literatura n a s ca rtas. D eleuze e G uattari co n sideram a s ca rtas de Kafka co m o parte integrante de su a obra, a ssim co m o a s n o velas e o s ro m a n ce s. N esse ca so há de fato u m u so , ,perverso,'do dis- positivo fantasm ático, porque m e sm o que n u m m o m m to e ste inviabilize o co rpo, ajuda a viabilizar a obra. e u e u so s inusitados desses n o vo s veÍculos poderiam se r atualizados hoje, e não so m e nte para u m grande e scritor co m o Kafka, m a s para todos nós? Cabe-nos descobrir. Seria preciso co n _ tudo chegar a obter ali a alteridade, que a o rdem que se e stipulou até agora co m e ssa inovação parece suprim ir. A questão da n o va o rganização da idenüdade n a s redes haz o ca so dos textos se m a utor. Isso n o s interessa de perto para a questão da criação. N ovam ente, e ssa situação pode produzir depressa dem ais o se u elogio. Interessa a o capita- lism o fazer tam bém da e scritura disponibilidade. N o trân- sito de textos se m a utor à m e rcê de gualquer apropriação _ situação ainda apenas im aginada, m a s perfeitam ente ve ro s- sím il n o co ntexto dessa m ídia - , a princípio só é possível ve r a m istura indiÍerenciada. A e scritura é tratada co m o inÍormação. Ela é trazida im ediatam m te para perto (no se n _ tido de Benjamin) e portanto prontam ente obstada n a su a duração. Será apropriada e ali se e sgotará, e a tendência é que a colagem substitua a criação. Trazer para perto o u tor_ n a r disponível é elim inar a distância de qúe a olra e o dese- jo n e ce ssitam e que a e strela cadente re e n ce n a e m se u per_ cu rso . A a rte não habita o banco de dados que tem , pode_ ríam os dizer, u m forte a specto de choque. O se u circuito é o Jer.ncr Celare I N osso sÉcwo XX: N oras so uR E AR TE TÉcl'ttcA E poDEREs 35 de incitar à criação, co m o quando se quer re co ntar u m a n a r- rativa - e não apropriar-se dela o u co m pletá-la. A n a rrativa tam bém vive da distância - ve r, o u vir e ler co m o gestos criativos im plicam se m pre a co n stituição da alteridade, que não podevir do e xce sso de proxim idade o nde não se possa divisar o n a rrador e o nde a n a rrativa seja apropriável e não re co ntável. Sou co ntagiado pelo processo de criação quan_ do so u charnado a criar a partir da obra e não a dispoidela co m o de u m a inform ação. Porque ela jâ fez u rn percurso, e de u m m odo que ú ela poderia fazer - é a su a singularìda- de. Só m e re sta fazêJa durar agora, produzindo u m ca m i- úo tam bém singular. E toda u m a o utra coisa que apontam D eleuze, G uattari e Foucault quando problem atizam a a utoria.e Foucault ques- tiona o s lim ites tênues que co nfiguram u m a obra e se u vín- culo se m pre precário co m a m a rca a utoral. Em u m m o m e n - to, reivindica m e sm o para si próprio a heteroním ia e o a n o - nim ato, aponta que u m a utor não pode se r úam ado a se r co e re nte co m se u livro a nterior, inclusive porque o proces_ so da e scrituna'o hansform a. O tornar-seàutrì ahavés da obra não é de fato incom um n a literatura. Fernando pessoa produz e stilos diferentes co m se u s heterônim os, a alteridade aparece diretam ente n a poesia, o texto ingressa n o devir - Fem ando Pessoa ele m e sm o vira u m heterônim o. O pseu- dônim o pode se r tam bém u m re cu rso para driblar a a utoria e vários e scritores o utilizaram . G re cu rso s do a n o nim ato, co ntudo, só são criadores quando produzem re sso nâncias n a própria e scritura, eles são a ntes u m a figura de u m traba- lho m ais a m plo co m a e xpressão - e ste sim a m a rca criado- ra e m qualquer texto, seja ele de u m a utor co n sagïado o u de u m hom em "infam e", de u m a nônim o. D eieuze e G uattari m o stram co m o Kafka fez re cu a r o lugar do sujeito da e n u n ciação e criou u m a literafura da e n u ricia$o coleti- va , dando precedência a o trabalho co m a e xpressão de vá- - - - -4 ce sso a m a rca da singularidade, e não da identidad". irfao rias m a n eiras: a o inhoduzir intensidades co m o a m úsica desterritorializada que náo se presta a ser u m pólo de u m a relação e strutural sim ples; a o produzir persoìagens des_ teritorializados n a n a rrativa; a o utilizar o alem ão , ,m e n o r,, de Praga etc. O a utor re cu a para dar lugar a u m frabalho se m pÍe a rriscado co m a e xpressão. e u etíonar a dim ensão a utoral não é e scre ve r u m a banalidade e não a ssináìa. O que não quer dizer que u m a utor de n o m e obscuro não pos_ sa produzir u m a literatura re volucionária. Ao co nhário, foi tornando-se de ce rta form a obscuro que Kafka produziu su a obra. D igam os a ntes tom ando-se , ,m e n o r,,, n o se ntido des_ se trabalho que co n stituina "a s co ndições re voiucionárias de toda literatura". Trata-se a ntes de tudo de u m a posição que se atinge, o u de u m devir e m que o s a utores m ais m o _ destos poderiam ingressar. Essa posìção não é obtida co m o m e ro gesto de não a ssinar u m texto. É u m a co nquista cuja re co m pensa é a criação - que vai co ntagiar o ukos, se r dádi_ va para o utros, produzir alhures devires. Vem os n e sse pro- 36 !çoDv q u .4rLd u ..r ürn8-urarnqaoe, e nâo cla identidade. Não n o s interessa ter textos de Kafka, Em ily D ickinson o u R im baud disponíveis e a nônim os. A aiitude criadora advinda de u m a síngularidade n o s toca quando a deixa- m o s re sso a r e n o s incitar à criação, n u m e xe rcício tam bém singular. Que pode ter o n o sso n o m e : u m n o m e é u m efeito, u m a figura provisória e tênue. A e xpressão deveria se r vi_ gorosa o suficiente para e m punhá-lo dessa m a n eira, co m o pura singularidade. D essa form a, ele poderia até se rvir para Iry* a e ssitura de ingressarno tum ulto da disponibiiida_ {e.. E até im agiúvel que o n o m e e nquanto efeito o u singula_ ridade pudesse se r u m protetor da ábra, m ais u m a palavra n o e xe rcício criador da e scritura. ^ . Esles eqúvocos parecem de fato figuras do e sforço de abreviar, de u su rpar'os a co ntecim entorã. ru " a u raçaá. É o úoque que Baudelaire tanto so ube su scitar e aparar e que f.lrucr Cerera N osso sÉcuto XX: N ot,rs so rnt n atr, ïÉcNrcA E poDEREs ó/ hoje a figura da inform ação gostaria que fosse para nós u m a fatalidade - o tum ulto de im agens n a TV (,todas se valem ,,, co m o observa D eleuze) o u a e scritura co m o disponibilida- de. A e m presa n a u niversidade é u m grande dilegado da m odalidade da inform ação. São o s , "rultudo, im ediatos e aplicáveis que de fato a cabarão co m toda a pesquisa. E só se rão aplicáveis se houver a preparação prév1a de u m co n _ texto para e ssa aplicação, o que já é re sultado de u m a ope. ração de poder. É de fato o pensam ento apoiado n a s re sso - nâncias de u m a duração que poderá produzir re sultados criadores co n cretos. R m nnÊrucns Bm lrocnÁRcAs 1. Benjamin, l99S, p. 139. 2. Barthes, I981a. 3. G illes D eleuze e Félix G uattari m o stram co m o a dom inação capi_ talista ca ra cteriza u m a a xiom ática. por e xe m plo, pelo Íato de su _ portar u rÍra heterogeneidade dos m odelos de re alização, desde que isom oúos a o s a xiom as que efetuam ; o u pela possibilidade de adicionar o u subtrair a xiornas etc. Cf. D eleuze e iuattari, 1997. 4. Benjamin, I99Sa, p.204. 5. Jean Baudrillard desenvotve e ssa tese e m À l,om bre des m aioritês silencieuses o u Ia fin du so cial. 6. Cf. janice CaiaÍa, 1992. Cf. tam bém M unú Sodré, 1990 p. 33. O a utor, a o elaborar o co n ceito de , ,telenealidade,,, afirm a que não há re e ngendram ento-absoluts-da vid.+soei+ì n e sseproeesso, mÍü, u m "proieto hegem ônico,, por parte dos , ,sim ulacrás da so cieda_ de pós-industrial,,. t. Iï,"T"r*"la definição breve de ',devjr,,,segundo aparece n o texto de D eleuze e G uattari. Trata-se de u m a cãm unicação trans_ ve rcal co m u m heterogêneo. N o nivel,,m olar,, a so ciedade n o s segm enta bìnariam ente, produzindo categorias identitárias (ho- m e m x m ulher, n egro x branco etc.). Contudo, o s fluxos de dese- jo e stão se m pre e scapando dessas dicotom ias n u m nÍvel "m olecular", Um hom em pode se r tom ado por u m , .devir_m u- lher" o u u m "devir<riança,,, e m que ele n a o e o u im ita, m a s se I - _ * .qryFj.
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