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OAB – SÃO PAULO 
COMISSÃO: DIREITO DO TERCEIRO SETOR 
 
TERCEIRO SETOR E AS TRANSFORMAÇÕES DO ESTADO – 
DRA. MARIA NAZARÉ LINS BARBOSA 
 
1. Introdução 
Nos últimos anos, a imprensa brasileira tem registrado uma recorrente associação entre “ONGs” e democracia, ora 
positivamente, ora negativamente. Assim, um editorial do jornal “O Estado de São Paulo” as qualificou de “inimigas da 
democracia” e vozes autorizadas já se levantaram para alertar contra a “dissolução democrática” promovida por 
determinadas ONGs[1]. Outros afirmam que o envolvimento político e a agenda dúbia acabarão por corroer o apoio que 
recebem[2]. Finalmente, outros associam positivamente ONGs e democracia: “as ONGs representam vários segmentos 
e são instrumentos de participação direta da população”[3]. 
O presente texto traz elementos para refletir sobre a relação entre as ONGs e a democracia no contexto brasileiro. 
Inicialmente, assinalamos em linhas gerais a fragilidade do nosso regime democrático, em função das limitações do 
modelo presidencialista e da fragmentação do nosso sistema partidário. A seguir, associamos ONGs e democracia, 
sugerindo como o terceiro setor pode contribuir para a consolidação do regime democrático. Para tanto, no caso 
brasileiro, apontamos como pré-condição distinguir “quem é quem” no universo do terceiro setor, pois muitos dos 
equívocos de análise partem dessa imprecisão. 
Na seqüência, consideramos aspectos do financiamento das ONGs pelo poder público, e suas implicações quanto às 
atividades políticas das ONGs. Feitos tais esclarecimentos, entendemos útil lançar uma base de diálogo entre as ONGs e 
o Estado pautada na transparência. A nosso ver, é possível e necessária uma conciliação entre as ONGs e o Estado, 
pois um terceiro setor fortalecido, vigoroso e independente é elemento útil para a consolidação do regime democrático. 
2. Instituições democráticas e governabilidade 
As instituições democráticas emergiram no bojo da tradição liberal. Há desde logo uma tensão inerente à aposta 
democrática: pressupõe a aceitação da desigualdade no plano econômico; e propõe igualdade no plano político. 
Coerentemente, a realização da democracia tem encontrado obstáculos práticos e teóricos, entre os quais as limitações 
dos sistemas de representação, o perigo de ingovernabilidade ou as dificuldades trazidas com a burocratização. 
Em regimes democráticos espera-se ampla possibilidade de representação dos diversos interesses (mediante partidos) 
e governabilidade, isto é: o governo deve conseguirimplementação daquelas políticas cuja formulação se deu em um 
processo aberto à participação e à contestação. Assim, os perigos que rondam os regimes democráticos são o 
isolamento na formulação das políticas ou a paralisia em sua execução. Os dois sistemas de governo adotados por 
Constituições liberais - presidencialista ou parlamentarista - procuram contorná-los, privilegiando, em maior ou menor 
grau, conforme o caso, a representatividade ou a governabilidade. Não se trata de eleger qual dessas formas seja a 
“melhor”; o fundamental é que as instituições sejam adequadas às condições em que se inserem. 
No modelo de presidencialismo adotado no Brasil, o chefe de governo, legitimado em eleições, deve negociar com o 
Legislativo as políticas a serem implementadas, posto que as coalizões eleitorais não implicam coalizões governativas. O 
sistema entre nós é pluripartidário, porém a fragilidade das regras de acesso à representação acarreta uma 
fragmentação excessiva. A aprovação de qualquer projeto político importante exige negociações contínuas e 
específicas. O processo não flui, criando condições favoráveis ao clientelismo. O quadro se agrava ainda mais com a 
lentidão da máquina burocrática, pois é da essência da ordem democrática que as decisões tomadas sejam 
implementadas. 
Ao longo do século XX o fenômeno da burocratização alcançou uma extensão sem precedentes, e o Brasil não foi alheio 
a este processo. O Estado foi chamado a formular e a implementar políticas em âmbitos cada vez mais extensos e 
diversos. Com a mudança nas relações entre o Estado e a sociedade, o aparato executivo e o contingente de burocratas 
cresceram vertiginosamente (apontando para uma nova relação entre os poderes). A extensão na máquina favoreceu o 
corporativismo e o descontrole, de modo a dificultar a implementação de políticas dependentes da ação concreta de 
inúmeros funcionários. A par disso, os conhecimentos cada vez mais especializados requeridos para as tomadas de 
decisões em novos âmbitos demandam a presença dos burocratas neste espaço, e nos levam a indagar sobre os efeitos 
de tal ação para a ordem democrática. Em suma, no cotidiano do Estado, hoje, os burocratas participam do processo 
decisório em espaços de contornos indefinidos. 
Paralelamente, cresce a desconfiança em relação ao Estado e aos políticos, e o terceiro setor emerge como novo ator 
na arena política. 
3. O terceiro setor e a democracia 
As ONGs têm crescido notavelmente nas três últimas décadas, constituindo o chamado "terceiro setor”. Trata-se - 
preliminarmente e de forma genérica - do espaço institucional das organizações privadas, sem fins lucrativos, voltadas 
para a produção de bens ou de serviços públicos. A expressão terceiro setor vem sendo utilizada em contraposição a 
um primeiro setor, identificado com o Estado, e a um segundo setor, referido à iniciativa privada e às atividades do 
mercado. 
Alguns associam o florescimento das ONGs ao declínio dos partidos políticos, temendo que elas ameacem o Estado de 
Direito e as instituições democráticas. Nessa linha de pensamento, as ONGs pretenderiam substituir os partidos políticos 
na apresentação de projetos de políticas públicas.[4] A democracia representativa seria a “partidocracia”, e 
conseqüentemente as ONGs seriam antidemocráticas. Carlos Estevam Martins, a propósito, chega a afirmar: 
“...os democratas mudaram de idéia. Convertidos em ex-democratas, abandonam os fundamentos do regime 
democrático: os valores (participação política) e as instituições (os partidos políticos, sua inserção nos processos 
decisórios, seus desdobramentos nas lutas ideológicas). Simultaneamente, o espaço da esfera pública que, por justiça, 
deve caber aos valores e as instituições típicas da democracia foi invadido e ocupado por valores e instituições 
absolutamente impróprios, essencialmente incapazes de assegurar o princípio da soberania popular (...) Todos nós , 
como cidadãos, somos vítimas dessa injustiça, mas nem sequer nos damos conta de que esse estado de coisas decorre, 
dentre outros fatores, do comportamento anti-ético dos meios de comunicação, das igrejas, dos sindicatos e das ONGs 
que se valem de recursos inerentes às suas respectivas esferas para invadir e colonizar o campo específico da 
política.”[5] 
Em suma, as ONGs são criticadas porque suas atividades não foram sancionadas por um processo democrático clássico; 
porque criticam ou se opõem às políticas de governos legitimados por este mesmo modelo clássico de democracia; e, 
ainda, porque gozam de privilégios fiscais (isenções, subsídios), impondo um custo ao Estado e à sociedade. 
Outros autores associam positivamente ONGs e democracia. Robert D. Putnam observa que o enfraquecimento das 
relações comunitárias repercute na fraqueza das instituições políticas. A queda do comparecimento às urnas, a 
alienação política e a crescente desconfiança em relação às instituições políticas é um fenômeno relacionado à 
desintegração dos laços sociais. Há evidências empíricas de que o “capital social” - cooperação voluntária, engajamento 
cívico manifestado em associação de moradores, clubes esportivos - influencia de modo incisivo a vida pública.[6] 
Tal constatação evoca a obra clássica de Tocqueville,descrevendo a Democracia na América: 
“Americanos de todas as idades, todas as posições sociais e todos os tipos de disposição estão sempre formando 
associações... Assim, o país mais democrático do mundo de hoje é aquele em que os homens levaram à mais alta 
perfeição de nosso tempo a arte de buscar em conjunto os objetos de desejos comuns.” 
A aguçada percepção de Tocqueville permitiu-lhe observar que na Europa, as idéias de liberdade não encontravam 
aquele conjunto de condições favoráveis existentes nos Estados Unidos da América. Na Europa, um passado histórico 
de instituições, crenças, costumes e opiniões constituiriam o que Tocqueville denominou de “estado social 
aristocrático”. Assim, concluiu que, com exceção da Inglaterra, a democracia na Europa corria o risco de não se 
consolidar sobretudo em função do Estado. 
Essas considerações nos parecem úteis para contextualizar a ação das ONGs na formulação e controle da execução de 
políticas públicas, mediante lobbies específicos, disseminação de informações ou denúncias. Elas não substituem os 
partidos, mas surgem como atores que canalizam interesses dos diversos segmentos da sociedade civil não 
suficientemente representados ou defendidos no âmbito dos partidos. Tem-se criticado muito, entre nós, a postura 
crítica das ONGs em relação às políticas governamentais. Porém, seu discurso político deve ser contextualizado no 
âmbito de um sistema que reconhece a liberdade de expressão dos cidadãos também no âmbito coletivo, como 
valorização de pluralismo, e no qual a representatividade dos partidos e a governabilidade sofrem os sérios 
condicionamentos apontados. 
As ONGs e a democracia no Brasil 
No Brasil, o florescimento das organizações da sociedade civil é paralelo ao ressurgimento do regime democrático, o 
que sugere uma associação positiva entre ONGs e democracia. Porém, sob a denominação “ONGs” encontra-se um 
contingente por demais heterogêneo, o que exige, entre nós, para melhor clarificar as relações entre ONGs e 
democracia distinguir “quem é quem” neste universo. 
4. Quem é quem no universo do terceiro setor 
O universo do chamado terceiro setor engloba entidades de formas e de fins muito diversos. O Banco Mundial, por 
exemplo, refere-se às ONGs para designar variadas organizações, algumas das quais estão constituídas formalmente e 
outras apenas de maneira informal, caracterizadas primordialmente por ter objetivos humanitários ou de cooperação, 
buscando geralmente aliviar o sofrimento, oferecer serviços sociais básicos, proteger o meio ambiente ou a defesa de 
direitos (“advocacy”). Nessa acepção, muitas entidades que compõem o setor sem fins lucrativos - tais como 
universidades privadas ou institutos de pesquisa - não seriam ONGs.[7] 
No Brasil, as entidades sem fins lucrativos revestem-se juridicamente da forma de associações ou fundações de direito 
privado. 
As associações sem fins lucrativos de caráter beneficente estão relacionadas com o apelo à caridade para socorrer os 
desvalidos: asilos, creches. No Brasil, mediante a obtenção de uma série de registros - utilidade pública, certificado de 
fins filantrópicos, - podem obter privilégios fiscais - imunidade e isenções diversas - e receber até mesmo subvenções 
oficiais. 
As fundações são pessoas jurídicas de direito privado, com patrimônio próprio, atividade altruística e fim não lucrativo, 
estando sujeitas à aprovação e fiscalização do Ministério Público, também podendo se habilitar ao gozo de benefícios 
fiscais. 
Mas, entre nós, clubes, hospitais, escolas e universidades privadas podem se revestir da forma de associações ou 
fundações sem fins de lucro. Em alguns casos, atendem um público majoritariamente de elite. No entanto – com 
amparo na Constituição de 1988- usufruem da isenção (ou imunidade) às contribuições para a seguridade social, em 
muitos casos sem contrapartida equivalente. Embora a fiscalização tenha sido incrementada nos últimos anos, 
permanece a dúvida quando à justiça do benefício. Na verdade, a renúncia fiscal – neste como em outros aspectos - 
recebe críticas reiteradas, seja em função da insuficiência de critérios para a concessão de benefícios, seja pela falta de 
controle. A “CPI do Orçamento”, há cerca de dez anos, revelou como subvenções oficiais podem ser permeadas de 
condições de favoritismo, evidenciando casos em que a “pilantropia” foi mais favorecida pelo Governo do que a 
filantropia. 
A desorientação em relação ao assunto induz a equívocos freqüentes, com soluções inadequadas e até contraditórias. O 
alcance e a extensão do fenômeno sugere a necessidade de que a legislação melhor contemple as especificidades de 
fins e formas associativas que persigam fins úteis à coletividade, e incentive as mesmas. 
Uma primeira distinção 
No universo formal das entidades sem fins lucrativos, no Brasil, não se distinguiam – até recentemente - entidades de 
fim público de organizações de benefício mútuo. A distinção é relevante para estabelecer critérios de gradação de 
incentivos fiscais. 
Organizações de benefício mútuo, são instituições que não perseguem fins de lucro, mas têm como objetivo a defesa 
ou promoção de interesse de seus membros ou instituidores. Anna Cynthia Oliveira as exemplifica entre aquelas cuja 
atuação se confunde com o interesse de um partido político ou de movimentos religiosos, as sociedades e associações 
de produtores, fornecedores, segmentos da agricultura, indústria ou de serviços, variados grupos de auto-ajuda, 
associação de moradores, de mutuários do SFH, inquilinos, grêmios literários ou culturais, clubes esportivos ou 
recreativos, federações e associações diversas, de caráter representativo de qualquer segmento da sociedade civil - 
inclusive de fundações ou de ONGs -, pois as entidades representativas atuam, em princípio, na defesa de seus 
interesses.[8] 
Organizações de fim público também não perseguem lucro, mas se distinguem porque beneficiam largo espectro da 
população, dedicam recursos e energias ao atendimento direto de necessidades ou à defesa de direitos de segmentos 
politicamente débeis ou marginalizados. Beneficiam populações-meta que estão além da própria instituição, 
perseguindo fins públicos ou interesses sociais difusos. Como anota a autora mencionada, não basta que os estatutos 
da associação ou da fundação estabeleçam fim público como missão para que se alcance este caráter. As atividades 
efetivamente desempenhadas devem tornar possível sua comprovação. 
Essa distinção consta do Manual de Práticas Construtivas em Matéria de Regime Legal aplicável às ONGs elaborado pelo 
Banco Mundial, e é importante para melhor delimitar a relação financeira entre as ONGs e o Estado. No Brasil, a Lei nº 
9.790/99 introduziu a distinção, para efeito de qualificação de uma entidade como Organização da Sociedade Civil de 
Interesse Público-OSCIP[9]. 
5. Financiamento pelo poder público e atividades políticas das ONGs no Brasil 
No Brasil consta que o custo da fiscalização do segmento seria maior do que a arrecadação. Apenas recentemente – em 
importante estudo conduzido pelo IBGE com o apoio de entidades como o GIFE e a ABONG – houve a divulgação de 
dados elementares, como por exemplo, nº de entidades cadastradas no CNPJ em tal ou qual categoria. No entanto, não 
sabemos quantas, por categoria, gozam de imunidade; quantas declarações de imposto de renda encontram-se em 
atrasos significativos; quais os volumes globais de receita e despesa em cada categoria. Assim, este é um primeiro 
tópico a ser enfrentado para esclarecer a relação financeira entre as ONGs e o Estado. 
Atividade política das ONGs 
A atividade política das ONGs situa-se fora dos partidos. A matéria tem sido objeto de análise cuidadosa em diversos 
contextos. Neste tópicos, resumimos consideraçõesapresentadas por Anna Cynhthia Oliveira no estudo mencionado, 
pois nos parece uma pauta útil para reflexão. 
Nos países de tradição anglo-saxônica, há restrições às atividades políticas das ONGs de fim público. O apoio financeiro 
do Estado impede que as organizações beneficiadas apóiem candidato a cargo político ou algum partido político. No 
entanto, atividades políticas de caráter educativo são admitidas, desde que observem certas condições: devem 
concorrer para a consecução dos objetivos da entidade, divulgando informação comprovada e a opinião de 
especialistas, consistindo de iniciativa claramente destinada a capacitar o público e as autoridades governamentais para 
que compreendam e discirnam, com melhor juízo, sobre determinados assuntos. No Canadá, as infrações são punidas 
drasticamente com a perda de incentivos. 
Nos Estados Unidos, desde 1954 as ONGs que recebem privilégios fiscais são proibidas de participar de campanha 
política para o preenchimento de cargos públicos. A proibição justifica-se pela tese da “neutralidade”, a saber: o 
contribuinte do imposto não deve ser compelido a subsidiar, direta ou indiretamente, a ação política de grupos ou 
correntes com as quais não concorda. 
No Brasil, a questão deve ser ponderada tendo em conta as circunstâncias políticas peculiares. Como assinala a autora, 
trata-se de verificar a conveniência de disciplinar a ação das ONGs na arena política . 
Cabe indagar se seria razoável no Brasil impor às ONGs que têm acesso a fundos públicos restrições análogas àquelas 
vigentes no Canadá ou nos EUA. Nessa ótica, a proteção estatal compromete a imparcialidade. Porém, no Brasil, sabe-
se que o Estado controla a contribuição obrigatória a sindicatos, federações e confederações como SESI, SENAC, SESC, 
SEBRAE. Seria contraditório reconhecer a representantes dessas entidades capacidade de participação política que se 
queira negar às ONGs. 
Por outro lado, as carências sociais são tamanhas que poderia ser contraproducente impor restrições ao exercício de 
papel importante desempenhado pelas ONGs que se ocupam de ações educativas baseadas na disseminação de 
informações. 
No Brasil, ressaltamos que a possibilidade de doações de parlamentares, a fundo perdido, no orçamento, beneficiando 
entidades de fachada, ainda repercute negativamente e prejudica a imagem do terceiro setor como um todo. Por isso, 
na agenda do debate, deve-se tender à extinção de tal tipo de subvenção. Paralelamente, admitimos que seja útil, 
também entre nós, a vedação de engajamento de ONGs beneficiadas com recursos públicos em campanhas eleitorais. 
6. As ONGs e as Políticas Públicas 
Nos âmbitos de formulação e controle situam-se tópicos importantes da agenda, como a definição da atuação política 
das ONGs fora dos partidos e a transparência e accountability necessários no acesso a fundos públicos. 
Mas, além do papel de crítica e denúncia, cumpre reconhecer o papel político - não partidário - que as ONGs 
desempenham e podem desempenhar construtivamente no Brasil complementando ou executando políticas públicas, 
em especial nos âmbitos de assistência e educação. Este reconhecimento porém requer esclarecimentos e também 
passa por ajustes de ordem jurídico-fiscal. 
O papel das ONGs em atividades de interesse público pode ser reforçado pelo Estado mediante política fiscal de 
incentivos fiscais - isenções, imunidades – concedidos, porém de modo criterioso. Por outro lado, há interesses que 
apenas o Estado pode prover, e deve ser reconhecida a limitação do espaço de atuação das ONGs. 
No âmbito da complementaridade a relação entre o Estado e as ONGs revela-se mais promissora. O Estado pode 
disseminar parcerias com as ONGs financiando projetos específicos, mediante concurso ou licitação entre ONGs, 
segundo critérios preestabelecidos, que incluem qualidade do atendimento e prestação de contas. 
Mas, para tanto, será necessário lançar bases para o diálogo, reconhecendo, por uma lado, o papel desse novo ator e 
exigindo controle e responsabilidade em sua atuação. 
As bases para o diálogo 
No Brasil, o número de pessoas ocupadas no terceiro setor cresceu cerca de 30% entre 1991 e 1995, percentual muito 
superior à evolução de 2% do total de empregos no país no mesmo período. Estima-se que o terceiro setor envolva já 
1,5 milhão de assalariados, cerca do triplo de servidores federais na ativa. O número de entidades também tem 
crescido. Em 1991 havia cerca de 200 mil entidades registradas como sem fins lucrativos na Secretaria da Receita 
Federal[10] . Estudo recente aponta em 2002 cerca de 275 mil[11]. 
Tais números manifestam a crescente importância das ONGs. De fato, o Governo tem manifestado atenção para o 
assunto. Em seu momento, o Conselho da Comunidade Solidária realizou rodadas de interlocução política sobre o 
“Marco Legal” das ONGs reunindo entidades representativas de ONGs e de fundações filantrópicas. A lei 9.608/98 (que 
regulamentou o trabalho voluntário) e a lei nº 9.790/99 (a lei das OSCIPs) são frutos desse esforço. No entanto, são 
ainda necessários ajustes jurídicos e fiscais aptos a estabelecer uma base de transparência nas relações entre as ONGs 
e o Estado. 
Como aspectos práticos, no âmbito da Secretaria da Receita Federal, conviria ampliar e aprimorar a divulgação dos 
dados que permitam uma aproximação mais informada sobre a extensão e a identidade do terceiro setor. 
No âmbito do Congresso, seria preciso suprir lacunas da legislação, sendo oportuno rever o incentivo às doações de 
pessoas físicas e jurídicas às ONGs, a fim de favorecer esse importante mecanismo de estímulo ao segmento. 
Finalmente, como condição preliminar para maior transparência, seria útil a simplificação dos procedimentos vigentes 
para gozo de determinados benefícios. Hoje, por exemplo, a multiplicidade de normas nas três esferas de governo 
(utilidade pública federal, estadual em municipal, sem que o certificado em uma instância repercuta nas demais) impõe 
às entidades um sensível ônus burocrático e administrativo, que prejudica a realização de suas atividades-fim. As 
organizações de pequeno porte provavelmente não cumprem todas as normas que lhe são aplicáveis, o que as torna 
vulneráveis em suas relações jurídicas, e as condiciona a comportamentos defensivos e poucos transparentes.[12] 
7. Conclusão 
O papel que as ONGs podem e devem desempenhar construtivamente no fortalecimento do regime democrático não se 
confunde com o papel dos partidos políticos. 
Para tornar mais claro este aspecto, impõem-se em outros países restrições às atividades políticas das ONGs 
financiadas pelo poder público. No Brasil, parece prematuro uma regulamentação estrita neste particular, embora seja 
desejável, desde logo, a proibição do engajamento de entidades beneficiadas com recursos públicos em campanhas 
eleitorais. Esta vedação inibiria distorções como as verificadas pela “CPI do Orçamento”, que abalam a confiança 
pública em relação ao terceiro setor como um todo. 
Contudo, é necessário, principalmente, estabelecer uma gradação clara de incentivos entre entidades sem fins 
lucrativos de fim público - que complementam a ação do Estado - de outras que beneficiam principalmente seus 
próprios membros ou instituidores. É preciso, pois, distinguir os desiguais no universo do terceiro setor, sob o enfoque-
jurídico e fiscal. A nosso ver, trata-se de uma pré-condição para delimitar outras restrições às atividades políticas das 
ONGs. 
Sob normas claras de identidade e de acesso a fundos públicos, o terceiro setor será um parceiro ainda mais promissor 
na implementação de políticas públicas. O incentivo às ONGs - com sua variada gama de valores e interesses dos 
diversos segmentos da sociedade civil - poderá contribuir significativamente para ofortalecimento das instituições 
democráticas no Brasil. 
 
 
 
* Maria Nazaré Lins Barbosa é advogada formada pela USP, onde fez aperfeiçoamento em Direito Econômico e 
Tributário, Mestre e Doutoranda em Administração Pública e Governo pela FGV. Professora de Direito do Terceiro Setor 
na EDESP/FGV. Membro da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB/SP. 
[1] Reale, Miguel “Dissolução democrática”, O Estado de São Paulo, 04-04-95, pg 2 
[2] Goldemberg, José “O futuro das ONGs, “O Estado de São Paulo”, 05.11.96. pg.2 
[3] Bicudo, Hélio, “As ONGs e a democracia”, Folha de São Paulo, 16.01.95 
[4] Reale, Miguel “Dissolução democrática”, O Estado de São Paulo, 04-04-95, pg.2 
[5] Martins, Carlos Estevam. “Da globalização da economia à falência da democracia”, 1996 (mimeo) 
[6] Putnam, Robert D “Capital social e democracia”. Braudel Papers nº 10, 1995 
[7] Banco Mundial. Manual de prácticas constructivas en materia del régimen legal aplicable o las 
organizaciones no gubernamentales. Borrador para discusión. 1997. Endereço eletrônico: 
http://www.vita.org/techenet/ong 
[8] Oliveira, Anna Cynthia. “Construindo um Marco Regulatório para a Consolidação do Setor Privado não Lucrativo e de 
Fins Públicos no Brasil” - Estudo para o Conselho Comunidade Solidária, novembro de 1996 (mimeo) 
[9] Para uma breve análise sobre a qualificação de OSCIP remetemos o leitor a nosso artigo “OSCIP: avanços e 
perspectivas”, disponível na Revista Eletrônica Integração, da FGV (www.fgvsp/publicações). 
[10] Gazeta Mercantil, 14.10.97 “Terceiro setor já é maior que o governo” 
[11] As Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos no Brasil, Estudos & Pesquisas, 2002, IBGE, IPEA, GIFE 
e ABONG, disponível em www.abong.org.br 
[12] Braga, Gustavo L. et alli .” Legislacion vigente para el sector privado e sin fines lucrativos en Brasil”, in “Marco 
regulador de las organizaciones de la Sociedad Civil en Sudamerica” Anna Cynthia Oliveira Ed., 1ª ed., 1997

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