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Janice Caiafa

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Q século XX se
 prepsrou n
o
 su
ce
ssõo cada
ve
z m
ois o
e
elerqdq dos inovoçóes técniccs-
N
ovos podróes de percepçoo e
 e
xperièncio
se
 produzirom
 e
 aíetarom
 diretum
ente o
s
co
rFos, o
s reloçóes so
cicis e
 toda a
 produç€o
hum
qne (oÉístico, subietivo, etc'). Floiq n
c
cuge desses processosr ü5 n
o
vcls descobertas
parecem
 por yezes m
ais obsÍor que viobilizor.
Porque todos e
sse
s o
co
ntecim
entos sóo
sntes de tudo figuras de m
utoçoes dc
ccpitclÍsmo. N
estas n
ctos de fim
 de sêculo,
aÍirmqmos que u
m
q, problem
otizoção
intronsigente de n
o
sso
 tem
po é a
 vio paro
co
n
seguir divissr o
 que ele n
o
s proporciono,
É o
 
,
"
.u
ro
 dos ditum
es do presente que n
o
s
abre poro o
utros tem
pósn pcrq u
rnü' tem
Po-
rslidqde crisdors. ïi:lvez e
ntoo pudéssem
os
cpostar nq püssog€m
 poro o
 n
o
vo
 eéculo *
de re
sto u
m
 m
crco
 srbitrório 
*
 co
mÊ u
m
o
psssogem
 de foto, co
m
o
 sslto'
r5}fie€J*.
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W
m
::.P;w
co
ng(óes
Cruen, FAZER
 CRLAR
Pur" u
 a
rte e
 o
 pensam
ento é preciso u1 lem
po de re
sso
-
;ât.i^; Ú* pou*u pode produzir 
se
u
s efeitos a
n
o
s depoìs
i" Uao porqu" su
a
 ação não se
 e
sgota e
 não sa
cia n
o
 m
o
-
*e
*o
 a
u
 teitura. D
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m
a
 obra de
a
rte im
pÌica abrigar a
s repercussões que a
 poética vai pro'
u
o
.r., u
 podem
os dizer iiso para qualquer a
rte' O
 Poem
a
u
oltu'co*o 
u
m
a
 dádiva n
u
m
 lapso de tem
po que pode co
'
brir toda u
m
a
 vida. O
 pensam
ento tam
bém
 precisa de u
m
i"C" a
. elaboração lpara o
 a
utor e
 Para o
 leitor) que o
tlìí;*p*tciu 
e
 u
a
"q''udo para e
xpressar'?or isso a
 fi-
gura da "
*pr*" fiã u
niversidade parece m
:sm
o
 se
r' co
m
o
ãi" O
"t.lr"., o
 fim
 de toda pesquisi' O
 im
ediatism
o ditado
pJo 
*
"t."ao e
 a
 e
xigência do a
specto 
"aplicado" para o
iaber vai co
ntra o
 processo de criação n
a
 a
rte e
 n
o
 Pensa-
m
e
nto. Não que obias de a
rte não Possam
 se
r tam
bém
 m
e
r-
cad.orias co
m
práveis 
-
 e
nquanto livros' discos o
u
 telas 
-
 m
a
s
utu, ui.r.rao 
,u
*pr" de óutra coisa que não se
 inscreverá
n
e
sse
 eireuits e
 m
e
sm
o
 trúa]hará 
co
ntra ele'
-
 
-
-
 úao e
 n
a
 relação de co
rsu
m
o
 que a
 a
rte chega a
 se
u
 des-
tinatário. O
 que é co
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su
m
ido 
co
m
o
 u
m
a
 m
e
rcadoria 
se
 e
s-
gota n
o
 m
o
m
e
nto, m
e
sm
o
 que Possa satisfazer' O
 proble'
ïru é *
*
*o
 
o
 fato de que satisÍaz' Beniam
in observa que'
diante de u
m
a
 pintura, o
 olhar 
"não co
n
segue 
se
 sa
ciar"'
O
ra, é a
 sa
ciedaàe que põe fim
 a
o
 deseio' M
as a
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rte
,
"Urf"" o
 deseio a
o
* 
"àlgu'nt 
coisa que alim
enta co
ntinua-
,:d
-
.:t'r
' ;:i.,1
r:,,1çr...
lÍtì'
::E;
$*4;
:rlï-::
frtucr Cerern
m
e
nte e
sse
 desejo".l A a
rte e
 o
 pensam
ento 
se
 inscrevem
n
e
sse
 tem
po e
m
 que o
s efeitos não se
 e
sgotam
 n
o
 m
o
m
e
nto
da sede, m
a
s vão repercutir m
ais além
 e
 e
m
 seguida, m
uito
depois, n
u
m
 lapso que é o
 dom
ínio m
e
sm
o
 da criação. O
gesto técnico de abreviar (o click ve
rsu
s o
s m
o
vim
entos dos
pincéis) por si m
e
sm
o
 não destrói e
sse
 lapso. A fotografia
e
n
co
ntraria 
u
m
a
 e
xpressão criadora n
u
m
a
 a
rte do instante.
Por o
utro Ìado, claro que inovação técnica favorecia a
 rela-
ção de co
n
su
m
o
, co
m
o
 Benjarnin percebeu n
o
 despontar
m
e
sm
o
 dessas m
udanças. A reprodução técnica tendia 
a
disponibilizar 
e
m
 e
xce
sso
, oferecer até a
 sa
ciedade. M
as o
cinem
a e
 a
 fotografia atíngem
 por se
u
s m
eios u
m
a
 singula-
ridade que não se
 e
sgota n
a
 relação precária do m
o
m
e
nto
do co
n
su
m
o
 e
 só vive de su
a
s rePercussões. Barthes fala do
punctum
 da foto, u
m
 re
ca
nto da im
agem
 que vai e
xe
rce
r u
m
fascínio justamente por não se
 colar a
 n
e
nhum
a e
xplicação
im
ediata, vai prender o
 observador n
u
m
a
 relação duradoura
de fruição.z Serge D
aney vai falar de u
m
 sa
u
a
e
nir-éüan para
u
m
 film
e, o
 m
o
m
e
nto e
m
 que ele é forte porque produz
u
m
a
 im
agem
 desúadora da e
siética dom
ínante e
 que vai
se
r a
 m
a
rca
 
"inesquecível" daçeÌe 61m
e. São poéticas n
a
fotografia e
 n
o
 cinem
a que vão perdurar n
a
 relação co
m
 a
s
obras e
 n
e
ce
ssa
riam
errte 
subtraí-las, n
e
sse
s m
o
m
e
ntos, do
circuito da sa
ciedade e
 do e
sgotaúento. D
e fato, todas a
s
a
rtes hoje têm
 que se
 haver co
m
 e
sse
 problem
a. O
 que se
instaura co
m
 e
ssa
s inovações 
-
 e
 é isso, creio, que Benjamin
a
n
u
n
cia 
*
 não é u
m
 destino da técnica, m
a
s precisam
ente
u
m
 n
o
vo
 problem
a que caberá doravante à a
rte e
 a
o
 PeÍÌsa-
m
e
nto re
volver, deslocar.
N
ossa época é m
a
rcada por u
m
a
 valorização da dispo-
nibilidade. A figura do banco de dados é e
xe
m
plar desse
processo. Tam
bém
 o
 é o
 e
n
altecim
ento das redes de infor-
m
ática n
a
 m
edida e
m
 que elas n
o
s disponibilizariam
 
"o
m
u
ndo". Claro que n
o
s é dado e
sPeÍar que algum
a coisa
t
N
osso sÉcuro Xll: N
or.rs so
u
n
r AR
TE, rÉcucl E PoD
ERËs
valiosa possa n
o
s vir daí. A disponibilidade e
m
 si, co
ntudo,
não garante e
sse
 valor. Ao co
ntrário, a
 ptofusão e
stabelece
a
 relação do co
n
su
m
o
, a
o
 preço do co
m
prom
etim
ento de
u
m
a
 densidade firndam
ental para a
 criação. Por o
utro lado,
é fato que e
ssa
 inÍinita disponibilidade, n
o
 que tange às re
-
des de inÍormática, vive n
e
ste m
o
m
e
nto m
ais do a
núncio
do que de u
m
a
 e
xistência efetiva. O
 infinito o
u
 o
 u
niversal
e
stá m
e
n
o
s n
o
 que se
 pode co
n
cretam
ente obter (bem longe
de substituir, por e
xe
m
plo, u
m
a
 visita a
 u
m
a
 biblioteca re
al)
do que n
o
s ca
m
inhos que se
 PercoÍrem n
o
s program
as. Es-
sa
s direções parecem
 co
nduzir 
m
e
n
o
s do que divertir de
ícone a
 ícone o
u
 de site a
 site, o
 que pode co
n
su
m
ir horas.
M
as a
 profusão persiste co
m
o
 e
m
blem
a, a
ssim
 co
m
o
 o
co
rre
co
m
 o
s a
núncios de televisão a
 cabo que e
nfatizam
 a
 quan-
tidade de opções e
 a
s facilidades de adicionar 
m
ais.
Será se
m
pre co
nEa a
s dim
ensões do u
niversal que se
co
n
seguirá traçar a
 linha singular da a
rte e
 do pensam
ento.
O
 capitalism
o 
vive m
uito de provocar grandes disponibili-
dades, se
u
s invesllm
entos se
rão cada ve
z m
ais do porte do
u
niversal. Interessa tam
bém
 à su
a
 a
xiom
ática3 que o
s vín-
culos sejam o
s m
ais precários, que se
 so
rva
 o
 m
áxim
o n
o
e
xce
sso
, que a
 sa
ciedade im
peça a
 duração. Um
a aposta tal-
ve
z seja que se
 co
n
siga e
stabeiecer aí m
e
sm
o
, 
n
e
sse
s n
o
vo
s
circuitos, o
utras reiações 
-
 m
a
s se
rá se
m
pre co
ntra a
 cre
nça
fácil de que a
 disponibilidade é e
m
 si m
e
sm
a
 Senerosa'
A re
sposta m
uitas ve
ze
s a
o
 e
m
udecim
ento que aTgum
as
m
ídias provocam
, 
co
m
o
 a
 televisão por e
xe
m
plo, é a
 
"inte-
ração". Essa se
ria a
 n
o
va
 relação a
 se
 e
stabelecer co
m
 a
 in-
form
ação. A n
o
va
 o
rganização co
m
u
nicativa que a
s redes
de inform
ática im
plicam
 tam
bérn tem
 co
m
o
 bandeira a
 in-
teração, dessa ve
z suPostam
ente potenciada a
o
 infinito'
Aqui o
 tem
po que sedespende às voltas co
m
 a
 m
ídia se
ria
qualitaüvam
ente diferente do tem
po de a
ssistir televisão
porque o
 u
suário interage co
m
 a
 m
áquina' A interação vira
4;:::;
i,rri:l
:ì,'',
:;.',
:::,
\
ì:.3'tíIrì:lriiìãí4ì{.l
26
fer.ncr Cruere
e
ntão u
m
 m
odo, u
m
 desenlace gue vai afetar m
e
sm
o
 a
 lite.
ratura e
 o
utras n
a
rrafivas. O
s livros interativos para crian-
ças já são u
m
a
 m
trada do co
m
putador n
a
 literatura. N
eles
a
 criança é cham
ada a
 co
m
pletar 
a
 história e
 se
 a
credita n
a
s
virtudes pedagógicas disso. Ao invés de re
ceber a
 história
pÍonta, ela a
 criaria. O
 role playing gam
e guarda o
 m
e
sm
o
a
specto interativo. Trata-se de u
m
 jogo e
m
 que se
 incolpo-
ra
m
 personagens 
e
 vai-se criando a
 história a
 partir de indi-
caçÕes já e
sLipuladas, m
a
s se
m
pre e
m
 interação. Com
 va
-
ri.ações, são todos e
xe
m
plos da m
e
sm
a
 postura diante do
que é criar e
 Íazer criar.
A interação co
m
eçou e
nlre nós n
o
 protÌama Você decíde,
ainda n
u
m
a
 Íorma precária. São grandes telas n
a
s praças
de diversas cidades brasileiras co
m
 m
ultidões 
se
 e
m
pur-
ra
ndo para decidir algum
a coisa co
m
 a
 televisão. E é sobre-
tudo a
 possibilidade de telefonar de ca
sa
 re
spondendo à
pergunta, o
u
 seja, dessa ve
e
 interagindo, saindo da passivi-
dade. Trata-se de u
m
 e
xe
m
plo m
ais fraco, porque ali fica
claro que não há decisão n
e
nhum
a quando se
 tem
 que a
s-
su
m
ir o
s pressupostos da televisão. A única decisão se
ria
re
cu
sa
r a
 pergunta o
u
 dar u
m
a
 re
sposta a
 o
utTa pergunta.
M
as e
ssa
 cre
nça de que algo de im
portante se
 cria quando
há interação (mesmo que o
 se
u
 parceiro seja a
 televisão)
pelpassa processos m
ais aliciantes. Para alguns, ela é a
 gran-
de virtude da Internet. É interessante e
xa
m
inar u
m
a
 e
ntra-
da ainda m
ais a
rriscada desse n
o
vo
 m
odo, o
 ca
so
 dos livros
interaüvos. Estam
os se
ndo passivos quando não 
"co
m
ple-
tam
os" u
m
a
 história, çando não retrucam
os, por e
xe
m
-
plo, a
 D
ostoievski?
As grandes obras são n
e
ce
ssa
riam
ente incom
pletas, m
a
s
não porque falte u
m
 final que se
ria preciso lhes fom
ecer. É
por não se
 e
sgotarem
 
n
o
 m
o
m
e
nto de su
a
 aparição, por não
se
 darem
 n
u
n
ca
 de u
m
a
 ve
z por todas, que elas perduram
 e
co
ntinuam
 provocando re
sso
nâncias. õom
pletàr é sa
ciar-
N
osso 
sÉcur,o XXI: N
oras so
snE aR
TE, TÉcMcA E poDEREs
,n
se
 (em alguns ca
so
s, 
"decidir" u
m
a
 banalidade) 
e
 o
 proces-
so
 ali se
 e
sgota. É quando a
 idéia de inform
ação e
nquanto
im
plicando a
 disponibilidade 
e
 a
 sa
ciedade pode se
r, e
m
plena profusão, e
m
pobrecedora. Em
 
"O
 n
a
rrador", Benja-
m
in diz que a
 n
a
rração e
n
volve se
m
pre u
m
a
 vo
ntade de
re
co
ntar a
 história. Cada história não se
 co
m
pleta n
o
 m
o
-
m
e
nto e
m
 que é co
ntada, porque o
 o
u
vinte vai querer
re
co
ntá-la, fazendo-a perdurar. A Ìiteratura a
ssu
m
e
 
e
sse
a
specto da n
a
rração que aparece n
a
 tradição o
ral. Ao co
n
-
trário do ponto final, a
 n
a
rração vive de u
m
 desejo de
Sherazade. Em
 Ás m
il e
 u
m
a
 n
oites a
s histórias se
 e
nlaçam
se
m
pre re
m
etendo a
 u
m
a
 o
utra história. Aqui podem
os
pensar tam
bém
 a
 a
rte de o
u
vir, de ler o
u
 de ve
r. O
 grande
n
a
rrador co
n
seguirá provocar e
sse
 desejo de re
co
ntar n
o
o
u
vinte-leitor, inclinação a
 gue ele cederá 
"irresistivelm
en-
te". D
a parte do o
u
vinte, a
 atitude se
rá de 
"e
squecer-se de
si". O
u seja, o
u
vir para re
co
ntar 
-
 para participar das re
sso
-
nâncias da obra, para criar 
-
 im
plica e
ntregar-se, ingressar
n
a
 duração'ãa obra se
m
 e
sgotá-la. O
 co
ntrário portanto de
co
n
su
m
ir. Criar co
m
 a
 obra é e
xperim
entar co
m
 ela e
sse
processo de re
sso
nâncias. Não é o
 truque técnico de
co
m
pletá-la. Pôr u
m
 ponto Íinal é tudo o
 que u
m
a
 grande
obra não precisa para repercutir n
a
 vida-obra do leitor.
Ao co
nhário, é preciso e
vitar 
"e
xplicações". É a
 infor-
m
ação que se
 apóia n
a
 e
xplicação im
ediata. A história do
Egiio e
scrita por H
eródoto n
ada e
xplica, diz Benjamin. É
por isso que ela 
"atndaêcapaz-rlepois 
de m
itCnlos, desus-
citar e
spanto e
 reflexão".4
Trata-se de u
m
 equívoco a
ssu
m
iÍ que a
 atitude de re
s-
ponder a
 u
m
a
 história n
o
 livro o
u
 a
 u
m
a
 co
nfiguração 
n
a
m
áquina e
m
 si m
e
sm
a
 provoque a
 criação, m
e
sm
o
 que a
dim
ensão dessa co
n
ve
rsa
 seja im
ensa o
u
 que a
s ligações
sejam m
últiplas e
 diretas. Essa m
ultiplicação, inclusive, pode
e
star apenas participando do elogio da disponibilidade e
-
28
|emcr Cerare
não produzir de fato m
ultiplicidade. Tudo vai depender da
qualidade dessas relações. Fazer criar é im
pulsionar n
o
 pro-
ce
sso
 de duração e
 re
sso
nâncias. Seria preciso co
n
seguir
e
n
sejar isso co
m
 a
 interação.
Um
 otim
ism
o não-crítico pode n
o
s im
pedir de buscar
a
s n
o
va
s e
stratégias de que precisam
os. Estratégias para a
o
m
e
sm
o
 tem
po fazer u
m
a
 crítica intransigente do capitalis-
m
o
 e
 viver a
s n
o
vidades de n
o
ssa
 época n
u
m
a
 intensidade
e
 n
u
m
a
 parcim
ônia que não n
o
s subtraiam
 
a
 dádiva da cria-
ção. Poderíam
os repensar tam
bém
, por e
xe
m
plo, u
m
a
 o
u
-
tra virlude a
ssu
m
ida de n
o
ssa
s n
o
va
s m
ídias. O
 a
n
o
nim
ato
que é possível n
a
 internet aparece m
uitas ve
ze
s co
m
o
 posi-
tivo. Um
 co
rolário da situação de a
n
o
nim
ato é a
 a
u
sência
de a
utoria. A tendência se
ria que o
s textos n
a
vegassem
 se
m
a
utores, disponíveis para o
 u
so
 coletivo. Isso tam
bém
 é vis-
to co
m
o
 u
m
a
 virtude e
 é u
m
 a
specto que n
o
s in1s1s5s6 Ílis-
cutir porque tam
bém
 toca a
 questão da criação.
Claro e
stá que o
 a
n
olim
ato pode provocar u
m
 tipo de
liberdade. Não m
o
strar-se, inventar personas etc. Contu-
do, e
sse
 a
specto já e
xiste de o
utra form
a e
m
 o
utras m
ídias,
co
m
o
 o
 telefone e
 o
 co
rreio. As ca
rtas a
nônim
as são o
 m
ais
das ve
ze
s a
m
e
açantes, m
a
s podem
 trazer hom
enagens. Com
o
 teleÍone tem
os o
 
"trote", a
ntigo e
 e
n
e
ryante, m
a
s talvez
tam
bém
 co
m
 su
a
s virfudes. M
as e
m
 todos o
s ca
so
s há o
 a
s-
pecto da invasão. O
 a
n
o
nim
ato e
n
co
raja a
 declarações 
o
u
-
sadas. Para re
cu
sá-las, n
o
 ca
so
 do co
rreio e
 do teleÍone, bas-
ta ra
sgar a
 ca
rta o
u
 desli gar. Já o
 tête-à1ête n
viabiliza 
o
 a
n
o
-
nim
ato e
, e
m
 ca
so
 de ofensa, é possível afastar-se o
u
 re
vidar.
Este é u
m
 ponto im
portante de se
r pensado a
 re
speito des-
sa
s n
o
va
s co
nfigurações da co
m
u
nicação. Esse tipo e
specí-
fico de a
n
o
nim
ato traz tam
bém
 u
m
a
 ca
rga de violência. Está-
se
 protegido pela possibilidade a
m
pliada agora de e
sco
n
-
der su
a
 identidade e
 a
o
 m
e
sm
o
 tem
po inserido n
u
rn
 e
sque-
m
a
 de e
scrita m
uito m
ais irnediato que a
 ca
rta. N
a ca
rta, a
N
osso sÉcrno XXI: N
orns so
rn
e
 AtrE, TÉc!ürcA E poDm
Fs
pausa e
ntre a
 e
scrita e
 o
 e
n
vio 
e
 talvez o
 defrontar_se 
co
m
 a
folha de papel participam
 da própria e
n
u
n
ciação que ali vai
vigorar. A im
agem
 da situação de e
scre
ve
r u
m
a
 caúa é de
alguém
 pensativo se
ntado a
 u
m
a
 m
e
sa
, talvez co
m
 algu-
m
a
s folhas a
m
a
ssadas e
m
 tom
o (não ra
ro
 re
e
scre
ve
m
o
s e
ponderam
os). N
o ca
so
 da rede, a
s n
o
va
s co
ndições pare_
ce
m
 co
ntribuir para a
 franqueza e
 m
e
sm
o
 para a
 agressão.
A co
m
u
nicação e
m
 rede, co
m
 a
 possibilidade a
m
pliada de
a
n
o
nim
ato e
 a
 instantaneidade, parece criar u
m
a
 n
o
va
 for_
m
a
 de interpelação 
e
 se
m
 dúvida u
m
 n
o
vo
 tipo de violên_
cia. As potencialidadescriadoras dessa n
o
va
 interpelação
não parecem
 se
 m
o
strar de im
ediato. A co
nfiguração técni-
ca
 dessa n
o
va
 form
a de falar (com m
uitos e
n
volvidos, co
m
e
n
vio im
ediato da m
e
n
sagem
 o
u
 m
e
sm
o
 e
m
 tem
po re
al)
por si m
e
sm
a
 não dem
onsha e
ssa
s potenciaiidades, 
co
m
o
Lam
bém
 não a
s n
ega. O
bservar o
s desdobram
entos desses
processos co
m
 u
m
 otim
ism
o crítico e
xige que não o
s credi_
tem
os co
m
 u
uia virtude de a
ntem
ão. Tratalse de que n
o
vo
s
probÌemas por su
a
 ve
z aparecem
, que deveriam
 n
o
s obri-
gar a
 pensar. A questão da yiolência é u
m
 deles.
O
 trabalho co
m
 a
 identidade poderia se
r u
m
a
 perspecti-
va
 interessante e
 ce
rtam
ente guarda u
m
a
 potência de cria-
ção. N
ovam
ente, ele já e
xistia e
m
 o
utras m
ídias, e
m
bora
agora apareça n
a
s redes co
m
 ca
ra
cterísticas e
specíficas 
e
m
uiüo rn
aisr a
m
plitude. N
+ irtternet alguem
 podená-forjar
totalm
ente para si u
m
 n
o
vo
 ro
sto o
u
 u
m
a
 história que não é
a
 su
a
 e
 a
ssim
 se
 apresm
tar àqueles co
m
 quem
 interage 
n
a
rede. A idéia de incorporar personagens aparece de form
a
se
m
elhante n
a
 rede e
 n
a
 role playing gam
e, a
m
bos são re
ali-
zações particulares do m
e
sm
o
 e
squem
a de interação. e
u
al
se
rá a
 Íorça desses jogos, se
rá que a
 interação n
a
 rede tem
 o
poder de fazer co
m
 que n
o
s tom
em
os o
utros, se
rá que de.
ve
m
o
s tom
ar a
o
 pé da leha aqueles que dizem
 
,
,viver,, e
s-
sa
s personas? Com
o é tudo m
uito re
ce
nte, pouco e
xiste que
30
:
JAìIcE CAIAFA
N
oso sÉcuro XXI: N
orls so
sn
r AR
TE, TÉcMcA Ë PoD
FR
rs
JL
ve
ze
s tenta n
o
s co
n
ve
n
ce
r de gue ela é tudo que e
xiste ("tudo
a
 ve
r" etc.). É im
portante 
observar que Por ve
ze
s a
s afirm
a-
ções da m
ídia e
 a
s de u
m
 ce
rto tipo de crítica a
 ela a
cabam
por coincidir. Estranham
ente, Parece que e
sse
s poderes
p"ssu* a
 se
 alim
m
tar tam
bém
 dessa denúncia.6 Tom
em
os
co
m
o
 e
xe
m
plo o
 cham
ado co
co
o
n
e
r da Internet' Esse term
o
referese a
 pessoas gue passariam
 m
uito tem
po de su
a
s vi-
das 
"n
a
vegando", supostam
ente e
vitando safu e
 Perm
ane-
ce
ndo n
u
m
 
"ca
sulo", e
stabelecendo 
co
ntato quase que e
x-
clusivam
ente 
n
a
 rede. Alguém
 que m
a
ntivesse e
sse
 e
sque-
m
a
, supondo-se que tal figura e
xista, se
rá que 
"viveria" n
u
m
u
niverso de relações internacionais, 
n
a
 diversidade do co
n
-
tato co
m
 o
s países m
ais distantes, línguas e
strangeiras etc'?
Não a
credito que tais Processos tenham
 qualquer densida-
de e
xistencial para se
 substituírem
 às relações co
n
cretas
dessas pessoas. O
s co
ntatos à distância são m
ais inócuos'
sejam eles interessantes 
o
u
 banais' Tam
pouco a
credito que
se
ria possível e
vitar o
 que se
 Passa e
m
 torno 
-
 de fato e
sse
ca
sulo não e
xiste se
m
 poros' Se fôssernos im
aginar a
s rela-
ções de u
m
a
-y'essoa 
n
e
ssa
 situação, elas se
 e
stabeleceriam
,
suponham
os, 
co
m
 a
 fam
ília, a
 e
m
pregada gue lhe haz co
-
m
ida e
 tem
 u
m
 salário x, o
u
 co
m
 se
u
 irm
ão que habita o
quarto co
ntíguo e
 ce
rtanente co
m
 u
m
a
 m
áquina a
 que eie
se
 a
copla. Sua so
ciedade induiria, por e
xe
m
plo, 
o
 e
ntregador
de superm
ercado 
e
 o
s m
e
ndigos que e
stão pela ru
a
, m
e
sm
o
que ele o
s e
vite à su
a
 m
a
n
eira'
Não é que não se
 pudessesuPor qusoscorÌfdüos n
a
 rede
produzissem
 interferência n
u
m
a
 vida, m
a
s não m
uito m
ais
que o
s telefonem
as o
u
 a
s ca
rtas podem
 produzir para al-
guém
 que se
 dedica a
 eìes. lnclusive, o
 co
rreio parece m
ais
eficaz co
m
o
 veiculador de e
strangeirism
os 
e
 interferências'
Aí tem
os a
 letra do re
m
etente, 
o
 e
n
velope que veio de fora,
o
 selo que pode vir de países distantes' Há u
m
a
 m
aior ca
r-
ga de alteridade n
e
sse
 ca
so
 Para produzir rePelcussões
já tenha sido dito para re
sponder co
m
 segurança a
 e
ssa
s
perguntas, 
m
a
s elas e
stão por aí a
 n
o
sso
 redor' n
o
s textos'
n
a
 m
ídia, e
m
 co
n
ve
rsa
s
D
e toda form
a, não parece que até agora e
ssa
 co
m
u
nlca-
ção tenha co
n
stituído u
m
a
 
"so
ciedade virtual"' o
u
 pelo
m
e
n
o
s não m
ais do que poderíam
os suPor Para o
 telefone e
o
 co
rreio. Poderíam
os talvez dizer que a
 co
m
u
nicação
epistolar co
n
stitui n
u
m
 ce
rto m
o
m
e
nto 
"uÍnn ssçiedade"'
m
a
s o
 diríam
os n
u
m
 se
ntido bem
 re
strito' devido à n
afure'
za
 das relações e
stabelecidas' Isso vale para a
 co
m
u
nicação
n
a
s redes de co
m
putador' Aqui o
s participantes' e
m
bora
e
m
 grande núm
ero, co
n
stituem
 u
m
 gruPo bem
 e
specífico 
-
não"se duvide de que a
 m
aioria da população do planeta
não é u
suária da rãde e
' co
m
o
 o
 capitalism
o se
 apóia n
a
.
 e
xclusão, e
sse
 u
so
 poderá funcionar co
m
o
 m
ais u
m
 indica-
dor de desigualdade (como de re
sto o
 telefone ainda é n
o
Brasil, e
m
 cãrta m
edida)' Quanto à n
atureza das relações' a
*tuçao so
cial im
plica por definição alteridade 
e
 risco' Cla-
,o
 qL" *
 
indivíãuo n
o
 abrigo de u
m
 torto fictício de u
m
a
.uiu, rro
 a
n
o
nim
ato do trote o
u
n
o
sn
o
vo
s 
"ca
sulos" da rede
(onde se
 e
stá m
uito m
ais protegido e
 o
nde pode haver m
ais
violência, co
m
o
 vim
os), vive a
ntes de ludo u
m
a
 fantasia
se
m
 a
 m
e
n
o
r força para se
r tom
ada co
n
cretam
ente 
co
m
o
vida so
cial. Trata-se aPenas de u
m
 iogo que' dos ca
so
s e
xa
-
m
inados, só n
a
 rede parece não se
 co
nfessar co
m
o
 tal' Tal-
ve
z-poÍque tal co
nÍissão 
m
o
straria 
n
o
ssa
s n
o
va
s m
ídias e
m
su
a
s va
ntagens e
 su
a
s bobagens, 
co
m
o
 qualquer o
utra'
Está aí presente o
 m
e
sm
o
 e
xagero que afirm
a que' a
s
transm
issões n
o
 tem
Po viriam
 a
 substituir hoie a
s relações
e
spaciais, o
u
 que vivem
os hoje n
a
 sideração das n
o
va
s
tárologias. O
utra m
a
n
eira de form
ular isso é dizer que o
so
cial n
"ão passa de u
m
a
 aparência's Som
os de fato atingi-
dos e
m
 cheio por e
sse
s Processos, m
a
s é duvidoso que se
possa falar e
m
 substituição' A televisão tam
bém
 m
uitas
lì
a
7)
Jnurcr Cerere
n
u
m
a
 vida e
 criar relações. Enquanto que n
a
 rede a
 tendên-
cia é a
 u
niform
ização clo texto n
o
s e
-m
ails e
 n
o
s chats. Com
a
 ca
rta de papel tem
os u
m
a
 inegularidade que a
 faz u
m
objeto heterogêneo, 
capaz de produzir atrito. Produz-se u
m
a
ilegibilidade fundam
ental para n
o
s trazer o
 e
straúo 
e
 que,
por su
a
 ve
z, a
 literatura co
n
segue por o
utros m
eios. Paie-
ce
 que o
 a
specto clesn da co
m
u
ni.cação por co
m
putador
tende a
 elim
inar e
ssa
 ilegibilidade. Não basta falar e
m
 in-
teração para garantir a
 alteridade 
n
a
 co
m
u
nicação por rede,
é preciso e
xa
m
inar a
s co
ndìções e
m
 que a
s relaçÕes se
 e
s-
tabelecem
.
N
ovam
ente há u
m
a
 superestim
ação dos poderes dessa
m
ídia. A fuga à identidade não só é m
uito local (embora
alguns e
ve
ntos locais possam
 adguirir e
m
 ce
rto m
o
m
e
nto
u
m
 e
n
o
n
n
e
 alcance), m
a
s sobretudo não parece ter m
aiores
repercussões n
a
 produção subjetiva do que u
m
a
 fantasia
pessoal e
 efêm
era. O
 personalism
o, aliás, é a
 m
a
rca
 dessas
diversôes solitárias que a
 rigor não co
n
stituem
 n
e
nhum
a
relação so
cial. A interação co
m
 a
 m
áquina ainda não n
o
s
trouxe a
 so
ciedade, a
o
 co
ntrário, e
m
 alguns ca
so
s parece
e
n
volver u
m
 desejo de faz&la re
cu
a
r, perm
anecendo n
a
 fan-
tasia e
 n
o
 
"ca
sulo". A vida so
cial, o
s e
m
bates hum
anos co
nti-
n
u
a
m
 se
 dando n
o
 local: n
a
s cidades, n
o
s ônibus, n
a
s ca
sa
s,
n
a
s ru
a
s, n
a
s a
ulas. A técnica deve se
r pensada 
n
e
sse
 co
n
-
texto, co
m
o
 u
mdos vetores desse jogo.
A heteronínia, im
plicando u
m
 
"tom
ar-se o
utro", é u
m
processo se
m
pre m
ais sério e
 m
e
n
o
s inócuo. Não digo que
não pudesse o
coffer tam
bém
 n
a
s redes de inform
ática, 
m
a
s
não o
 se
ria co
m
 e
ssa
 superficialidade, 
n
e
m
 se
 daria pelo
m
e
ro
 huque técnico de não re
velar-se. As personas da co
-
m
u
nicação epistoiar jamais tiveram
 
a
 pretensão de u
m
 e
xe
r-
cício efetivo da alterídade e
 jamais pensam
os n
a
s brinca-
deiras por telefone co
m
o
 u
m
a
 form
a de n
o
s.transform
ar-
m
o
s. Precisaríam
os perder a
 pom
pa a
o
 n
o
s referirm
os 
a
 e
s-
N
osso sÉcuro XXI N
oras sogne e
n
rr, rÉcruc.l 
u
 ro
oi*,rs
JJ
sa
s n
o
va
s brincadeiras que tem
os agora, tanto para apro-
veitá-las quanto para dispensá-las.
Todos e
sse
s dispositivos prom
ovem
 
a
 desqualificação
do co
rpo e
 co
n
seqüentem
ente a
 e
vitação dos riscos que ca
r-
regar u
m
 colpo gera. São o
s diversos tipos de co
ntágio n
o
co
nfronto co
m
 o
 heterogêneo 
-
 o
nde circulam
 doenças,
idéias, afetos. N
a rede, o
 a
specto da e
vitação de úcos n
a
co
m
u
nicação fantasm
ática (que já o
 telefone, a
s se
cretárias
eletrônicas, a
 televisão apresentam) 
aparece agravado.
Com
o virFos, a
 proteção que se
 co
n
sfitui ali para o
 e
n
u
n
cia-
dor cria a
o
 m
e
sm
o
 tem
po u
m
a
 franqueza e
 u
m
 n
o
vo
 tipo
de violência. Com
 isso fiìa ainda m
at aifcit produzir o
 he-
terogêneo e
 a
 m
ultiplicação de parceiros não parece a
 rigor
co
n
stituir m
ultiplicidade. O
 parceiro tende a
 e
star ali co
m
o
disponibilidade e
 dificilm
ente co
m
o
 o
utro. N
esse ca
so
, a
interação co
m
o
 re
sposfa a
o
 m
utism
o do u
suário não pro-
duz alteridade. N
a 
"literatura" interativa 
-
 o
nde o
 leitor é
tom
ado co
m
o
 u
suário 
-
 e
sse
 equívoco parece querer desa-
fiar a
 próp{aliteratura 
a
o
 tentar im
por-lhe a
 obsolescência.
O
s deviresz e
m
 que poderíam
os e
ntrar co
m
 a
 literatura vêm
,
a
o
 co
ntrário, das re
sso
nâncias que a
s obras de aÉe provo-
ca
m
 a
o
 perdurarem
, a
o
 não se
 e
sgotarem
 n
u
m
 
,
,fim
,, (in-
ve
ntado que seja pelo leitor) o
u
 n
u
rn
 e
spisódio de intera-
ção. E n
e
sse
 processo de duração e
 repercussão que pode.
m
o
s n
o
s transform
ar.
D
eleuze e
 G
uattari observam
 que Kafka u
so
rr xg r"a
ring
que e
scre
via para adiar o
 e
n
co
ntro efetivo co
m
 a
s n
a
m
o
ra
-
das e
 a
ssím
 e
vitar o
 ca
sa
m
e
nto.S N
as ca
rtas, dizem
 o
s a
uto-
re
s, Kafka fez u
m
 
"u
so
 perverso" da dualidade sujeito da
e
n
u
n
ciação-suieito do e
n
u
n
ciado. Essa dualidade é m
ais
u
m
a
 
"m
áquina binária" co
m
 que a
 lingüística habalha. O
sujeito da e
n
u
n
ciação é aquele que fala e
 o
 sujeito do e
n
u
n
-
ciado é o
 sujeito gram
atical. N
as ca
rtas de Kafka, o
 sujeiüo
do e
n
u
n
ciado 
a
ssu
m
e
 o
 m
o
vim
ento que o
 sujeito da e
n
u
n
-
ciação não quer a
ssu
m
ir 
-
 trata-se de 
,
,u
m
 m
o
vim
ento de
papel". As ca
rtas vão para que Kafka não vá e
 co
ntinue às
voltas co
m
 su
a
 m
áquina de e
xpressão. porque Kafka 
,
,opu-
nha ca
sa
r a
 e
scre
ve
r" e
 se
 se
rvia desse veículo fantasm
ático
para persistir n
a
 e
scritura. A produção m
e
sm
a
 da obra e
ra
se
u
 m
o
vim
ento 
"se
m
 sair do lugar". Essa brincadeira de
KaÍka se
rvia-lhe indusive para fazer literatura n
a
s ca
rtas.
D
eleuze e
 G
uattari co
n
sideram
 a
s ca
rtas de Kafka co
m
o
parte integrante de su
a
 obra, a
ssim
 co
m
o
 a
s n
o
velas e
 o
s
ro
m
a
n
ce
s. N
esse ca
so
 há de fato u
m
 u
so
 
,
,perverso,'do dis-
positivo fantasm
ático, porque m
e
sm
o
 que n
u
m
 m
o
m
m
to
e
ste inviabilize 
o
 co
rpo, ajuda a
 viabilizar 
a
 obra. e
u
e
 u
so
s
inusitados desses n
o
vo
s veÍculos poderiam
 se
r atualizados
hoje, e
 não so
m
e
nte para u
m
 grande e
scritor co
m
o
 Kafka,
m
a
s para todos nós? Cabe-nos descobrir. Seria preciso co
n
_
tudo chegar a
 obter ali a
 alteridade, que a
 o
rdem
 que se
e
stipulou até agora co
m
 e
ssa
 inovação parece suprim
ir.
A questão da n
o
va
 o
rganização da idenüdade 
n
a
s redes
haz o
 ca
so
 dos textos se
m
 a
utor. Isso n
o
s interessa de perto
para a
 questão da criação. N
ovam
ente, e
ssa
 situação pode
produzir depressa dem
ais o
 se
u
 elogio. Interessa a
o
 capita-
lism
o fazer tam
bém
 da e
scritura disponibilidade. N
o trân-
sito de textos se
m
 a
utor à m
e
rcê de gualquer apropriação 
_
situação ainda apenas im
aginada, m
a
s perfeitam
ente ve
ro
s-
sím
il n
o
 co
ntexto dessa m
ídia 
-
,
 a
 princípio só é possível
ve
r a
 m
istura indiÍerenciada. A e
scritura é tratada co
m
o
inÍormação. Ela é trazida im
ediatam
m
te para perto (no se
n
_
tido de Benjamin) 
e
 portanto prontam
ente obstada n
a
 su
a
duração. Será apropriada e
 ali se
 e
sgotará, e
 a
 tendência é
que a
 colagem
 substitua a
 criação. Trazer para perto o
u
 tor_
n
a
r disponível é elim
inar a
 distância de qúe a
 olra e
 o
 dese-
jo n
e
ce
ssitam
 
e
 que a
 e
strela cadente re
e
n
ce
n
a
 e
m
 se
u
 per_
cu
rso
. A a
rte não habita o
 banco de dados que tem
, pode_
ríam
os dizer, u
m
 forte a
specto de choque. O
 se
u
 circuito é o
Jer.ncr Celare
I
N
osso sÉcwo XX: N
oras so
uR
E AR
TE TÉcl'ttcA E poDEREs
35
de incitar à criação, co
m
o
 quando se
 quer re
co
ntar u
m
a
 n
a
r-
rativa 
-
 e
 não apropriar-se dela o
u
 co
m
pletá-la. A n
a
rrativa
tam
bém
 vive da distância 
-
 ve
r, o
u
vir e
 ler co
m
o
 gestos
criativos im
plicam
 se
m
pre a
 co
n
stituição da alteridade, que
não podevir do e
xce
sso
 de proxim
idade o
nde não se
 possa
divisar o
 n
a
rrador e
 o
nde a
 n
a
rrativa seja apropriável e
 não
re
co
ntável. Sou co
ntagiado pelo processo de criação quan_
do so
u
 charnado a
 criar a
 partir da obra e
 não a
 dispoidela
co
m
o
 de u
m
a
 inform
ação. Porque ela jâ fez u
rn
 percurso, 
e
de u
m
 m
odo que ú ela poderia fazer 
-
 é a
 su
a
 singularìda-
de. Só m
e
 re
sta fazêJa durar agora, produzindo u
m
 ca
m
i-
úo tam
bém
 singular.
E toda u
m
a
 o
utra coisa que apontam
 D
eleuze, G
uattari
e
 Foucault quando problem
atizam
 
a
 a
utoria.e Foucault ques-
tiona o
s lim
ites tênues que co
nfiguram
 u
m
a
 obra e
 se
u
 vín-
culo se
m
pre precário co
m
 a
 m
a
rca
 a
utoral. Em
 u
m
 m
o
m
e
n
-
to, reivindica m
e
sm
o
 para si próprio a
 heteroním
ia 
e
 o
 a
n
o
-
nim
ato, aponta que u
m
 a
utor não pode se
r úam
ado 
a
 se
r
co
e
re
nte co
m
 se
u
 livro a
nterior, inclusive porque o
 proces_
so
 da e
scrituna'o hansform
a. O
 tornar-seàutrì 
ahavés da
obra não é de fato incom
um
 n
a
 literatura. Fernando pessoa
produz e
stilos diferentes co
m
 se
u
s heterônim
os, a
 alteridade
aparece diretam
ente n
a
 poesia, o
 texto ingressa n
o
 devir 
-
Fem
ando Pessoa ele m
e
sm
o
 vira u
m
 heterônim
o. O
 pseu-
dônim
o pode se
r tam
bém
 u
m
 re
cu
rso
 para driblar a
 a
utoria
e
 vários e
scritores o
 utilizaram
. G
 re
cu
rso
s do a
n
o
nim
ato,
co
ntudo, só são criadores quando produzem
 re
sso
nâncias
n
a
 própria e
scritura, eles são a
ntes u
m
a
 figura de u
m
 traba-
lho m
ais a
m
plo co
m
 a
 e
xpressão 
-
 e
ste sim
 a
 m
a
rca
 criado-
ra
 e
m
 qualquer texto, seja ele de u
m
 a
utor co
n
sagïado o
u
de u
m
 hom
em
 
"infam
e", de u
m
 a
nônim
o. D
eieuze 
e
G
uattari m
o
stram
 co
m
o
 Kafka fez re
cu
a
r o
 lugar do sujeito
da e
n
u
n
ciação e
 criou u
m
a
 literafura da e
n
u
ricia$o coleti-
va
, dando precedência a
o
 trabalho co
m
 a
 e
xpressão de vá-
-
-
 
-
-4
ce
sso
 a
 m
a
rca
da singularidade, e
 não da identidad". irfao
rias m
a
n
eiras: a
o
 inhoduzir intensidades 
co
m
o
 a
 m
úsica
desterritorializada que náo se
 presta a
 ser u
m
 pólo de u
m
a
relação e
strutural sim
ples; a
o
 produzir persoìagens des_
teritorializados 
n
a
 n
a
rrativa; a
o
 utilizar o
 alem
ão 
,
,m
e
n
o
r,,
de Praga etc. O
 a
utor re
cu
a
 para dar lugar a
 u
m
 frabalho
se
m
pÍe a
rriscado co
m
 a
 e
xpressão. e
u
etíonar a
 dim
ensão
a
utoral não é e
scre
ve
r u
m
a
 banalidade 
e
 não a
ssináìa. O
que não quer dizer que u
m
 a
utor de n
o
m
e
 obscuro não pos_
sa
 produzir u
m
a
 literatura re
volucionária. Ao co
nhário, foi
tornando-se de ce
rta form
a obscuro que Kafka produziu su
a
obra. D
igam
os a
ntes tom
ando-se 
,
,m
e
n
o
r,,, 
n
o
 se
ntido des_
se
 trabalho que co
n
stituina 
"a
s co
ndições re
voiucionárias
de toda literatura". Trata-se a
ntes de tudo de u
m
a
 posição
que se
 atinge, o
u
 de u
m
 devir e
m
 que o
s a
utores m
ais m
o
_
destos poderiam
 ingressar. Essa posìção não é obtida co
m
 o
m
e
ro
 gesto de não a
ssinar u
m
 texto. É u
m
a
 co
nquista 
cuja
re
co
m
pensa é a
 criação 
-
 que vai co
ntagiar o
ukos, se
r dádi_
va
 para o
utros, produzir alhures devires. Vem
os 
n
e
sse
 pro-
36
!çoDv q u
.4rLd u
..r ürn8-urarnqaoe, 
e
 nâo cla identidade. Não
n
o
s interessa ter textos de Kafka, Em
ily D
ickinson o
u
R
im
baud disponíveis e
 a
nônim
os. A aiitude criadora
advinda de u
m
a
 síngularidade n
o
s toca quando a
 deixa-
m
o
s re
sso
a
r e
 n
o
s incitar à criação, n
u
m
 e
xe
rcício tam
bém
singular. Que pode ter o
 n
o
sso
 n
o
m
e
: u
m
 n
o
m
e
 é u
m
 efeito,
u
m
a
 figura provisória 
e
 tênue. A e
xpressão deveria se
r vi_
gorosa o
 suficiente para e
m
punhá-lo dessa m
a
n
eira, co
m
o
pura singularidade. D
essa form
a, ele poderia até se
rvir para
Iry* 
a
 e
ssitura de ingressarno tum
ulto da disponibiiida_
{e.. E até im
agiúvel que o
 n
o
m
e
 e
nquanto 
efeito o
u
 singula_
ridade pudesse se
r u
m
 protetor da ábra, m
ais u
m
a
 palavra
n
o
 e
xe
rcício criador da e
scritura.
^
. Esles eqúvocos parecem
 de fato figuras do e
sforço de
abreviar, de u
su
rpar'os a
co
ntecim
entorã. ru
" a
u
raçaá. É o
úoque que Baudelaire tanto so
ube su
scitar e
 aparar e
 que
f.lrucr Cerera
N
osso sÉcuto XX: N
ot,rs so
rnt n
atr, ïÉcNrcA 
E poDEREs
ó/
hoje a
 figura da inform
ação gostaria que fosse para nós u
m
a
fatalidade 
-
 o
 tum
ulto de im
agens n
a
 TV (,todas se
 valem
,,,
co
m
o
 observa D
eleuze) o
u
 a
 e
scritura co
m
o
 disponibilida-
de. A e
m
presa n
a
 u
niversidade é u
m
 grande dilegado da
m
odalidade da inform
ação. São o
s 
,
"rultudo, im
ediatos e
aplicáveis que de fato a
cabarão co
m
 toda a
 pesquisa. E só
se
rão aplicáveis 
se
 houver a
 preparação prév1a de u
m
 co
n
_
texto para e
ssa
 aplicação, o
 que já é re
sultado de u
m
a
 ope.
ração de poder. É de fato o
 pensam
ento apoiado n
a
s re
sso
-
nâncias de u
m
a
 duração que poderá produzir re
sultados
criadores co
n
cretos.
R
m
nnÊrucns Bm
lrocnÁRcAs
1. Benjamin, l99S, p. 139.
2. Barthes, I981a.
3. G
illes D
eleuze 
e
 Félix G
uattari m
o
stram
 co
m
o
 a
 dom
inação capi_
talista ca
ra
cteriza 
u
m
a
 a
xiom
ática. por e
xe
m
plo, pelo Íato de su
_
portar u
rÍra heterogeneidade dos m
odelos de re
alização, desde
que isom
oúos 
a
o
s a
xiom
as que efetuam
; o
u
 pela possibilidade
de adicionar o
u
 subtrair a
xiornas etc. Cf. D
eleuze e
 iuattari, 1997.
4. Benjamin, I99Sa, p.204.
5. Jean Baudrillard desenvotve e
ssa
 tese e
m
 À l,om
bre des m
aioritês
silencieuses o
u
 Ia fin du so
cial.
6. Cf. janice CaiaÍa, 1992. Cf. tam
bém
 M
unú Sodré, 1990 p. 33. O
a
utor, a
o
 elaborar o
 co
n
ceito de 
,
,telenealidade,,, afirm
a que não
há re
e
ngendram
ento-absoluts-da vid.+soei+ì 
n
e
sseproeesso, 
mÍü,
u
m
 
"proieto hegem
ônico,, por parte dos 
,
,sim
ulacrás da so
cieda_
de pós-industrial,,.
t. Iï,"T"r*"la 
definição breve de 
',devjr,,,segundo aparece n
o
texto de D
eleuze 
e
 G
uattari. Trata-se de u
m
a
 cãm
unicação 
trans_
ve
rcal co
m
 u
m
 heterogêneo. N
o nivel,,m
olar,, 
a
 so
ciedade n
o
s
segm
enta bìnariam
ente, produzindo categorias identitárias (ho-
m
e
m
 x m
ulher, n
egro x branco etc.). Contudo, o
s fluxos de dese-
jo e
stão se
m
pre e
scapando dessas dicotom
ias n
u
m
 nÍvel
"m
olecular", Um
 hom
em
 pode se
r tom
ado por u
m
 
,
.devir_m
u-
lher" o
u
 u
m
 
"devir<riança,,, 
e
m
 que ele n
a
o
 e
 o
u
 im
ita, m
a
s se
I
-
_
*
.qryFj.

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