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85Editora Bernoulli MÓDULO A principal e mais original forma de manifestação de uma língua é a oralidade. A escrita, que surgiu apenas no século IV a.C., é uma forma de representar graficamente diversas sequências de sons, que falantes reconhecem como significantes, ou seja, a parte material, sonora de um signo linguístico. Segundo o linguista Ferdinand de Saussure, um signo linguístico é formado pela associação que se faz entre um significante e um significado, ou seja, um conceito que pode aludir a coisas, ações, qualidades, circunstâncias, etc. Observe: Signo linguístico = Significante Significado / ‘ahvorI / = No esquema, usa-se a transcrição fonética / ‘ahvorI /, e não a sua forma escrita “árvore”, porque um significante deve ser entendido como uma sequência de sons; a forma escrita “árvore”, por sua vez, é a representação gráfica dessa sequência sonora, feita segundo as normas de ortografia da língua portuguesa. É preciso observar, também, que a relação entre significante e significado em um signo linguístico não é motivada, e sim convencionada. Tanto é assim que um mesmo significado – como o conceito de “árvore” identificado no esquema – é associado a diferentes significantes, dependendo do idioma em que é expresso. Esses diferentes significantes serão representados na escrita também de modos distintos. Além disso, na grafia das palavras, ainda incidem outras variantes, como o tipo de alfabeto utilizado, certas regras fonológicas e normas de ortografia. Observe o quadro a seguir, que mostra como as palavras “árvore”, “casa” e “galinha” são representadas de modos distintos em diferentes idiomas. Significados Representação gráfica dos significantes em diferentes línguas Português Inglês Espanhol Francês Alemão Russo Árabe Chinês árvore tree árbol arbre Baum дерево 樹 casa house casa maison Haus дом 房子 galinha chicken gallina poulet Huhn цыпленок 小雞 As traduções do russo, do árabe e do chinês foram feitas a partir do Google Tradutor e são apenas ilustrativas. LÍNGUA PORTUGUESA FRENTE Acentuação e ortografia 01 C 86 Coleção Estudo Frente C Módulo 01 A escrita é uma forma de representação gráfica dos significantes e, tal como outras formas de representação, é não mais que uma convenção. Essa convenção é determinada por uma série de regras ortográficas – as quais se encontram listadas em gramáticas normativas. Neste módulo, serão relembradas algumas das regras para se representarem palavras na língua portuguesa. Não todas, porque isso seria exaustivo e pouco prático. Na verdade, serão retomadas as regras de acentuação e, no que diz respeito à ortografia, serão focadas algumas especificidades do português, como o uso do hífen e de algumas expressões. A ortografia de cada idioma possui suas especificidades e dificuldades. A partir do momento em que o falante aprende a ler e a escrever, vai se familiarizando cada vez mais com a forma como a língua oral é representada na escrita. Para que você domine cada vez melhor a ortografia, procure ler bastante e escrever também; sempre que errar, reveja seu erro, memorize a ortografia correta. ACENTUAÇÃO GRÁFICA Classificação das palavras quanto à posição da sílaba tônica Na língua portuguesa, a sílaba tônica pode aparecer em três posições diferentes; consequentemente, as palavras podem receber três classificações quanto a esse aspecto: • Oxítonas: são aquelas cuja sílaba tônica é a última: você, café, jiló, alguém, ninguém, ruim, carcará, vatapá, anzol, condor. • Paroxítonas: são aquelas cuja sílaba tônica é a penúltima: gente, planeta, homem, alto, âmbar, éter, dólar, pedra, caminho, amável, táxi, álbum. • Proparoxítonas: são aquelas cuja sílaba tônica é a antepenúltima: lágrima, trânsito, xícara, úmido, mágico, lâmpada, ótimo, médico, fanático. Nossa língua não contém palavras com acento na pré-antepenúltima sílaba, isto é, palavras bisesdrúxulas. Somente algumas formas verbais seguidas de pronome oblíquo são bisesdrúxulas: fazíamo-lo, amávamo-la, etc. Você observou que, nos exemplos dados para os três casos, só há palavras com mais de uma sílaba. As palavras de apenas uma sílaba são chamadas monossílabos. Quando tais palavras apresentam tonicidade, como nos casos de má, pó e fé, são consideradas monossílabos tônicos. Quando não apresentam tonicidade, como de, por, mas, são denominadas monossílabos átonos. As regras básicas Na língua portuguesa, temos as vogais a, e, i, o, u. Entre essas vogais, o i e o u são vogais tônicas, fortes, ou seja, tendem a tornar tônica a sílaba em que aparecem. Por exemplo, na palavra caqui, a simples presença do i na última sílaba torna a palavra uma oxítona, não sendo necessário o uso de um acento agudo para indicar a tonicidade. Por outro lado, em táxi, é necessária a utilização de um acento agudo na penúltima sílaba para que a palavra seja lida como paroxítona. Se não houvesse esse acento, os falantes tenderiam a ler a palavra como oxítona, tal como ocorre em caqui. Se se analisarem as palavras tatu e vírus, será possível observar que ocorre o mesmo em relação ao u. Saber disso é muito útil, pois ajuda a entender algumas regras básicas de acentuação das palavras oxítonas, paroxítonas e dos monossílabos. Observe, a seguir, como as regras são coerentes com o que foi descrito: A) Monossílabos tônicos: são acentuados os terminados em: – a, as: pá, vá, gás, Brás; – e, es: pé, fé, mês, três; – o, os: só, xô, nós, pós. Os monossílabos que contêm i ou u, como ti e tu, não precisam receber acento, pois já são tônicos. B) Oxítonas: são acentuadas as que terminam em: – a, as: Pará, vatapá, estás, irás; – e, es: você, café, Urupês, jacarés; – o, os: jiló, avô, retrós, supôs; – em, ens: alguém, armazéns, parabéns. As oxítonas terminadas em i e u, como tatu, aqui, Aracaju, Araguari, não precisam ser acentuadas, pois a presença dessas vogais na última sílaba de cada uma delas já torna a palavra uma oxítona. C) Paroxítonas: são acentuadas as que terminam em: – i, is: táxi, beribéri, lápis, grátis; – us, um, uns: vírus, bônus, álbum, parabélum (arma de fogo), álbuns, parabéluns. Caso essas palavras não recebessem acento, seriam lidas como oxítonas, dada a presença do i e do u na última sílaba. Leticia Realce Leticia Realce Acentuação e ortografia 87Editora Bernoulli LÍ N G U A P O R TU G U ES A Acentuam-se, ainda, as paroxítonas terminadas em: – l, n, r, x: incrível, útil, próton, elétron, éter, mártir, tórax, ônix; para guardar melhor essa regra, observe que l, n, r e x são as consoantes da palavra rouxinol. – ps: bíceps, fórceps. – ã, ãs, ão, ãos: ímã, órfã, ímãs, bênção, órgão, órfãos, sótãos. – ditongo oral, crescente ou decrescente, seguido ou não de “s”: água, árduo, pônei, vôlei, cáries, mágoas, pôneis, jóqueis. Para simplificar, pode-se dizer: “Acentuam-se todas as paroxítonas, exceto as terminadas em a, e, o, am e em, seguidos ou não de s”: palha, deixa, peixe, entre, caldo, desenvolvimento, falaram, vieram, vertigem, voltagem, etc. D) Proparoxítonas: são todas acentuadas: lâmpada, Júpiter, ótimo, flácido, relâmpago, trôpego, lúcido, etc. As regras especiais A) Hiatos: eis a regra de acentuação para os hiatos: • Quando a segunda vogal do hiato for i ou u, tônicos, acompanhados ou não de s, haverá acento: saída, proíbo, faísca, caíste, carnaúba, viúva, balaústre, país, aí, baú, Jaú. Se depois do “i” ou do “u” vier “nh”, o acento não ocorrerá. É o caso de rainha, moinho, unha, tainha, campainha. Também não haverá acento se a vogal “i” ou a vogal “u” se repetirem, o que ocorre em poucas palavras: vadiice, sucuuba, mandriice, xiita. B) Ditongos: a regra de acentuação para os ditongos é: • Ocorre acento na vogal tônica dos ditongos éu, éi e ói desde que sejam abertos e que se encontrem na última sílaba da palavra ou em monossílabos: céu, chapéu, réu, véu, troféu, anéis, aluguéis, coronéis, dói, constrói, destrói. C) Acento diferencial: • pôr (verbo)e por (preposição); • pôde (pretérito perfeito) e pode (presente do indicativo); • que (conjunção, pronome) e quê (substantivo ou pronome em fim de frase); • porque (conjunção) e porquê (substantivo). A Reforma Ortográfica e as mudanças nas regras de acentuação As regras apresentadas anteriormente já estão de acordo com a Reforma Ortográfica que entrou em vigor no ano de 2009. O que se percebe é que, embora os que já estão acostumados à língua possam estranhar as mudanças, a Reforma simplificou bastante a acentuação, extinguindo uma série de regras especiais. A primeira delas é a que obrigava o uso do acento circunflexo na primeira vogal dos grupos ee e oo. Dessa forma, em vez de se escrever crêem, dêem, lêem, vêem, descrêem, relêem, prevêem, revêem, côo, vôo, enjôo, magôo, abotôo, deve-se escrever: creem, deem, leem, veem, descreem, releem, preveem, reveem, coo, voo, enjoo, magoo, abotoo. Com a Reforma, também deixam de ser acentuados os ditongos ei e oi que estiverem na penúltima sílaba de palavras paroxítonas. A nova regra passa a ser coerente com a que vale para o ditongo eu, que, quando aparece nessa sílaba, como em feudo, terapeuta, hermeneuta, não é acentuado, apesar de ser tônico. A diferença, no caso do eu, é que, na penúltima sílaba, ele é sempre fechado, ao contrário de ei e oi, que podem ser abertos. Assim, palavras paroxítonas com esses dois ditongos na penúltima sílaba que, até 2008, eram obrigatoriamente acentuadas segundo a velha regra, como idéia, assembléia, paranóico, heróico, esferóide, passam a ser grafadas da seguinte forma: ideia, assembleia, paranoico, heroico, esferoide. Vale lembrar que, embora não sejam mais acentuados, os ditongos continuam tônicos, e as palavras, paroxítonas, ou seja, a pronúncia não é alterada. A Reforma também extingue regras especiais de acentuação para o u dos grupos gue, gui, que, qui, o qual, antes, dependendo do fato de ser ou não pronunciado e de sua tonicidade, era diferenciado, levando trema ou acento agudo. O trema deixa de existir e, junto com ele, o acento agudo que marcava a tonicidade do u. Assim, palavras em que o u é pronunciado e não é tônico e que, antes, levavam trema, como lingüiça, seqüestro, eqüino, agüentar, ungüento, tranqüilo, conseqüência, argüir, passam a ser grafadas da seguinte forma: linguiça, sequestro, equino, aguentar, unguento, tranquilo, consequência, arguir. Do mesmo modo, palavras em que o u é pronunciado e tônico e que, antes, eram acentuadas, como as raríssimas apazigúe, obliqúe, argúi, argúem, averigúe, averigúem, obliqúem (formas verbais apenas), passam a ser grafadas como a seguir: apazigue, oblique, argui, arguem, averigue, averiguem, obliquem. Leticia Realce Leticia Realce Leticia Realce Leticia Realce Leticia Realce Leticia Realce Leticia Realce Leticia Realce Leticia Realce 88 Coleção Estudo Frente C Módulo 01 Novamente, a pronúncia e a tonicidade das palavras não foram modificadas. Se um dia vão ser, o tempo e a vontade dos falantes de nossa língua decidirão. A Reforma Ortográfica extingue, ainda, uma regra especial de acentuação de hiatos: a que obrigava o uso de um acento agudo sobre o i e o u tônicos de hiatos antecedidos de ditongos. Portanto, palavras que contêm hiatos em i e u antecedidos de ditongos e que eram acentuadas, como baiúca, boiúna, cheiínho, saiínha, feiúra, feiúme, perdem o acento e passam a ser escritas assim: baiuca, boiuna, cheiinho, saiinha, feiura, feiume. A última mudança da Reforma nas regras de acentuação extingue o acento diferencial em palavras homógrafas, ou seja, aquelas que são grafadas da mesma forma. Por exemplo, não se distingue mais para (preposição) de para (forma verbal da 3.ª pessoa do presente do indicativo de “parar”); ou pelo (substantivo) de pelo (contração da preposição por com o artigo o). As únicas exceções são os pares por (preposição) / pôr (verbo) e pode (forma verbal da 3.ª pessoa do presente do indicativo de “poder”) / pôde (forma verbal da 3.ª pessoa do pretérito perfeito do indicativo de “poder”). Os acentos diferenciais que marcam as classes das palavras que, quê, porque e porquê também permanecem. ORTOGRAFIA Ortografia é o sistema correto de representar, na escrita, os fonemas e as formas da língua. Ele trata da representação escrita dos sons que formam os vocábulos, por meio dos símbolos denominados letras. Com a Reforma Ortográfica, foram incorporadas as letras “k”, “w” e “y” ao nosso alfabeto, que passa a ter 26 letras: a, b, c, d, e, f, g, h, i, j, k, l, m, n, o, p, q, r, s, t, u, v, w, x, y e z. Uso de K, W e Y Essas letras são usadas em siglas, símbolos, nomes próprios, palavras estrangeiras e seus derivados. Exemplos: km (quilômetro), K (potássio), Kr (criptônio), kg (quilograma), kw (quilowatt), kwh (quilowatt-hora), watt, kantismo, kepleriano, byroniano, taylorista, etc. RELAÇÕES ENTRE FORMA E SIGNIFICADO Há palavras cuja pronúncia e / ou grafia são idênticas, mas que possuem diferentes significados; do mesmo modo, em alguns casos, atribuímos um mesmo significado a termos distintos. Tendo isso em vista, as palavras podem ser: Sinônimas São palavras de sentido igual ou aproximado. Exemplos: – solilóquio e monólogo; – suposição e hipótese; – modelo e protótipo. Antônimas São palavras de significação oposta. Exemplos: – calmo e agitado; – extrovertido e introvertido; – defender e atacar. Homônimas São palavras que têm, às vezes, a mesma pronúncia e, às vezes, a mesma grafia, mas significação diferente. Nesse caso, é o contexto que determina a significação dos homônimos. Palavras homônimas podem ser: Homógrafas heterofônicas Iguais na escrita, mas diferentes na pronúncia. Exemplos: – colher (forma verbal) e colher (substantivo); – jogo (forma verbal) e jogo (substantivo). Homófonas heterográficas Iguais na pronúncia e diferentes na escrita. Exemplos: – ascender (subir) e acender (pôr fogo); – cela (prisão), sela (forma verbal). Homófonas homográficas Iguais na escrita e na pronúncia. Exemplos: – cedo (forma verbal) e cedo (advérbio); – manga (fruta) e manga (parte de uma blusa, paletó ou vestido). Parônimas Semelhantes na escrita e na pronúncia. Exemplos: – degredado (exilado) e degradado (estragado); – infligir (aplicar castigo) e infringir (transgredir). Leticia Realce