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Noções Gerais Sobre Ciência Forense

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Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
 
MEDICINA LEGAL - 2003/2004 
NOÇÕES GERAIS SOBRE 
OUTRAS CIÊNCIAS FORENSES 
1. Toxicologia Forense 
 
2. Genética e Biologia Forense e Criminalística 
 
3. Psiquiatria e Psicologia Forense 
 
4. Antropologia e Odontologia Forense 
 
5. Perícias em caso de responsabilidade médica 
 
 
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Medicina Legal / Noções Gerais sobre outras ciências forenses 
 
 
 
1 
TOXICOLOGIA FORENSE 
 
 
Rui Rangel 
 
 
a) INTRODUÇÃO 
 
Toxicologia representa a ciência cujo principal objectivo é a identificação e quantificação dos 
efeitos adversos associados com a exposição a determinados agentes. Esses agentes, que 
assumem a designação de tóxicos, são normalmente substâncias químicas de origem inorgânica 
ou orgânica, às quais, em sentido mais lato, se podem associar certos agentes físicos ou outras 
condições. A toxicologia compreende o estudo dos tóxicos e das intoxicações, de modo a 
estabelecer os limites de segurança com que os meios biológicos podem interagir com os tóxicos. 
Considera-se a toxicologia moderna constituída por quatro disciplinas principais: clínica, forense, 
reguladora e de investigação. Em função da área de actividade adoptam-se as seguintes sub-
divisões: Ecotoxicologia, Toxicologia Alimentar, Toxicologia Clínica, Toxicologia Experimental, 
Toxicologia Forense, Toxicologia Industrial, Toxicologia dos Medicamentos, Toxicologia 
Ocupacional e Toxicologia Regulamentadora. 
A definição do conceito de tóxico é muito difícil, uma vez que qualquer substância, mesmo 
aquelas que fazem parte essencial dos organismos vivos, pode ser lesiva ou produzir transtornos 
no equilíbrio biológico. Nesta medida, todas as substâncias seriam tóxicas, incluindo aquelas que 
à partida, são habitualmente assumidas como alimentos ou medicamentos. 
São vários os critérios pelos quais os tóxicos podem ser classificados. Para melhor 
sistematização, em toxicologia analítica classificam-se os tóxicos de acordo com os métodos 
extractivos adequados ao isolamento do analito. Assim consideram-se sete grupos de tóxicos, a 
saber: gases; substâncias voláteis; substâncias orgânicas termolábeis; metais ou metalóides; 
pesticidas; aniões; outras substâncias mais específicas. 
A toxicologia forense insere-se no âmbito da toxicologia analítica tendo, por conseguinte, como 
principal objectivo a detecção e quantificação de substâncias tóxicas. Contudo, a actividade do 
toxicologista forense aplica-se a situações com questões judiciais subjacentes para as quais 
importa reconhecer, identificar e quantificar o risco relativo da exposição humana a agentes 
tóxicos. Como tal aproveita conhecimentos alcançados em praticamente todas as áreas da 
toxicologia moderna. 
Até ao século XX, a toxicologia forense limitava-se a estabelecer a origem tóxica de um 
determinado crime; o “toxicologista” actuava directamente no cadáver com a mera intenção da 
pesquisa e identificação do tóxico. Actualmente o campo de acção desta ciência é mais vasto, 
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Medicina Legal / Toxicologia Forense 
 
 
 
estendendo-se desde as perícias no vivo e no cadáver até circunstâncias de saúde pública, tais 
como aspectos da investigação a nível da actividade laboral ou do meio ambiente. 
No caso das pessoas vivas estes exames têm sobretudo a ver com perícias toxicológicas para 
rastreio e confirmação de drogas de abuso no âmbito dos exames periciais ou médicos para 
caracterização do estado de toxicodependência (Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01) e com o regime 
legal da fiscalização do uso de substâncias psicoactivas nos utilizadores da via pública (Decreto-
Lei nº 265-A/2001, de 28/09; Decreto-Lei nº 2/98, de 3/01; Decreto Reg. nº 24/98, de 30/10; 
Portaria nº 1006/98, de 30/11). Neste último caso a participação do INML compreende, além dos 
procedimentos para garantia de cadeia de custódia de produtos e amostras, os exames de 
quantificação de álcool etílico no sangue, e o rastreio e confirmação da presença das substâncias 
legalmente consideradas estupefacientes e psicotrópicas na urina e no sangue, respectivamente. 
Os exames no vivo têm como objectivo a avaliação da intoxicação como circunstância 
qualificadora de delito, como causa de perigosidade ou de inimputabilidade. 
Em caso de morte por intoxicação que se enquadra no âmbito da morte violenta, existe 
obrigatoriedade de, nesta suspeita, se proceder à autópsia médico-legal (Decreto-Lei nº 96/01, de 
26/03), e consequentemente, em geral, à requisição de perícia toxicológica. 
As intoxicações podem ser criminais, legais (pena de morte), acidentais (alimentares, mordedura 
de animais, absorção acidental, medicamentosas) ou voluntárias (lesões auto infligidas, 
toxicodependência, terapêutica). 
Distinguem-se três formas de intoxicação segundo a velocidade de desencadeamento de acções 
ou dos efeitos tóxicos: intoxicação aguda, sub-aguda e crónica. 
Os tóxicos podem actuar sobre a célula produzindo uma destruição global da mesma por 
processos de necrose, ou sobre o sistema enzimático ou partes selectivas da célula (membranas, 
estruturas endocelulares ou organelos celulares). As principais reacções adversas produzidas 
pelos tóxicos a nível do sistema enzimático evidenciam-se através da inibição irreversível (ex: 
insecticidas organofosforados orgânicos) ou reversível (ex: carbamatos) de certos complexos 
enzimáticos. 
Na interpretação dos resultados analíticos devem ser considerados factores como a dose e via de 
administração; produtos de “corte” consumidos (impurezas ou adulterantes); efeitos aditivos, 
antagonismo ou sinergismo devido a associação com outras substâncias; estados patológicos 
existentes; idiossincrasias. 
A resposta do organismo a um determinado tóxico depende, para além dos factores do 
“hospedeiro”, da sua concentração no orgão alvo (orgão mais acessível ou mais sensível aos 
efeitos após exposição) e do seu mecanismo de acção. Há portanto que determinar a relação 
entre exposição, dose e resposta. Como tal, é importante conhecer a cinética das substâncias no 
organismo. Os principais fases em toxicocinética são absorção, distribuição, metabolização e 
eliminação. 
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Cada um destes passos pode influenciar a extensão da toxicidade produzida pelo agente tóxico, 
pelo que uma avaliação do ponto de vista da toxicocinética pode ser importante na apreciação dos 
dados analíticos obtidos. Em toxicologia, o processo de metabolização (ou biotransformação) 
assume especial interesse, dado que os tóxicos são geralmente agentes xenobióticos, portanto 
particularmente susceptíveis a sofrer alterações metabólicas no organismo, o que pode resultar na 
produção de novas substâncias designadas por metabolitos. Como factores do hospedeiro que 
afectam muitas das respostas a diversos tipos de agentes tóxicos podemos considerar as 
determinantes genéticas, idade, género, e outros tais como dieta ou coexistência de doença 
infecciosa. Estes factores podem afectar a exposição e a dose, através de alterações na 
absorção, distribuição ou metabolismo. A variabilidade nas populações humanas e no indivíduo 
deve ser considerada na avaliação de riscos da exposição a tóxicos e na ponderação de testes e 
estudos de investigação toxicológica em organismos não humanos. 
As diferentes intoxicações humanas apresentam geralmente um quadro sintomatológico 
comum, que por isso associa um conjunto de sintomas tóxicos inespecíficos. Os sintomas mais 
frequentes e de pior prognóstico para a recuperação do intoxicado são os seguintes: comas, 
síndromas hepatotóxicos,nefrotóxicos, cardiovasculares, respiratórios e hematológicos, 
neuropatias periféricas de origem tóxica e síndromes dermatológicos. 
Em toxicologia analítica, a investigação toxicológica é o conjunto de processos analíticos que 
têm por objectivo o reconhecimento, identificação e quantificação dos tóxicos para diagnóstico de 
intoxicação e esclarecimento dos factos. 
Em toxicologia forense executam-se perícias toxicológicas que implicam investigação 
toxicológica humana no vivo ou no cadáver, baseada em procedimentos de garantia de qualidade 
e de cadeia de custódia, com o objectivo do esclarecimento de questões de âmbito judicial 
supostamente relacionadas com intoxicações. 
Existe uma grande variedade de amostras que podem ser analisadas em toxicologia forense, tais 
como órgãos colhidos na autópsia, fluídos biológicos obtidos do cadáver ou do vivo, e produtos 
orgânicos e inorgânicos suspeitos (líquidos, sólidos, vegetais, etc.). Conforme a especificidade do 
caso e o tipo de análise pretendida, procede-se à selecção e colheita da amostra ou das amostras 
mais adequadas. A estas não pode ser adicionado qualquer preservante ou conservante, devendo 
o seu acondicionamento e remessa obedecer a critérios de garantia da cadeia de custódia, 
passos fundamentais à preservação da prova e correcta realização da perícia. Assim, na 
conservação das amostras deve ser eliminado todo e qualquer factor de contaminação, 
nomeadamente para o seu acondicionamento deve-se atender às condições de luz, humidade e 
calor - fontes prováveis de reacções de oxidação ou hidrólise que podem acelerar a 
decomposição dos produtos. 
O exame toxicológico deve ser capaz de detectar qualquer substância química exógena 
(xenobiótico) presente no material objecto da perícia. O facto de existirem um elevado número de 
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substâncias tóxicas constitui uma limitação importante na realização destas perícias, pelo que a 
maior parte dos laboratórios dirigem a sua investigação na procura daqueles que, segundo a 
casuística da respectiva área de actividade, estão implicados na maior parte dos casos. Para a 
selecção dos tóxicos a pesquisar é fundamental a informação sobre o evento (policial, clínico, 
familiar) e a descrição dos achados da autópsia, uma vez que cada caso tem as suas próprias 
particularidades. 
As metodologias de investigação passam por uma série de fases: rastreio, confirmação, 
quantificação e interpretação. Iniciam-se por um teste geral (que detecta um grande número de 
substâncias, permitindo fazer uma triagem de casos negativos) e, só numa fase posterior se 
recorre aos métodos de confirmação (que permitem confirmar a presença de substância suspeita, 
bem como identificá-la e/ou quantificá-la). 
As técnicas de análise toxicológica variam desde os clássicos métodos não instrumentais, tais 
como reacções volumétricas ou colorimétricas, até outros mais sofisticados para os quais se 
recorre a tecnologia apropriada, simples ou acoplada, como as técnicas espectrofotométricas (ex: 
espectofotometria de absorção molecular - UV-Vis, de infra-vermelhos - IR ou de absorção 
atómica - AAS), cromatográficas (ex: cromatografia gasosa – GC e cromatografia líquida - HPLC), 
imunoquímicas (ex: Elisa, imunoensaios com fluorescência polarizada – FPIA ou 
radioimunoensaio - RIA), e de espectrometria de massas - MS. 
O resultado destas perícias apresenta-se na forma de relatório onde devem constar, para além 
duma eventual interpretação dos resultados, os seguintes dados: identificação do processo e da 
entidade requisitante, método analítico utilizado e referências à técnica de isolamento utilizada, 
datas de recepção de amostras e de conclusão dos exames, amostras analisadas, especialista 
responsável pela execução das análises, níveis de detecção e de quantificação, estado das 
amostras analisadas, e outros que possam ser considerados relevantes para elaboração de 
conclusões. 
Geralmente, o relatório de perícia toxicológica é enviado ao perito médico que requisitou a perícia, 
sendo posteriormente remetido à entidade requisitante isoladamente ou em conjunto com o 
relatório de autópsia ou de clínica médico-legal. 
O “álcool” e as “drogas de abuso” são as substâncias que, na actualidade, fazem parte da 
maioria das requisições de exames toxicológicos. 
O consumo de bebidas alcoólicas pode ocasionar intoxicação acidental ou voluntária, ou mesmo 
profissional, sendo o agente tóxico responsável o álcool etílico (ou etanol). 
A intoxicação pode resultar da ingestão de bebidas alcoólicas em quantidade variável, de forma 
esporádica ou habitual, podendo dar origem a intoxicações agudas no primeiro caso ou crónicas 
no segundo. 
As intoxicações agudas apresentam formas leves (embriaguez), que pode ter elevado interesse 
médico-legal, pela sua influência na condução rodoviária, pelo seu importante efeito criminogéneo 
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e por várias outras questões de ordem legal que se podem colocar como, por exemplo, questões 
de responsabilidade penal. As formas graves desta intoxicação são esporádicas, podendo em 
alguns casos ser causa de morte. Nestes casos, em virtude dos sintomas, é por vezes difícil o 
diagnóstico diferencial com situações de traumatismo craniano. 
As intoxicações crónicas têm consequências importantes, por exemplo a nível clínico originando 
gastrites, dispepsia, miocardites ou cirroses, e em termos psiquiátricos levando a quadros 
patológicos como delirium tremens, alucinações ou demências. 
Consideram-se como “drogas de abuso” todas as substâncias químicas de origem diversa que 
apresentam a característica comum de serem substâncias psicoactivas, cujo consumo ilícito se 
processa de modo, mais ou menos, compulsivo. As “drogas de abuso” mais comuns inserem-se 
nos seguintes grupos de substâncias: opiáceos, cocaína, canabinóides, anfetaminas e outros 
produtos naturais ou de síntese laboratorial análogos a psicofármacos ou com efeito 
alucinogénico. Como se verifica face aos grupos enunciados, não se trata de um grupo 
homogéneo, pelo que implica uma classificação mista de modo a atender às características 
químicas, mecanismo de acção ou efeitos produzidos no organismo. 
No vivo, os estudos relacionados com “drogas de abuso” são feitos essencialmente para 
avaliação do estado de toxicodependência e em casos de condução sobre influência destas 
drogas. 
Nas situações de morte associada ao consumo de drogas, esta pode surgir por sobredosagem 
(overdose simples ou por associação de agentes potenciadores), ou por outras circunstâncias 
associadas ao consumo, como uma reacção anafilática à droga ou aos produtos de corte, 
doenças infecciosas (SIDA ou hepatite) ou outras complicações (acidentes, suicídio, homicídio, 
morte súbita, pneumonia, etc.). 
 
b) A AUTÓPSIA EM CASOS DE SUSPEITA DE INTOXICAÇÃO 
 
A autópsia em casos de suspeita de intoxicação pode ocorrer em dois tipos de situações distintas: 
1) autópsia imediata - morte recente (cadáver não inumado) 
2) autópsia tardia - morte há muito tempo (cadáver inumado) 
No caso de se tratar de uma autópsia imediata os procedimentos são semelhante às autópsias 
realizadas por outros motivos, excepto no que diz respeito à colheita de amostras (órgãos ou 
fluídos biológicos) para posterior exame toxicológico. 
- Convém, no entanto, relembrar que contrariamente à ideia generalizada de que nestes 
casos é só colher e enviar amostras para exame toxicológico, este tipo de autópsia implica uma 
atenção especial a todo um conjunto de elementos tão ou mais importantes quanto o resultadodo 
exame toxicológico. Esses elementos a ter em consideração vão desde o exame do local, à 
informação respeitante às circunstâncias que rodearam a morte, ao exame do hábito externo e do 
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hábito interno, ao resultado de outros exames complementares de diagnóstico que não os 
toxicológicos, por forma a ser possível estabelecer um diagnóstico diferencial. 
 
a) Exame do local em casos de suspeita de morte por intoxicação 
Nos casos de suspeita de morte por intoxicação, quem procede ao exame do local deve ter 
especial atenção à existência de: 
- restos de vómito 
- na vítima (corpo, roupa suja de vómito) 
- no local onde foi encontrada 
- cheiro ou odores no local (intoxicação por gases, fumos, etc.) 
- torneira do gás aberta / fechada 
- exaustão dos gases de combustão 
- presença de braseira ou qualquer outra fonte produtora de monóxido de carbono 
- janelas e portas abertas / fechadas 
- existência de dispositivos para recolher gases de combustão de motores (ex. mangueira 
ligada ao cano de escape) 
- presença de outros elementos indiciadores de morte por intoxicação 
- seringas/agulhas, algodão, limão 
- tampas de garrafas 
- colheres 
- “pratas” 
- “cachimbos” 
- embalagens de medicamentos 
- frascos ou contentores de tóxicos (pesticidas, outros produtos químicos) 
 
b) Informação em casos de suspeita de morte por intoxicação 
O perito médico antes de iniciar uma autópsia com suspeita de intoxicação deve dispor de toda a 
informação social colhida junto de familiares e/ou amigos ou vizinhos da vítima. 
Deve haver, sempre que possível, informação sobre: 
- fármacos habituais? quais? quantidades? desde quando? 
- consumo de drogas? tipo? vias? desde quando? 
- antecedentes patológicos (doença psiquiátrica) 
- tentativas de suicídio anteriores 
- método? quando? quantas vezes? 
- ideação suicida 
- carta ou bilhete de despedida 
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No caso de ter havido sobrevida com passagem e tratamento hospitalar não poderá o cadáver ser 
enviado para autópsia médico-legal sem os respectivos registos clínicos onde conste claramente: 
- tóxico suspeito/respectiva pesquisa e/ou doseamento pela toxicologia clínica 
- sobrevida (data e hora de entrada e da verificação de óbito) 
- a evolução clínica 
- sintomas apresentados 
- tratamentos efectuados 
- lavagem gástrica 
- administração de antídotos 
 
c) Aspectos relevantes no exame do hábito externo e interno em casos de suspeita de 
morte por intoxicação 
As substâncias tóxicas podem actuar sobre o corpo humano provocando lesões por acção local 
(ex. tóxicos caústicos e tóxicos irritantes) ou por acção sistémica. No caso das lesões por acção 
sistémica, esta pode manifestar-se sob a forma de acção tóxica directa ou indirecta. 
Conforme se trate de lesão por acção local ou sistémica do tóxico podemos ter aspectos lesionais 
macro e microscópicos completamente diferentes. 
Os aspectos lesionais que podem ser objectivados durante uma autópsia por suspeita de 
intoxicação, muitas vezes são inespecíficos e não permitem ao perito médico retirar conclusões 
definitivas sobre o tipo de substância(s) responsávei(s) por determinada morte. 
Muitas vezes os aspectos lesionais macro e microscópicos são meramente indicativos de 
determinado tipo de intoxicação e carecem de confirmação toxicológica. 
 
1) Lesões por acção local ( ex. tóxicos cáusticos) 
a) Ingestão - via mais frequentemente utilizada para intoxicação por cáusticos. O perito 
em tanatologia pode encontrar: 
- lesões cáusticas na boca, esófago e estômago 
- ácido sulfúrico – negras 
- ácido nítrico – amareladas 
- perfuração gástrica 
- conteúdo estomacal na cavidade peritoneal, derramando-se o cáustico pelas 
restantes vísceras abdominais 
- regurgitação 
- para árvore respiratória 
- necrose e inflamação da mucosa 
- para a boca (queimadura química muco-cutânea) 
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b) Queimaduras por arremesso de cáusticos - situações potencialmente mortais, pelas 
complicações que podem surgir, que também resultam da acção local de agentes 
cáusticos. O exemplo mais frequente é o arremesso à vítima de ácido sulfúrico (óleo 
de vitríolo – ác. sulfúrico), geralmente à face (para desfigurar) – vitriolagem. Outras 
regiões corporais podem ser afectadas, nomeadamente o pescoço, o tórax e os 
membros superiores. 
 
2) Lesões por acção sistémica 
Podem ser directas resultantes da acção directa do tóxico a nível dos diversos órgãos e tecidos 
ou por acção indirecta resultantes da anóxia ou choque devidas à intoxicação. 
Tanto as lesões directas como as indirectas são inespecíficas. Raramente o estudo 
anatomopatológico macro e microscópico dá o diagnóstico de intoxicação ou identifica o tóxico. 
Dentro das lesões por acção tóxica indirecta é clássico descrever-se um conjunto de achados de 
autópsia inespecíficos, a saber: 
- congestão visceral generalizada 
- edema (cerebral, pulmonar) 
- hemorragias petequiais (epicárdio, pleuras) 
- sangue muito fluído e escuro 
Como já foi dito anteriormente, todos estes achados não são patognomónicos de uma situação de 
intoxicação. Apesar de muito inespecíficos, devem ser procurados e registados no relatório. 
 
3) Exame do hábito externo – alguns aspectos que merecem especial atenção 
 
3.1 – Livores 
Os livores cadavéricos nas situações de intoxicação são normalmente descritos como mais 
intensos, havendo nos autores clássicos referência a determinadas tonalidades dos livores que 
serão indicativas deste ou daquele tóxico. 
Na prática, excepto em casos de intoxicação por monóxido de carbono com elevadas 
percentagens de carboxihemoglobina, em que os livores são descritos como “carminados”, todas 
as outras situações são de difícil (para não dizer impossível), diagnóstico, com base 
exclusivamente na cor dos livores. 
3.2 - sinais recentes ou antigos de punção venosa (em toxicodependentes) 
3.3 – odor exalado pelo cadáver – (ex: a amêndoas amargas em casos de intoxicação por ácido 
cianídrico). 
3.4 – queimaduras nos lábios e face – intoxicação por substâncias caústicas 
 
3) Exame do hábito interno 
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Nunca será demais relembrar que na maior parte das intoxicações, o exame do hábito interno 
revela achados inespecíficos, na maioria das vezes. 
Estes achados são, por vezes, tão inespecíficos que podem aparecer em intoxicações por 
substâncias muito diversas e podem inclusivamente ser semelhantes a aspectos encontrados 
noutros tipos de mortes violentas, nomeadamente em situações de asfixia mecânica. 
 
Recomendações práticas para a realização de autópsia em que haja suspeita de 
intoxicação 
Em relação à realização da autópsia em casos de suspeita de intoxicação, sempre que possível, 
seria de tomar em consideração um conjunto de recomendações práticas que devem ser do 
conhecimento do perito médico: 
1) evitar, se possível, outros odores na sala de autópsia 
2) começar a autópsia pela cabeça para evitar os odores emanados da cavidade abdominal 
3) retirar em bloco os órgãos do pescoço e as órgãos torácicos - facilita a técnica de colheita 
dos pulmões quando se trata de uma intoxicação por gases e facilita também a abordagem 
para confirmar ou não da existência de aspiração para árvore respiratória 
4) evitar lavar os órgãos 
5) evitar perdero conteúdo das vísceras ocas (estômago, intestino, bexiga) 
6) em relação ao estômago sempre que o seu conteúdo seja importante para esclarecer a 
causa de morte deve-se: 
- laquear ao nível do cárdia e do piloro (dupla laqueação) 
- verter o conteúdo para recipiente apropriado para envio para análise toxicológica 
- cheirar e descrever o odor, a consistência e os constituintes do conteúdo e medir e 
registar o volume do conteúdo 
7) em relação ao intestino sempre que o seu conteúdo seja importante para esclarecer a causa 
de morte deve-se: 
- laquear ao nível do piloro, do cego e do recto (dupla laqueação) 
- verter o conteúdo para recipiente apropriado para envio para análise toxicológica 
- cheirar e descrever o odor, a consistência e os constituintes do conteúdo nos diferentes 
segmentos intestinais 
8) em relação à urina sempre que o seu conteúdo seja importante para esclarecer a causa de 
morte deve-se: 
- colher com seringa e agulha por punção depois de feita abertura da cavidade peritoneal 
- verter o conteúdo para recipiente apropriado para envio para análise toxicológica 
9) em relação ao húmor vítreo sempre que a sua análise seja importante para esclarecer a causa 
de morte deve-se: 
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- colher em estados de putrefacção avançada para doseamento do álcool etílico; em 
casos de intoxicação por insulina, para doseamento da glicose 
- colher com seringa e agulha por punção que deve ser feita com cuidado para não 
perfurar o globo ocular 
- a punção deverá ser feita no plano equatorial do olho, com a agulha dirigida para o 
centro do globo ocular, sem penetrar profundamente. 
- verter o conteúdo para recipiente apropriado para envio para análise toxicológica 
10) em relação aos restantes órgãos ou tecidos biológicos sempre que a sua análise seja 
importante para esclarecer a causa de morte deve-se: 
- colher evitando lavagem prévia 
- colocar em contentores apropriados, na quantidade indicada pelo laboratório 
11) em relação ao envio ao laboratório das órgãos ou dos fluídos biológicos convém realçar que: 
- devem ser seguidas escrupulosamente todas as recomendações contidas nas 
requisições de exames toxicológicos 
- envio o mais rápido (para a respectiva delegação) 
- garantir a cadeia de custódia 
- sempre que seja conhecido, indicar que há risco de infecção 
- não misturar na mesma remessa amostras de processos diferentes 
- nunca misturar na mesma remessa amostras enviadas para laboratórios diferentes (ex. 
exames periciais de toxicologia, biologia ou de histologia) 
- proceder sempre à rotulagem das amostras com referência aos seguintes dados : 
- entidade requisitante 
- data da colheita 
- nº processo de autópsia 
- identificação do conteúdo 
- identificação do perito 
 
 
Passos fundamentais do exame toxicológico 
 
O contributo de um exame toxicológico pode dar-se a dois níveis principais, tendo como base, 
achados concretos ou opiniões. Deste modo, distinguem-se: 
) exames toxicológicos baseados em achados – consideram dados obtidos no isolamento, 
identificação e doseamento de substâncias tóxicas. Neste passo, inserem-se também resultados 
de confirmação da ausência de outras substâncias químicas potencialmente relacionadas com a 
intoxicação e os procedimentos usados e respectiva qualidade. 
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) exames toxicológicos baseados em opiniões - podem ser, mais ou menos, fundamentados, 
de acordo com a informação que é recolhida, a interpretação dada a cada caso e a emissão de 
pareceres periciais. 
Na requisição de exames toxicológicos, a dúvida que, frequentemente, se coloca, é discernir 
acerca do real interesse em optar pela pesquisa toxicológica e, em caso afirmativo, qual o tipo de 
análise a requerer. 
A opção final pelo exame mais adequado deve ser conferido ao toxicologista, pois na qualidade 
de perito especialista desta área, pode basear a decisão na sua preparação técnica para integrar 
toda a informação relevante, e relacioná-la com o tipo e qualidade das amostras disponíveis. 
Contudo, não se coloca em causa a importância do conhecimento por parte das entidades 
requisitantes de alguns conceitos básicos na orientação da análise toxicológica, tais como os 
sugeridos no esquema seguinte: 
 
Provável substância implicada em caso de intoxicação
SIM
NÃO
Porque se pede a análise?
SIM
SIM
NÃO
NÃO
Investigar com
método específico
para a substância
Existe alguma informação credível e orientadora?
Pesquisar os tóxicos que 
melhor se enquadram na
informação disponível despiste sistemático
É conhecido, de forma verosímil, o agente tóxico?
?
Proceder a um
 
 
 
A selecção de amostras em toxicologia forense 
 
Consoante a especificidade do caso e o tipo de análise toxicológica pretendida procede-se à 
colheita das amostras mais adequadas. Desta forma, existem análises que requerem apenas um 
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tipo de amostra, enquanto outras ficarão incompletas se não forem enviadas diversos tipos de 
amostras. Por exemplo, as determinações de alcoolemia (etanol no sangue) ou de 
carboxihemoglobina (monóxido de carbono presente na hemoglobina sanguínea) exigem apenas 
um único substracto (sangue). 
Contudo, e em especial para o sangue, existem condições em que não é possível obter as 
amostras mais apropriadas de uma forma qualitativa e/ou quantitativa, particularmente em 
situações de putrefacção avançada, exumações ou de mortes por choque traumático. Neste caso, 
há que recorrer a amostras alternativas ou complementares, que apenas nos permitem inferir 
acerca da concentração provável de tóxico presente no sangue. 
Na determinação de álcool etílico é possível efectuar essa pesquisa em diversos outros fluídos, 
tais como urina, humor vítreo, líquido sinovial, medula óssea ou saliva. 
Segundo directivas europeias, qualquer suspeita de intoxicação e/ou situação cujos achados de 
autópsia não revelaram causa de morte evidente, deve incluir a recolha das seguintes amostras 
básicas para exame toxicológico: sangue periférico; urina; conteúdo estomacal; bile; fígado e rim. 
No caso de existir suspeita específica, a recolha e envio de amostras deve ter em consideração o 
grupo de tóxicos a analisar, pelo que a anterior amostragem permite, igualmente, pesquisas de 
hipnótico-sedativos, substâncias psicoactivas, cardiotónicos, analgésicos e pesticidas. 
A pesquisa de drogas de abuso deve englobar, além das amostras já descritas, líquido 
céfaloraquidiano; encéfalo; local de picada de injectáveis e cabelos. 
A inclusão de sangue cardíaco da cavidade do ventrículo esquerdo, encéfalo, tecido gordo 
subcutâneo, pulmão e vestuário, deve complementar a amostragem básica quando interessa 
efectuar pesquisas de substâncias lipossolúveis voláteis, tais como combustíveis e solventes. 
As intoxicações alimentares implicam a suplementação do envio das amostras básicas com 
amostras de conteúdo intestinal colhido, se possível, em três locais diferentes. 
Já no caso de a intoxicação poder ter sido do tipo crónico, por acção entre outros, de metais 
pesados, certos medicamentos ou pesticidas, devem-se adicionar à recolha de amostras normal, 
cabelos, ossos, tecido adiposo e conteúdo intestinal. 
Uma análise toxicológica tem, muitas vezes, por limite a qualidade ou quantidade das amostras de 
que se dispõe, daí que, seja preferível o envio de amostras em excesso, apesar das dificuldades 
de conservação e transporte que se possam colocar,com a vantagem de poder diversificar as 
pesquisas, duplicar, garantir ou até contribuir para o sucesso analítico de uma determinada 
pesquisa. 
 
Conservação das amostras 
As amostras destinadas a exame toxicológico não devem ser adicionadas de qualquer 
preservante ou conservante, porque a detecção de qualquer substância, seja ela adicionada ou 
não, poderá ser relevante do ponto de vista toxicológico. 
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Tal como em qualquer regra existe excepção no que se refere à amostra de sangue destinada a 
doseamentos de álcool, cocaína ou ácido cianídrico, à qual se adiciona fluoreto de sódio na 
concentração aproximada de 1% (peso por volume). 
Com esta atitude pretende-se impedir a proliferação microbiana, e assim prevenir a probabilidade 
de se induzirem alterações nas taxas sanguíneas dos referidos tóxicos. 
 
Técnicas adoptadas na pesquisa toxicológica 
 
A sequência de procedimentos empregues na pesquisa toxicológica, desde a requisição de 
autópsia ou exame clínico pelas autoridades judiciais, com o envio das amostras ao laboratório, 
até à elaboração do relatório toxicológico, assenta em alguns passos fundamentais, como a seguir 
se demonstram: 
 
HOSPITALAUTÓPSIA
AUTORIDADE JUDICIAL
Registo de amostrasRastreio
Confirmação
Quantificação
Interpretação
requisição
colheita
isolamento
 relatório 
 
 
 
Preparação da amostra 
 
A preparação da amostra é um procedimento chave das análises toxicológicas, pois é nesta fase 
que se procede ao isolamento do tóxico com a intenção de lhe serem aplicadas as técnicas de 
análise instrumental. 
 
Rastreio analítico 
 
Este rastreio ou "screnning" é realizado pela utilização de métodos de sensibilidade elevada e 
fraca especificidade. Os métodos, ainda, devem ser simples e pouco exigentes, em termos de 
ocupação de recursos humanos e de consumos de material. 
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As técnicas de rastreio para tóxicos termolábeis poderão ser: imunoensaios, cromatografia em 
camada delgada e cromatografias gasosa ou líquida (quando equipadas com detectores 
universais). 
 
Identificação e Doseamento 
 
Os resultados fornecidos pelos testes de rastreio são muito limitados, pelo que, um resultado 
positivo só pode ser encarado como tal, se se confirmar através do recurso a testes de 
identificação e confirmação. 
Além do mais, tratando-se de provas periciais, a correcta identidade da substância detectada e a 
avaliação do seu teor quantitativo são, em certos casos, essenciais para a distinção de 
interferências de matriz e analíticas, que possam contribuir para a obtenção de falsos resultados 
positivos. 
A cromatografia gasosa ou a cromatografia líquida acoplada a detectores mais específicos tais 
como, a espectrometria de massas ou detectores de varrimento na zona dos ultravioletas ou 
infravermelhos, quando utilizados em condições adequadas permitem identificações com elevado 
grau de confiança. 
A técnica que tem vindo a ser utilizada na identificação no doseamento de substâncias 
elementares, em especial, as de carácter mineral, tem sido a espectrofotometria de absorção 
atómica (AAS), nas suas variantes com ou sem chama, adaptada com gerador de hidretos ou com 
câmara de grafite. 
 
Interpretação dos resultados analíticos 
 
À medida que as metodologias analíticas evoluem, a principal questão da toxicologia forense não 
é saber o que é, mas sim o que isso significa. 
Não basta, portanto, identificar a nível das amostras orgânicas uma substância com relevância 
toxicológica, mas para além disso, é essencial interpretar adequadamente os resultados obtidos 
face às variáveis envolvidas. 
Os factores que estão envolvidos numa pesquisa toxicológica são inúmeros. Por um lado, temos 
os que são relativos à análise em si, tais como: estado das amostras, técnica analítica empregue, 
analista operador, rendimento dos métodos, e um sem número de erros sistemáticos ou fortuitos 
passíveis de ocorrer em qualquer actividade de análise química. Por outro lado, temos aqueles 
factores, que sendo inerentes ao caso analisado, podem contribuir para que os resultados 
analíticos entrem em contradição com as hipóteses da investigação (como exemplos, podemos ter 
a via de absorção do tóxico, o tempo de sobrevida - tempo decorrido entre a ocorrência e a 
morte- ou o intervalo de tempo até colheita de amostras, medidas terapêuticas, de diagnóstico ou 
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de suporte administradas, sinergia de efeitos devida à associação de tóxicos, e muitas outras 
dependentes da circunstâncias de cada caso. 
Além destes aspectos, existem muitas outras condições em que se exige conhecimentos técnicos 
e periciais no sentido de elucidar certas circunstâncias, tais como a demonstração, do reduzido 
interesse analítico a atribuir à técnica de imunoensaios face à sua fraca especificidade, dos efeitos 
devidos à adsorção de substâncias nas paredes dos recipientes dos contentores de amostras, da 
degradação de substâncias em função do tempo e condições de conservação, da degradação 
metabólica das amostras, ou da degradação térmica que possa ocorrer em análises por 
cromatografia gasosa. 
Por outro lado, não existem dados objectivos que permitam estabelecer analogias concretas entre 
os resultados obtidos e as tabelas de níveis letais séricos ou tecidulares existentes. 
Para isso, o analista introduz no processo analítico meios de controlo que assentam na validação 
de métodos analíticos, uso de padrões internos ou externos certificados, recurso a normas de 
boas práticas laboratoriais, implementação de programas de controlo de qualidade intra e 
interlaboratoriais. Deste modo, pretende-se garantir a detecção da frequência com que ocorrem 
erros sistemáticos ou fortuitos, e formas de os solucionar, de modo a manter qualidade 
laboratorial. 
 
 
e) PROCEDIMENTOS RELATIVOS À DETECÇÃO DA INFLUÊNCIA DE SUBSTÂNCIAS 
PSICOACTIVAS NA CIRCULAÇÃO RODOVIÁRIA 
 
Relação Clínico - Toxicologista 
 
A legislação do Código da Estrada (Decreto-Lei nº 265-A/2001, de 28/09) na parte relativa à 
fiscalização da circulação na via pública sob efeito de álcool e das substâncias legalmente 
consideradas estupefacientes ou psicotrópicas pressupõe a participação, além das autoridades 
fiscalizadoras, dos serviços de urgência hospitalares e do Instituto Nacional de Medicina Legal. 
Aos primeiros compete executar os procedimentos de avaliação clínica e de colheita de amostras 
biológicas, realizar os exames de rastreio analítico a estupefacientes e psicotrópicos e, caso 
necessário, requisitar exames toxicológicos de quantificação de álcool no sangue ou de 
confirmação da presença de estupefacientes e psicotrópicos através da remessa de amostras 
adequadas em bolsas próprias à Delegação do INML da área respectiva. 
Aos Serviços de Toxicologia Forense do INML compete equipar e distribuir as bolsas destinadas à 
colheita de amostras biológicas, verificar o cumprimento dos procedimentos de cadeia de 
custódia, e executar as análises toxicológicas de quantificação de álcool no sangue ou de 
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confirmação da presença de estupefacientes e psicotrópicos por equipamentos e metodologias 
adequadas. 
Como tal a nível destas competências, os médicos dos serviços de urgência hospitalares e os 
toxicologistas do INML beneficiam em adoptarem um relacionamento que se traduzaem 
colaboração institucional, de modo a assegurar com rigor e justiça, a execução dos procedimentos 
destinados a uma aplicação universal da lei vigente. Por outro lado, enquanto cidadãos com 
responsabilidades acrescidas, os médicos e paramédicos que, sem justa causa, se recusarem a 
proceder às diligências previstas na lei para diagnosticar o estado de influenciado pelo álcool e 
das substâncias legalmente consideradas como estupefacientes ou psicotrópicas são punidos por 
desobediência. 
A realização de exames clínicos e de colheita de amostras biológicas para diagnóstico do estado 
de influenciado por substâncias aplica-se, quer em indivíduos admitidos no serviço de urgência na 
sequência de acidentes de viação, quer em indivíduos conduzidos ou notificados pelas 
autoridades fiscalizadoras para serem avaliados no serviço de urgência no âmbito de operações 
de fiscalização. 
Quando se suspeita que um indivíduo possa estar influenciado pelo álcool etílico, se tiver sido 
possível, antes da sua admissão hospitalar a autoridade fiscalizadora procedeu aos exames 
prévios de determinação da taxa de álcool no sangue (TAS) através de aparelhos de medição no 
ar expirado. Deste modo, interessa a realização de contraprova mediante análise de sangue, pelo 
que compete ao serviço hospitalar a colheita de amostra de sangue, preenchimento da requisição 
de exame de quantificação de TAS (modelo Anexo I à portaria nº 1006/98, de 30/11) e remessa 
da respectiva bolsa contendo requisição e amostra de sangue ao INML. Na impossibilidade da 
colheita de amostra de sangue, o médico deve proceder a exame clínico adequado conforme 
previsto na secção III do capítulo I da portaria nº 1006/98, de 30/11. 
No que se refere ao diagnóstico do estado de influenciado por substâncias legalmente 
consideradas estupefacientes ou psicotrópicas, em virtude das autoridades não disporem de 
métodos com vista à sua detecção, todos os indivíduos envolvidos em acidentes de viação dos 
quais resultem mortos ou feridos graves, bem como os conduzidos pelas autoridades ao serviço 
de urgência com esse objectivo devem ser avaliados por médico, seja por via de exame médico 
de rastreio de acordo com secção I do capítulo II da portaria nº 1006/98, de 30/11, seja através de 
exame analítico de rastreio na urina, por utilização de imunoensaios, efectuado a nível do serviço 
de patologia clínica do hospital. Os exames analíticos de rastreio a realizar no hospital destinam-
se a despistar a presença de substância que integrem os seguintes grupos: metabolitos da 
marijuana, opiáceos, cocaína e metabolitos e anfetaminas e derivados. Somente em caso de 
algum dos exames analíticos de rastreio dar resultado positivo é que o médico responsável deve 
providenciar pela remessa ao INML de amostras de urina e de sangue colhidas ao examinando, 
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acompanhadas de requisição de análise toxicológica de confirmação da presença de 
psicotrópicos (modelo anexo VI à portaria nº 1006/98, de 30/11). 
Os conjuntos de recolha de amostras, também designados como KIT’S, dos quais fazem parte as 
bolsas a enviar ao INML são fornecidos pela autoridade fiscalizadora (PSP ou GNR) devendo as 
mesmas estar seladas através de selo vermelho numerado (este número não é importante para o 
procedimento), que assegura a validade dos materiais de colheita nela incluídos. No interior do 
conjunto encontra-se um selo azul numerado (número muito importante para identificação do 
processo) destinado a ser usado para selagem da bolsa após introdução de amostras biológicas e 
do triplicado de requisição de análises. 
A identificação do processo de remessa de amostras ao INML não é nominal mas assente no 
número do selo azul, pelo que é imprescindível que no triplicado de requisição de análises 
conste o respectivo número de selo. Outros elementos como data/hora de colheita das amostras, 
resultados de exames prévios, tipo de amostras enviadas, terapêuticas efectuadas, e identidade 
do serviço hospitalar e do médico responsável são essenciais para evitar falhas de procedimento. 
Sempre que se verificam factos em desacordo com os procedimentos previstos, o Serviço de 
Toxicologia Forense elabora Autos de Ocorrência, através dos quais comunica e regista falhas 
de procedimento, bem como descreve o encaminhamento dado a cada caso. 
Os Serviços de Toxicologia Forense assumem o papel de entidade reguladora por garantir a 
segurança dos materiais incluídos nos KIT’s, pela execução de análises rigorosas com o intuito de 
confirmar a presença de psicotrópicos ou estabelecer a taxa de alcoolemia em amostras 
biológicas, e pelo controlo dos procedimentos relativos à cadeia de custódia de amostras. 
Sempre que ocorra violação das bolsas ou qualquer outra circunstância de não conformidade, 
devem as mesmas ser remetidas ao INML para que se proceda à sua verificação, re-
equipamento, selagem e devolução à respectiva autoridade fiscalizadora. 
Nesta, tal como em outras áreas, pressupõe-se uma estreita colaboração Hospital/Instituto 
Nacional de Medicina Legal. 
 
 
 
 
 
 
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2 
GENÉTICA E BIOLOGIA FORENSE, E CRIMINALÍSTICA 
 
Maria de Fátima Pinheiro 
 
 
Entre as múltiplas actividades de um laboratório de Genética e Biologia Forense constam a 
realização das perícias referentes aos casos de filiação, criminalística biológica e identificação 
individual (genética). A resolução destes casos, ou seja, a identificação genética pressupõe 
sempre o estabelecimento da individualidade biológica que cada ser humano representa e 
fundamenta-se na exclusividade do seu DNA e na igualdade e invariabilidade deste em todas as 
células do organismo ao longo da vida. Ou seja, o DNA é unico para cada ser humano e este fica 
perfeitamente identificado através do seu estudo em qualquer vestígio biológico que lhe pertença. 
Para a análise de DNA é necessário qualquer tipo de amostra ou produto que contenha material 
genético. Este material encontra-se em todas as células nucleadas do organismo. 
 
A identificação genética é, actualmente, de importância fundamental em Medicina Legal, tanto no 
que concerne à investigação biológica da paternidade como à identificação em criminalística ou 
de restos cadavéricos. 
 
a) INVESTIGAÇÃO BIOLÓGICA DE PATERNIDADE 
 
A investigação biológica da paternidade tem como objectivo, dado um trio filho, mãe e pretenso 
pai, determinar se este é ou não excluído da possibilidade de ser o pai biológico. 
As investigações de paternidade têm sido o tipo de exames mais frequentemente solicitados às 
Delegações (Porto, Coimbra e Lisboa) do Instituto Nacional de Medicina Legal, que realizam mais 
de 300 perícias, do género, por ano. Na do Porto verificou-se, um aumento considerável do 
número de exames, solicitados pelos tribunais, particularmente a partir da década de 80. 
O principal motivo do pedido de um tão elevado número de casos deve-se, sobretudo, à reforma 
do Código Civil Português, de 1977, nomeadamente ao artigo 1864º. Este obriga a que se 
proceda à averiguação oficiosa da paternidade nos casos em que o filho é registado apenas com 
o nome da mãe. 
 
Relativamente aos exames do âmbito da criminalística biológica, nos últimos anos, houve um 
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acréscimo notável do estudo de vestígios biológicos em casos relacionados com crimes. Este 
incremento deveu-se, fundamentalmente, ao melhor poder informativo proporcionado, uma vez 
quese dispõe, actualmente, de técnicas mais sensíveis. Estas perícias consistem no estudo dos 
vestígios e comparação das suas características genéticas com as da vítima e suspeito. A sua 
identificação e caracterização têm grande interesse, uma vez que, habitualmente, são transferidos 
fluídos orgânicos e secreções entre o criminoso e a vítima e o objectivo principal é identificar o 
autor do crime. 
Acresce ainda a sua importância na identificação individual (genética) a partir de restos 
cadavéricos, como ossos ou tecidos mumificados. 
A perícia médico-legal do âmbito da Biologia Forense, seja investigação de filiação, criminalística 
biológica ou identificação, desenrola-se em duas fases: análise laboratorial e valorização 
bioestatística dos resultados. 
As diferentes fases têm características comuns para os distintos tipos de perícias, pois em 
qualquer dos casos a prova é baseada na comparação de perfis genéticos. 
Perfil genético, do ponto de vista médico-legal, pode ser definido como sendo o conjunto de 
características hereditárias ou padrões fenotípicos que um indivíduo possui, para um determinado 
número de marcadores genéticos, detectável em qualquer amostra biológica que lhe pertença. 
Este perfil ficará definido mediante a análise laboratorial das referidas amostras. 
Antes de se fazer a valorização bioestatística ter-se-á que estudar os marcadores genéticos a 
usar, na população em causa, no nosso caso, na população do Norte de Portugal. 
Por outro lado, uma vez concluído o estudo laboratorial, importa fazer a avaliação dos 
resultados obtidos. 
Assim, nos casos de investigação de paternidade, que são quase exclusivamente os casos de 
filiação que nos são presentes, porquanto na casuísta do nosso serviço tem-se registado um 
número baixo de casos de investigação de maternidade, as conclusões possíveis, são: exclusão 
de paternidade e não exclusão de paternidade. 
Em princípio, conclui-se por exclusão de paternidade, quando houver exclusão, no mínimo, por 
dois marcadores genéticos e, preferentemente, se pelo menos uma das exclusões for de 1ª 
ordem, referindo-se no relatório quais os sistemas que proporcionam a exclusão. 
Todavia, os casos de exclusão de paternidade devem ser suficientemente ponderados antes da 
elaboração do relatório final, porquanto tem-se constatado que os STRs, polimorfismos do DNA 
actualmente muito usados na resolução dos casos, exibem uma taxa de mutação relativamente 
elevada. Por isso, em casos excepcionais pode-se verificar exclusão por mais de um marcador 
genético e na realidade não corresponder a exclusão de paternidade, mas a uma coincidência de 
mutações genéticas em mais de um sistema. 
 
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Relativamente aos casos de não exclusão, exprime-se o resultado em probabilidade de 
paternidade, cujo cálculo se baseia no Teorema de Bayes. 
Em face do que foi anteriormente dito, hoje é mais difícil concluir uma situação de exclusão de 
paternidade do que de não exclusão. 
 
 
Em relação aos casos criminais há três conclusões possíveis: 
a) Os perfis de DNA do suspeito e dos vestígios (cujas características genéticas não são 
idênticas às da vítima e que há indícios de que possam pertencer ao suspeito) não são 
sobreponíveis; 
b) Há coincidência dos referidos perfis; 
c) O estudo não é conclusivo, ou porque o DNA disponível não é em quantidade suficiente e/ou 
porque há problemas laboratoriais na extracção, amplificação ou tipagem do DNA. 
 
Assim, à semelhança dos casos de investigação de paternidade, quando não houver coincidência 
entre as características genéticas do suspeito e dos vestígios, devem ser referidos no relatório os 
polimorfismos que proporcionam a referida exclusão. 
Relativamente ao caso dos perfis serem idênticos, o perito deve fazer a valorização da prova, que 
habitualmente é feita calculando a probabilidade de concordância ou o seu inverso, o “likelihood 
ratio” (razão bayesiana de probabilidades). 
 
 
Aspectos legais da aplicação da análise do DNA aos casos forenses. Legislação 
portuguesa (investigação de paternidade) 
 
A reforma do Código Civil Português ocorrida em 1977 contribuiu para o incremento do número de 
exames de investigação de paternidade realizados. Até àquela data foram efectuados, em média, 
dois exames por ano, enquanto que na década de 80, 621 , tendo vindo a aumentar 
progressivamente ao longo dos anos. 
Simultaneamente à entrada em vigor do “novo” Código Civil surgiram novas técnicas, 
designadamente a PCR e marcadores genéticos muito mais informativos, que contribuíram para a 
conclusão dos casos de uma forma mais consentânea com a realidade biológica. 
O artigo do “novo” Código Civil que contribui de uma forma decisiva para o aumento considerável 
do número de casos solicitados foi o 1864º. 
 
 
 
 
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Artigo 1864º 
(Paternidade desconhecida) 
 
Sempre que seja lavrado registo de nascimento de menor apenas com a maternidade 
estabelecida, deve o funcionário remeter ao tribunal certidão integral do registo, a fim de se 
averiguar oficiosamente a identidade do pai. 
 
Como foi atrás referido, esta norma é a responsável pelo incremento do elevado número de 
perícias de investigação biológica de paternidade solicitadas. 
No direito anterior supunha-se a perfilhação materna; agora não é possível a perfilhação pela 
mãe, pelo que nesta norma se utiliza a expressão “... apenas com a maternidade estabelecida...” 
Impõe-se agora ao tribunal que investigue a identidade do pai, quando apenas é conhecida a da 
mãe. 
O estabelecimento da averiguação oficiosa da paternidade apenas encontra eco nos 
ordenamentos jurídicos dos países escandinavos. 
“A sua justificação pode encontrar-se no desejo de satisfazer o direito à identidade e à integridade 
moral, de tutelar o interesse geral da melhor socialização e amparo económico do filho; e na 
consciência de que não vale grande coisa garantir a todos os filhos a igualdade de direitos se não 
se fizerem os esforços possíveis no sentido de constituir as relações de filiação” (Krause, cit, por 
Guilherme de Oliveira). 
Para além dos pedidos efectuados pelos tribunais as perícias também podem ser solicitadas por 
entidades privadas ou por particulares. 
 
 
Decreto-Lei nº 96/2001, de 26 de Março 
 
De acordo com o Decreto-Lei nº 96/01, relativo à Lei Orgânica do Instituto Nacional de Medicina 
Legal, concretamente o artigo 2º, uma das atribuições dos serviços médico-legais, segundo a 
alínea i) do mesmo artigo, é: “Prestar serviços a entidades públicas e privadas, bem como aos 
particulares, em domínios que envolvam a aplicação de conhecimentos médico-legais”. Esta 
disposição já se encontrava contemplada no Decreto-Lei nº11/98, revogado aquando da entrada 
em vigor deste decreto. 
Depois da publicação deste decreto, o Serviço de Genética e Biologia Forense tem sido 
contactado para a realização de exames solicitados por particulares, cuja concretização tem de 
ser previamente requerida pelos interessados sendo, o requerimento, apreciado antes de se 
proceder à marcação da colheita de amostras ou à sua recepção. 
Quando se trata de vestígios biológicos a analisar no âmbito da criminalística biológica, o exame 
só será efectuado se estiverem garantidos os direitos individuais e civis, designadamente o direito 
à privacidade individual ou familiar consignados na Constituição Portuguesa, na Declaração 
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Universal dos Direitos Humanos (artigo 12º) e na ConvençãoEuropeia dos Direitos Humanos 
(artigo 8º). 
 
 
Constituição Portuguesa 
 
A nossa Constituição, no capítulo relativo aos direitos, liberdades e garantias pessoais, Artigo 26º, 
refere-se aos direitos atrás citados. 
 
 
 
Artigo 26º 
(Outros direitos pessoais) 
 
1. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da 
personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à 
reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de 
discriminação. 
2. A lei estabelecerá garantias efectivas contra a utilização abusiva, ou contrária à dignidade 
humana, de informações relativas às pessoas e famílias. 
3. A lei garantirá a dignidade pessoal e identidade genética do ser humano, nomeadamente na 
criação, desenvolvimento e utilização das tecnologias e na experimentação científica. 
4. A privação da cidadania e as restrições à capacidade civil só podem efectuar-se nos casos e 
termos previstos na lei, não podendo ter como fundamento motivos políticos. 
 
 
Casos de filiação. Fundamento 
 
A grande maioria dos casos de filiação presentes são as investigações de paternidade. Por isso, 
abordar-se-á quase exclusivamente este tipo de perícias, todavia, os procedimentos a ter quando 
se trata de uma investigação de maternidade, são idênticos aos da paternidade. 
Actualmente, a grande maioria dos laboratórios utiliza, exclusivamente, polimorfismos do DNA. 
O fundamento biológico da resolução dos casos de filiação assenta no facto de cada indivíduo 
resultar da união de dois gâmetas, um materno (óvulo) e outro paterno (espermatozóide) que dão 
origem à formação de uma célula, o zigoto, a partir da qual se desenvolvem vários biliões de 
células que compõem o organismo humano. Cada um dos gâmetas possui um número haplóide 
de cromossomas (n), enquanto que as outras células do organismo, as células somáticas, têm um 
número diplóide de cromossomas (2n). Quando os dois gâmetas dos progenitores se unem, a 
descendência herda informação genética de ambos e cada uma das suas células possui essa 
informação. 
Por isso, a investigação biológica da paternidade consiste na análise do património genético que 
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um filho herdou da mãe e do pai. Uma vez apurada a parte genética herdada da mãe, é 
necessário verificar se o resto da informação é transmitida pelo pretenso pai. Se este possui as 
características hereditárias transmitidas à criança, não pode ser excluído da paternidade e o 
resultado é apresentado em probabilidade de paternidade. Se, pelo contrário, o indigitado não tem 
essas características, é afastado da possibilidade de paternidade. 
 
Exames laboratoriais 
 
Na generalidade dos casos o estudo é efectuado a partir do sangue e da zaragatoa bucal, 
colhidos a todos os intervenientes. 
Sob o ponto de vista médico-legal uma investigação de paternidade, pressupõe três fases: 
 
1ª - Identificação e colheita de sangue 
2ª - Caracterização dos marcadores genéticos 
3ª - Elaboração do relatório 
 
 
Identificação e colheita de sangue 
A identificação deve ser pormenorizada, registando-se os dados pessoais dos intervenientes 
numa ficha própria, como sejam, nome completo, data de nascimento, naturalidade, estado civil, 
raça, números dos bilhetes de identidade ou cédulas pessoais. Devem ser tiradas fotocópias de 
todos os elementos de identificação, assim como devem ser colhidas as impressões digitais do 
dedo indicador direito. Também deve ser perguntado se lhes foi administrada transfusão de 
sangue ou transplante de orgãos, confirmando-se este dado com a respectiva assinatura. 
Como os documentos de identificação podem ser falsificados, considera-se obrigatória a presença 
simultânea dos intervenientes para se efectuar a colheita, isto é, não se realizam colheitas se 
todos os intervenientes não estiverem presentes, salvo indicação expressa do juiz. 
 
Caracterização dos marcadores genéticos 
 
Marcadores genéticos são características identificáveis, transmitidas de pais para filhos, 
rigorosamente controladas por genes situados num par de cromossomas homólogos 
 
Antes de 1985, tanto as investigações biológicas de paternidade como a análise de amostras 
biológicas com interesse criminal eram resolvidas mediante o estudo de marcadores genéticos 
convencionais ou tradicionais, a maioria dos quais, proteínas. 
Hoje, a utilidade dos marcadores genéticos convencionais tem um interesse limitado, por serem 
sistemas pouco polimórficos. 
 
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Ácido desoxirribonucleico (DNA). Aplicação da análise do DNA à Medicina Legal 
 
A Medicina Legal dispõe, actualmente, de uma nova tecnologia que se baseia na variabilidade dos 
ácidos nucleicos das células, polimorfismos do DNA, cuja importância fundamental reside no facto 
de se estudar a individualidade biológica directamente do código genético, ao contrário das 
proteínas, cuja caracterização depende da sua expressão em tecidos e fluídos biológicos. É para 
notar que o DNA está presente em todas as células nucleadas do organismo humano (DNA 
nuclear) e que esse DNA é, basicamente, idêntico em todas as células do mesmo indivíduo. Têm 
sido desenvolvidos métodos de extracção do DNA que permitem, por exemplo, separar DNA de 
células espermáticas (suspeito) das células vaginais (vítima), em casos de agressão sexual, em 
que o perito dispõe do exsudato vaginal da vítima ou de manchas existentes em peças de 
vestuário. 
O estudo do DNA constitui hoje uma tecnologia que é admitida internacionalmente como prova 
pericial em tribunal, permitindo a resolução de casos de filiação complexos, como, por exemplo, 
casos de investigação de paternidade em que a mãe ou o pretenso pai faleceram, quando existe a 
possibilidade do estudo de familiares próximos; o estudo de restos cadavéricos e a comparação 
das suas características genéticas com as do sangue, também, de familiares próximos; e ainda 
casos de filiação em que se dispõe de restos fetais resultantes de aborto ou infanticídio, em que 
se pretende identificar o autor do crime. 
Tem sido especialmente na resolução de casos relativos à criminalística biológica que esta 
tecnologia tem demonstrado revestir uma importância fundamental, uma vez que na maioria dos 
casos relacionados com crimes o perito dispõe de uma quantidade exígua de DNA, apresentando-
se muitas vezes degradado. 
A admissibilidade jurídica, a nível internacional, da utilização das técnicas de tipagem do DNA, foi, 
numa primeira fase, alvo de controvérsias nos Estados Unidos, relativamente à própria 
metodologia empregue, à interpretação dos resultados e aos métodos estatísticos utilizados, tais 
como, o equilíbrio de Hardy-Weinberg, a homogeneidade populacional e o equilíbrio de ligamento 
entre os loci. 
O primeiro passo para obviar os problemas atrás referidos foi o desenvolvimento de metodologias 
que não suscitassem problemas de interpretação e que permitissem uma classificação exacta dos 
alelos dos diferentes polimorfismos. Em seguida, surgiram inovações relativas aos métodos 
estatísticos utilizados na análise dos resultados, proporcionando conclusões mais aproximadas à 
realidade biológica. Esta evolução conjunta dos métodos laboratoriais e estatísticos empregues na 
resolução de perícias médico-legais permite, actualmente, a obtenção de resultados que eram 
impensáveis há ainda escassos anos. 
Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Medicina Legal / Noções Gerais sobre outras ciências forensesA análise do DNA com aplicação médico-legal foi usada pela primeira vez no Reino Unido, em 
1985. Nos Estados Unidos a sua utilização iniciou-se em 1986, tendo sido aplicada pela primeira 
vez à resolução de casos criminais em 1987, num caso de agressão sexual. 
 
 
Análise do DNA 
 
O genoma humano é constituído por cerca de 3500 milhões de pares de bases (pb). 
A análise do DNA nuclear, permitiu definir que no genoma humano existem regiões que se podem 
classificar do seguinte modo: 
 
- DNA não repetitivo (polimorfismos de sequência) 
- DNA moderadamente repetitivo (regiões minisatélite) 
- DNA altamente repetitivo (regiões microsatélite) 
 
Algumas sequências não codificantes (DNA não expressivo, não codificante ou heterocromatina), 
cuja função biológica ainda não está perfeitamente estabelecida, encontram-se repetidas em 
"tandem", isto é, uma sequência de pares de bases (pb), seguida de outra sequência idêntica e 
assim sucessivamente. 
Estas regiões hipervariáveis, onde existem os loci VNTR (Variable Number of Tandem Repeats), 
são chamadas minisatélites se a sequência (core) é constituída por 10-70pb que se repete entre 
20 e 60 vezes. Se as referidas sequências são constituídas apenas por 2-7 nucleótidos que se 
repetem, também, várias vezes, as regiões são denominadas microsatélites ou loci STR (Short 
Tandem Repeats). 
O DNA que forma as regiões hipervariáveis (HVR-Hipervariable Regions) do genoma, proporciona 
a existência de uma grande variação entre os indivíduos de uma população. Esta variação 
consiste no número de vezes que a sequência (core) se repete e é variável de indivíduo para 
indivíduo. Esta parte do genoma é a que tem maior interesse médico-legal. 
 
 
Polimorfismos do DNA 
 
Antes de se proceder à tipagem tem de se efectuar a extracção do DNA. 
Existem vários protocolos para se efectuar a extracção do DNA. Quando não é exigida a obtenção 
de DNA de alto peso molecular, utiliza-se o Chelex 100. Trata-se de uma técnica de extracção de 
DNA mais rápida, fácil de executar e eficiente. O Chelex é uma resina quelante (chelating resin) 
com grande afinidade para iões metálicos polivalentes, por isso previne a degradação do DNA em 
presença de iões metálicos a altas temperaturas e em condições de baixa força iónica. 
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Quando é necessária a obtenção de DNA de alto peso molecular utiliza-se a extracção orgânica 
com fenol-clorofórmio ou com fenol-clorofórmio-álcool isoamílico, cujo protocolo é mais complexo 
e demorado. 
Nos casos de violação em que são presentes os exsudatos vaginais das vítimas e/ou as peças de 
vestuário que aquelas envergavam aquando da ocorrência do crime, é preferencialmente utilizado 
um método diferencial de lise celular que, para além do fenol-clorofórmio-álcool isoamílico usa o 
detergente (SDS) e uma proteinase (Proteinase K), cuja função consiste na libertação das células 
vaginais da vítima, enquanto as cabeças dos espermatozóides se mantêm intactas em virtude do 
seu revestimento proteico conter pontes dissulfito. As células seminais são posteriormente 
recuperadas por centrifugação e subsequentemente lisadas na presença de ditiotreitol (DTT). O 
uso desta metodologia tem demonstrado ser eficaz, pois verifica-se que mesmo nos casos em 
que a quantidade de espermatozóides (observação microscópica) é escassa, consegue-se 
efectuar a tipagem do DNA da fase espermática. 
 
Polymerase Chain Reaction (PCR) 
 
A técnica mais usada para o estudo do DNA é a PCR. Esta técnica foi descrita por Kary Mullis, 
em 1985 e baseia-se na amplificação enzimática in vitro de um fragmento de DNA de interesse 
(target) que é flanqueado por 2 "primers" que hibridam com as extremidades 3´ da dupla cadeia. 
Ciclos repetidos, consistindo na desnaturação do DNA, "annealing" dos "primers" e sua extensão, 
originam em cada ciclo a duplicação da sequência inicial, correspondendo a um crescimento 
exponencial da referida sequência. Isto é, decorridos 20 ciclos, o DNA em estudo, delimitado 
pelos "primers", cuja sequência de bases foi previamente seleccionada, estará amplificado cerca 
de 1 milhão de vezes. 
Cada um dos referidos ciclos inclui as seguintes fases: 
 
1ª- Desnaturação da sequência de DNA que se pretende estudar (± 90ºC) 
2ª- “Annealing” dos “primers” (± 60ºC) 
3ª- Extensão dos “primers” (± 72ºC), graças à Taq polimerase e aos nucleótidos trifosfatados 
(DNTPs – dATP, dTTP, dGTP e dCTP). 
 
A automatização do processo, com a utilização dos termocicladores, proporcionou a simplificação 
de todo o procedimento, constituindo também uma importante inovação. 
O uso da técnica de PCR requer que, pelo menos, seja conhecida a sequência de DNA que 
rodeia a região de interesse, para ser possível a construção dos "primers" usados na 
amplificação. Conhecendo-se a referida sequência, é possível escolher os "primers" por forma a 
permitirem a delimitação directa do local polimórfico. 
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Actualmente, são vários os polimorfismos de DNA com interesse médico-legal, que podem ser 
estudados por PCR, como polimorfismos de sequência, AMPFLPs e loci STR. No entanto, 
actualmente, só são usados estes últimos. 
Das vantagens desta técnica, destaca-se o facto da PCR possuir a capacidade para efectuar a 
análise de uma determinada sequência numa amostra exígua de DNA, qualquer que seja a sua 
quantidade e qualidade, desde que a amostra tenha, pelo menos, uma cadeia de DNA intacta, 
rodeando a região a ser amplificada. Esta sensibilidade, segundo vários autores, tem permitido a 
tipagem de diferentes polimorfismos de DNA de um único cabelo, de um espermatozóide e de 
células somáticas individuais. Outros autores referem ter efectuado reacções de amplificação em 
DNA degradado de tecidos guardados em arquivo e fixados em formol ou embebidos em parafina, 
ou ainda, extraídos de peças antigas existentes em museus ou achados arqueológicos. 
Por tudo o que foi anteriormente referido, poder-se-á afirmar que a técnica de PCR se tornou um 
meio precioso para a análise de regiões polimórficas, em amostras de DNA humano, 
particularmente em criminalística, nos quais raramente se dispõe de DNA de alto peso molecular 
em quantidades apreciáveis. Trata-se de uma metodologia muito usada na resolução de casos 
médico-legais, sendo também utilizada no diagnóstico clínico e noutros ramos da ciência. 
 
 
Sistemas AMPFLPs e STRs estudados por PCR 
 
Sistemas AMPFLPs (Amplified Fragment Length Polymorphisms) são os loci VNTR, cujos alelos 
possuem tamanhos moleculares, aproximadamente, de 100 a 2000 pb. 
Os dois grupos de sistemas, AMPFLPs e STRs, em virtude do curto tamanho dos seus alelos, são 
susceptíveis de amplificação por PCR e visualização directa dos produtos de amplificação, 
embora, actualmente, apenas se usem os últimos. 
 
 
 Loci STR estudados por PCR 
 
Os loci microsatélite podem definir-se como pequenas sequências de DNA (com menos de 350 
pb), dispersas pelo genoma, repetidas em tandem, de 2 a 7 pb de tamanho, pelo que também são 
conhecidos por loci STR (Short Tandem Repeats). Calculou-se que o genoma humano contém, 
aproximadamente, 500.000 STRs, dos quais 6.000 a 10.000 são tri ou tetraméricos. Um grande 
número destes loci apresenta um elevado grau de polimorfismo genético, cuja base molecular 
consiste na variação do número de unidades de repetição. 
Estes sistemas, devido à sua abundância no genoma humano, ao seu elevado grau de 
polimorfismo e à possibilidade de serem facilmente estudados mediante técnicas de PCR, 
converteram-se nos marcadoresde eleição em vários campos da ciência, designadamente na 
identificação genética humana. 
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É para notar, que o estudo dos loci STR proporciona uma maior sensibilidade, devido ao pequeno 
tamanho dos produtos de amplificação permitindo, por conseguinte, uma amplificação mais eficaz 
em amostras degradadas. 
 
É possível, no caso dos STRs, proceder-se à amplificação simultânea de vários loci numa única 
mistura de reacção (PCR multiplex), podendo-se fazer a análise conjunta dos produtos 
amplificados. Tal facto, proporciona o aumento do poder de discriminação e a diminuição do 
tempo de análise, bem como das quantidades de DNA e de reagentes a usar. 
Os STRs são claramente identificáveis, permitindo a distinção de alelos que diferem apenas num 
nucleótido. Tal facto torna viável a comparação dos resultados obtidos por diferentes laboratórios. 
É aconselhável a estandardização das condições experimentais (composição do gel, 
electroforese) e o uso de padrões alélicos consenso adequados e de sequência conhecida, assim 
como a uniformidade na nomenclatura empregue na classificação dos alelos. 
Em casos pontuais e excepcionais em que exista dúvidas relativamente a estes aspectos, pode-
se proceder à sequenciação dos alelos considerados duvidosos. 
Actualmente, estes problemas estão praticamente ultrapassados com o uso de kits comerciais, 
porquanto estes possuem os produtos e condições perfeitamente estandardizados para o estudo 
de uma grande gama de sistemas STR. 
Assim, por exemplo a Perkin-Elmer está a comercializar kits, como o Profiler Plus e o SGM Plus 
que permitem o estudo da amelogenina (gene homólogo do cromossoma X e Y) e de, 
respectivamente, os seguintes sistemas: D3S1358, VWA, FGA, D8S1179, D21S11, D18S51, 
D5S818, D13S317, D7S820 e D3S1358, VWA, D16S539, D2S1338, D8S1179, D21S11, D18S51, 
D19S433, TH01, FGA. 
Importa sublinhar que, após a reacção de PCR, os produtos de amplificação têm de ser 
analisados, usando-se para esse fim várias metodologias sendo, todavia, a mais divulgada e a 
que oferece resultados mais fiáveis a que utiliza sequenciadores automáticos, pelas razões 
adiante expostas. 
 
Uso dos sequenciadores automáticos para o estudo dos STRs 
 
A utilização de sequenciadores automáticos é hoje praticamente imprescindível como tecnologia 
associada à PCR, tanto na análise de loci STR, como no próprio estudo da sua sequência, nos 
casos em que, por exemplo, se torna necessário o esclarecimento da presença de uma mutação 
genética ou, ainda, na análise do DNA mitocondrial que pressupõe a sequenciação de duas 
regiões hipervariáveis (HVI e HVII). 
Estes permitem que a informação electroforética se vá armazenando à medida que decorre a 
migração, graças à utilização de um software apropriado, sendo os alelos detectados por laser, 
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pois os “primers” usados são marcados com fluorescência. Para além de que, paralelamente à 
migração das amostras de DNA em estudo, migram vários padrões externos (“sizer” externo) e 
padrões internos adicionados a todas as mostras a estudar (“sizers” internos). Os referidos 
padrões são reconhecidos pelo software e servem para construir curvas de calibração, eliminando 
as diferenças de mobilidades electroforéticas que podem existir em diferentes “lanes”. Deste 
modo, é possível eliminar automaticamente as variações da mobilidade electroforética, as quais 
podiam conduzir a uma tipagem errada dos alelos. 
Com um sequenciador é possível a tipagem simultânea de vários sistemas, pelo que é necessária 
uma quantidade inferior de DNA molde, o que constitui uma grande vantagem na resolução de 
casos com interesse forense em que se dispõe de pequenos vestígios, com quantidades exíguas 
de DNA. 
A Perkin-Elmer possui vários modelos de sequenciadores automáticos, dos quais podemos 
destacar o modelo ABI 310 e o ABI 3100 (electroforese capilar), que possuímos no nosso 
laboratório que, para além das vantagens atrás expostas, possibilitam o estudo de vários 
sistemas, designadamente loci STR, em que se verifique a sobreposição do tamanho dos alelos, 
porque os distintos primers, para amplificação de cada sistema, são marcados com diferentes 
fluorocromos, ou seja, com cores diferentes. Estes sequenciadores usam a electroforese capilar, 
em vez dos geis de poliacrilamida utilizados noutros modelos, obviando a preparação e 
manipulação do gel o que, muitas vezes, representava muito trabalho laboratorial, até porque nem 
sempre os geis tinham a qualidade requerida para que se obtivesse bons resultados. A 
electroforese capilar, entre outras vantagens, possui uma grande sensibilidade que é de grande 
interesse, especialmente quando a quantidade de produto amplificado é exígua. 
Por isso, de uma maneira geral, o uso dos sequenciadores apresenta muitas vantagens 
relativamente aos processos manuais, designadamente o facto de obviar a necessidade da 
manipulação do gel, após a electroforese, para a detecção dos produtos de PCR, ao contrário do 
que ocorre quando a técnica empregue não é automática, em que é necessária a exposição 
autorradiográfica do gel ou a coloração com nitrato de prata. 
Outra vantagem a registar é o facto da análise dos resultados ser também automatizada, através 
da utilização de software adequado, permitindo armazenar os dados em bases de dados, para 
posteriores análises estatísticas. 
Os sinais de fluorescência são conhecidos por serem lineares num maior grau de intensidades do 
que as autorradiografias convencionais. Por isso, estes sistemas de detecção são, provavelmente, 
mais úteis para a quantificação directa dos produtos de PCR. Este facto revela-se de especial 
interesse quando se possui mistura de amostras provenientes de mais de um indivíduo, pois o 
tamanho dos picos obtidos dá uma ideia do material celular existente de cada indivíduo, por 
exemplo, nos casos de violação. 
 
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DNA Mitocondrial e Cromossoma Y 
A análise do DNA mitocondrial e do cromossoma Y, permite determinar relações familiares, 
quando existe um hiato de várias gerações entre um ancestral e descendentes vivos. No entanto, 
não possuem o poder de discriminação dos sistemas autossómicos, designadamente dos loci 
STR autossómicos do DNA nuclear, para além de que é necessária uma maior ponderação na 
elaboração das conclusões. 
Num futuro próximo, com a criação de um número suficiente de bases de dados, com o 
desenvolvimento de novas metodologias e, possivelmente, também de novas técnicas, bem como 
com um perfeito controlo das situações excepcionais, cuja conclusão pode levantar algumas 
dúvidas de interpretação, o estudo do cromossoma Y e do DNA mitocondrial pode constituir uma 
peça relevante na resolução de perícias médico-legais do âmbito da Biologia Forense. 
 
Conclusões 
 
 
Investigação da paternidade 
 
Prova positiva de paternidade 
 
Nos casos da prova positiva de paternidade, isto é, quando não se verificar a existência de 
exclusão de paternidade por nenhum dos sistemas estudados, calcula-se a probabilidade de 
paternidade, com base no Teorema de Bayes. Este teorema é usado para determinar a 
probabilidade final de um sucesso, deduzida a partir das probabilidades iniciais e certa informação 
ou informações adicionais. 
A fórmula que expressa a probabilidade (a posteriori) de paternidade contém um parâmetro para 
poder ser simplificada, que é a probabilidade a priori de paternidade. Assim, se se atribuir a este 
valor de

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