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História da Educação - Pedagogia UERJ CEDERJ Material Completo

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Aulas/Aula 1 Educação Jesuitica .pdf
Revista Eletrônica de Ciências da Educação, Campo Largo, v. 7, n. 2, nov. 2008. 
 
 
 
EDUCAÇÃO JESUÍTICA: CONTEXTO, SURGIMENTO E 
DESDOBRAMENTOS 
 
 
Carin Carvalho1
Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB) 
carinbnu@al.furb.br
 
 
Carlos Odilon da Costa2
Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB) 
carrlosodiloncosta@gmail.com
 
 
Célia Regina Appio3
Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB) 
regippio@yahoo.com.br
 
 
Neide de Melo Aguiar Silva4
Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB) 
cvnet@furb.br
 
RESUMO 
 
Este estudo se ocupa da apresentação e análise do período histórico que marcou o 
início da educação no Brasil. Tal período, chamado jesuítico, pode ser caracterizado 
como do século XVI a metade do século XVIII, e está relacionado com a colonização 
do Brasil. Discute inicialmente o contexto histórico e os movimentos sociais, políticos 
e culturais que foram cenário para o desenvolvimento da educação jesuítica na 
Europa. Posteriormente, reconstrói o cenário de institucionalização da educação 
jesuítica no Brasil. Em paralelo, apresenta uma leitura da educação brasileira atual, 
na busca das possíveis raízes decorrentes do movimento jesuítico no Brasil. São 
tomadas como referência para leitura e apresentação das discussões, as 
concepções que permeiam as diretrizes legais, as práticas pedagógicas e os 
diversos discursos da educação atual. 
 
Palavras-chave: História da Educação, Educação no Brasil, Educação Jesuítica. 
 
1 Mestre em Educação pela Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB) – SC – Brasil. 
Bolsista da Capes. Professora da Rede Pública Municipal de Blumenau – SC. 
2 Mestre em Educação pela Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB) – SC – Brasil. 
Professor da Rede Pública Municipal de Blumenau – SC. 
3 Mestre em Educação pela Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB) – SC – Brasil. 
Coordenadora Pedagógica da Rede Pública Estadual de Blumenau – SC. 
4 Professora do Programa de pós-graduação em Educação da FURB. Doutora em Educação. 
 
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INTRODUÇÃO 
 
 
Entender o presente de nossa história educacional brasileira, sem antes 
compreender no seu passado, os processos sociais, as forças, relações e ideais que 
se estabeleceram e proporcionaram que determinados grupos e modelos 
educacionais detivessem a hegemonia nos processos escolares, em proveito de 
seus interesses, é uma estratégia pouco sustentável. Retomar a história da 
educação constitui-se um esforço para apresentar e compreender a construção 
histórica da escolarização, bem como suas principais perspectivas teóricas, políticas, 
sociais, históricas, culturais e ideológicas. 
Para tal, este estudo se detem na apresentação do período histórico que 
marcou o início da educação no Brasil. Este período, chamado de jesuítico, pode ser 
caracterizado como do século XVI até metade do século XVIII, e está relacionado 
com a colonização do Brasil. Embora tenhamos acreditado por muito tempo que a 
escolarização fosse um processo inocente e neutro de transmissão desinteressada 
do conhecimento, a inserção e apresentação da construção histórica da mesma, 
permitiu compreender que a seleção dos conhecimentos e a organização dos 
tempos/espaços escolares constituem estilos privilegiados de poder, regulação 
social e imposição cultural. 
De acordo com Silva (1996), o interesse pelo início da história da educação 
do Brasil não é reconhecer como se estruturava e selecionava o conhecimento 
escolar, bem como os tempos/espaços escolares no passado, mas compreender 
como esta forma de organização curricular alcançou o presente influenciando 
nossas práticas e concepções de ensino. 
A análise histórica da educação deve levar em consideração que as 
seleções que se faz, seja com relação aos conteúdos, seja com relação à 
organização dos tempos/espaços escolares, não é nunca natural e produz 
constantemente subjetividades e identidades determinadas. Quem tem força e está 
legitimado para dizer o que se inclui ou exclui no currículo não está indiferente para 
“com a inclusão ou exclusão na sociedade”. (SILVA, 1996, pg. 81) 
 
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A EDUCAÇÃO JESUÍTICA: CONTEXTO E RAÍZES 
 
A educação Jesuítica está relacionada com o que se pode chamar de uma 
reação aos ideais da Renascença européia. A Renascença ou Período das Luzes é 
o período compreendido entre os séculos XIV e XVI. “Compreende o movimento 
literário, artístico e filosófico que se originou na Itália, com base no desenvolvimento 
pessoal de reação contra todo o tipo de autoritarismo”. (LAGO, 2002, p.53) Leva 
esse nome por representar, inicialmente, a retomada dos valores greco-romanos, 
colocando o homem como centro, como medida de todas as coisas, em 
contraposição às concepções predominantemente teológicas da Idade Média. A 
Renascença marca centralmente a busca pela individualidade e confiança para com 
o poder da razão. 
Segundo Lago (2002), este período representou a evolução do método 
científico de investigação, o início da revolução científica. A idéia de que a natureza 
é regida por leis próprias provoca a erosão do mundo medieval e gera uma forte 
crítica à estrutura autoritária da Igreja, centrada no poder Papal. O homem se 
descobre como indivíduo, capaz de, pelo conhecimento, transformar a realidade 
segundo seus interesses. 
Além de decisivo para desenvolvimento da civilização moderna, na 
educação, o renascimento representou a retomada do ideal educativo grego. O 
cuidado com o corpo, a formação do homem perfeito e uma educação humanista5 
levou ao estudo das literaturas clássicas, o domínio das línguas e literatura e 
desenvolvimento de uma nova vida orientada pela razão e não mais pela fé. Ainda é 
importante lembrar que a ação educativa voltou-se para o que se considerava 
“superior”, a cultura européia. 
 
5 “Humanismo (do latim humanistas) Movimento intelectual que surgiu no Renascimento. Lutando 
contra a esclerose da filosofia escolástica e aproveitando-se de um melhor conhecimento da 
civilização greco-latina, os humanistas (Erasmo, Tomás Morus etc.) se esforçaram por mostrar a 
dignidade do espírito humano e inauguraram um movimento de confiança na razão e no espírito 
crítico. Na filosofia designa toda doutrina que situa o homem no centro de sua reflexão e se propõe 
por objetivo procurar os meios de sua realização; na linguagem universitária, designa a idéia segundo 
a qual toda formação sólida repousa na cultura clássica (chamada de humanidades). Numa palavra, o 
humanismo é a atitude filosófica que faz do homem o valor supremo e que vê nele a medida de todas 
as coisas”. (JAPIASSÚ, 1996, p.84) 
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Este período ainda vê o surgimento da revolução comercial do século XVI, a 
decadência do feudalismo, a pólvora que fragiliza a nobreza feudal, a imprensa e o 
papel ampliam a difusão da cultura. A bússola permite aumentar as distâncias com 
maior segurança. Os caminhos para as Índias, a conquista da América e o 
enriquecimento da burguesia. 
É neste contexto
que surge a divisão da igreja ocidental em meio a um 
conflito de natureza político-ideológica. Esta divisão ficou conhecida como Reforma 
e Contra-Reforma. A Reforma, movimento iniciado no século XVI e encabeçado por 
Lutero, ficou conhecido como de rebeldia, questionamento e libertação do poder da 
igreja católica. Lutero também recebe a adesão dos nobres, interessados no 
confisco dos bens do clero. As divergências não eram apenas religiosas, mas 
representavam as alterações sociais e econômicas que mergulhavam a Europa. 
O que começou como reforma religiosa, configurou-se como luta pela 
liberdade de consciência e de supremacia política e econômica, de aspirações 
sociais e nacionais. Este movimento também possibilitou em impulso para um novo 
sistema escolar, baseado na igualdade. A Reforma Protestante critica da Igreja 
Medieval, propõe o retorno às origens por meio da consulta direta ao texto bíblico, 
sem a intermediação estabelecida pela tradição cristã. Surge a característica da 
defesa da personalidade autônoma, que repudia a hierarquia e restabelece o vínculo 
direto entre Deus e o fiel. Este movimento foi germe para popularização da 
instrução, introduzindo o ideal de educação para todos e como atributo do estado. 
Frente a este contexto, a igreja católica reagiu com o movimento que ficou 
conhecido como contra-reforma. Foi uma reação da igreja católica a fim de recuperar 
o poder perdido. Teve por diretrizes, tomadas no Concílio de Trento (1545-1563), 
reafirmar os princípios da fé e a supremacia Papal por meio da criação de 
seminários, colégios e da inquisição atuante em Portugal e Espanha. 
A igreja católica condenou severamente a Reforma e providenciou a 
reorganização das escolas com base nas antigas tradições. O movimento chamado 
de Contra-Reforma, que durou por volta de dois séculos, pretendia o retorno a 
situação anterior ao Humanismo, no sentido de suprimir o espírito crítico da razão e 
submeter a religião aos ditames da autoridade eclesiástica. 
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A luta entre católicos e protestantes se deu, mais diretamente, no campo 
educacional. A Contra-Reforma instituiu o que ficou conhecido como Companhia de 
Jesus ou Jesuítas, fundada por Inácio de Loyola em 1540. A Companhia de Jesus 
surgiu como instrumento de luta contra a Reforma e seu fundamento consistia na 
máxima que tudo deve ser feito para maior glória de Deus. 
Este ideal previa o desaparecimento do indivíduo como personalidade 
autônoma e crítica. Seu principal objetivo era controlar por meio da educação, o 
povo em geral e, em especial, os nobres e a alta burguesia, facções propícias ao 
ideário protestante. Pode-se dizer que a Contra-Reforma foi um forte movimento de 
resgate da hegemonia da igreja católica, em detrimento de toda inovação política, 
ideológica e cultural. 
 
 
A EDUCAÇÃO JESUÍTICA NO BRASIL COLÔNIA 
 
Quando a terra-mãe era nosso alimento, quando a noite escura formava o 
nosso teto, quando o céu e a lua eram nossos pais, quando todos éramos 
irmãos e irmãs, quando nossos caciques e anciãos eram grandes lideres, 
quando a justiça dirigia a lei e a sua execução, aí outras civilizações 
chegaram. Com fome de sangue, de ouro, de terra e de todas as riquezas, 
trazendo em uma mão a cruz e na outra a espada, sem querer conhecer ou 
aprender os costumes de nosso povo. (Trecho da Declaração Solene dos 
Povos Indígenas) 
 
 
Para os portugueses o Brasil seria o paraíso bíblico, buscado por muitos 
navegadores e exploradores. De acordo com Holanda (2000), para os teólogos da 
idade média não se representava o paraíso terreal em um mundo intangível, 
incorpóreo, perdido no começo dos tempos, nem simplesmente alguma fantasia 
vagamente piedosa, e sim uma realidade ainda presente em sítio recôndito, mas 
porventura acessível. Representado por numerosos cartógrafos, afincadamente 
buscados pelos viajantes e peregrinos, pareceu descortinar-se, enfim, aos primeiros 
contatos dos europeus com o novo continente. 
 Américo Vespúcio em carta que ele descreve para Lourenço de Médici, em 
1504, deixa clara a primeira impressão que teve sobre a gente e a terra do Brasil. 
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Para ele, e para o imaginário de muitos exploradores, o paraíso poderia ser 
encontrado nas Américas. 
 
 Extremamente fértil e aprazível é a terra. As árvores, mormente ali 
vicejam sem cultura, e muitas dão frutos de agradável gosto e úteis ao 
corpo humano; outras, porém, nada produzem e nenhuns frutos ali existem 
semelhantes aos nossos. Pululam também, naquelas plagas, inumeráveis 
modalidades de ervas e raízes de que fabricam pão e excelentes alimentos. 
Têm eles, outrossim, muitas sementes, de todo em todo diversas das 
nossas. As árvores todas são ali odorosas e destilam goma, óleo ou outra 
essência, cujas propriedades, se conhecidas nos fossem, serviriam para 
guarnecer o corpo humano em minha opinião. E, em verdade, se o paraíso 
terrestre está localizado em alguma parte da terra, julgo que não dista muito 
daquelas regiões. (Castro, 1969, p.36). 
 
Dessa espécie de ilusão originária haveriam de partilhar indiferentemente os 
povoadores de nossa América, marcando vivamente o começo da expansão das 
nações ibéricas no continente. Era inevitável, não obstante, que o mundo 
paradisíaco chegasse a imprimir traços comuns e duradouros à colonização das 
várias regiões correspondentes a atual América Latina e com isso afirmando a teoria 
que estava na América e mais precisamente no Brasil, o Paraíso. Sendo um paraíso, 
tudo aquilo que era encontrado, poderia ser usufruído, para o prazer e deleite dos 
conquistadores. 
Para os desbravadores, estas terras, representavam a propriedade, a 
possibilidade do poder e de autoridade do dono de terras. Como era tida terra de 
ninguém os que para aqui vieram procuravam imitar hábitos da camada nobre de 
Portugal, hábitos aristocráticos de vida. 
No dia 29 de março de 1549, desembarcaram na vila de Pereira, depois Vila 
Velha, quatro padres e dois irmãos da Companhia de Jesus, liderados por Padre 
Manuel da Nóbrega. “Vinham os religiosos na armada do primeiro governador-geral 
Tomé de Sousa, e em pouco tempo começaram a exercer seu apostolado”. 
(CHAMBOULEYRON, 2004, pg. 55) 
A vinda da Companhia de Jesus, ao Brasil colônia, esteve relacionada com 
os propósitos do governo de Portugal. Naquele momento, os padres e sua missão 
facilitariam a implantação e manutenção do modelo econômico escravista-
mercantilista e a divulgação da fé e dos valores cristãos, ameaçados pela Reforma. 
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Além da conversão do “gentio” de um modo geral, o ensino das crianças, 
fora uma das primeiras e principais preocupações dos padres da 
Companhia de Jesus (...). Preocupação que, aliás, também se expressa no 
Regime do governador Tomé de Sousa, no qual o rei D. João III 
determinava que “aos meninos porque neles imprimirá melhor a doutrina, 
trabalhareis por dar ordem como se façam cristãos”. (CHAMBOULEYRON, 
2004, PG, 56) 
 
Foi esta determinação, de um governo preocupado com a manutenção da 
ordem, disciplina, domesticação para o serviço escravo e imposição da fé cristã,
que 
marcou o início da formação da identidade brasileira. Os padres Jesuítas ocuparam 
papel central neste modelo de formação educacional, característica do ideal de 
pessoa e sociedade que se pretendia formar aqui no Brasil. 
Naquele momento, os interesses implícitos e explícitos da ação jesuítica e do 
governo de Portugal não se faziam presentes aos gentios e crianças que aqui 
viviam. Assim como hoje, compreender a escolarização, suas origens, interesses, 
efeitos e, nesta imersão, perceber qual a herança deixada pelos jesuítas não é 
tarefa tão fácil de desempenhar. 
De acordo com Ariès (1981) até o século XV os colégios, estabelecidos por 
doadores, eram considerados asilos para estudantes pobres. Os estudantes viviam 
em comunidades democráticas, inspiradas em regras monásticas. Não se ensinava 
nos colégios e, foi somente no século XV que estas instituições comunitárias 
ganharam contornos de institutos de ensino, em que se começa a submeter os 
estudantes a uma hierarquia autoritária e de ensino local. 
 
Finalmente, todo o ensino das artes passou a ser ministrado nos colégios, 
que forneceriam o modelo das grandes instituições escolares do século XV 
ao XVII, os colégios dos jesuítas, os colégios dos doutrinários e os colégios 
dos oratorianos. (...) O estabelecimento de uma regra de disciplina 
completou a evolução que conduziu da escola medieval, simples sala de 
aula, ao colégio moderno, instituição complexa, não apenas de ensino, mas 
de vigilância e enquadramento da juventude. (...) no início aceitava sem 
dificuldade a mistura das idades. Chegou um momento em que surgiu uma 
repugnância nesse sentido (...) Desejava-se proteger os estudantes das 
tentações da vida leiga, (...) desejava-se proteger a sua moralidade. (...) as 
instituições de ensino, no início, consideradas meio de garantir a um jovem 
clérico uma vida honesta, (...) adquiriu um valor intrínseco, tornou-se a 
condição imprescindível de uma boa educação, (...) tornou-se um 
instrumento para a educação da infância e da juventude em geral. (Áries, 
1981, pg. 169) 
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A citação acima deixa a descoberto que a escola moderna não foi um 
processo construído “naturalmente”, no qual se objetivava inocentemente a 
transmissão desinteressada do conhecimento acumulado pela humanidade. Pode-se 
dizer que a escola moderna foi uma invenção a serviço do ensino, mas, em especial, 
de vigilância da disciplina e da moral. 
 Por isso, considera-se que não é possível pensar espaços/lugares/conteúdos 
alternativos, em direção a alteração de uma determinada ordem de organização e 
desenvolvimento escolar, sem uma inserção e compreensão histórica, das questões 
sociais, políticas, culturais e de poder que permearam o início da escolarização e se 
fazem ainda presentes. Nesta direção, acredita-se que a alteração de determinadas 
formas de pensamento e ação educacional passa pela reflexão e compreensão 
crítica da práxis, seus fundamentos teóricos e históricos, dos aspectos que se 
perpetuam, bem como, dos espaços de possível ruptura. 
 A educação jesuítica do Brasil colonial esteve relacionada com todo o 
movimento de emergência da escolarização no mundo. Os jesuítas tiveram grande 
influência na organização da sociedade brasileira e coube a eles orientar a 
população, desde os filhos dos senhores de engenho, colonos, escravos e índios, na 
fé cristã, na disciplina do corpo e do silêncio, nos valores morais, nas artes eruditas 
e nos costumes europeus. Aos índios coube, em especial, a catequese, a leitura e 
escrita e o idioma de Portugal. 
 
Desde o início, o rei de Portugal estava convencido que a catequese era o 
jeito mais eficaz e de menor custo para o domínio dos povos nativos do 
continente americano. Portanto a catequese era uma obra fundamental, 
para Deus e para o rei. A rigor, seus benefícios se fizeram sentir antes para 
o rei do que para Deus, uma vez que a dúvida se os índios tinham alma só 
foi dirimida quando o projeto colonizador já estava decolando. (HECK, 2000, 
p.20) 
 
Desde a chegada no Brasil, os portugueses e colonizadores colocaram o 
índio à mercê de três interesses. A metrópole desejava integrá-lo ao processo 
colonizador, os jesuítas desejavam convertê-lo ao cristianismo e aos valores 
europeus, e os colonos queriam usá-lo como escravo para o trabalho. A elite da 
época considerava-os seres sem alma, bichos, feitos para serem domesticados e 
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instruídos a base da violência e de opressão. De acordo com Ferreira (2001), as 
práticas educacionais objetivavam negar a diversidade indígena e incorporá-las à 
sociedade nacional. 
No início os padres visitavam as aldeias e ensinavam as crianças a ler, a 
escrever, a contar e a doutrina cristã. Contudo, como o trabalho de conversão e 
adaptação do indígena para a lavoura exigia sua presença para um treinamento 
cotidiano e continuado, empenharam-se, em organizar aldeias, para atrair o indígena 
da região. Estas aldeias ficaram conhecidas como missões6. Além disso, 
organizaram escolas elementares e colégios e, acima de tudo, propagaram um 
projeto pedagógico uniforme, tão bem planejado que é possível perceber nos 
tempos atuais seus reflexos. 
Com o tempo, o objetivo primeiro que era a obra da catequese, acabou 
cedendo lugar a educação da elite. Embora sua principal missão fosse a conversão 
dos índios, a fundação de colégios acabou por assumir, senão a primazia, 
importância comparada à outra. Pode-se dizer que a educação jesuítica acabou 
empreendendo-se na formação da elite letrada no Brasil, ou seja, dos padres e 
senhores de engenho. Uma concepção que acabou por assumir contornos elitistas, 
almejada por todos que procuravam status, como símbolo de classe e de distinção, 
que demarcou as raízes fundantes da organização do ensino nacional. 
Diante deste cenário, pode-se dizer que o ensino no Brasil foi se constituindo 
instrumento de subjetivação e sujeição, visando atender aos interesses de uma elite. 
Segundo Di Giorgi (2004, p.109), “torna-se claro que a realidade de sala de aula é 
um simulacro de aprendizagem. O modelo “copiar, repetir, memorizar” é amplamente 
 
6 As Missões foram edificações construídas sob o comando dos padres jesuítas na selva brasileira. 
Estas construções se organizaram por todo o litoral brasileiro, e ainda o Paraguai, Argentina e 
Uruguai. Objetivavam acolher os índios e cultivar o esplendor da arte e cultura européia e o 
desenvolvimento urbano ainda não conhecido. As reduções não eram aldeias, mas verdadeiras 
cidades que se instalavam nas selvas, com toda a infra-estrutura; além da igreja, que era o centro de 
tudo, havia hospital, asilo, escolas, casa e comida para todos e em abundância, oficinas e até 
pequenas indústrias. Fabricavam-se todos os instrumentos musicais, tão bem quanto na Europa, e 
até, imprimiam-se livros em plena selva, alguns até em alemão. Possuíam observatório astronômico e 
até editavam um boletim meteorológico. Foi nessas reduções que se começou a industrializar o ferro, 
a produzir os primeiros tecidos, e a se criar gado no continente. Ocupavam essas reduções as mais 
diversas tribos indígenas, desde guaranis, tapes, chiquitos, entre outros. 
(www.riogrande.com.br/historia/missoes_a.htm) 
 
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predominante, deixando quase nenhum espaço para o questionamento crítico, para 
o pensamento independente, para a criatividade”. 
O governo de Portugal ao perceber como a educação vai se configurando 
importante meio de submissão e de domínio político, não intervém nos planos dos 
jesuítas. Permite que se estabeleça o ideário que à elite caberia o trabalho não 
braçal, próprio dos que ocupariam os futuros cargos políticos, religiosos, advocacia, 
economia, etc. Em suma, o poder político, econômico e cultural da colônia. 
 
(...) Símbolo de classe, esse tipo de educação livresca, acadêmica e 
aristocrática foi fator coadjuvante na construção das estruturas de poder na 
colônia. Isso porque a classe dirigente, aos poucos, foi tomando 
consciência do poder dessa educação na formação de seus representantes 
políticos junto ao poder público. (Romanelli, 1978, p.36) 
 
Infelizmente até hoje, a educação tem se estabelecido como instrumento 
para distinção de classe e exclusão social. O fato de a grande maioria da população 
não ter acesso à cultura, saúde, lazer, alimentação e educação de modo geral, 
revela que muito da tradição dos antepassados continua presente na organização da 
sociedade brasileira, sejam nas práticas pedagógicas realizada na grande maioria 
das escolas; nas diretrizes legais que orientam e organizam o ensino; nos discursos 
sobre a educação atual. 
As raízes da educação Jesuítica, em especial, o comprometimento para 
com a formação da elite brasileira, marcaram profundamente a história da educação 
brasileira. Este desenho atingiu nossa educação, mais precisamente até a 
constituição de 1988. Para Moreira (1995), até o final dos anos 80 o Brasil ainda 
carecia de um ensino básico universal de boa qualidade e uma nova Lei de 
Diretrizes e Bases da Educação. Diante das reivindicações dos setores populares e 
sindicais, por políticas de caráter mais transparentes e participativas, com vistas à 
democratização do estado, nasce o texto da constituição de 1988. 
Foi somente a partir de 1988 que surge no texto da constituição a 
possibilidade da participação pública em todos os espaços de decisão colegiada das 
instituições públicas, com exceção das instituições privadas. Também, pela primeira 
vez, se torna explícito o compromisso do Estado, em regime de colaboração com as 
famílias, para com a garantia de igualdade de condições de acesso, permanência na 
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escola e gratuidade do ensino público nos estabelecimentos oficiais, desde o 
primário ao superior. 
Esta realidade marca claramente o descompromisso, até aí, para com 
políticas públicas que garantissem a igualdade de condições educacionais no Brasil. 
Todas as constituições anteriores apontavam a necessidade da oferta do ensino 
público para todos. Contudo, no texto das mesmas, não se pronunciava as formas 
como os cofres públicos fariam para manutenção do ensino, oferta de novos 
estabelecimentos e contratação de profissionais adequados. 
No Brasil, a educação jesuítica passou por dois momentos principais. A 
primeira fase iniciou em 1549 com a chegada dos jesuítas e perdurou até 1570, 
quando morre Pe. Manoel da Nóbrega. 
 
Nóbrega elaborou um plano de ensino que caracterizou essa fase. Esse 
plano tinha inicio com o aprendizado do português, da doutrina cristã, a 
escola de ler e escrever, algumas vezes canto orfeônico e música 
instrumental, culminando, de um lado com a aprendizagem profissional e 
por outro lado à gramática latina a qual era destinada para aqueles que 
continuariam seus estudos na Europa. (SAVIANI, 2004, p. 126) 
 
 
A infância era um tema em plena discussão neste período7. A descoberta da 
mesma como um estado/período diferenciado do adulto acabou por determinar que 
desta poder-se-ia esperar muito mais, em termos de aprendizagens e conversão, do 
que dos adultos. De acordo com Chambouleyron (2004), a proposta educacional de 
Nóbrega previa desde atividades do cotidiano, como caça, pesca, até doutrina, 
missa e procissões, articulados com o aprendizado das artes, leitura, escrita e 
cálculos, por meio de estratégias pedagógicas como a memorização e o catecismo 
dialogado. 
A segunda fase caracterizou-se pela proposta pedagógica que, seguindo a 
orientação do Real Colégio das Artes de Coimbra, chamava-se Ratio Studiorum. 
Esta proposta foi dos anos de 1570 a 1759 e se constituía num manual de instrução 
que tinha como concepção, uma pedagogia tradicional característica de uma visão 
assistencialista de homem, na qual se compreendia que o mesmo era constituído 
por uma essência universal e imutável, em que todas as coisas já estavam prontas e 
 
7 Para saber mais Ariés (1981) 
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determinadas. Á educação, cabia apenas conformar os alunos segundo a essência 
universal. Buscava-se a perfeição humana para atingir a dádiva da vida celestial. 
O Ratio Studiorum teve como base à unidade da matéria, a unidade do 
método. O assunto estudado deveria contemplar poucos autores, de preferência 
aqueles ligados ao pensamento oficial da Igreja, como Tomás de Aquino, bem como, 
princípios como a disciplina rígida, o cultivo da atenção e da perseverança nos 
estudos, o silêncio, a repetição e memorização, a copia e o ditado, a competição, a 
premiação, a prova, o castigo, coadunado com o respeito a hierarquia e baseado na 
obediência, controle e meritocracia. 
Com o passar do tempo, como muitos índios ao atingirem a juventude 
retornavam aos costumes e práticas de seu povo, se foi reforçando a hipótese que 
era preciso uma “conversão pela sujeição e temor (...). Essa perspectiva foi tomando 
consistência e organizando a estruturação de um rígido sistema disciplinar, (...) que 
desde o século XV, dependia de uma vigilância constante, da delação e dos castigos 
corporais. (CHAMBOULEYRON, 2004, PG, 69) 
Nos dias atuais, os mecanismos de punição e vigilância têm assumido 
contornos muito mais sutis. Diferentemente do século XVI, a vigilância e a punição 
têm se manifestado por meio da mídia, da política, dos discursos da igreja, dos 
modelos/padrões de consumo, que acabam por revogar as melhores formas de lidar 
com a diversidade de culturas, de classe social, de maneiras de ser, das questões 
relativas a gênero, raça, etnia, sexualidade. Neste contexto, se nós educadores, não 
estivermos atentos, seremos facilmente levados a pensar, agir e ensinar de acordo 
com interesses para nós pouco explícitos e questionados. 
Entre 1554 e 1570 os jesuítas fundam cinco escolas de instrução elementar 
(Porto Seguro, Ilhéus, Espírito Santo, São Vicente e São Paulo de Piratininga) e três 
colégios (no Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia). O currículo dividia-se em duas 
seções ou classes distintas. Nas classes inferiores, com duração de seis anos, 
ensinava-se retórica, humanidades, gramática portuguesa, latim e grego. Nas 
classes superiores, com três anos, os alunos aprendiam matemática, física, filosofia, 
que incluía lógica, moral e metafísica, além de gramática, latim e grego. 
No Brasil, persevera até hoje uma infinidade de colégios, universidades, 
centros de reflexão social, casas para retiros espirituais, paróquias,
etc, ligadas à 
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ordem jesuíta. Pode-se encontrar, dividido em quatro províncias e um distrito, uma 
infinidade de instituições. No Brasil as províncias estão divididas em: Brasil Centro-
Leste ( SP, MG, RJ, DF, GO e TO), Brasil Meridional ( PR, SC, RS, MT, MS e RO), 
Brasil Setentrional (CE, RN, PB, PE, AL e SE), Brasil Leste-Equatorial (Bahia) (AP, 
MA, PI, BA e ES) e Distrito da Amazônia (AC, AM, RR e PA). 
Muito da proposta educacional jesuítica se percebe presente nos diferentes 
estabelecimentos de ensino, sejam eles públicos ou privados. É uma constante, no 
interior das escolas, o interesse e ocupação para com a formação de valores, a 
imposição de uma disciplina do corpo, da perseverança nos estudos, de hierarquias 
e, pedagogicamente, estratégias didáticas como: o aluno “líder”, exemplo a seguir e 
delator, a memorização, a competição, o silêncio, etc. 
 
A EXPULSÃO 
 
Em 1759, o Marquês de Pombal, expulsa os jesuítas de Portugal e de todos 
os seus domínios, destruindo completamente a organização educacional existente 
em terras brasileiras. Sebastião de Carvalho e Melo, mais conhecido como Marquês 
de Pombal, comandou durante 27 anos a política e economia portuguesa. Ele foi 
nomeado por D. José I (1750-1777), primeiro ministro de Portugual, no qual 
reorganizou o Estado e protegeu os grandes empresários, criando as companhias 
monopolistas de comércio. De acordo com Gauer 
 
 O projeto de reformas implantadas por Pombal, pressupunha um 
dinamismo próprio da velocidade moderna e almejava a homogeneização 
da sociedade. Entre as estratégias utilizadas por Pombal temos: a 
homogeneização do Estado, a organização das grandes instituições sociais 
nesse caso, a reorganização da Universidade e do ensino do Reino. Essas 
reformas atingiram o Brasil ocasionando algumas transformações. (GAUER, 
2004, pg. 148) 
 
A colônia era peça importante na política econômica de Pombal. Além da 
criação das companhias de comércio, que, privilegiadas pelo monopólio, tinham 
liberdade de taxar os preços de compra e venda dos produtos, houve o aumento da 
cobrança de impostos, na região das Minas, onde foram criadas as casas de 
fundição e fixadas quotas anuais de produção de ouro. 
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 O estado português, representado pelo rei, chamou para si a 
responsabilidade de realizar a reforma do ensino em geral e da 
universidade; a ação do estado teve como principal função a organização de 
uma equipe de especialistas chefiada pelo Marquês de Pombal, que 
reformou o ensino vinculando-o aos interesses da época, cujo objetivo 
fundamental consistia em implantar um ensino laico que levasse ao 
progresso. Dados esses pressupostos e tomando a linha da concepção de 
ciência que a comissão responsável pela Reforma demonstrou, é possível 
perceber que Pombal e equipe de reformadores que o assessorava 
concebiam o campo científico como o caminho para construir o verdadeiro 
homem, o progresso econômico e social, a felicidade humana, o encontro 
do verdadeiro Deus, assim como para chegar ao conhecimento da 
verdadeira natureza. Na visão dos reformadores, a ciência teve um sentido, 
o de solucionar os problemas humanos, de transformar a história da 
civilização portuguesa; nessa civilização estavam incluídas as colônias onde 
o Brasil se insere. (GAUER, 2004, pg. 149) 
 
Em conformidade com uma política de consolidação do domínio português no 
Brasil, Pombal por meio do Tratado de Madrid, ampliou as fronteiras econômicas, 
tanto no Norte quanto no Sul, entrando em confronto direto com as missões 
jesuíticas. Acusando os jesuítas de conspirar contra o Estado, expulsou-os de 
Portugal e de seus domínios em 1759, confiscando seus bens. A França, a Espanha 
e os demais países europeus adotaram a mesma medida, e o próprio Vaticano 
extinguiu a ordem em 1773. 
O controle das missões passou para os funcionários do governo. As capelas 
tornaram-se paróquias, com vigários nomeados pelo rei; os indígenas deveriam 
deixar de ter “nomes bárbaros”, passando a ter nomes portugueses; as línguas 
nativas foram proibidas e a língua portuguesa tornou-se obrigatória. Os caciques 
viraram capitães e juízes, e as lideranças passaram a ser vereadores municipais. 
Todos os indígenas, a partir daquele momento, se tornariam cidadãos portugueses. 
Na visão de Portugal, este seria o fim do "atraso" no Brasil. A educação, que 
no Brasil era quase inteiramente de responsabilidade dos jesuítas, sofreu um grande 
recuo. Vinte anos após a expulsão, em toda a Bahia não havia mais que dois 
professores. Várias escolas foram fechadas e as bibliotecas dos conventos foram 
abandonadas ou destruídas. 
 Como não se contava com infra-estrutura e professores especializados, 
ficcaram uma grande lacuna nos serviços educacionais, cuja solução, 
posteriormente encontrada, foi instituir aulas régias, avulsas, sustentadas por um 
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novo imposto colonial, o “subsídio literário”. Essas aulas deviam suprir as disciplinas 
antes oferecidas nos extintos colégios. Através delas, a mesma reduzida parcela da 
população colonial continuava se preparando para estudos posteriores na Europa. 
Sem sistematização, sem freqüência definida, sem pessoal docente em 
quantidade e qualidade suficientes, a instrução no país foi drasticamente limitada, 
até 1799, quando as licenças para docentes passaram a ser concedidas pelo vice-
rei. 
Com a vinda de D. João VI para o Brasil, em 1808, houve investimentos no 
ensino técnico e no superior; foi criada a Academia da Marinha e a Academia Militar, 
para atender as necessidades de defesa militar do reino. No entanto a educação do 
povo, com estudos primários e médios, ficou esquecida. Durante todo o período 
colonial houve poucos e localizados avanços educacionais, com criação de algumas 
salas e graus. 
 
PARA MAIOR GLÓRIA DE QUEM? : CONSIDERAÇÕES DESTE PROCESSO 
 
A investigação da educação brasileira, em especial do período jesuítico, 
permitiu perceber que o discurso da escola como instituição legitimada socialmente 
para conduzir as novas gerações ao saber elaborado, sistematizado e 
historicamente produzido pela humanidade constitui-se como engodo. 
Esta instituição que no imaginário teve o papel de socializar e democratizar o 
conhecimento, se investigada em suas origens revela que o sistema educacional 
brasileiro carrega em si características de um ensino pensado, idealizado e criado 
para atender aos interesses de alguns sobre o domínio de outros. 
Nos dois séculos que permaneceu no Brasil, a educação jesuítica, tomou os 
rumos de uma educação elitista, aristocrática e colonizadora, nada atenta aos 
interesses e necessidades do povo brasileiro. 
As características do modelo pedagógico e organizacional do ensino 
jesuítico, bem como das ideologias e interesses que permearam sua constituição e 
permanência no Brasil, por mais de dois séculos, ainda permanece vivo em boa 
parte das escolas brasileiras e concepções educacionais. 
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No caso do Brasil, pode-se dizer que o mergulho histórico permitiu 
compreender que a educação dos séculos XVI ao XVIII previa a formação de um ser 
“dócil” e “educado”. A ênfase foi na formação individual, na idéia de que é preciso 
controlar individualmente as “almas”. No fundo, objetivava-se descobrir os “dons” e 
“vocações” que serviriam a Deus, possíveis de serem descobertas pelos guias 
espirituais, os padres jesuítas. 
Infelizmente, ainda hoje se percebe em muitas propostas educacionais a 
idéia de que a educação deve ser a possibilidade de desvelamento dos dons e 
capacidades individuais a serviço do bem. Neste processo, o professor é tido como 
aquele que é o principal responsável por este desvelamento. Aquele que tem o 
“Dom” de descobrir o bem e orientar o melhor caminho. 
Em pesquisa a cerca dos objetivos que regem as escolas jesuítas no Brasil 
encontramos: 
 
Um dos objetivos da formação cristã presente em todas as instituições 
jesuítas é não apenas ajudar jovens e adultos a praticar individualmente sua 
fé, mas torná-los cada vez mais conscientes das exigências de sua vocação 
cristã que é essencialmente apostólica, missionária. (http://venus.rdc.puc-
rio.br/jesuitas) 
 
Esta citação torna explícita a lógica da vocação como a melhor opção a 
serviço do bem. É interessante como a obra da missão ultrapassa séculos e 
permanece viva e atuante. Ainda é mais intrigante o fato de, socialmente, estes 
modelos de formação constituirem-se exemplo de respeito e excelência em termos 
de ensino e educação. Para Silva (2003), o que não se pode negar é que toda a 
obra jesuítica foi um exemplo de política educacional consistente e definida, de 
acordo com os objetivos políticos e desejos formativos que se tinha na época. 
Pode-se dizer que carecemos de estudos que permitam compreender que 
as escolhas educacionais e a forma de organizar os tempos/espaços escolares e os 
conteúdos pedagógicos não é nunca neutra e sim resultado de inter-relações com 
outras instituições sociais e relações de poder. De forma explicita ou não, o ato 
educativo é sempre um ato de controle social, de imposição de um modelo, de um 
ideal a seguir, na medida em que na escolarização se cruzam sempre conteúdos 
políticos, sociais e culturais, condutores do fazer e ensinar. 
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 Por isso, compreender o momento atual e que forças o regem deve se 
constituir movimento permanente. É preciso que nós, professores, façamos 
constantemente um exercício de reflexão e compreensão de nossas ações e opções 
pedagógicas. Talvez por meio do questionamento constante e da investigação dos 
fundamentos históricos da educação brasileira, possamos compreender os impactos 
que a mesma encerra sobre todos os seres humanos e dos que ainda terá sobre a 
educação no futuro. 
 
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Aulas/Aula 2 Reforma Pombalina.pdf
465Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.3, p. 465-476, set./dez. 2006
A educação brasileira no período pombalino: uma
análise histórica das reformas pombalinas do ensino
Lizete Shizue Bomura Maciel
Pontifícia Universidade Católica-SP
Alexandre Shigunov Neto
Universidade Federal de Santa Catarina
Resumo
Os autores, por meio de um recorte histórico, apresentam um es-
tudo de caráter bibliográfico, a partir do qual analisam o ensino
brasileiro, ao focalizar especialmente a proposta de reforma edu-
cacional realizada por Marquês de Pombal. Nessa análise, apontam
para as conseqüências da proposta pombalina para a educação
brasileira e portuguesa, em cujo contexto social estavam presentes
idéias absolutistas, de um lado, e idéias iluministas inspiradoras de
Pombal, de outro lado. Os estudos estão centrados na fase
governativa de Pombal, isto é, como ministro da Fazenda do rei
D. José I e, como tal, buscou empreender reformas em todas as
áreas da sociedade portuguesa, inclusive atingindo o Brasil como
colônia, visando dar-lhe uma unidade. A análise crítica converge
para a afirmação de que a reforma pombalina foi desastrosa para
a educação brasileira e, em certa medida, também para o sistema
educacional português. Tal afirmação está fundamentada na se-
guinte questão – destruição de uma organização educacional já
consolidada e com resultados seculares dos padres da Companhia
de Jesus, ainda que contestáveis do ponto de vista social, históri-
co, científico, sem que ocorresse a implementação de uma nova
proposta educacional que conseguisse dar conta das necessidades
sociais. Portanto, a crítica que se pode formular, nesse sentido, e
que vale para
o momento atual de nossa sociedade, está relacio-
nada às freqüentes descontinuidades das políticas educacionais.
No entanto, torna-se necessário enfatizar que a substituição da
metodologia eclesiástica dos jesuítas pelo pensamento pedagógico
da escola pública e laica marca o surgimento, na sociedade, do
espírito moderno.
Palavras-chave
Marquês de Pombal – Reforma educacional – Iluminismo – Escola
pública.Correspondência:
Lizete Shizue Bomura Maciel
Rua Santos Dumont, 2173 – apto.
1201
87013-050 – Maringá – PR
e-mail: newliz@uol.com.br
Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.3, p. 465-476, set./dez. 2006466
Brazilian education in the Pombaline period: a
historical analysis of the Pombaline teaching reforms
Lizete Shizue Bomura Maciel
Pontifícia Universidade Católica-SP
Alexandre Shigunov Neto
Universidade Federal de Santa Catarina
Abstract
The authors center on a historical period to present a study of
bibliographical character, on which basis they analyze education
in Brazil by focusing specifically on the proposal for educational
reform made by the Marquis of Pombal. Along the analysis they
point to the consequences of the Pombaline reform to Brazilian
and Portuguese education, whose social context included, on the
one hand, Absolutist ideas, and on the other, the Enlightenment
ideas that inspired Pombal. The studies concentrate on Pombal’s
period in government, namely when he, as Ministry of the
Treasure of King José I, tried to carry out reforms in all areas of
the Portuguese society, affecting Brazil as a colony, in an attempt
to give it unity. The critical analysis converges to the conclusion
that the Pombaline reform was disastrous for Brazilian education
and, to a certain extent, also to the Portuguese education
system. This assertion is based on the following issue: the
destruction of the time-honored, consolidated – albeit
questionable from social, historical, and scientific viewpoints –
educational organization of the Jesuit priests, without the
implementation of a new educational proposal capable of
coping with societal needs. Therefore, the criticism that can be
formulated here, and that is valid for the current moment of our
own society, relates to the frequent discontinuities of the
educational policies. However, it must be emphasized that the
substitution of the ecclesiastical methodology of the Jesuits by
the pedagogical thinking of the public, lay school signals the
arrival, in that society, of the spirit of Modernity.
Keywords
Marquis of Pombal – Educational reform – Enlightenment – Public
school.
Contact:
Lizete Shizue Bomura Maciel
Rua Santos Dumont, 2173 – apto.
1201
87013-050 – Maringá – PR
e-mail: newliz@uol.com.br
467Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.3, p. 465-476, set./dez. 2006
Considerações iniciais
Sebastião José de Carvalho e Melo,
conde de Oeiras, mais conhecido como Marquês
de Pombal, nasceu em 13 de maio de 1699.
Pertencia a uma família da pequena nobreza,
desconhecida, e não relacionada à nobreza por-
tuguesa. Durante um curto período de tempo,
fez parte do exército e foi membro da Acade-
mia Real de História. Iniciou-se na vida públi-
ca somente a partir de 1738, quando foi nome-
ado para desempenhar as funções de delegado
de negócios em Londres.
Segundo Avellar (1983), sua permanên-
cia em Londres criou-lhe uma aversão pelos
ingleses e “[...] seus métodos de dominação
econômica” (p. 9). Tal antipatia pôde ser nota-
da em suas medidas antibritânicas que visavam
obstinadamente libertar o comércio português da
subordinação ao poderio inglês. O enviado in-
glês, em Lisboa, chegou a ponto de realizar o
seguinte comentário: “esse homem tem-nos feito
muito mal” (p. 9). Durante sua duradoura esta-
da na cidade londrina, Marquês de Pombal não
chegou a aprender o idioma inglês, pois desde
os tratados de Vestfália, em 1648, o idioma fran-
cês era considerado a língua diplomática.
A vida de Marquês de Pombal pode ser
dividida em quatro grandes fases. A primeira é
referente aos seus interesses particulares, isto é,
a fase do cidadão Sebastião José de Carvalho
e que compreende o período de 1699 a 1738.
Nesse momento temporal, o cidadão dedica-se
exclusivamente aos interesses de pequeno fidal-
go. Encerra tal fase com a tentativa frustrada de
compor o Conselho de Fazenda do rei D. João
V. A segunda é a fase diplomática, relativa ao
período de 1738 a 1749, em que exerce suas
funções diplomáticas em Londres e Viena. A
terceira corresponde à fase governativa e esta
se torna a mais importante de sua vida, pois, no
reinado de D. José I1 , que durou de 1750 a
1777, acabou por dirigir os negócios do país.
A última fase refere-se ao período do exílio,
compreendido entre a morte de D. José I, em
1777, e sua própria morte, em 1782.
Marquês de Pombal, de acordo com
Rêgo (1984) e Serrão (1982), foi fortemente
influenciado em sua formação política, quando
de sua passagem em Viena como diplomata
(1745-1749), uma vez que se pode
[...] afirmar que foi nessa capital do espírito
que o ministro português, em contato com o
mundo da política e da diplomacia, bebeu os
grandes princípios do Despotismo Iluminado
que haveria de aplicar no seu regresso ao país.
E de lá trouxe igualmente, no entender de Ma-
ria Alcina Ribeiro Correia, as idéias econômicas
e culturais que serviram de trave-mestra do seu
governo. (Serrão, 1982, p. 22)
A formação de Pombal também sofreu
influência da política econômica inglesa, pois
procurou as soluções da crise portuguesa no
modelo inglês. Contudo, um dos motivos pelos
quais não obteve o êxito esperado foi pela exis-
tência de uma contradição fundamental: a dife-
rença no sistema político dos dois países. Em
Portugal, estava presente o absolutismo e, na
Inglaterra, o sistema instituído era o parlamentar.
Ao assumir o cargo de ministro da Fa-
zenda do rei D. José I, em 2 de agosto de 1750,
no lugar de Azevedo Coutinho, Pombal empre-
endeu reformas em todas as áreas da sociedade
portuguesa: políticas, administrativas, econômi-
cas, culturais e educacionais. Essas reformas
exigiam um forte controle estatal e eficiente
funcionamento da máquina administrativa e fo-
ram empreendidas, principalmente, contra a
nobreza e a Companhia de Jesus, que represen-
tavam uma ameaça ao poder absoluto do rei.
A Companhia de Jesus, ordem religiosa
formada por padres (conhecidos como jesuítas), foi
fundada por Inácio de Loyola em 1534. Os jesu-
ítas tornaram-se uma poderosa e eficiente congre-
gação religiosa, principalmente, em função de seus
princípios fundamentais: busca da perfeição huma-
1.D. José I (1714-1777), filho e sucessor de D. João V, casou-se com D.
Mariana Vitória e teve quatro filhas (D. Maria I, D. Maria Ana, D. Maria
Francisca Dorotéia e D. Maria Francisca Benedita). Recebeu grande cola-
boração e influência, em seu governo, do Marquês de Pombal.
468 Lizete MACIEL e Alexandre SHIGUNOV NETO. A educação brasileira no período pombalino:...
na por intermédio da palavra de Deus e a vonta-
de dos homens; obediência absoluta e sem limites
aos superiores; disciplina severa e rígida; hierarquia
baseada na estrutura militar; valorização da apti-
dão pessoal de seus membros. Tiveram grande
expansão nas primeiras décadas de sua formação,
constatada pelo crescimento de seus membros. Em
1856, eles contavam com mil membros e, em
1606, esse número cresceu para treze mil. A Ordem
dos Jesuítas não foi, entretanto, criada só com fins
educacionais; ademais, é provável que no come-
ço não figuravam esses fins entre os seus propó-
sitos, uma vez que a confissão, a pregação e a
catequização eram as prioridades. Os ‘exercícios
espirituais’ transformaram-se no principal recurso,
os quais exerceram enorme influência anímica e
religiosa ente os adultos. Todavia, pouco a pouco,
a educação ocupou um dos lugares
mais impor-
tantes, senão mais importante, entre as suas ativi-
dades. A Companhia de Jesus foi fundada em ple-
no desenrolar do movimento de reação da Igreja
Católica contra a Reforma Protestante, podendo ser
considerada um dos principais instrumentos da
Contra-Reforma nessa luta. Tinha como objetivo
sustar o grande avanço protestante da época e,
para isso, utilizou-se de duas estratégias: a edu-
cação dos homens e dos indígenas; e a ação
missionária, por meio das quais procuraram con-
verter à fé católica os povos das regiões que es-
tavam sendo colonizadas.
Teixeira Soares (1961) apresenta como
problemas fundamentais da administração do
Governo de D. João I2 , antecedente do gover-
no de D. José I, e que vieram a ser combatidas
pelo Marquês de Pombal: o apego à rotina,
evitando a realização de reformas necessárias e
úteis ao funcionamento da estrutura adminis-
trativa do Estado, principalmente, em relação
ao regime fazendário e à administração ultra-
marina; o desinteresse pela instrução pública,
que na Coroa portuguesa era um privilégio dos
nobres e da burguesia; o obscurantismo exis-
tente em todos os níveis do governo e que
dificultaram as reformas necessárias.
Avellar, ao analisar as reformas empreen-
didas por Marquês de Pombal, avalia que este
possuía um profundo conhecimento da realida-
de portuguesa, motivo pelo qual pretendia efe-
tivar uma reformulação cultural, política e eco-
nômica na sociedade portuguesa. Portanto,
[...] é o reconhecimento de que o insucesso de
aspectos de sua administração se deve a fator
sobre o qual não poderia o Ministro exercer
controle seguro. Assim mesmo, não se poderá
afirmar que descurasse da consciência nacional,
se laicizou a administração, e fez pontos de
apoio de sua temática econômica a idéia de li-
bertar o comércio da regulação britânica, a da
necessidade de proteger e desenvolver a indús-
tria nacional e, de sua programática educacio-
nal, a indispensabilidade de retornar os estudos
menores e superiores, impulsionar o ensino pro-
fissional (aulas de comércio e artilharia), bem
como, de seu breviário social, libertar o negro
no Reino e o índio no ultramar, salvando, com
a erradicação da administração comunal
jesuítica no Estado do Maranhão, a unidade
lingüística do Brasil, como vários autores já
proclamaram. (1983, p. 12)
Para atingir um de seus objetivos, a
transformação da nação portuguesa, Marquês
de Pombal precisaria inicialmente fortalecer o
Estado e o poder do rei. Isso seria possível por
meio do enfraquecimento do prestígio e poder
da nobreza e do clero que, tradicionalmente,
limitavam o poder real. Assim, como afirma
Ribeiro (1998, p. 30), o então ministro “orien-
tava-se no sentido de recuperar a economia por
intermédio de uma concentração do poder real
e de modernizar a cultura portuguesa”.
Marquês de Pombal, ao assumir o car-
go de Ministro, formulou e implementou refor-
mas administrativas, visando tornar mais ágil e
eficiente a máquina administrativa do Estado e
2. D. João I (1357-1433) era filho bastardo do rei D. Pedro e de Teresa
Lourenço. Governou Portugal de 1385 até sua morte em 1433. Para Serrão
(1982), D. João I foi o maior rei português do século XV e um dos maiores
de toda história portuguesa. Ficou famoso por sua ‘firmeza governativa e
pela visão política’, as quais mostram a presença de sinais do Estado
moderno em formação.
469Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.3, p. 465-476, set./dez. 2006
aumentar a arrecadação. Ainda no campo das
reformas administrativas e econômicas, preten-
dia com essas medidas dinamizar a economia
nacional e incentivar o desenvolvimento das
indústrias e das companhias de comércio –
surgiram indústrias têxteis de seda e de lã;
chapéu; tapetes; fundições; cerâmicas; laticíni-
os; vidros; sabão; entre outras. Contudo, suas
tentativas de consolidar um pólo industrial forte
e em condições de competir, no mercado inter-
no e externo, durou pouco. Isso ocorreu por-
que muitas indústrias tiveram curto período de
funcionamento em virtude da pequena deman-
da do mercado interno, que optaram por pro-
dutos manufaturados ingleses, de melhor qua-
lidade que os produtos portugueses. Há ainda
que se destacar que Pombal descuidou-se da
política agrícola, dando pouca atenção aos seus
problemas.
As reformas do Marquês de Pombal
também atingiram a colônia brasileira, ao visar
a reformulação dos serviços públicos por meio,
principalmente, do combate à sonegação de
impostos. Sua preocupação orientava-se no
sentido de proporcionar uma unidade, um con-
junto à colônia brasileira. Foi durante o seu
governo que a cidade do Rio de Janeiro teve
um extraordinário desenvolvimento, com desta-
que para seu porto e o aumento da população.
Entretanto, o recorte deste estudo deter-se-á
mais especificamente nos atos educacionais de
sua administração.
Marquês de Pombal e as
reformas educacionais
A partir do século XVI, a direção do
ensino público português desloca-se da Univer-
sidade de Coimbra para a Companhia de Jesus,
que se responsabiliza pelo controle do ensino
público em Portugal e, posteriormente, no Bra-
sil. Praticamente, foram dois séculos de domínio
do método educacional jesuítico, que termina
no século XVIII, com a Reforma de Pombal,
quando o ensino passa a ser responsabilidade da
Coroa Portuguesa.
Segundo Falcon (1993), a análise de
historiadores e pesquisadores acerca das obras
e da vida de Marquês de Pombal pode ser
constituída de seis momentos bem próprios: no
primeiro, encontram-se os seus contemporâne-
os; no segundo, surgem os admiradores e os
críticos imediatos de suas obras; no terceiro,
estão os liberais e o mito do liberalismo
pombalino; no quarto, encontram-se os conser-
vadores e o mito da tirania pombalina; no
quinto, estão os estudos e as investigações
apresentadas por pesquisadores e historiadores
durante a primeira metade do século XX; no
sexto e último momento, iniciado em 1945,
encontram-se as análises mais recentes.
[...] ainda hoje, os alvarás e provisões pombalinos
são examinados como se não houvesse um outro
caminho entre a alternativa que então se propôs:
jesuitismo e antijesuitismo. Nesta alternativa, os
jesuítas representam para os historiadores tudo o
que há de antimoderno e Pombal, com seus ho-
mens, a autêntica antecipação das aspirações
modernas. Ora, forçoso é reconhecer que os ter-
mos desta alternativa constituem um dos mais
graves impedimentos para a justa compreensão de
um dos momentos mais lúcidos da história lusita-
na. (Carvalho, 1978, p. 29)
Na administração de Pombal, há uma
tentativa de atribuir à Companhia de Jesus todos
os males da Educação na metrópole e na colônia,
motivo pelo qual os jesuítas são responsabilizados
pela decadência cultural e educacional imperante
na sociedade portuguesa.
Carvalho (1978) chama a atenção para
o fato de que esse processo, denominado de
antijesuitismo, representava uma atitude pre-
sente em muitos países europeus, não sendo
exclusividade de Portugal. Nesse sentido, os
jesuítas representavam um obstáculo e uma
fonte de resistência às tentativas de implanta-
ção da nova filosofia iluminista que se difun-
dia rapidamente por toda a Europa.
Serrão (1982) e Almeida (2000) expli-
cam que o ódio do Marquês de Pombal aos
470 Lizete MACIEL e Alexandre SHIGUNOV NETO. A educação brasileira no período pombalino:...
jesuítas ficou expresso em documentos oficiais
da época. Nesse sentido, Carvalho afirma que
[...] o tão celebrado ódio do Marquês de Pombal à
Companhia de Jesus não decorreu dos prejuízos
opiniáticos de uma posição sistemática previamente
traçada. Fatores vários e complexos, de ordem so-
cial, política e ideológica, influíram decisivamente
na evolução de uma questão que ainda hoje apai-
xona e obnubila a visão dos espíritos mais esclare-
cidos. Na brevidade desta forma de ideal
político
nacional – a conservação da união cristã e da so-
ciedade civil – se condensa toda uma filosofia com
objetivos claramente definidos, responsável, aliás,
de certa forma, tanto pelas virtudes quanto pelos
vícios do despotismo imperante. (1978, p. 32)
Tal espírito antijesuítico está expresso,
em última análise, na atribuição à Companhia
de Jesus de todos os males da Educação na
metrópole e na colônia brasileira, bem como
pela decadência cultural e educacional domi-
nante na sociedade portuguesa.
As principais medidas implantadas pelo
marquês, por intermédio do Alvará de 28 de junho
de 1759, foram: total destruição da organização
da educação jesuítica e sua metodologia de ensi-
no, tanto no Brasil quanto em Portugal; instituição
de aulas de gramática latina, de grego e de retó-
rica; criação do cargo de ‘diretor de estudos’ –
pretendia-se que fosse um órgão administrativo de
orientação e fiscalização do ensino; introdução das
aulas régias – aulas isoladas que substituíram o
curso secundário de humanidades criado pelos je-
suítas; realização de concurso para escolha de
professores para ministrarem as aulas régias; apro-
vação e instituição das aulas de comércio.
Inspirado nos ideais iluministas,
Pombal empreende uma profunda reforma edu-
cacional, ao menos formalmente. A metodologia
eclesiástica dos jesuítas é substituída pelo pen-
samento pedagógico da escola pública e laica.
É o surgimento do espírito moderno que,
[...] marcando o divisor das águas entre a peda-
gogia jesuítica e a orientação nova dos mode-
ladores dos estatutos pombalinos de 1772, já
aparecem indícios claros da época que se deve
abrir no século XIX e em que se defrontam essas
duas tendências principais. Em lugar de um sis-
tema único de ensino, a dualidade de escolas,
umas leigas, outras confessionais, regidas todas,
porém, pelos mesmos princípios; em lugar de
um ensino puramente literário, clássico, o de-
senvolvimento do ensino científico que começa a
fazer lentamente seus progressos ao lado da
educação literária, preponderante em todas as
escolas; em lugar da exclusividade de ensino de
latim e do português, a penetração progressiva
das línguas vivas e literaturas modernas (fran-
cesa e inglesa); e, afinal, a ramificação de ten-
dências que, se não chegam a determinar a
ruptura de unidade de pensamento, abrem o
campo aos primeiros choques entre as idéias
antigas, corporificadas no ensino jesuítico, e a
nova corrente de pensamento pedagógico, influ-
enciada pelas idéias dos enciclopedistas france-
ses, vitoriosos, depois de 1789, na obra escolar
da Revolução. (Azevedo, 1976, p. 56-57)
A introdução dos ideais iluministas3 , nas
ciências e em específico na Educação, se processa
de acordo com as condições sociais da época.
Boto analisa que a partir do século XVIII há
[...] uma intensificação do pensamento pedagó-
gico e da preocupação com a atitude educativa.
Para alguns filósofos e pensadores do movimento
francês, o homem seria integralmente tributário
do processo educativo a que se submetera. A
educação adquire, sob tal enfoque, perspectiva
totalizadora e profética, na medida em que, por
intermédio dela, poderiam ocorrer as necessárias
reformas sociais perante o signo do homem pe-
dagogicamente reformado. (1996, p. 21)
3. Para Carvalho (1978), o iluminismo português pode ser caracterizado
diferentemente do modelo encontrado nas demais reações européias (Fran-
ça, Inglaterra, Alemanha), pois apresenta algumas peculiaridades. Entre-
tanto, apesar de reconhecer as peculiaridades presentes em cada nação,
foi sempre um programa pedagógico, uma atitude crítica preocupada com
os problemas sociais e com as intenções de reformulação das instituições
e da cultura social.
471Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.3, p. 465-476, set./dez. 2006
Para o ideal iluminista, a nova sociedade
exige um novo homem que só poderá ser formado
por intermédio da Educação. Assim, apesar de o
ensino jesuítico ter sido útil às necessidades do
período inicial do processo de colonização do
Brasil, já não consegue mais atender aos interes-
ses dos Estados Modernos em formação. Surge,
então, a idéia de Educação pública sob o controle
dos Estados Modernos. Portanto, a partir desse
momento histórico, o ensino jesuítico se torna
ineficaz para atender às exigências de uma soci-
edade em transformação.
Para o discurso do movimento iluminista
e, mais especificamente, do Marquês de Pombal,
a educação e o direito são importantíssimos por-
que ambos são os centros de tais pensamentos.
Importa considerar que a renovação pe-
dagógica, pretendida pelo Marquês de Pombal,
não é exclusividade de seu governo, pois desde
o reinado de D. João V até o governo de D. Maria
I, encontram-se os traços desse movimento
Iluminista, como afirmam Serrão (1982), Carvalho
(1978), Holanda (1993) e Ribeiro (1998).
[...] as reformas pombalinas da instrução públi-
ca constituem expressão altamente significativa
do iluminismo português. Nelas se encontra
consubstanciado um programa pedagógico que,
se por um lado, representa o reflexo das idéias
que agitavam a mentalidade européia, por ou-
tro, traduz, nas condições da vida peninsular,
motivos, preocupações e problemas tipicamente
lusitanos. (Carvalho, 1978, p. 25)
Para Ribeiro, fica evidenciado que
[...] as ‘reformas pombalinas’ visavam transfor-
mar Portugal numa metrópole capitalista, a
exemplo do que a Inglaterra já era há mais de
um século. Visavam, também, provocar algu-
mas mudanças no Brasil, com o objetivo de
adaptá-lo, enquanto colônia, à nova ordem pre-
tendida em Portugal. (1998, p. 35)
Verifica-se, portanto, uma nova ordem
social, um novo modelo de homem, uma nova
sociedade pautada nos valores do sistema de
produção pré-capitalista.
Marquês de Pombal, ao propor as re-
formas educacionais – por intermédio da apro-
vação de decretos que criariam várias escolas e
da reforma das já existentes –, estava preocu-
pado, principalmente, em utilizar-se da instru-
ção pública como instrumento ideológico e,
portanto, com o intuito de dominar e dirimir a
ignorância que grassava na sociedade, condição
incompatível e inconciliável com as idéias
iluministas (Santos, 1982).
Almeida (2000) e Ribeiro (1998) concor-
dam que o grande empecilho para a concretização
desses objetivos foi a falta de homens capacitados
para o ensino elementar e primário, ou seja, havia,
tanto na metrópole quanto na colônia, uma grande
carência de professores aptos ao exercício da fun-
ção de ensinar.
Frente a esse contexto, pode-se afirmar
que Pombal, ao expulsar os jesuítas e oficialmen-
te assumir a responsabilidade pela instrução
pública, não pretendia apenas reformar o siste-
ma e os métodos educacionais, mas colocá-los
a serviço dos interesses político do Estado. Se-
gundo Haidar, buscou-se:
[...] criar a escola útil aos fins do estado, e nes-
se sentido, ao invés de preconizarem uma polí-
tica de difusão intensa e extensa do trabalho
escolar, pretenderam os homens de Pombal or-
ganizar a escola que, antes de servir aos inte-
resses da fé, servisse aos imperativos da Coroa.
(1973, p. 38)
Pelo Alvará de 5 de abril de 1771,
Pombal transfere a administração e a direção
do ensino para a Real Mesa Censória, órgão
criado em abril de 1768, com a qual pretendia
efetivar a emancipação do controle absoluto
dos jesuítas no ensino, passando, então, ao
controle do Estado. Após esse ato, foram cria-
das, no Brasil, 17 aulas de ler e escrever; e foi
instituído um fundo financeiro para a manuten-
ção dos estudos reformados, denominado de
subsídio literário. Uma das implicações do
472 Lizete MACIEL e Alexandre SHIGUNOV NETO. A educação brasileira no período pombalino:...
desmantelamento da organização educacional
jesuítica e da falta de implantação de um pro-
jeto educacional formal e eficaz foi a demora
em instituir-se, no Brasil colônia, as escolas
com cursos graduados e sistematizados (1776).
Almeida (2000) destaca uma questão
importante para a compreensão da instrução
pública no Brasil colônia: a tentativa da Coroa
portuguesa e do governo colonial local em
abrandar o desenvolvimento da instrução públi-
ca da população brasileira. Tal atitude justifica-
va-se, pois se pretendia reprimir a expansão do
espírito nacionalista que começava a aflorar
entre a população.
Consegue-se, portanto, verificar a pre-
sença, desde muito cedo, de uma característica
marcante da Educação brasileira – ‘a destruição
e substituição das antigas propostas educacionais
em favor de novas propostas’. Assim, constata-se
que, de uma maneira geral, no Brasil, não há uma
continuidade nas propostas educacionais implan-
tadas. A expulsão dos jesuítas e a total destruição
de seu projeto educacional podem ser considera-
das como o marco inicial dessa peculiaridade tão
arraigada na Educação brasileira.
Segundo Holanda, com a expulsão dos
jesuítas,
[...] a instrução pública em Portugal e nas colônias,
foi duramente atingida. Desapareceram os colégios
mantidos pela Companhia de Jesus que constituíam
então os principais centros de ensino. Urgia, por-
tanto, a adoção de providências capazes de, pelo
menos, atenuar os inconvenientes da situação cria-
da com as drásticas medidas administrativas de
Sebastião de Carvalho e Melo. O terreno para a
implantação de novas idéias pedagógicas, entretan-
to, já havia sido preparado, com vária sorte, pelos
esforços isolados de alguns homens de ciência e de
pensamento, entre os quais figuravam o singular
Luís Antônio Verney e os padres da Congregação
do Oratório de São Felipe Néri. (1989, p. 80-81)
Pode-se notar que a intenção e a ten-
tativa de isentar o Estado de sua responsabili-
dade por meio de artimanhas, projetos e impos-
tos para financiamento da Educação não é nova
e não é exclusividade de governos contempo-
râneos. Também, pode-se notar a presença, já
nessa época, de dois tipos de escolas (uma
para os filhos da nobreza e burguesia e outra
para os grupos sociais menos abastados) e de
políticas educacionais que privilegiavam o en-
sino particular, com apoio do Estado.
Para Teixeira Soares, mais importante do
[...] que a reforma e modernização da Universi-
dade de Coimbra foi o Alvará de 06 de novem-
bro de 1772, que institui o ensino popular a ser
dado nas escolas públicas. Pombal não ficou
apenas no texto da lei. Passou de imediato à
fundação de escolas, que deveriam completar
um total de 479. A lei determinou que o ensino
popular poderia também ficar a cargo de parti-
culares, que para tanto contariam com apoio
do Estado no prelecionamento das seguintes
matérias: ortografia, gramática, aritmética,
doutrina cristã e educação social e cívica (‘civi-
lidade’). O ensino secundário daria ênfase espe-
cial ao latim, grego e francês. Ao mesmo tem-
po em que cuidava do ensino popular, fundou o
‘Colégio dos Nobres’, seminário dedicado à edu-
cação de filhos da nobreza; e, para manter o
equilíbrio social e educacional, fundou também
o Colégio de Mafra, destinado à educação dos
plebeus, com programa idêntico ao reservado
aos filhos da nobreza. [...] O primeiro-ministro
criou um imposto especial destinado à manu-
tenção e ampliação das escolas fundadas (lei de
10 de novembro de 1772). (1961, p. 218)
O ministro Pombal pretendia promover
a substituição dos tradicionais métodos peda-
gógicos instituídos pela Companhia de Jesus
por uma nova metodologia educacional, con-
dizente com sua realidade e o momento his-
tórico vivenciado. Pretendia, portanto, que as
escolas portuguesas tivessem condições de
acompanhar as transformações que estavam
ocorrendo naquele momento.
Marquês de Pombal pretendia, com a
aprovação desse alvará, promover a substituição dos
473Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.3, p. 465-476, set./dez. 2006
tradicionais métodos pedagógicos instituídos pela
Companhia de Jesus por uma nova metodologia
educacional, considerada moderna e, portanto,
condizente com os ideais iluministas.
Almeida (2000), apesar de reconhecer a
obra do Marquês de Pombal relativa à instru-
ção pública, não deixa de mencionar que após
a expulsão da Companhia de Jesus do Brasil e
da destruição de sua obra educacional, outras
ordens religiosas tentaram continuar a obra
iniciada pelos padres jesuítas, contudo, sem
grande êxito. Além disso, considera que o êxi-
to do projeto educacional jesuítico deve-se, em
parte, às habilidades dos padres ao desempe-
nharem a função de professores, pois ‘mantive-
ram numerosas escolas dirigidas por professo-
res verdadeiramente hábeis’.
Tanto Carvalho (1978) como Avellar
(1983) e Ribeiro (1998) concordam que o con-
teúdo da reforma pombalina, sob a égide de seus
principais inspiradores, Luís Antonio Verney4 , Ri-
beiro Sanches5 e Antônio Genovessi, considera-
dos pensadores modernos, trazem traços do en-
sino tradicional, isto é, eclesiástico. Portanto, não
houve uma ruptura total com o ensino jesuítico,
pois a mudança ocorrida foi mais de conteúdo do
que de método educacional.
Falcon afirma que
[...] a partir de Verney, o reformismo ilustrado,
apoiado no otimismo jurídico que o caracteriza,
entra na ordem do dia. A secularização constitui
seu traço dominante. A fé no progresso, a ênfase
dada à razão e a crença no poder quase mágico
das ‘Luzes’ completa o ideário. (1993, p. 364)
‘O verdadeiro método de estudar’, de
Luís Antonio Verney, pretendia opor-se ao
método pedagógico dos jesuítas. A obra, que
na realidade eram dezesseis cartas escritas em
Roma e publicadas no período de 1746-1747,
apresenta uma análise sobre os problemas do
ensino português ministrado, até então, pela
metodologia dos jesuítas; além disso, fornece
orientações de como proceder para adequá-los e
torná-los condizentes com a nova realidade.
Cada carta trata de um determinado
tema e, no conjunto, compõem as disciplinas
da proposta pedagógica de Verney: primeira
carta – a língua portuguesa; segunda carta – o
latim; terceira carta – o grego e o hebraico;
quarta carta – as línguas modernas; quinta
carta – a retórica; sexta carta – continua a
análise sobre o ensino da retórica; sétima car-
ta – a poesia portuguesa; oitava carta – a filo-
sofia; nona carta – a metafísica; décima carta
– a lógica/física; décima primeira carta – a
ética; décima segunda carta – a medicina;
décima terceira carta – a jurisprudência como
prolongamento natural da moral; décima quar-
ta carta – a teologia; décima quinta carta – o di-
reito econômico; décima sexta carta – apresenta
uma seqüência de planos de estudos: os estudos
elementares, a gramática, o latim, a retórica, a fi-
losofia, a medicina, o direito, a teologia e termina
com o apêndice sobre ‘o estudo das mulheres’.
Seu projeto pedagógico está constituído
de algumas dessas propostas, tais como: secula-
rização do ensino; valorização da língua portu-
guesa; papel e importância do estudo do latim,
realizado por intermédio da língua portuguesa
(uma das razões do estudo do latim era a possi-
bilidade de simplificar e abreviar a duração dos
estudos); redução do número de anos destinados
aos estudos nos níveis de ensino inferiores, visan-
do fundamentalmente aumentar o número de
ingressos nos cursos superiores; apresentação de
um plano de estudos para todos os níveis de
ensino, do fundamental (que se inicia a partir dos
sete anos de idade) até os níveis superiores de
ensino; disciplinas que compõem sua proposta
pedagógica são, em sua maioria, literárias, tais
como: português, latim, retórica, poética e filosofia
(lógica, moral, ética, metafísica e teologia), direi-
to (direito civil e direito canônico), medicina
4. Luís Antonio Verney (1713-1792) nasceu na cidade de Lisboa. Oriun-
do de uma família francesa de boas condições financeiras,

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