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ARRABAL, Fernando A bicicleta do condenado

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Prévia do material em texto

Grande alegria. Viloro esfrega as
mãos de contentamento, mas apesar
de tudo, um pouco timidamente. Si-
lêncio. Recomeça a tocar cheio de
confiança.
D' , . f' I- o, re, nu, a, so .
Trejeito de contrariedade. Ouvem-
se risos ao fundo. Vi/oro volta-se re-
I ceosamente. Ao fundo, distinguem-se
I dois homens por detrás do muro. Vi-
1/01'0 olha para eles. Os homens tal'·
nam-se bruscamente sérios. Olham
também para Viloro. Silêncio. Vila·
1'0 recomeçaa tocar:
- Dó, ré, mi, fá, sol, ré.
Trejeito tímido de contrariedade.
Risos dos dois homens por detrás do
muro. Vi/oro volta-se e timidamente
olha para o fundo. Os homens dei·
xam de rir. Vi/oro olha para eles. Os
homens olham para Vi/oro seriamen-
te. Silêncio. Viloro tenta ainda fazer
aescala:
- Dó, ré, mi, fá, si, ré.
A,BICICLETA DO
CONDENADO
Fernando Arrabal
Tradução: Virginia Mendes
Adaptação: Naldo Alves
, Personagens:
TASLA
, Vn.ORO
, PASO
DOIS HOMENS
ATO ÚNICO
Tasla ao centro do palco imita a
estátua da justiça, sem a venda nos
olhqs; à direita, por trás do muro,
dois Homens com características de
policiais, e à esquerda, sentado no
banco do pialw, Viloro encara apla-
téia. Depois de algum tempo vê-se
slÚ'gir daS costas de Vi/oro, como se
fosse parte dele, Paso que ostenta uma
coroa na cabeça. (Black-out)
, Palco pouco iluminado. À direita,
muito ao fundo, um pequeno muro
de 1,30m por 3m. À esquerda, um
piano. Viloro toca piano apenas com
um dedo, muito desajeitadamente.
Ensaia aescala musical:
D" 'f'l''- o, re, mi, a, a.
Gesto de contrariedade. Silêncio.
Tênta recomeçar a escala. Toca mui-
to lentamente para não se enganar.
- Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó.
Cessam de rir. Encaram-no seria-
mente. Si/êncio. Paso desaparece par
detrás do muro. Silêncio. Viloro to~
ca mais uma vez:
- Dó, ré, mi, fá, si, ·sol. "
Os dois homens riem por detrás
do muro. Vi/oro volta-se para eles
com ar zangado mas com timidez.
Os dois homens param de rir. Enca-
ram-no muito seriamente. Silêncio;
Pela esquerda entra lima mulher -
TASLA - montada numa bicicleta
que transporta à maneira de reboque
uma gaiola de madeira. A gaiola tem
três pequenas rodas e transporta um
homem nlÍvo. É PASa, com as mãos
atadas. Traz uma mordaça. Tasla
desce da bicicleta. Dirige-se para Vi~
loro. Os dois homens olham descara-
damente para Tasla.
TAsLA - Bom dia, Viloro. (Viloro
com gesto de fadiga aponta o muro.)
VlLORO - Não fale. Eles estão
ali. '
TAsLA (Olha receosamente para os
Trejeito tímido de contrariedade. homens) _ Ainda! (Silêncio. Risos
Os homens riem. Vi/oro olha para do / e T I V'l '1"s 10m ns. as a e I oro votam
eles. Os homens param de rir e
olham-no muito seriamente. Silêncio. receosamente o olhar para Omuro;
Os dOIS homens calam-se. Silêncio.
Viloro prepara-se para recomeçar a Viloro e Tasla olham um para oou-
tocar. Ao fundo, próximo aos dois tro. Os homens desaparecem. Silên-homens e igualmente por detrás do cio.) '
muro, aparece um terceiro homem; É
Pas.o - um homem de cabelos rui. VILORO - Vê se eles aindaestão
vos. Paso indica Vi/oro descarada- lá.
mente com lQ dedo e ri ruidosamente. i TASLA ...:... Olha você. Tenho medo.
Os três homens riem. Viloro volta-se i VILORO - Eu também. (Silêncio:
receosamente econtempla os homens. Vi/oro olha receosamente para o fun~
Os três deixam de rir. Encaram mui- do.) , "
to seriamente Viloro, que tenta de VILORO (muito contente) - Eles
n.ovo fazer a escala: ' já foram embora. (Tasla olha. Oseil
- Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si. rosto ilumina-se.)
Os três homens riem por detrás do ' TA5LA - Finalmente estamos
muro e apontam descaradamente tranqüilos.
com o dedo. Paso, principalmente, ri VlLORO - Temos que esperar;
muito alto. Vi/oro volta-se receosa- Não vão eles voltar daqui a pouco
mente e contempla os três homens. como fazem algumas vezes? 27
". '. :
TASLA(Após um silêncio) - Pro-
grediste?
VILORO(Muito contente) - Oh!
sim. Fiz enormes progressos.
TASLA .; Toca para eu ouvir.
VILORO- Tenho um pouco de
vergonha.
,TASLA - Coragem! Não há moti-
vo para ficar vermelho de vergonha.
VILORO(Entusiasmado) - É sem
querer.
, TASLA - De repente?
VILORO- Não é bem de repen-
te . . . masquase.
, TASLA- Toca um bocadinho. (Vi-
/oro' toca piano: Dó, ré, mi, fá, lá
--:Gesto contrariado de Viloro.)
TASLA- Muito bem, Viloro. Vo-
cê.fez um progresso espantoso!
VILORO - Enganei-me no fim.
Não percebeste?
TASLA - Não. Realmente não
·percebi. .Fiquei com a boa impres-
são do começo. Porque no começo
sepode dizer que foste extraordiná-
'. '
no.
VILORO- Vou tentar tocar tudo
sem parar.
TASLA- Tenta. (Viloro toca pia-
no: Dó, ré, mi, fá, sol - Gesto de .
grande contentamento de Tasla eVi-
loro -:' lá - ame~ma coisa - si -
(( mesma coisa. Tasla grita IIbravo"
~ mi - gesto de contrariedade de
Vilo;o.)
VILORO- Errei por uma coisinha
ti to«
TASLA(Entusiasmada) - Perfeito!
Magnífico!
VILORO- Sim, saiu bem. Mas no
fim .enganei-me numa coisa de nada.
TASLA - Realmente, pode-se di-
28 zer que fizeste progressos espantosos.
VlLORO- Isso é verdade. TASLA - É, nunca. Tenho que
TASLA - Nunca teria imaginado. transportar os condenados.
VlLORO- Lembra do ano passa- VILORO- É verdade.
do? TASLA - Olha, trouxe este balão
TASLA - Só conseguias tocar as para você brincar.
duas primeiras notas. I VlLORO - Obrigado, Tasla. (Vi-
VILORO- Isso mesmo. loto coloca o balão azul sobreo pia-
TASLA - Sim, sim, eu me lembro no.)
disso. TASLA- Adeus, Viloro.
VlLO~O - Nãohá n~da melhor do I VILORO - Adeus, Tasla. (Tasla
que treinar todos os dias. I monta na bicicleta e sai pela direita.
TASLA - E ter talento. I Viloro fica só em cena. Silêncio. Ati-
VlLORO (Timidamente) - Tam- I ra uma vez obalão azul ao ar. Puxa-
bém, éevidente. (Silêncio. Viloro in- I o. Faz o balão saltar duas vezes. Fo-
dica Paso, o homem encerrado na i ge-lhe das mãos. Gesto de contrarie-
gaiola.) dade. Risos ao fundo. Viloro volta-
VlLORO- Tens de levá-lo? se receosamente. Ao fundo, por de-
TASLA_ T h I trás do muro, aparecem os dois ho-en o. E V'l . V'lmens. ncaram Iara sem nr. Iara
VlLORO- Vão matá-lo? olha para eles timidamente. Silêncio.
TASLA - Não sei, mas creio que Viloro prepara-se para fazer saltar o
sim. Eles sabemmelhor do que eu. balão. Os homens riem. Viloro colo-
VILORO- Pesa muito? ca o balão emcima do piano. Timi-
TASLA - Mais ou menos. Perdeu damente senta-se para focar. Os ho-
muito sangue. mens deixam de rir. Silêncio. Viloro
t 't I t D' I •VlLORO _ Bateram-lhe para o ~ca ~Ul,o en amente:- .0, re, ml,
obrigar a confessar? fa, SI, re. Gesto de contrariedade de
T S' h . EI Viloro. Risos ao fundo. Silêncio.
bASLA Ih 1~, ac o que snn, es Perto dos dois homens, por detrás
sa em me ar o que eu. do muro, aparecePaso queri eapon-
VlLORO- Econfessou? ta com o dedo descaradamente para
TASLA - Não sei. Mas de qual- Viloro, que se volta rece.osamente e
quer forma isso vem a dar na mes- olha para 'os três. Os três param de
ma . rir e olham-no seriamente. Viloro
VlLORO - Pode falar. (Pausa). - volta-se para o piano. Silêncio. Os
Ainda não me beijaste. (Beijam-se) três desaparecem por detrás do muro.
TASLA (Indicando o muro) _ Viloro toca: - ?ó, ré, mi~ fá, ré.
Aquilo me incomoda. Gesto decontrarzedade de VIloro que
I olha receosamente para um lado e
VlLORO - .Mas. agora estamos sos. para o outro. Silêncio. Vi/oro toca
Pelo menos, nnagmo, com mais alegria: - Dó, ré, mi, fá,
TASLA - Tenho pressa. Tenho sol, lá, ré, sol. Enquanto Viloro to-
que me livrar dele. Você sabe como cou anota ré, Poso e os dois homens
eles são. entraram pela direita. Colocaram-se
VlLORO - Nunca se tem tempo junto de Viloro, que parece não ter
para nada; dado por nada; está muito aborreci-
do por não poder tocar bem toda a
escala. Silêncio. Vilmo prepara-se
para tocar mais uma vez. Paso tosse.
Silêncio. Vi/oro levantatimidamente
a cabeça. Olha um momento para os
três homens que olhamtambémpara
ele. Baixa rapidamente oolhar.Silên-
cio.)
PASO - Continuas a tocar? (Silên-
cio. Viloro baixa a cabeça cada vez
mais.)
PASO - Fica em pé! (Viloro le-
vanta-se rapidamente.)
PASO - Então? (Silêncio. Paso ao
segundo homem) - Amarra-o! (O
Homem põe uma algema de terra à
volta dos pés de Vi/oro. Amarram-
lhe os dois pés.)
o
de alegria, embora timidamente. - ram e (Apollta os pés) e me amarra-
Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó. Gran- ramo Estás vendo?
de alegria de Viloro. Pausa. Toca TASLA- Nunca mais vão te 'dei-
ainda. - Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, xar empaz?
dó. Pára bruscamente. Continua a to-
D' , . f' I l' . d' VILORO - Bem sabes que não gos-caro - o, te, ml, a, so, a, SI, O.
Pára bruscamente e volta: - Dó, ré, tam que eu toque.
mi, fá, sol, lá, si, d. Esfrega as mãos i TASLA- Virá o dia em que se-
de contentamento. Cheio de alegria, remos livres.
olha para todas as direções, embora VILORO (Entusiasmado) - Acre-
com certa timidez. Toca de novo sem ditas, Tasla?
parar: - Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, TASLA_ Acredito. E não terei
dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, do, ré, mi, tar mai d d
"f que transpor ar mais con ena os.fá, sol, lá, si, do, re, mi, á, sol, lá,
si, dó. Grande alegria de Vi/oro. VILORO - Sim, nunca mais.
Olha para todos os lados timidamen- TASLA - Evocê poderá tocar pia-
te mas cheio de alegria. Pela direita, no todas as vezes que quiser.
entra Tasla, com a mesma bicicleta, VILORO _ Sempre?
o mesmoreboque e omesmo conde-
PASO - Você sabe muitobem que nado da primeira vez.) TASLA - Sempre efacilmente.
nã? te~ o .direito de tocar piano. VlLORO (Descobrindo Tasla) _ VlLORO - Facilmente? (Pausa.
(SllenclO. VIloro levan~a .receosamen~ . Ouve, Tasla. (Toca rapidamente) _ Com orgulho) Verás que nessa alturat~ acab.efa).- Da p.roxlma vez sera I Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó, ré, mi, serei um grande pianista. Chegarei
por. (~l/~nclO: ?s.tres .homens saem fá, sol, lá, si, dó, ré, mi, fá, sol, lá, mesmoa compor.
pela .dlrelta. SilencIO. Vzl~ro desce d~ si, dó. O contentamento e a alegria TASLA - Você também quer com-
cadeira e tentaandar. VaI. Pausa. VI- de Tasla crescem à medida que Vi- por?
l~ro comefa a andar de gatas. Anda loro toca as escalas.) VlLORO- Claro! Quero escrever
rapido. FICOU contente. Percorreu a • . ? - • (A
cenade gatas e relativamente depres- TAISLA - Como voce consegmu, uma cançao para voce. r envergo-I nhadD) - Uma canção nova e ori-
sa de um lado ao outro. Ficou muito I VlLORO(Orgulhoso) - Sou umsu- ginal.
contente. Levanta-se e tenta cami- jeito formidável, não é verdade? T~LA - Que ótimo!
nh.ar deva.garinllO. Dá alguns passos. TASLA - Sim. Você é umsujeito
F t t VlLORO - Já fiz a letra.ICOU~l/lto CDn .en e,avançaU~l pO~l- excepcional. (Vi/oro repara na pre-
co mas, mas caroTem u!n ar mfel~z. sença de Paso.) TASLA (Cheia de admiração) - :B
Pausa. ConseguechegarJuntoaoPia- , . ? mesmo?!
noaandar de gatas. Levanta-se ede VlLORO- E o mesmo ainda' VlLORO- É. (Pausa) - Estou
pé tenta andar apoiado ao piano. TASLA - Sim. Dizemque não o certo de que você vai gostar muito.
C~nsegue, dar a volta ao piar;o sem I torturaram ainda o suficiente. Quer que eu cante?
cmr. Es~a conte~te . Pausa. Da avol- VILO:{Q - E você é que o con- TASLA - Lógico!
ta.aotnano ap.o ~ando-s: nele comas duz à câmara de torturas? V E
maos e sem cair. Esta contente, de .. . II:.ORO- stou umpouco enver-
pé. Levanta-se. Cai. Ar infeliz. Pau- TASLA - Sim. FOI o que me dis- ganhado.
sa. Viloro dirige-se para o banco do seram paraJazer. ~om umP?UCO de TASLA - Vamos, vamos, não fi-
piano. Consegue atingi-lo. Endireita- , sorte eles ~ao otera,o por m~lto !e~- que envergonhado. Se quiser, não
se e senta. Muito contente, prepara- p~. Gosta~a de l~va-lo (IndIca a dl- olho para você.
se para tocar. Toca: - Dó, ré, mi, reIta) - ainda hoje mesmo. VILORO - Está bem, não olhepa-
fá, sol, lá, si, dó. GraJlde alegria de VlLORO- Claro, assim ficarás li- ra mim. (Pausa) - Põe a mão'nos
Viloro. Olha para todososlados cheio vre mais cedo. (Pausa) - Eles vie- olhos. (Tasla executa o gesto) Não 29
--- ~-_. ~--------------------
estás .vendo nada? Os olhos estão
bem fechados?
· TASLA'- Estão, estão, vá, canta.
VILQRO(Envergonhado) - À luz
doluar, minha Taslazinha taralálálá,
t '1'1'1'araaaa.. .
.TASLA(Entusiasmada) - Que linda
canção!
V G ?" lLORO - osta.
TASLA - Oh, sim, muito, muito.
"YILORO(Sério) - Você me ama,
Tasla?
TASLA - Amo, Viloro.
·.VILORO- Também te amo muito.
(Pausa) Faz uma éanção para'mim?
TASLA - Mas não tenho talento
nenhum!
· VILORO - Se quiseres posso te
dar uma idéia. Ouve: à luz do lu ...
Isso não te diz nada?
TASLA - Vagamente. (Comar re-
,çolulO) - À luz do luar, meu pe-
quenino Viloro.
'. VILORO- Como a tua canção é
linda' Você realmente tem inspira-
'çãol (Pausa) Mas podias fazer ainda
melhor, ouve: "à luz do luar, meu
grande Viloro."
TASLA - Ah, é, está realmente
'melhor.
VILORO- Comovês, tenho idéias.
.TASLA - Sim, você 'é formidável.
VlLORO - Não vai embora, Tasla,
fica comigo.
TASLA - Impossível, Viloro. Bem
sabes como eles são.
VlLORO- Você vai pensar em
mIm.
TASLA - Sim.
VlLORO- Vais fazer outros poe-
mas para mim?
30 TASLA - Vou.
VlLORO - Para cada chicotada i VlLORO - E em todas as aldeiàs
que derem no condenado, você me . por onde passarmos tocaremos piano:
manda um beijo. dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó. Sei to-
TASLA - Está bem. car tão bem! Assim todas as pessas
VILORO - Não vais esquecer? que encontrarmos f~carão con~en ~es.
TASLA - Não, Viloro. TAS;A- ,E depois ... se quiseres,
V N- I poderas recuar o poema que escre-
ILORO - a~ me trouxeste ne- veste para mim . .
nhumpresente hoje? I ,
T T . V'I T VILORO- Ah, SIm, claro, o poe-ASLA- r?uxe, Sim, I oro. e ma também.
trouxe um pellICO. . , . .
, TASLA- E dirás a toda a gente~ILORO (M~~to? contente) - Um que o escreveste para mim?
pemco para muar. V CI
T S· .. C lLORO- aro.ASLA- nn, para mijar. orno T . , I
amarraram teus pés. isso vai te ser ASLA- Ainda seras famoso.
muito útil. ' VILORO - E compraremos solda-
V C ' , b P dos de chumbo para brincar.lLORO - 'Ornovoce e oa en-
sa sempre emmim! TASLA- Sim.
TASLA - E você o que vai me VlLORO- Sim.
dar? VILORO- EModess para quando
VlLORO- Uma coisa muito bo- estiveres menstruada?
nita. (Pega o balão azul e lhe dá) TASLA - Sim, Viloro.
Toma! VlLORO - Como vamos ser feli-
TASLA - Puxa, que surpresa, Vi. zes! (Silêllâo) •
loro! TASLA - Vou embora, Viloro.
VlLORO- Então, gostou? VILORO- Adeus, Tasla. Não de-
TASLA - Gostei muito! mora. Não esquece o balão.
VlLORO- Quando pudermos ir TASLA, (Segur~ o balão) - O.bri-
embora seremos muito felizes gado, VIIoro, ate logo. (Tas/a so: de
T ' E ~t d' . . t f bicicleta pelo lado esquerdo. ViloroASLA - xraor manamene e- f' , S'l ' , JI'I t .li Ica so. I enao. I oro oca ptalUJ
izes, d l'd d D' ,
, com gran e )1(' OCI a e. - o, re,
VlLORO- Mas sera quepodemos? mi, fá, sol, lá, si, dó. Ar de vivo con-
TASLA - Sim, havemos de poder. tenumeüo. Toca mais uma vez. -
Mas agora tenho que ir embora. Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó. Gum-
VlLORO- Não vai ainda. Eles de alegria. Longa pausa. Recomeça.
ainda não se deram conta. (Brusca- P?ra br~l~camell l e, - ~6, si, lá, sol,
mente) Tasla, me diz, quando esca- re. TreJeito ,de .co~traned~de. ,Reco-
parmos você me leva? meça:- Do, SI, la, sol, ta, do. Tre-
T ' S' T I jeito de contrariedade. Risos ao tU1l-ASLA - nn, e evo. do. Viloro volta-se receosamente e
VlLORO- Mas ouve, Tasla. Se encara os dois homens, que acabam
você se cansar, posso te substituir de de aparecer por detrás do muro. Os
vez emquando e você irá sentada na dois param imediatamente de rir e
gaiola. olham-no com ar sério. Silêncio. Ao
I TASLA - Como você é amável! lado dos dois homens aparece Paio.
o braço insinuantemente. Os dois ho- : menteergue várias vezes o balão.Pa-Paso ri descaradamente e aponta Vi- .
Iara com o dedo e recomeçam arir.
Silêncio. Viloro toca mais uma vez.
- Dó, si, lá, sol, fá, lá. Trejeito de
contrariedade de Viloro. Os três ho-
mens riem ruidosamente e apontam
Viloro com o dedo. Viloro não ousa
sequer mexer-se. Baixa a cabeça. Os
três homens apontam para ele deses-
peradamente, rindo sempre. Saem de-
trás do muro e, continuando a rir,
avançam para Viloro, que se volta re-
ceosamente. Olha-os por um instante.
Os homens ficam de pé. Sem se me-
xerem, com ar sério. Viloro baixa de
novo a cabeça. Os três homens co-
meçam abrincar de trem ao redor do
piano. Paso éalocomotiva e os ou-
tros, os vagões. Riem os três eolham
para Viloro que tem um ar amedron-
tado. Continuam a brincar de trem.
Paso imitando os silvos. as três rin-
do sempre, continuam a olhar para
Viloro, que apavorado ergue acabe-
ça e olha para eles. Os três homens
deixam de rir e olham-no com ar sé-
rio, sem se mexerem. Viloro baixa
mais uma vez a cabeça com ar re-
ceoso. Os três recomeçam a brincar.
Estão certamente cansados porque se
sentam no chão olluUldo fixamente
para Viloro. Silêncio prowngado.
Viloro olha para eles receosamen-
te e baixa mais uma vez a cabeça.
Imediatamente os três homens o
apontam descaradamente com o de-
do, rindo muito alto. Víwro olha
outra vez para eles. Silêncio. Os ou-
tros continuam arir indicando-o com
o dedo. Silêncio.
Por detrás do muro aparece obra-
ço duma mulher que segura na mão
um grande balão azul. Os homens
desviam o olhar para o muro. Paso
não se interessa pelo espetáculo. Ou-
ve-se atrás do muro o riso lascivo
de uma 11lulher que começa a agitar
mens olham. Paso não presta nenhu-
ma atenção ao espetáculo. Os dois
homens correm para omuro. Obra-
ço e o balão desapar~cem. Os dois
/wmens voltam a colocar-se junto de
Paso. Silêncio.
Riso lascivo de mulher. Por detrás
do muro aparece o braço nu e insi-
nuante que dgita o balão. Os dois
homens olham. Eles tentam se le·
vantar, mas Paso os retém. O jogo
insinuante do braço continua. Ouve-
se oriso lascivo. Os dois homens ten-
tam ainda dirigir-se para omuro: Pa-
so não deixa. Riso lascivo de mulher.
A perna nua da mulher aparece se-
gurando o balão com opé. Riso las-
ciso. Nova tentativa dos dois homens
para se aproximarem do muro. Apa-
recem as duas pernas nuas da mulher.
Segura o balão com os pés. Riso las-
civo. Suspiros amorosos. Os dois ho-
mens tentam atingir omuro. Poso os
impede. Longo Silêncio.
Expectativa: os dois· homens olham
para omuro. Paso desinteressa-se do
espetáculo. Tasla aparece com o ba-
lão na mão e um vestido transpa-
rente, muito decotado e a saia arre-
gaçada. Os dois homens olham para
ela. Gestos de Tasla insinuantes e
cheios de volúpia.
Riso lascivo. Viloro volta receosa-
mente acabeça para ela. Tasla deixa
de rir e tenta pudicamente tapar as
pernas nuas. Viloro baixa a cabeça.
Silêncio.
Novo riso lascivo de mulher e no-
vos gestos insinuantes e provocantes.
Os dois homens olham, Paso não.
Tasla faz saltar o balão e quando o
agarra estreita-o voluptuosamente. Os
dois homens tentam levantar-se pa-
ra se juntar a Tasla. Paso retém-nos
com dificuldade. Tasla voluptuosa-
so já não consegue reter os doisho~
mens que se escapam e vão para
junto de Tasla, que ao vê-los apro--
ximar aperta com força o balãocon-;
tra o peito. Os dois homens .lançam":
se sobre ela e fazem grandes esfor-
ços para lhe arrancar o balão. Tasla
resiste. Caem os três no chão e ficám
assim um bom tempo. Estão de tai
modo envolvidos que já não se pode
seguir bem odesenrolar da luta. o;
vem-se grunhidos.
Viloro volta a cara para eles com
ar receoso. A luta cessa. Os três dei-
tados no chão levantam acabeça pa~
ra olharem. Viwro com ar sério; que
não os encara e baixa a cabeça. :A
luta recomeça. Ouvem-se grunhidos
cada vez mais ofegantes. ContinUani
arevolver-se no chão, até que os dois
homens conseguem apoderar-se do
balão. Tasla fica deitada no chao,
ofegante. .Os dois homens brincam
com o balão. Atiram-no um para o
outro. Paso mistura-se ao jogo. Ian-
çam obalão uns para os outros. Riem
com ar feliz. Tasla levanta-se e se
dirige para Paso estreitando-o com
volúpia. Paso empurra-a. Um dos ho-
mens lança-se sobre Tasla. Rolam os
dois pelo chão lascivamente. " Du-
rante esse tempo ooutro homem joga
o balão com Paso. Atiram-no agora
por cima da cabeça de Viloro: um
está à direita do piano, outro àes-
querda. Atiram o balão e riem 'com
ar feliz. À direita, Tasla e o homem
espojados no chão eestreitamente en-
laçados lançam grunhidos lascivos.
Viloroolha receosamente para o ba-
lão que vai e vem por cima de sua
cabeça. Paso e o outro homem dei-
xam de brincar. Viloro olha-os e eles
muito sérios olham para Viloro que
timidamente baixa acabeça.31
ohomem que estava com Tasla ~ Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó. (Silêncio. Os três homens saem 'pe~
levanta-se e vai jogar balão com Pa- Pára bruscamente, depois continua la direita. Pausa demorada. Viloro
so e o outro companheiro. Jogam e a tocar. olha para todos os lados. Tenta to-
riem. Tasla mais uma vez tentqabra- D" li 1 f I l' car comas mãos algemadas. Martela
P 1 - o, SI, a, so, a, a. . ' S'IA ' Lçar aso vo uptuosamente- sempre '.A ' com as maos ao plano. I enao. e-
que Paso passa perto de Tasla, esta Gesto de contranedade. SllenclO. vanta-se de novo com muita precau-
dá-lhe uma palmadana bunda. Viloro tenta apanhar o balão, que ção. Grande satisfação.Caminha. Cai.
Paso ao fugir abandonou junto ao I Pausa. Arrasta-se pelo chão com re-Paso empurra-a violentamente. O C .
muro. ai, as pernas estão. entrava.- I lativa facilidade. Pausa. Contenta-primeiro homem atira-se novamente d 1 1 T d
as peas. agemas., enta ~m a.caml- menta. Atinge o piano. Levanta-se.
sobreTasla derrubando-a e ficamom- h C A h-
bos deitados no chãode uma manei- n a!. ai. o cmr ~o c ao atl11ge o Dá a volta ao piano apoiado nele.
ra obscena. O outro homem e Paso balao. A~arra-o e fa-lo saltar. Vo~ta Grande alegria. Senta-se. Com as
. . f I' A f para oplano arrastando-se pelo chao. mãos amarradas toca piano com um
neme Jogamcomar eIZ. gora a- C'~ b 1· , D' lt . . .b r . d V' ooc«o aaono plano. aavo a dedo. Comgrande dificuldade. Toca:
tem passar o aao por cima . e 1- ao piano, apoiado nele. Ar de con- I I ' I' I I
loro. Este olha-w. O':lesma Jogo. O tentamento. Senta-se em frente ao .-: Do, re, ,ml" sol~ la, SI, do, do,
homemque estav~ ~eltado com ras- I piano. Silêncio. Toca de novo. SI, la, sol, rrll, .re, do.
la levanta-se e Vai Jogar com Paso e D" I 1 f I • dI Muito contente, Viloro toca ainda:
oseu companheiro. Tasla tentatocar I - o, SI, la, soi, a, nu, o. I I ' . I " I
T .. d . d d T. - Do re tm fa sol la SI dolW ventre de Paso ao mesmo tempo reJelfo e camtone a e. oca: ' 1' I' f ; ~ ; d,' , , ,
, Ih di 1 d b d SI, a, SO, a, n1l, te, o.que e a uma pa ma a na un a. - Dó, si, sol, fá, mi, ré, lá. '. .
Paso afasta-a várias vezes enquanto . . , . Recomeça a tocar cheiOde alegrta
. t d ' E t TreJeitodecontranedade. Contmua e muito depressa'Joga comos ouros OiS. ses segu- .
T '1 I ' f a tocar. DI I . ' I 1 li . diram as a e evam-na a orça para I • I I • I - o, re, nü, ta, SO, a, SI, o,
trás do muro. Tasla desaparece. Os - Do, SI, la, fa, 1111, te, sol. si, lá, sol, fá, mi, ré, dó.
doi~ homen~ correm para b~scar ~ .E~quanto ele toca~la, apareceram à Cheio de alegria. Recomeça três ve.
pemcode Vl!oro. Voltam parao '~U- direItaPas~ eos d?IS homens. Coio- zes, sem parar. Tasla entra pela es-
1'0. O brafo de Tas~a aparece. Dôo- c~m-se atras de Vlloro. Este parece querda. Transporta Paso que est4 na
lhe o pemco. Os dOIS homens enco~- nao ter dado por nada. .P:ep,ara-se gaiola. Grande alegria de Viloro
t~os ao muro (de costas para o pu- i para tocar. Paso tosse. SilencIO. quando repara em Tasla.)
bl:cO)dobservamS?IAq~e se passa por Vi/oro ergue timidamente acabeça. VILORO_ Não vais acreditar.
tras o muro. I enao. Olha os três homens} que também A
, II 1 d ' b . b TASLA - O que?
, Ouve-se o barulho de alguém que o 10mparaee, epou alxaaca e- . _
urüza demoradamente no penico. Vi- ça. Silêncio. VILORO - Ouve, (Com as. maos
[oro volta timidamente a cabeça. O PASO_ Continuas? (Silêncio. Vi- ~marradas tocacomum ar muuo fe-
;uído pára bruscamente. Ouve-se de loro baixa acabeçaainda mais. Nun- 11.)
novoobarulho. Os dois homens num ca teve a cabeça tão inclinada.) - Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó,
silêncio absoluto continuam a olhar PASO_ Levanta. (Viloro levanta- si, si, lá, sol, fá, mi, ré, dó.
o'que se passa atrás do muro. Paso e p'd e te ) TASLA (Entusiasmada) - Você 'é
f' I F I b I· s ra I am n .ic« so em cena. az satar o aao um sujeito formidável! Fez um pro-~árias vezes. Vilora volta-se para ele .PASO (Parao segundo homem) -
com ar decidido, Aponta-lheodedo e Poe-Ihe as ~lgemas ! ,(Este executa, gresso espantoso.
ri, Pasorecua espantado edesaparece amarra as maos de Vtloro.) VILORO - Mesmo com as mãos
atrás do muro. Viloro envergonhado PASO(Para Viloro) - Sabes mui- algemadas!
baixa a cabeça à espera do castigo. to bem que não tens o direito de to- TASLA- E ainda por cima com
Si/bicio. Pausa longa. Vilora olha car piano. (Silêncio , Viloro baixa ti- as mãos algemadas.
com receio a sua valia. Viloro toca midamente a cabeça.) Da próxima VlLORO- Você já se deu conta
32 piano. vez será pior. que eu sou um sujeito espantoso?
o
-
TASLA - Sim, Viloro. (Pausa)
Eles te algemaram as mãos?
VILORO - Sim. Mas você sabe
que"eu posso andar me arrastando.
. TASLA - Verdade?
VlLORO - É.
TASLA - Você é muito corajoso.
VILORO (Indicando Paso) - Já
acabaram de torturá-lo?
TASLA - Sim, acredito que sim.
VILORO (Com ollws muito aber-
tos) - Ecada vez que o torturavam,
você pensava em mim?
TASLA- Sim, Viloro, pensava em
' A
voce.
VlLORO (Numsobressalto) - Pen-
savas emmim como? (Desconfiado)
Não'é verdade.
TMiLA- É verdade, Viloro.
VILORO- Você é uma moça ver-
dadeiramene inteligente: chega mes-
mo a pensar.
.,. ~
.TASLA (Envergonhada) - Bom...
nem por ISSO.
VILORO- Bateram muito nele?
·TASLA- Muito, mas cadavezque
lhe batiam, ele botava a língua para
os carrascos.
VlLORO- Atreveu-se?
TASLA - E nãoficou sónisso.
VILORO - Tentou fugir também?
TASLA - Não. Não chegou a tan-
to. Não mexeuum dedo durante todo
o tempo. Estava dobrado sobre si
mesmo. Embora nunca deixasse de
botar a língua para os carrascos. Ou-
vi mesmo chamar-lhes "repugnan-
tes".
VlLORO - E eles ouviram?
.TASLA - Não, felizmente paraele.
VILORO - É um condenado. Não
é realmente um santinho.
TASLA - É isso, temos que reco- TASLA - Eu também trouxe um
nhecer. presente que vai deixar você admi-
VILORO - E a você, nunca pôs arado.
língua? VlLORO - Adivinha qual é omeu
TASLA - Não. (Paso, o condena- presente.
do, que até aqui tinha estado imóvel, TASLA - Não sei. (Pausa. Pensa.
ergue-se de repente e põe desafora- De repente) - Umpenico.
damente a língua para Tasla e faz- VILORO - Não, não. (Muito con-
lhe piruetas com amão no nariz. Es- tente) - Já sabiaque ia te fazer uma
ta vira-lhe as costas, não dando por surpresa. É exatamente o contrário.
nada, assim como Vi/oro que na po- Vê se adivinha.
sição em que está não pode ver o TASLA _ Não consigo.
condenado.)
VILORO - Confessa que não adivi-
VlLORO - Pois bem, pode se di- nha?
zer que tens tido sorte.
TASLA - Confesso.TASLA - Sim, é verdade, desde
que o entregaram que ele está sosse- VILORO - Pois bem, é um balão
gado ali dentro. azul. (Tasla e Vi/oro olham um para
o outro, entusiasmados.)VILORO - Achas que ele tentaria
fugir? TASLA - Como você queria que
eu adivinhasse isso?TASLA - Na presença dos carras-
cos não, mas agora, se pudesse, não VILORO- Vê comote amo. (Mos-
hesitaria. É um bom ponto, mas a tra-lhe o balão que está em cima do
gaiola ésólida. (Paso abre aporta da piano) - Pega. É teu.
gaiola. Põe a cabeça de fora e faz TASLA- Posso brincar com ele?
muitas piruetas com as mãos no na- VILORO - Sim. Se quiseres.
riz para Tasla e toca-lhea bundade TAsLA (Fazendo saltaro balão) -leve. Tasla, inconscientemente, saco- É formidável. .
de amão de Paso como sese tratas-
se de uma mosca.) VILORO - É preciso aprender a
VILORO - Vai levá-lo agora lá fazê-losaltar bemparamostrarmos as
nossas habilidades quando passarmospara baixo? (Aponta para a direita.)
os dois pelas aldeias.
TASLA- Sim. Vãomatá-lo. (Paso TASLA ...... Como?
fecha a porta da gaiola e, como a . ~
princípio parece mais adormecido.) VILORO- MUIto SImples. Jogas
, . .. . para oaltoetornas aapanhá-lo.Vais
VILORO - E depois, vais ficar 1I- I ver como é bonito .
vre? . . .
TASLA - Conseguirei aprender?
!ASLA - Sim, se não tiver outra I VILORO_ Evidentemente. Você é
coisa para fazer. I muito habilidosa. Para você, que até
VILORO - E virás ver-me? é capaz de pensar, isso não tem diíi-
TASLA - Claro, Viloro I culdade nenhuma.
VlLORO - Sabe Tasla te arran- I TNSLA - Vocême ensinacomoé?
jei um presente qu~ vai deixar você I VILORO- Claro. E para que o
espantada. I número tenha ainda mais sucesso, en- 33
- Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó,
do, si, lá, sol, fá, mi, ré, dó.
Sem fazer nenhuma pausa recome-
çaa tocar a mesma coisa três vezes.
Pausa. Toca várias vezes a mesma
coisa, cada vez mais depressa. En-
quanto ele toca. Paso e os dois
homens entramecolocam-se atrás de
- Dó, ré, mi, fá, 5.01, lá, si, dó,
do, si, lá, sol, fá, mi, ré, dó.
Para bruscamente para depois re-
começar a tocar:
- Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó,
do, si, lá, sol, fá, mi, ré, dó.
Viloro toca no penico com as mãos
algemadas. Olha-o atentamente eaca-
ricia-o. Recomeça a tocar piano.
rece por detrás do muro. Pausa "de-
morada. Poso continua no chão e os
dOI~ homens na mútua troca de ternu-
ras.
número dois aproixma-se de Tasla,
abraça-a fogosamente e a acaricia. O
homem número um dá um violento
soco no dois. Riso lascivo de Tasla.
Ohomem número dOls cai e fica es- Tasla aparece por detrás do mu-
tendido no chão sem poder sequer se 't d d d d dO 1'0 com o pela esnu a o, an o a
mexer. ho~ne~ marte/~-lhe acabe- impressão de que está nua. Chama
ça com o p~. RISO laSCIVO de Tasla. I pelos dois homens com volúpia. Os
Ohomem numero um lança-se sobre dois levantam-se e olham-na com
ela~ abraça-a: .rebola com ela pelo concupisciência. Tasla faz 'um gesto
ch?o e ocanao-a. Paso aparece por provocante para os convidar a",5e
tras do muro. Olha para eles. aproximar. Os dois correm. Saem e
Ohomem número um c!leio de so- desaparecem por detrás do muro.
licitude aproxima-se do número dois. Compreende-se que eles se lançaram
Trata-o com muita atenção. Limpa- sobre Tasla. Riso lascivo desta. Gru-
lhe o sangue, abraça-o com ternura. nhidos obscenos dos dois homens
Reconforta-o. Ohomem número dois Não se vê nada do que eles fazem
recupera pouco apouco aconsciência. porque estãoescondidos atrás do mu-
Beija fervorosamente as mãos do nú- 1'0. Paso com dificuldade consegue
mero um. Prodigalizam um ao outro por-se de pé. Olha d sua volta. ViÚJ-
cuidados e manifestam calorosamen- 1'0 volta-se para ele com ar decidido.
te asua recíproca afeição. Paso apro- Aponta-o com o dedo e ri. Paso te-
uma-se de Tasla, que se afasta dele tua espanta~o. Desaparece por detr~s
com irritação. Paso aproxima-se no- do muro. Vlloro, envergonlta~, ba~-
vamente dela e lhe belisca as náde- X? a. cabeça esperando o c~stlgo. S,-
gas. Tasla se afasta violentamente lenclO. Pausa ?emorada. Vlloro ol?a
dele Vila de t II receosamente a sua volta e toca pw-
. O'lhro repen e o ta par,a. o no _ com as mãeis atadas.
grupo. em-no todos com ar seno.
Viloro baixa timidamente a cabeça.
Eles riem apontando-lhe o dedo des-
caradamente. Os dois homens conti-
nuam a acarinhar-se.
quanto jogas"°balão, eu tocarei dó,
ré, mi, fá, sol, lá, si, só.
TASLA (De repente)- Garanto
que não consegues adivinhar o que é
o meu presente.
VILORO - Não sou. (Reflete. De
repente) Já sei: um balão azul.
TASLA - Não, não é. (Muito con-
tente) Já sabia que ia te fazer uma
surpresa. É exatamente o contrário,
adivinha?
VILORO - Não.
TASLA - Confessa que não 'é ca-
paz de adivinhar?
VILORO - Confesso.
TASLA - Pois bem, "é um penico.
VILORO - Como você queria que
eu adivinhasse uma coisa dessas? (Os
dois riem muito entusiasmados.)
TASLA - Viloro, tenho que ir em-o
bora. Preciso levar o condenado.
"VILORO- Não te demores.
TASLA - Volto logo.
VIi.oRo - Bom, então até logo.
'rASLA - Até logo, Viloro.(Tasla
sai pela direita, montada na bicicle-
ta. Viloro fica só. Toca piano:
- Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó,
si, Já, sol, fá, mi, ré, dó.
Vivo contentamento de Viloro.
Barulho ao fundo. Entra em cena, pe- Paso tenta agarrar Tasla e beliscá-
lo lado do muro, o homem número la. Tasla escapa. Paso perse~ue-a.
um que cai de costas. Ohomem nú- Correm à volta do piano. Fazem fin-
mero dois atira-se sobre ele. Ocom- tas. Param indecisos em frente um do
bate é violento, mas os dois adversá- I outro de cada lado do piano. Viloro
rios não se mexem. Tasla, seminua, levanta a cabeça e os olha. Tasla e
Paso olham-no com ar sério. Viloro
aparece por trás do muro. Segue o
combate com ar voluptuoso. Riso baixa acabeça.
lascivo. Aproxima-se dos dois ho- I PaSDeTasla continuamacorrerao
mens que se batem. Dá-lhes palmadas redor do piano. Paso consegue agar-
nabunda eacaricia-os nas costas com rá-la. Rebola com ela pelo chão. Tas-
volúpia. O combate continua. Tasla la consegue escapar. Ela dá-lhe um
abraça-os no pescoço e nas pernas. O pontapé na cabeça. Paso fica no chão
34 homem número um fica no chão. O aturdido. Tasla escapa, sai e desapa-
Viloro que continuaa tocar com um
frenesi crescente. Paso tosse. Viloro
continua a tocar.)
PASO - Levanta! (Viloro toca ca-
da 'vez mais depressa.)
PASO - Levanta! (Viloro continua
a tocar. Paso lança-se sobre 'ele e o
assassina pelas costas. Viloro cai mor-
to sobr~ o piano. Silêncio. Os dois
homens olham para Viloro. Pasotam-
bêm. Ouvem-se risos ao fundo. Não
se vê ninguém, mas são os mesmos
risos de quando os homeM estavam
atrás do muro. Silêncio. Ouvem-se
agora ao fundo o riso de Tasla. Paso
e os dois homens que se encontram
junto de Viloro olham-no, pelo con-
trário, com um profundo respeito.)
PASO (Para o homem número Ilm)
- Diga a ela que venha buscar o
corpo. (Ohomem número um sai pe-
la direita. Paso e o outro saem pela
esquerda. Silêncio demorado. Tasla,
montada na bicicleta, entra pela di-
reita. À maneira de reboque trás um
caixão. Tasla põe amorosamente Vi-
Iara no caixão. Tasla deixa o balão
azul - que estava preso ao seu porta
bagagens - sobre o piano. Tasla,
antes de fechar o caixão abraça amo-
rosamente aViloro. Tasla sai pela di-
reita com a bicicleta e o caixão. Si-
lênCio prolongado. Ouvem-se risos
de crianças. Obalão começa asubir
lentamente e desaparece no ar. Du-
rante esse tempo ouve-se cada vez i
mais alto os risos infantis muito pu-
ros e, ao fundo, as escalas tocadas ao
pianoeperfeitamente executadas.)
FIM
11
35

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