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Artigo - Epistemologia da Administração - Franca Filho

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Para um olhar epistemológico da administração: problematizando o seu objeto*[1: * Este texto constitui uma versão preliminar a ser publicada no livro Discussões metodológicas para a reafirmação da administração como campo do conhecimento, sob a organização de Reginaldo Souza Santos, Ed. Hiucitec, Rio de Janeiro, 2004.]
Por Genauto Carvalho de França Filho**[2: ** Doutor em Sociologia (Universidade de Paris VII), Mestre e Graduado em Administração (UFBA). Professor da Escola de Administração da UFBA e do seu Programa de Pós-Graduação (NPGA). Pesquisador do NEPOL (Núcleo de Estudos sobre Poder e Organizações Locais).]
Introdução
A pergunta sobre o que é a administração, muitos responderiam sem titubear: trata-se de um arcabouço de idéias sobre como dirigir uma organização. Um tal tipo de resposta traduz uma visão bastante usual/comum da administração que a associa a um conjunto de atividades muito práticas voltadas a gestão de organizações. Administração assim percebida define-se antes de tudo como um verbo de ação, do fazer, ou seja, um ato eminentemente prático. Mas, neste contexto de entendimento, que espaço então resta a uma reflexão sobre a administração? Afinal de contas, gerir uma organização não supõe de antemão uma compreensão acerca do que ela seja? Se uma organização pode ser vista como um sistema de atividades em funcionamento, será que tal funcionamento não existe exatamente numa ordem social específica? Se esta ordem social relaciona-se mais aos aspectos simbólicos do trabalho (remetendo ao significado das ações dos indivíduos), enquanto que o funcionamento aqueles fatores mais de natureza técnica, como entender então esta dupla dimensão, técnica e simbólica, que estrutura o universo organizacional e repercute sobre o padrão de gestão adotado?
Estas são, portanto, algumas questões cujas respostas suscitam a necessidade de uma ampliação da visão habitual que se tem da administração. Isto pode ser tentado através de uma reflexão sobre o caráter das idéias produzidas nesta área, que inclusive apoia-se em larga medida num ponto de vista histórico. Um tal tipo de leitura parece-nos representar um caminho fecundo de discussão sobre a natureza do conhecimento que se produz nesta área. Esse é exatamente o objetivo desse texto: discernir sobre o que se faz, assim como, sobre o sentido das ações, isto é, sobre o que se pensa em administração. O sentido é discutir o caráter e natureza das idéias que se elaboram nesta área. Este é um ponto de vista que assume a possibilidade de conceber-se a administração como um campo do conhecimento, uma disciplina científica, e enquanto tal, portadora de um objeto privilegiado de estudos. Interessa-nos, neste texto, ainda examinar-mos esta questão do objeto da administração, situando nosso posicionamento: seria ele a gestão, como prática, ou as organizações, enquanto fenômeno social?
A pergunta inicial sobre o que é administração, nos parece, portanto, mais adequadamente examinada se adotarmos esse ponto de vista epistemológico, isto é, se centramos nosso olhar sobre a natureza do conhecimento ou das idéias desenvolvidas em nome da administração. Neste sentido, o texto esta estruturado em três grandes momentos. No primeiro, sugerimos uma classificação das idéias produzidas em administração em função da natureza do conhecimento. Discutimos assim o que pode ser considerado como três subcampos do conhecimento em administração. Tal exame revela a diversidade das idéias produzidas em administração, servindo de base para a discussão proposta no momento seguinte quando sugerimos diferentes possibilidades de interpretação da administração. Em particular discutimos três possibilidades para seu entendimento: enquanto arte, ideologia e ciência. Trata-se aqui de revisitar um debate clássico, entretanto pouco difundido, sobre a definição da administração. Finalmente, concluímos o texto abordando exatamente a controvérsia em torno do objeto da administração. Tal abordagem é complementada através de uma reflexão que sugere uma relação possível entre formas organizacionais e modos de gestão.
A administração: três grandes subcampos do conhecimento
	A pergunta sobre o que é a administração pode ser melhor discutida se partirmos de um olhar sobre como se organiza o conjunto das idéias disseminadas em seu nome. Nesta perspectiva, um primeiro exame projetado sobre o conjunto do conhecimento produzido neste campo permite-nos desde já distinguir entre pelo menos três grandes corpos de idéias: as técnicas ou metodologias gerenciais, as áreas funcionais e a teoria das organizações (esta última também conhecida mais recentemente sob a denominação de estudos organizacionais).
	
As técnicas ou metodologias gerencias
As técnicas ou metodologias gerenciais dizem respeito ao conjunto das idéias voltadas ao auxílio do trabalho do gerente, num sentido muito prático e aplicado. Foram desde os primórdios concebidas no âmbito das empresas, mas sempre com pretensão de validade geral, e é assim que são transpostas ao âmbito de instituições públicas, entidades não governamentais e organizações sociais em geral, como modelos a serem seguidos para “a boa eficiência” administrativa. Vale ressaltar que “boa eficiência”, ou mesmo eficácia, aqui, define-se antes de mais nada segundo os parâmetros clássicos de uma racionalidade instrumental ou funcional, ou seja, nos termos de um cálculo utilitário de conseqüências: é eficiente ou eficaz aquilo que permite atingir a finalidade ou o fim proposto. Tal racionalidade ignora todo tipo de questionamento sobre a validade ética da ação, isto é, o sentido mesmo dos fins propostos, importando apenas a sua consecução. É a noção mesma de útil que passa a constituir aqui parâmetro para definição do atributo ético da ação, suscitando em todo caso a pergunta que não quer calar: útil para quem ou para que?[3: Nos parece mais adequado o emprego da expressão “técnicas gerenciais” aqui, no lugar de “teorias gerenciais”, uma vez que trata-se efetivamente de conhecimento técnico e não teórico. Ou seja, as idéias aqui sugerem como a organização deve funcionar, numa perspectiva muito prática e aplicada. Não se almeja refletir sobre o que é a organização.]
Elaboradas sob a forma de modelos gerenciais, essas metodologias incorporam em geral um conhecimento muito técnico sobre a gestão mesclado com algumas idéias sobre temáticas ligadas ao campo das relações humanas como motivação, liderança ou comunicação. Ao longo da história da administração, sucedem-se como exemplos desde a famosa organização racional do trabalho (ORT) proposta por F.Taylor no início do século, passando pela administração por objetivos (APO) do P.Drucker nos anos 50, até mais recentemente nos anos 80 e 90 as ondas da qualidade total, reengenharia, downsizing etc.. A produção do conhecimento aqui confunde-se com proposição de metodologia de gestão empresarial, revelando o sentido pragmático das idéias disseminadas e a natureza prescritiva do conhecimento: ele dispõe sobre como deve funcionar uma empresa e seu compromisso é com os resultados econômicos do empreendimento. É exatamente em função de tais características que as técnicas ou metodologias gerencias tornam-se o alvo privilegiado dos chamados modismos em administração.
Do mesmo modo, o compromisso de tais metodologias com a realidade empresarial e seus objetivos apenas econômicos, pode explicar em parte uma lacuna importante dos conhecimentos administrativos: a necessidade de desenvolvimento de metodologias gerencias que contemplem a ação de organizações cuja estratégia define-se antes pela busca do atingimento de outros objetivos que não aqueles puramente econômicos. A questão que nos ocuparia aqui então seria aquela de indagar-se sobre a construção de metodologias de gestão social: Como se definem? Que fundamentos alicerçam tal prática? Como se elaboram? Entretanto tais questões não constituem o objeto da discussão neste momento. Algumas pistas para um tal debate serão apresentadas na conclusão.
As áreas funcionais
As áreas funcionaiscompartilham com esta primeira o sentido pragmático das idéias desenvolvidas e a natureza prescritiva do conhecimento. Tratam-se aqui das subáreas de especialização da prática administrativa tal como vem sendo desenvolvida no universo empresarial: o marketing, as finanças, a gestão da produção e a gestão de recursos humanos, para muitos, parecem tão indispensáveis ao exercício da administração que tais conteúdos estruturam em larga medida a elaboração dos currículos de formação do profissional em administração.·.
Esta área do conhecimento administrativo parece tão antigo quanto à própria disciplina, sua origem remontando a noção de divisão do trabalho proposta por Fayol no início do século como princípio universal da administração. Este autor havia sugerido duas formas de divisão do trabalho. A primeira, verticalizada, ocorre em função da necessidade de aumento do controle na organização e implica um aumento nos níveis dos cargos hierárquicos numa estrutura organizacional. Já a segunda, horizontalizada, existe em função do aumento da necessidade de funcionalidade aplicada ao desenvolvimento do trabalho, implicando em dividir, reunir e agrupar aquelas atividades cuja natureza seja semelhante. Este princípio da divisão horizontal do trabalho tornou-se mais conhecido sob expressão de departamentalização funcional. Reside não apenas aí a origem das áreas funcionais, como também, na própria proposição fayoliana acerca da existência de seis funções básicas da empresa: técnicas, financeiras, contábeis, de segurança, comerciais e administrativas. 
Com o desenvolvimento e complexificação da atividade administrativa em decorrência das transformações no próprio contexto ambiental das organizações (advento das novas tecnologias e novos materiais, por exemplo), novas áreas funcionais tendem a surgir como é o caso da gestão da informação ou da gestão do conhecimento. Assim como outras podem alterar sua definição, mesmo que seja apenas para efeito retórico: o termo “recursos humanos” (RH) hoje tende a ser superado pela expressão “gestão de pessoas” em grande parte das empresas. A idéia é não sugerir que o fator humano no trabalho possa ser associado a mais um recurso ou insumo da atividade produtiva. Trata-se aqui de uma alteração no discurso sobre a gestão que nem sempre vem acompanhado (e isso é comum no mundo da administração) de uma efetiva mudança na prática gestionária. Em todo caso, para muitos, as áreas funcionais encerram o próprio sentido de ser da administração hoje, devendo este profissional necessariamente especializar-se em uma delas.
A teoria das organizações ou o campo dos estudos organizacionais
	Enquanto nos dois casos anteriores a natureza do conhecimento que se elabora é eminentemente pragmática e prescritiva, já que a ênfase fundamental esta colocada sobre a dimensão operacional e aplicada do trabalho gerencial, com o advento de uma teoria das organizações tal enfoque tende a alterar-se. Isto posto em razão de um deslocamento do objeto mesmo da administração que passa do trabalho (ou da gerência e/ou gestão do trabalho) para a organização como unidade de análise. A preocupação, portanto amplia-se do trabalho em si (como nos casos das técnicas gerenciais) para o contexto onde este trabalho é exercido, ou seja, o próprio universo organizacional. Do mesmo modo, o enfoque do conhecimento produzido tende também a deslocar-se de uma perspectiva prescritiva - que se orienta a partir de questões do tipo: como o trabalho deve ser mais eficazmente gerido? -, para uma perspectiva mais explicativa - baseada em questões como: o que é o universo organizacional? Que dimensões o constitui? Ou que fatores influenciam a dinâmica das organizações? [4: Para ilustrar-mos este ponto, vale a pena uma breve referência a alguns autores considerados como pioneiros do pensamento administrativo. Com efeito, gostaríamos de avançar como hipótese de entendimento a visão de que com Fayol o objeto da administração define-se através da idéia de organização do trabalho, num enfoque sobre a estrutura mais geral que a organização deveria possuir para ser eficiente. Já com Taylor, esse mesmo objeto pode ser definido através da idéia de gestão da produtividade, a partir do seu enfoque sobre a racionalização do trabalho operário. Com E.Mayo, por sua vez, o objeto da administração pode ser considerado como aquele da gestão de pessoas, em razão da sua ênfase sobre o aspecto das relações humanas no trabalho influenciando a gerência.]
	
É importante ressaltar que por teoria das organizações aqui não deve-se compreender exatamente o mesmo que teoria geral da administração (TGA). Esta última inicia-se com a chamada escola clássica, passando pela de relações humanas, comportamentalista, estruturalista e sistêmica, até finalizar-se com a chamada escola contingencialista da administração, conforme ensina os principais manuais da área. Uma teoria das organizações, ao contrário, só nascerá realmente lá pelos idos de 50 nos EUA com os trabalhos de H.Simon e a contribuição de alguns psicólogos e sociólogos (também americanos e de inspiração funcionalista). É verdade que o marco preciso, encontra-se um pouco antes, no livro as funções do executivo de Chester Barnard escrito em 1939, pois apresenta-se aí uma primeira definição da organização na literatura administrativa, conforme sublinha Serva e Ruben (1995): “Embora tal livro tenha sido dedicado ao administrador, como bem indica seu título, curiosamente é a organização que surge como elemento essencial do texto. Ao definir a organização como um ‘sistema cooperativo racional’ e a ela dedicar grande atenção, Barnard se viu numa situação inusitada até então: ele parecia perceber que tratar do trabalho do gerente sem a relevante consideração do seu espaço social de atuação poderia acarretar, no mínimo, uma ausência comprometedora da qualidade do seu estudo” (p.207).
	
Os dois pilares fundantes de uma teoria das organizações encontram-se, portanto em duas orientações principais: os estudos ditos do “comportamento organizacional”, também conhecidos como abordagem comportamentalista das organizações, de um lado, e a chamada sociologia das organizações, também conhecida como abordagem estruturalista das organizações, do outro. A primeira é herdeira da tradição da psicologia dominante nos EUA, e privilegiará o tratamento de temas como motivação, liderança e tomada de decisão no universo organizacional. A segunda é influenciada, sobretudo por sociólogos americanos de inspiração funcionalista (A.Gouldner, P.Selzinick, R.Merton...), que desenvolverão estudos sobre a burocracia e os sistemas sociais, na esteira da interpretação feita por Talcott Parsons dos trabalhos deixados por Max Weber. 
Conforme nos lembra Serva e Ruben (1995): “tratando a organização sob a ótica eminentemente sociológica, os ‘estruturalistas’ fizeram avançar, mesmo que presos ao paradigma funcionalista, a percepção da organização como uma das questões centrais dessa época. Vivia-se a expansão exitosa do capitalismo, notadamente o americano, e a burocratização crescente das sociedades ocidentais nas quais a organização empresarial passava rapidamente a servir de modelo institucional, principalmente para a estruturação administrativa do Estado” (p.208). É neste momento que elabora-se a expressão “sociedade das organizações” para sublinhar uma das características fortes das sociedades ocidentais industrializadas. Como também, serão propostas algumas tipologias para refletir as diferentes formas organizacionais presentes na realidade para além do tipo empresa. Dentre estas destaca-se a tipologia proposta por Etzioni que distingue as organizações coercitivas, utilitárias e normativas.
Desse modo a abordagem estruturalista apresenta o mérito de ampliar o objeto de estudos da administração, afirmando a necessária interdependência entre as organizações e o contexto do qual participam, isto é, a própria sociedade. Além de favorecer a introdução de métodos sociológicos, e seu respectivo rigor de aplicação, na abordagem do fenômeno organizacional.Entretanto, em razão de sua filiação ao paradigma funcionalista originado nas ciências sociais, tal abordagem enfocará apenas aqueles temas relacionados a ordem social como “integração, estabelecimento de objetivos e autoridade nas organizações burocráticas”, deixando de abordar (ou obscurecendo) “dimensões essenciais das organizações produtivas como poder, influência, conflitos, desigualdades, dominação étnica, embates entre sexos, questões religiosas e ideológicas, dentre outras, que não poderiam estar ausentes num esforço profundo de análise e compreensão de organizações” (Serva e Ruben, 1995:209).
O mesmo ocorre com a abordagem comportamentalista, que também influenciada pelo paradigma funcionalista, ao passo que contribuiu no sentido da abertura das questões organizacionais ao campo das ciências humanas (sobretudo a psicologia), por outro lado, seus estudos, especialmente aqueles dedicados aos processos organizacionais de liderança, motivação, comunicação etc., revelaram-se extremamente comprometidos com uma tendência pragmática e utilitarista de visão. Citando Chanlat (1994), Serva e Ruben (1995) nos relembra mais uma vez que nesta abordagem, “a obsessão pela eficácia, desempenho e aumento de produtividade em curto prazo tem levado vários pesquisadores a restringir seus esforços à mera exploração de técnicas de controle” (p.209). Além disso, “sua orientação behaviorista e positivista desemboca numa percepção da natureza humana guiada univocamente pelo tipo ideal de homem requerido pela sociedade centrada no mercado, absorvendo inteiramente os ditames desse tipo histórico de sociedade e generalizando-os para todos os espaços sociais; processo este que Guerreiro Ramos denominou ‘síndrome comportamentalista’. Em duas palavras, o homem é reduzido a um ser que responde a estímulos, cuja sedimentação valorativa é fundamentalmente econômica, ainda que em alguns casos revestida de ‘necessidades psicossociais’; ‘sua categoria mais importante é a conveniência. Em conseqüência, o comportamento é desprovido de conteúdo ético e validade geral. É um tipo de conduta mecanomórfica, ditada por imperativos externos (Guerreiro Ramos, 1981:51)” (p.209).
	Podemos observar assim o quanto este campo da teoria das organizações, sobretudo no seu início aparece influenciado por um pensamento utilitarista que já se fazia bastante presente no próprio campo das ciências sociais mais geral com o seu economicismo. Tal utilitarismo ganha consistência através da ascensão de um paradigma funcionalista. É exatamente a partir dessa base funcionalista que se desenvolverá o campo dos estudos organizacionais, ora renovando-o, ora rompendo-o. Podemos assim considerar em linhas muito gerais um dupla perspectiva norteadora do desenvolvimento da teoria das organizações. De um lado, aquelas abordagens que renovam a tradição de um pensamento funcionalista enfocando em geral temáticas muito caras a ciência econômica de tendência mais neoclássica como as questões da tecnologia, da estrutura, da inovação etc., até outros temas mais ligados a outras disciplinas como a questão da cultura de empresa tornado praticamente um modismo nos anos 80 e 90. A tônica neste âmbito de estudos, que permanece hegemônico na teoria das organizações, diz respeito as possibilidades de adaptação das organizações de natureza empresarial no espaço do mercado. [5: Entre aqueles autores mais destacados nesta perspectiva podemos mencionar alguns nomes mais conhecidos como M.Porter, P.Drucker e E.Schein.]
Por outro lado, desenvolvem-se também uma série de outras abordagens, que tem sido chamadas por alguns de “estudos críticos” das organizações, cuja preocupação fundamental é revelar algumas dimensões importantes da análise organizacional não percebida pela perspectiva funcionalista. Esta corrente crítica dos estudos organizacionais empreende diálogos mais aprofundados com algumas disciplinas no campo mais geral das ciência sociais, a exemplo da antropologia e/ou da psicanálise, trazendo para o mundo da administração o tratamento de temas extremamente presente no dia à dia da gestão como a questão do gênero nas organizações, o conflito inter-étnico, a problemática do poder e da ideologia organizacional, além de um outro enfoque para questões antes já identificadas na vertente funcionalista como a questão da linguagem e da comunicação na dinâmica organizacional, da ética, da cultura etc.. O compromisso maior de uma tal abordagem crítica dos estudos organizacionais, para além da desconstrução do discurso e retóricas gerencias renovados incessantemente pela literatura administrativa de grande circulação, parece ser muito mais aquele de procurar esclarecer o universo simbólico que estrutura e atribui sentido as ações na organização. Tal perspectiva de visão vêm ratificar o pressuposto de entendimento das organizações segundo o qual tão importante quanto compreendê-las enquanto sistemas de atividades significa entendê-las como uma ordem social, que estrutura e atribui sentido as próprias atividades, ou seja, uma ordem simbólica.[6: Entre os autores que mais tem se destacado nesta perspectiva merecem destaque os nomes de Jean-François Chalat e de Omar Aktouf, do lado francofônico, além de Burrel e Morgan ou de S.Clegg, do lado anglo-fônico. Entretanto não são poucas as contribuições de autores situados em outros campos disciplinares e que passam a tratar de temáticas no âmbito dos estudos organizacionais a exemplo de E.Enriquez, V.deGaulejack, J.Girin dentre outros. Do lado brasileiro duas fontes de inspiração fundamental encontram-se nos trabalhos de Guerreiro Ramos e de Mauricio Tragtemberg.]
	Após esta breve leitura acerca do campo dos estudos organizacionais podemos melhor avaliar o quanto este âmbito do conhecimento administrativo distingue-se dos demais. A teoria das organizações apresenta uma vocação fundamental de conhecimento mais explicativo e interpretativo. Tal vocação afirma-se com muito mais ênfase através das chamadas abordagens críticas, enquanto que na perspectiva funcionalista sempre é comum haver algum pendão para um viés mais prescritivo. Em todo caso, seja numa ou na outra abordagem, o objeto principal de estudos são as organizações. O que não é possível concluir em se tratando das áreas funcionais ou das técnicas gerenciais. Em ambos os casos permanece o compromisso com um conhecimento de natureza eminentemente prescritivo. 
Esta primeira classificação do conhecimento produzido em administração nos revela desde já a diversidade das idéias produzidas neste campo, apontando deste modo para uma pluralidade de interpretações possíveis como resposta a questão fundamental posta no início deste texto sobre o que é a administração. É exatamente em razão dessa pluralidade de idéias que se elaboram em nome da administração que sugerimos a seguir três possibilidades para sua interpretação ou definição mesmo. Se a administração aparece assim como um campo plural do conhecimento, porque não então também entendê-la de modo plural?
A administração - três grandes possibilidades de interpretação: arte, ideologia ou ciência? 
	Parece instrutivo notar que estas diferentes interpretações acerca da administração são veiculadas por diferentes atores e instituições a partir do modo mesmo como cada um lida com este conhecimento.
A administração como arte
	Para muitos a administração é uma arte. Quem nunca ouviu aquela célebre frase “a arte de administrar” tão decantada em diferentes contextos? A compreensão da administração como arte repousa sobre o pressuposto do seu entendimento antes de tudo como uma prática, uma ação, um fazer que se aprende na medida em que se exercita (ou se pratica), um learning by doing. A prática administrativa ou o exercício da administração, nesta perspectiva, supõe um conjunto de habilidades tidas como inerentes ao indivíduo, conformando uma espécie de talento natural. A idéia é de comparar a figura do administrador com aquela de um artista no sentido em que, ambos, seja o administrador na gestão de uma organização, seja um artistana produção de sua obra, teriam um pendão natural para o que fazem, sua profissão. Ressalta-se nesta interpretação as chamadas características inatas aos indivíduos, pouco considerando os chamados comportamentos adquiridos ou aprendidos.
	
Neste entendimento considera-se que muitos são “administradores de fato”, isto é, prescindem da obtenção de um conhecimento formal para tanto. A especificidade da idéia de administração enquanto arte residiria assim no fato de que, na prática, se um artista é capaz de realizar sua obra sem ter passado por uma Escola de Belas Artes, o mesmo não poderia ser considerado em relação a quase todos os campos profissionais à exemplo da medicina, química, física, entre outros, onde supõe-se que o indivíduo deva qualificar-se para o direito e possibilidade do seu exercício profissional que será legitimado através da instituição do diploma de graduação na área respectiva. [7: Em oposição aos “administradores de direito”, como os bacharéis ou graduados na área.]
	É assim que muitos atribuem a prática administrativa um caráter artístico: ela seria desse modo similar a uma arte, “a arte de administrar”. Tal expressão constitui linguagem corrente no discurso veiculado pela maioria dos manuais na área. A idéia de uma “arte de gerenciar” encontra-se sobretudo ligada a uma concepção particular da gestão, que ressalta uma série de habilidades sobretudo aquelas ligadas a capacidade de “fazer as coisas através das pessoas”. Trata-se portanto de uma concepção renovada de gestão, em certa medida, uma vez que rompe com a ênfase sobre as habilidades de planejador racional tão ressaltada pelos clássicos. Desse modo, algumas habilidades que constituiriam requisitos básicos para “a arte de gerenciar” seriam uma grande competência política denotando capacidade de articular interesses diversos, uma intuição para perceber oportunidades denotando um certo caráter visionário e “olho clínico” no sentido de saber se cercar de pessoas competentes.
Mas se se trata de um concepção particular de gestão que dá suporte a esta visão da administração, tal concepção encontra justificativa na maioria dos casos a partir das estórias e histórias pessoais de sujeitos considerados “grandes administradores” com um mínimo de escolaridade básica. Tais estórias transformam-se muitas vezes em verdadeiras sagas, servindo para alimentar uma “cultura de empresa” sequiosa de elementos simbólicos que justifique sua ação ideologicamente. Não são poucos os casos de empresa, cujo suposto “sucesso” seria explicado pela trajetória exemplar do seu líder fundador, que de uma condição humilde consegue em seguida construir “um império econômico”.
Duas observações, um pouco sob a forma de questionamentos, nos fica como reflexão sobre este modo de pensar a administração. A primeira diz respeito a necessidade de estudos mais ampliados sobre trajetórias pessoais e dinâmica organizacional, que possam levar em consideração também os casos de insucesso e analisar com mais minúcia e independência as várias dimensões psicológicas e sociológicas que constituem a real trajetória do sujeito. Um segundo aspecto diz respeito a uma interrogação sobre as condições do êxito profissional em gestão ontem e hoje. Num contexto atual, por muitos batizados de “era do conhecimento”, onde exige-se níveis de qualificação cada vez maiores aos indivíduos nas mais diversas áreas profissionais, em função da própria complexificação do ambiente das organizações, que chances de êxito teria aquele empreendedor cujo perfil apresenta entre outras características um baixo grau de escolaridade?
A administração como ideologia
	Interpretar a administração como ideologia significa de antemão assumir o pressuposto que a identifica a noção de gerência de empresas e admitir que ela não se define como um saber neutro. A administração, nestes termos, estaria sempre a serviço do capital, isto é, dos interesses dos proprietários ou controladores da empresa.
	
Tal interpretação implica em privilegiar um pressuposto político de entendimento da realidade organizacional, o que significa abandonar a definição das organizações em termos de “empreendimentos interligados e racionais” e assumir um outro: as organizações devem ser vistas como “redes de pessoas independentes com interesses divergentes”, ou seja, como um sistema de atividade política. Nestes termos, a administração aparece menos como uma “ação humana cooperativa” e mais como um sistema de dominação. É assim que o universo do trabalho na realidade das empresas é visto como um campo de conflitos fundamentais, onde destaca-se aquele envolvendo empregadores e empregados ou o capital e o trabalho. Parte-se do pressuposto segundo o qual existe um conflito social básico no seio de toda sociedade capitalista (um conflito de classes sociais) e tal conflito aparece como reflexo do embate cotidiano ocorrido no mundo do trabalho em função dos interesses divergentes entre empregadores e empregados. Toda empresa como modo de organização carrega consigo portanto uma contradição interna essencial. Percebe-se assim o quanto tal formulação é herdeira de uma tradição de pensamento sociológico marxista. Muito embora essa percepção da administração como ideologia não se limite a uma perspectiva marxista de análise. Todas as contribuições oriundas do campo antropológico, da psicanálise, além dos trabalhos de alguns psicólogos e psicossociólogos vêm reforçar essa leitura crítica do universo organizacional.[8: A esse respeito não nos parece desnecessário lembrar que classicamente a sociologia definiu a questão social na modernidade sobretudo em termos de exploração que ocorre no local de trabalho fruto de um processo de dominação de uma classe social sobre outra. Tal representação parece sofrer algumas mudanças no cenário do chamado novo capitalismo que se gesta a partir dos anos 80. A chamada nova questão social que se vive nos países centrais do capitalismo parece definir-se menos em termos de exploração no interior do trabalho e mais em termos de exclusão dos espaços de trabalho. Isto conduz a uma nova representação do conflito social fundamental, que passa a ser definido menos em termos de dominação (de uma classe sobre a outra) no local de trabalho e mais em termos de segregação ou de discriminação nos espaços da cidade, o que tem levado alguns sociólogos mais recentemente a representá-lo não mais em termos de luta de classes mas em termos de luta por lugares dos indivíduos na sociedade. Para retomar os termos da análise touraniana, é como se a representação do conflito deixa-se de ser vertical (uma questão de encontrar-se em cima ou em baixo na posição de poder) e passa a ser horizontal, isto é, o que importa é encontrar-se dentro ou fora, in ou out em relação a participação social que se define a partir da identidade gerada pelo trabalho. Portanto, de uma questão de dominação e exploração, os termos fundamentais do conflito social básico parece deslocar-se para uma questão de discriminação ou de segregação, que conduz a uma relação social de indiferença com o outro.][9: Apenas para citarmos um exemplo, Gaulejac e Auber (Le coût de l’excellence, Éditions du Seuil, Paris, 1992), trabalhando na fronteira entre a sociologia, a psicanálise e a análise organizacional, insistem na questão da psicologização das relações de trabalho, sugerindo que os novos padrões de gestão empresarial baseado na retórica da excelência tem implicado um custo social importante que é de natureza psíquica: aquele da angústia das pessoas como forma de sofrimento humano no trabalho.]
	
Enquanto ideologia portanto, a administração viria assim representar um conjunto de normas, valores e idéias que justificam posições sociais desiguais. Ela, administração, nestes termos, legitima o status quo dominante. Neste sentido, para alguns que avaliam criticamente os rumos do conhecimento administrativo, um novo discurso construído a partir dos anos 80 em torno do ideal de uma cultura de empresa e amplamente incorporados por inúmeros gestores vêm bem representar umanova ideologia empresarial.
	
Parece-nos muito instrutivo observar o quanto essa vertente de interpretação da administração ganha consistência através de uma análise etimológica do termo. De fato, a decomposição da palavra administração funda-se no prefixo ad do latim, que quer dizer direção à ou tendência para, e no sufixo minister também do latim, que quer dizer mais baixo, inferior ou subordinado. Baseado num tal exame etimológica seria incorreto concluir definindo a administração como a busca de obtenção de subordinação ou obediência? Tal conclusão parece extremamente lógica, o que reforça pois o pressuposto de entendimento da administração como forma de dominação, muito diferente portanto de uma suposta busca de obtenção de comprometimento tão alardeada recentemente por uma certa literatura em gestão de empresas.
	
Do mesmo modo, o exame do termo em inglês que parece melhor refletir a idéia de administração, isto é, o verbo to manage, demonstra que tal palavra origina-se no latim manus, que significa literalmente mão, ou mais particularmente manipulação, pois o termo fora usado durante muito tempo na idade média na Inglaterra para referir-se ao ato de cavalgar segurando a rédeas do cavalo.
	
Uma tal apreciação etimológica do termo administração, além dessa própria perspectiva mais geral de entendimento, não nos parece se limitar a induzir a uma desconfiança generalizada acerca de tudo que se produz em nome da administração. Ela fornece, por outro lado, um meio instrutivo de discernimento crítico acerca do conteúdo que se veicula em nome da administração, dos novos discursos e seus modismos. Além disso, e sobretudo, uma tal leitura nos permite reconhecer, e propõe assumir, algumas heranças históricas da administração e que parecem na maioria das vezes despercebidas ou negadas. Como por exemplo em relação ao ancestral da nossa empresa moderna, conforme nos lembra Aktouf (1996): ele não se encontra nos ateliês ou butiques de artesãos como suporiam alguns, mas no lugar mesmo onde o mascate de tecidos reunia muitos tecelões para fazê-los trabalhar para si: “nele a mão-de-obra é cada vez mais sem qualificação, a hierarquia é piramidal e não-rotativa (...), o tempo e o ritmo de trabalho são impostos e controlados. Era pela força que neles se enfiavam (...) pobres, órfãos, mulheres etc. Freqüentemente, a prisão ou o hospício forneciam a mão-de-obra, que recebia salários de fome ou um leito e uma ração miseráveis” (p.103). 
Reconhecer assim algumas heranças passadas da prática administrativa pode representar um meio importante para sua renovação. Reside aí talvez um papel propositivo dessa visão da administração como ideologia, para aqueles que a enxergariam exclusivamente com uma função de desconstrução, que, diga-se de passagem, em se tratando de administração, parece-nos sempre bem vinda e necessária.
A administração como ciência: a controvérsia em torno do seu objeto
	Pensar a administração como ciência aqui significa reconhecê-la como uma área do conhecimento científico. Antes de desenvolvermos este ponto cabe esclarecer que não se trata de recuperar o projeto dos clássicos em administração. Lembremos que autores como F.Taylor e H.Faylor, além de outros de seus contemporâneos como H.Gantt e os Gilbreths, todos engenheiros de formação, propuseram tornar a administração uma ciência. Eles pensaram a administração estritamente em termos do ato de gerir empresas (sobretudo indústrias) e imaginaram que este ato deveria ser dotado de planejamento racional, previsibilidade e controle, portanto deveria ser abordado em termos científicos (ou melhor, segundo a concepção de ciência positivista bastante em voga na época). É assim que sugeriram, a fim de tornar a administração uma ciência legítima, uma série de princípios gerais devendo governar o ato administrativo. Tais princípios desempenham o papel de uma espécie de conjunto de leis científicas, com pretensão evidente de validade geral e universal. Seguia-se assim aquele raciocínio segundo o qual para que todo campo do conhecimento seja considerado científico ele deve dispor de suas próprias leis. Neste caso da administração, como a natureza do conhecimento era eminentemente prescritiva e técnica (e menos explicativa), os princípios ou leis funcionam como pré-condições para obtenção de eficiência no plano da produção industrial. Supõe-se pois a existência de um modo correto de administrar que depende exatamente da aplicação, adoção ou uso, desses princípios. Relembremos alguns deles na visão de Fayol como por exemplo: hierarquia, divisão do trabalho, centralização das decisões, unidade de comando, autoridade e responsabilidade etc.. Parece desnecessário recolocar que tais idéias causaram uma revolução no campo da organização do trabalho numa época em que a gestão das organizações carecia de meios sistemáticos de procedimento. Do mesmo modo, tais idéias impactaram sobretudo em relação ao padrão da gestão das relações humanas no trabalho. Cabe, em todo caso, e sobretudo, situar num contexto social e econômico específico tais idéias, isto é, numa dada temporalidade. Indagando-se de outro modo, hierarquia e centralização de decisões, do mesmo modo que a chamada organização racional do trabalho – ORT (proposta por Taylor), podem ser consideradas como pré-condições para obtenção de eficiência no plano da gestão organizacional na maioria dos casos hoje ?[10: É nestes termos que se forja em Fayol aquilo que é considerado como a definição clássica da administração. Esta, entendida fundamentalmente como uma prática que muito dependeria de atitude racional, envolve quatro processos gerenciais básicos: o planejamento, a organização, direção e o controle. Isto é, o famoso POC3 que se funde em PODC.][11: Desde então toda uma literatura crítica, sobretudo no campo da sociologia, desenvolveu-se numa perspectiva de denúncia das conseqüências da adoção dos métodos clássicos de administração. Tais críticas tem escolhido como alvo privilegiado os efeitos desumanizadores do modo taylorista de gestão da força de trabalho.]
	Ao contrário portanto dessa perspectiva cientificista de visão, esse terceiro eixo de interpretação pretende simplesmente considerar a possibilidade da administração ser pensada como uma área do conhecimento, ou seja, um campo disciplinar de estudos e pesquisas. Para tanto faz-se necessário a existência de um objeto. Entretanto aqui repousa uma controvérsia: seria esse objeto a gestão, enquanto prática, ou as próprias organizações como fenômeno ?[12: Afinal de contas, a administração não promove seu próprio congresso científico ? Entre inúmeros outros encontros, apenas para se referir ao contexto nacional, a ANPAD (Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Administração), realiza anualmente o seu encontro nacional (o ENANPAD), sempre numa cidade brasileira diferente a cada momento. Trata-se do principal encontro científico da área de administração no país e encontra-se subdividido em 16 grandes áreas temáticas.]
O objeto de estudos da administração: a gestão ou a organização ?
	Sustentamos a segunda hipótese como resposta, embora a primeira não seja descartada. Trata-se, em verdade, segundo nosso entendimento, de uma relação de envolvimento ou imbricação: a gestão constitui uma dimensão essencial do universo organizacional.
	
Consideramos que, enquanto campo disciplinar, a administração ocupa-se principalmente com o estudo das organizações como um fenômeno social. A compreensão adequada desse fenômeno/objeto implica um diálogo com outras disciplinas do conhecimento científico, sobretudo no campo das ciências sociais. É a razão pela qual a administração apresenta um caráter eminentemente interdisciplinar. A título de exemplo vale lembrar:
Ela dialoga com a psicologia a fim de esclarecer, entre outros fenômenos, a questão do comportamento humano no trabalho, além do auxílio que esta disciplina presta no tratamento de temas como liderança, motivação e dinâmica de grupo nas organizações;
Ela dialoga com a sociologia a fim de esclarecer especialmentea dinâmica do poder e dos conflitos nas organizações, além de abordar o aspecto das relações institucionais que tece a organização no seu ambiente político, cultural, social e econômico;
Ela dialoga com a economia a fim de esclarecer a dinâmica das relações de trocas econômicas estabelecidas pela organização no seu meio ambiente;
Ela dialoga com a antropologia a fim de desvendar sobretudo o universo simbólico e cultural, essa ordem social que atravessa a dinâmica de funcionamento organizacional.
Isto posto apenas para citar alguns poucos exemplos. Não apenas uma série de outras disciplinas podem auxiliar a administração na explicação do seu objeto, quanto o alcance das temáticas é variável e flexível em razão das diferentes tendências teóricas presentes em cada campo do conhecimento, bem como, sua própria evolução (evolução dos temas tratados).[13: Para alguns, vale salientar, a especificidade da administração reside no seu caráter de ciência social aplicada. Isto implica um duplo aspecto de visão. De um lado, enquanto campo científico, administração se apoia sobre outras disciplinas a fim de favorecer a análise organizacional ou a compreensão do seu objeto. Do outro lado, enquanto prática profissional, o administrador ou gestor de organizações também apoia-se no conhecimento produzidos em outras disciplinas a fim de subsidiar sua atividade de gestão. Nesse ultimo sentido parece existir um paralelismo entre três áreas profissionais: a administração, a medicina e a engenharia. Cada uma delas afirma sua vocação de um conhecimento eminentemente aplicado e prático, beneficiando dos avanços produzidos pelas demais disciplinas em suas respectivas grandes áreas de concentração. No caso da engenharia, ela apropria-se das contribuições no campo das chamadas ciências exatas, sobretudo aquelas oriundas de disciplinas como a física ou a química, transformando tais conteúdos em conhecimento técnico. O mesmo ocorre com a medicina na sua relação com as demais disciplinas no campo das chamadas ciências da saúde. Cabendo portanto a administração um papel semelhante a estes dois outros, entretanto situando-o no âmbito das chamadas ciências humanas. Isto posto em relação a administração se partimos do pressuposto de entendimento da gestão antes de tudo como um ato de relacionamento humano, uma interação com outras pessoas, o que nem sempre prevaleceu na história da administração.]
	Consideramos que a compreensão do fenômeno organizacional implica o reconhecimento e identificação das suas diferentes dimensões ou variáveis constitutivas. Algumas delas se destacam na tradição da análise organizacional, como estratégia, estrutura, ambiente, cultura etc.. Desse modo, segundo nosso entendimento, a gestão representa uma outra variável do universo organizacional. É verdade que ela não pode ser tomada como apenas “mais uma” variável, pois é dotada de um atributo essencial: aquele de articular as demais variáveis, definindo-as inclusive. Portanto merece sempre um tratamento analítico especial.
Concluindo
	A título de conclusão gostaríamos de sugerir uma breve reflexão sobre os termos organização e gestão. Pensamos que ambos não podem e não devem se conjugar no singular. Não apenas são muitas as formas de organização existentes na sociedade quanto são inúmeras suas respectivas modalidades de gestão.
	De modo preciso, parece adequado sugerir que diferentes formas organizacionais relacionam-se com diferentes espaços ou enclaves societário, dentro dos quais correspondem grandes lógicas específicas orientado a ação desses agentes institucionais. Assim podemos considerar, de modo esquemático, de um lado, as empresas atuando no mercado e orientadas segundo uma lógica fundamentalmente econômica e utilitária. De outro lado, as instituições públicas atuando no espaço do chamado Estado. Estas se orientam segundo a lógica do poder burocrático e devem por princípio buscar satisfazer a dignidade dos cidadãos. E ainda, é preciso considerar um amplo espectro de organizações sobretudo de natureza associativa atuando no espaço público da sociedade, isto é, fora do circuito do Estado e do mercado. Estas, embora possam ser consideradas como iniciativas privadas, pois partem da ação de cidadãos, não tem objetivos lucrativos e almejam o atingimento de finalidades que são também públicas.
	Portanto, as organizações podem assumir formas muito diversas em função do enclave social fundamental onde atua, variando assim de empresas, instituições públicas, fundações (públicas ou privadas), associações, cooperativas, e mais recentemente, organizações sociais (OS) e organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP). Embora cada tipo organizacional corresponda a um enclave social específico, na prática muitas organizações atuam exatamente num espaço fronteiriço, como no caso de algumas associações atuando no limite entre as esferas do Estado e da sociedade civil, ou de algumas cooperativas atuando entre o mercado e a sociedade civil.[14: A originalidade que representa a temática da economia solidária mais recentemente merece destaque, pois trata-se exatamente de formas organizacionais, assumindo na maioria dos casos o estatuto associativo ou cooperativo, cuja vocação fundamental é articular as três esferas, entretanto visando sempre submeter a lógica econômica aos imperativos públicos da sua ação social, uma vez que trata-se antes de tudo de iniciativas da sociedade civil.]
	É assim, com base nessa referência a três esferas ou enclaves sociais fundamentais (o mercado, o Estado e a sociedade civil), sob os quais definem-se grandes lógicas da ação coletiva, que gostaríamos de articular diferentes formatos organizacionais com diferentes tipos genéricos de gestão. Trata-se efetivamente de diferentes modalidades de gestão que se apresenta efetivamente em linhas muito gerais pois num mesmo enclave social as respectivas organizações podem apresentar características muito variadas quanto ao seu modo de gestão. Inclusive torna-se necessário sempre reconhecer o aspecto da cultura mais geral influenciando o padrão de gestão adotado pelas organizações.
	Mesmo levando em consideração tais aspectos, sugerimos em linhas gerais que, às três esferas da sociedade correspondem três modos específicos de gestão: a gestão privada, a gestão pública e a gestão social. O importante num tal tipo de distinção é reconhecer as lógicas prevalecentes que orientam a gestão em certos tipos de organizações. A finalidade de uma instituição pública não é a mesma de uma empresa privada. As políticas públicas tem papel distinto da ação de grandes grupos corporativos privados. A racionalidade que orienta a gestão em tais campos distinguem-se profundamente.
Já em relação a noção de gestão social para referir-se a modalidade de gestão que se pratica no espaço da chamada sociedade civil, algumas reservas devem ser discutidas. Em primeiro lugar tal formulação se apresenta demasiado genérica: poderíamos assim indagarmos sobre qual forma de gestão não é social? Uma vez que toda forma de gestão supõe uma dimensão social fundamental, isto é, o próprio trato humano ou a própria relação entre pessoas. Em segundo lugar a gestão social supõe também a idéia de gestão das demandas e necessidades do social. Ora, isto não é o que efetivamente se faz em nome da gestão pública ? Desse modo as noções de gestão social e de gestão pública se confundem como construções e significados. Mas é preciso reconhecer em todo caso que neste aspecto o papel das organizações atuando no campo da chamada sociedade civil, portanto organizações de natureza privada que cumprem porém uma finalidade pública, acaba muito naturalmente por se confundir com aquele que é próprio do Estado. O conceito de gestão social comporta assim uma dupla dimensão de análise. De um lado, supõe a gestão de problemáticas sociais, numa perspectiva portanto mais macro, do outro, sugere a idéia de uma modalidade específica de gestão, mais apropriada a formas particulares de organizações que brotam da sociedade civil. Assim podemosconcluir que a gestão de tais formas de organizações não se limita jamais a sua esfera interna, sua vocação é de projetar-se sempre, e necessariamente, sobre o espaço público.
Referências Bibliográficas
Aktouf, O., A administração entre a tradição e a renovação, ed. Atlas, São Paulo, 1996.
Chanlat, J-.F., Ciências sociais e management, ed. Atlas, São Paulo, 2000.
Guerreiro Ramos, A., A nova ciência das organizações, ed. FGV, Rio de Janeiro, 1989.
Morgan, G., Imagens da organização, ed. Atlas, São Paulo, 1996.
Rubem, G. e Serva, M, “Resíduos e complementaridade: das relações entre a teoria da administração e a antropologia”, In Anais do 19 ENANPAD, 1995.
Tragtemberg, M., Administração, poder e ideologia, ed. Cortez, São Paulo, 1989.
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