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Revista dos Juizados Especiais D ou tr in a e Ju ri sp ru dê nc iaISSN 1414-2902 PODER JUDICIÁRIO DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS Revista dos Juizados Especiais Jul./Dez. 2009 27 ISSN 1414-2902 Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios Ano XIII – Número XXVII – Jul./Dez. 2009 Revista dos Juizados Especiais Doutrina e Jurisprudência Comissão Organizadora Presidente Des. Romão Cícero de Oliveira Coordenador Juiz de Direito Fernando Antônio Tavernard Lima Secretária-Geral Ivana Hermínia Ueda Resende Secretário de Jurisprudência e Biblioteca Bruno Elias de Queiroga Subsecretário de Doutrina e Jurisprudência Jorge Eduardo Tomio Althoff Supervisor Rafael Arcanjo Reis Pede-se permuta On demande de l’échange We ask for exchange Man bitte um austraush Pídese canje Si richiede lo scambio Redação Subsecretaria de Doutrina e Jurisprudência Serviço de Revista e Ementário Palácio da Justiça - Praça Municipal, Bloco A, Ala A, Sala 404 CEP: 70094-900 - Brasília - DF Telefones: (61) 3343-5909 e 3343-7001 - ramal 5902 (Fax) E-mail: jurisprudencia@tjdft.jus.br Home Page do TJDF: http://www.tjdft.jus.br Revis ta dos Ju izados Especia i s : dout r ina e ju r i spr udência / Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios – vol.1, nº 1 (1997) – Brasília: O Tribunal, 1997 – . Publicada em ago./2003 Semestral ISSN 1414-2902 1. Ju izados Espec ia i s – Jur i spr udênc ia. 2. Ju izados Espec ia i s – Doutrina. I. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios Des. Nívio Geraldo Gonçalves - Presidente Des. Romão Cícero de Oliveira - Vice-Presidente Des. Getulio Pinheiro de Souza - Corregedor Juizados Especiais Coordenação Cível Juiz de Direito Flávio Fernando Almeida da Fonseca Coordenação Criminal Juíza de Direito Giselle Rocha Raposo 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais Juíza Sandra Reves Vasques Tonussi - Presidente Juiz Flávio Fernando Almeida da Fonseca - Vogal Juíza Wilde Maria Silva Justiniano Ribeiro - Vogal Juiz Luis Eduardo Yatsuda Arima - Suplente Juíza Giselle Rocha Raposo - Suplente Juíza Rita de Cássia de Cerqueira Lima Rocha - Suplente 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais Juiz José Guilherme de Souza - Presidente Juiz Asiel Henrique de Sousa - Vogal Juiz Fernando Antonio Tavernard Lima - Vogal Juíza Edi Maria Coutinho Bizzi - Suplente Juíza Oriana Piske de Azevedo Magalhães Pinto - Suplente Juiz Edmar Ramiro Correia - Suplente REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT6 SUMÁRIO 7 Sumário Doutrina 15Os protagonistas dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais Oriana Piske de Azevedo Magalhães Pinto Jurisprudência Cível 33Acórdãos ....................................................................... Acidente de Trânsito ...................................................................33 Condomínio ..............................................................................37 Dano moral - cia. Aérea ............................................................. 41 Dano moral - cia Telefônica ........................................................46 Dano moral - diversos ............................................................... 55 Execução.................................................................................60 Obrigação de Fazer .................................................................. 65 Responsabilidade Civil ................................................................ 71 REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT8 Jurisprudência Cível Acidente de trânsito .................................................................. 79 Assinatura básica ...................................................................... 82 Associação .............................................................................. 83 Cobrança ................................................................................84 Competência .............................................................................91 Condomínio ............................................................................. 96 Consórcio ............................................................................... 96 Corretagem ............................................................................. 98 Dano material ........................................................................ 100 Dano moral - banco ................................................................. 101 Dano moral - cia. Aérea ............................................................106 Dano moral - cia. Telefônica ........................................................112 Dano moral - diversos ...............................................................118 Dano moral - spc ..................................................................... 132 Empreitada ............................................................................. 136 Furto em estacionamento ............................................................137 Obrigação de fazer ................................................................. 140 Plano de saúde ........................................................................ 147 Posse ................................................................................... 152 Propaganda ............................................................................ 152 Recurso ................................................................................. 154 Responsabilidade Civil .............................................................. 157 Seguro .................................................................................. 163 79Ementas ......................................................................... SUMÁRIO 9 Jurisprudência criminal Abuso de autoridade ..................................................................175 Competência ........................................................................... 188 Contravenção Penal ................................................................. 192 Crime de Resistência ..................................................................197 Porte de Entorpecente............................................................. 204 Ato obsceno ...........................................................................207 Competência ...........................................................................209 Contravenção penal .................................................................. 210 Crime de Dano .........................................................................212 Crime de Trânsito .....................................................................212 Desacato .................................................................................213 Falsa Identidade ........................................................................215 Injúria ....................................................................................216 Lesão Corporal ........................................................................218 Porte de Entorpecente............................................................. 220 175Acórdãos ....................................................................... 207Ementas ......................................................................... Transtorno Cotidiano ............................................................... 163 Vício do Produto .....................................................................164 Vício Oculto ........................................................................... 168 REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT10 Enunciados Cíveis .............................................................................231 Enunciados Criminais ........................................................................ 245 Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios ......................... 225 Índice Jurisprudencial ....................................................... 257 223Súmulas ......................................................................... 229Enunciados do FONAJE .................................................... SUMÁRIO 11 REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT12 DOUTRINA 13 Doutrina REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT14 DOUTRINA 15 Os Protagonistas dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais Introdução Na Constituição cidadã de 1988, o Poder Judiciário passou a ter uma participação ativa no processo democrático, especialmente com a sua presença mais efetiva na solução dos conflitos e ao ampliar a sua atuação com novas vias processuais, demons- trando preocupação voltada priori- tariamente para a cidadania, através de instrumentos jurídicos, normas, preceitos e princípios que sinalizam a vontade popular de ter uma Justiça célere e distributiva. Com a promulgação da Cons- tituição Federal de 1988, em função do disposto no seu artigo 98, I, foi determinada a criação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, cabendo à União, no Distrito Federal e nos Ter- ritórios, e aos Estados, criar “Juizados Especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a ORIANA PISKE DE AZEVEDO MAGALHÃES PINTO Juíza de Direito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Doutoranda em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino (UMSA). REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT16 execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau”. Os Juizados Especiais são in- tegrados por juízes de Direito de primeira instância que homologam acordos, decidem as causas e também julgam recursos. Além de juízes de Direito, os Juizados são compostos de conciliadores, atermadores e servido- res que trabalham em uma Secretaria de Juízo, como escrivães, escreventes, oficiais de Justiça, contadores e demais auxiliares. Para o seu bom funciona- mento, é necessária a presença de magistrados, de promotores de justiça, de advogados, de defensores públicos, de serventuários da Justiça e de con- ciliadores. 1. O MagisTRaDO, O PROMOTOR, O aDvOgaDO E O DEFEnsOR PúbliCO A atualidade vem exigindo uma profunda tomada de consciência do magistrado quanto ao papel social que deve desempenhar junto à sociedade. Não mais como uma figura autômata, como imaginava Montesquieu, mas, ao contrário, hoje é um profissional preparado multidisciplinarmente e atento às mudanças e angústias so- ciais, ao mesmo tempo que dotado de prudência, valores e virtudes éticas para encontrar a solução que possa melhor contribuir para a efetiva tutela dos direitos dos cidadãos e para a paz social. O juiz é o guardião dos interesses públicos e privados, é responsável em dizer a última palavra sobre o Direito, como dever institucional de que está privativamente investido.1 Exige-se, além da imparcialidade, apanágio de sua função, o dever de incorruptibi- lidade e a obrigação moral de ditar a sentença, sendo-lhe vedado o non liquet, por constituir denegação da justiça.2 A Lei no 9.099/95 deu ampla condição ao juiz para melhor formar sua convicção determinando, quando lhe convier, as provas a serem produ- zidas, podendo inclusive limitar, nesse campo, a atividade das partes sem que haja qualquer cerceamento de defesa (confira-se a parte final do art. 33). Outrossim, o juiz apreciará as provas produzidas e as que porventura tenha que determinar com os olhos voltados para as regras de experiência comum ou técnica. Tais regras são extraídas pelo julgador examinando aquilo que ordinariamente acontece 1 SOUZA, Carlos Aurélio Mota de. Poderes éticos do juiz: a igualdade das partes e a repressão ao abuso no processo. Porto Alegre: Fabris, 1987. p. 53. 2 SALSMANS, José. Deontología jurídica. Bilbao: El Mensajero, 1953. p. 255. DOUTRINA 17 nas relações humanas; são as máximas de experiência, dentro do conceito de normalidade comum das coisas. O legislador conferiu ao magis- trado amplos poderes, e este deverá exercê-los atentando para os princí- pios da simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, de modo a facilitar o acesso de todo cida- dão ao caminho efetivo da Justiça. Acrescente-se que, no tocan- te à aplicação da lei, a fórmula é também mais ampla do que aquela comum, prevista no artigo 5o da Lei de Introdução ao atual Código Civil, uma vez que, nos termos do artigo 6o da Lei no 9.099/95, o Juiz adotará em cada caso a decisão que reputar mais justa e equânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum. Portanto, o supracitado artigo da Lei dos Juizados Especiais confere ao magistrado o uso da equidade, na interpretação e concreção da lei e do fato da causa, decidindo sempre com a preocupação de fazer justiça. Vale lembrar que o juiz tem o seu livre convencimento, expressado como um princípio processual cons- tante no artigo 131 do CPC, “por constituir irrespondível lição aos juspositivistas ortodoxos, de que até mesmo no seio das correntes doutri- nárias mais tradicionais há vaga para a expressão da tendência ideológica do Magistrado, caldeada pela opi- nião pública e pelo posicionamento da jurisprudência.”3 Não há Justiça sem ideologia. É de uma atualidade atemporal a observação feita pelo Prof. Raimundo Nonato Fernandes: “os tempos novos, entretanto, começam a abalar os alicerces dessas concepções tradicionais. O conceito de Justiça parece impregnar-se de um sentido político, que se traduz na pro- cura de novas soluções para os problemas do homem e da socie- dade... Existe a preocupação de imprimir à Justiça um conteúdo definido, de identificá-la com uma aspiração de reforma social e política, de dar-lhe, enfim, uma diretiva ideológica.”4 Deverá o juiz sempre motivar todos os seus atos, como princípio constitucional obrigatório para o controle da administração da Justiça,5 garantia contra o arbítrio. Não obstante toda sua falibili- dade humana, requer-se do juiz um constante aperfeiçoamento cultural, moral e até mesmo espiritual, porque constitui personagem fundamental no restabelecimento da harmonia social, desempenhando relevante papel na 3 CARVALHO, Ivan Lira de. Eficácia e democracia na atividade judicante. Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados. v. 171, jul./ago. 1999, p. 54. 4 FERNANDES, Raimundo Nonato. Justiça e Ideologia. Revista do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Natal, v. 19 – 24, n. 1, 1965, p. 12. 5 TARUFFO, Michele. La motivazione della sentenza civil. Pádua: CEDAM, 1975. p. 392. REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT18 realização concreta do direito. Em toda sua conduta exige-se, sobretudo, a prudência, a reta estimativa das leis (evitando o error in judicando), a humildade no saber (intelectual e pro- fissional), a sagacidade (presteza no julgamento), circunspecção e cautela, para manter íntegra sua autoridade e sua independência. O Ministério Público é uma ins- tituição que, a partir da Constituição de 1988, apresentou-se como guardiã das liberdades públicas e privadas e dos direitos de cidadania, com uma atuação digna de registropela maneira com que vem desempenhando seu ofício, num exercício combativo na luta pela con- cretização dos direitos de cidadania. O Ministério Público, na esteira do que estabelece o artigo 127 da Constituição Federal, “é instituição permanente, essencial à função ju- risdicional do Estado, incumbindo- lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”. É inerente ao desempenho do munus, primordialmente, a defesa do interesse público, tanto ligado ao autor, ao réu, ou mesmo desfavorável a ambos já que ressalta a obediência aos ditames legais. A sua atuação no processo não decorre de vontade própria, mas dos casos especificados na norma de processo (civil ou penal), seja para agir como parte, seja para funcionar como custos legis. O Ministério Público tem o ele- vado encargo de defender a lei e o bem comum perante todos os Tribunais.6 O fiscal da lei não está exclusivamente a serviço da manutenção da ordem jurídica, nem mesmo do interesse social público, mas sobretudo da Justiça. Isso explica o princípio da legalidade a que estão adstritos, pelo que se denominam apropriadamente custos legis, os fiscais por excelência da lei. Contudo, reduzidíssima se de- monstra, na prática, a intervenção do Ministério Público, seja em razão das limitações de capacidade processual, seja em face da competência material do Juizado Especial Cível. O próprio exercício do Direito de Ação do Ministério Público, outor- gado por força do artigo 81 do Código de Processo Civil, não pode ter lugar junto ao Juizado Especial Cível, eis que, não sendo o Ministério Público pessoa física, não pode ser autor. Em tese, admite-se a legitimidade do Ministério Público para interpor recurso, já que, para recorrer, não há a limitação acima descrita, mas tal somente pode ocorrer no caso em que o Ministério Público tenha atribuição prévia no feito.7 Isto porque os casos de interven- ção obrigatória do Ministério Público, 6 NAVARRO, Antonio Pleinador. Tratado de moral profesional. Madri: BAC, 1969. p. 264. 7 TOSTES, Natacha Nascimento Gomes; CARVALHO, Márcia Cunha Silva Araújo de. Juizado Especial Cível: estudo doutrinário e interpretativo da Lei no 9.099/95 e seus reflexos processuais práticos. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 70. DOUTRINA 19 segundo dispõe o artigo 82 do Código de Processo Civil, são aqueles em que se verifica interesse de incapaz, causas concernentes ao Estado, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamen- to, declarações de ausência e disposi- ções de última vontade, e causas onde há interesse público. A priori, já se vislumbra a ina- plicabilidade de qualquer destas situações aos processos do Juizado Especial Cível, eis que este juízo é incompetente para julgar as causas previstas no inciso II do artigo 82 do Código de Processo Civil, conforme o disposto no artigo 7o, § 2o da LJE; não dispondo o incapaz de capacidade para postular, como autor ou como réu, frente ao Juizado, que também não tem, dentre as causas de sua competência, hipótese onde se verifica interesse público. Nos casos em que ocorra inca- pacidade superveniente (p. ex., na hipótese de interdição de qualquer das partes após instaurada a lide), também não surge hipótese de intervenção do Ministério Público, já que, surgindo a incapacidade, imediatamente será o feito extinto, na forma do disposto no artigo 51, inciso IV da LJE. A despeito da reduzida atuação do Parquet nos Juizados Especiais Cíveis, por outro lado, verifica-se que o Ministério Público é uma das instituições que tiveram alargada a sua responsabilidade diante da Lei no 9.099/95. Protagonista da transa- ção penal; custodiador da liberdade individual através da proposição das penas alternativas; titular da proposta de suspensão condicional do processo, sem dúvida coube-lhe papel extrema- mente relevante no que concerne aos Juizados Especiais Criminais. O advogado é, inegavelmente, um grande e fundamental agente construtor social em prol da cidada- nia. É artífice na renovação de ideias, de valores, de princípios, na proteção dos direitos e garantias fundamentais do homem. O artigo 133 da Constituição Federal dispõe que “o advogado é indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. Esse ad- jetivo (indispensável) já constava no revogado Estatuto da Ordem dos Ad- vogados do Brasil (art. 48). Também o atual Estatuto assim se manifesta no artigo 2o: O advogado é indispensável à administração da Justiça. Numa interpretação simplista do dispositivo, conclui-se que a indispen- sabilidade do advogado perante a Jus- tiça se refira unicamente à formação do tripé de estabilização processual: autor, juiz, réu. No entanto, a função do advogado vai mais além do exer- cício do jus postulandi, isto porque incumbe-lhe também colaborar para que a Justiça se efetive, independente- REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT20 mente de estar deste ou daquele lado da lide. Neste caso, estará defendendo a posição de seu constituinte; naquele, coloca-se como figura de apoio, ele- mento de pacificação social, prestando especial serviço público.8 As atividades do advogado se desdobram em duas frentes: a advocacia judicial e a extrajudicial. A primeira, de caráter predominantemente contencio- so (com a ressalva relativa à jurisdição voluntária); a segunda, eminentemente preventiva. Por isso, a prestação do serviço público e exercício de função social não se dá somente “no ministério privado” (§ 1o, art. 2o, Lei no 8.906 de 4 de julho de 1994), porque a advocacia não é o desempenho de uma profissão privada, nem a incumbência de um serviço público. Ela é ambas as coisas, sem confusões nem contradições. O advogado no exercício da profissão, tem a missão constitucional, perante o Poder Judiciário, de desenvolver uma pretensão ou a ela resistir, em nome dos cidadãos, bem como no desempenho de função social de não se enclausurar na busca de interesses privados, mas na realização da Justiça e na paz social, finalidade última de todo processo litigioso. Contudo, cabe ressaltar que a indispensabilidade do advogado deve ser aferida sempre, nos termos da lei, atendendo aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum, de acordo com o preceito no 8 FRIGINI, Ronaldo. Comentários à Lei de Pequenas Causas. São Paulo: Livraria e Editora de Direito, 1995. p. 132. artigo 6o da Lei no 9.099/95. Saliente-se ainda, que o artigo 9o ao dispor que, nas causas de valor até vinte salários míni- mos, as partes poderão facultativamente ser assistidas por advogados, procurou aproximar o cidadão da Justiça através de meios simplificados de composição de litígios. Não se desconhece o valor da assistência judiciária, por advogado, às partes envolvidas em litígio judicial, mas certo é que a obrigatoriedade de tal assistência, nas referidas causas, poderia impedir o ingresso da parte em juízo, afrontando o preceito constitu- cional que assegura o livre acesso ao Judiciário para a satisfação de direitos individuais injustamente lesados. As pequenas lesões de direitos sacrificam, indistintamente, os pobres e os mais afortunados. Quando a parte é pobre, é a ela assegurado o direito a assis- tência judiciária gratuita. Todavia, a parte que não é pobre bastante para obter este direito passa a não dispor de condições para buscar, no Judiciário, a realização do seu direito lesado, uma vez que o seu reduzido valor econô- mico não comporta o pagamento dos honorários profissionais de quem lhe irá prestar assistência. Nos Juizados Especiais verifica- se que o advogado participanão só como defensor, quando procurado, mas, primordialmente, como con- ciliador, trazendo sua colaboração eficaz para a administração da Justiça. DOUTRINA 21 O advogado é parcela importante da Justiça, da qual fazem parte não só juízes e promotores, mas também a população que a ela recorre. Na ver- dade, não há Justiça sem sociedade, não há sociedade sem povo. A Defensoria representa o Esta- do Democrático de Direito próximo e a serviço do cidadão. Representa o cuidado e a proteção jurídica dada pelo Estado ao cidadão humilde, que clama por Justiça e que já não tem forças, nem condições de pagar ho- norários advocatícios. Quando da citação e das in- timações, o acusado, no Juizado Especial Criminal, sempre deve ser advertido de que não se fazendo acompanhar por advogado, ser-lhe-á designado defensor público. A ex- pressão “Defensor Público”, porém, tem que ser interpretada extensi- vamente.9 Na falta de Defensoria Pública, o juiz deve nomear para a defesa procuradores de assistência judiciária ou, na falta, defensor dativo, com subsídio no artigo 263 do Código de Processo Penal. Ao acusado que se omite em constituir defensor deve ser nomeado defensor dativo, quando não assistido pela Defensoria Pública, independente- mente de sua condição econômica, para garantia da ampla defesa. 9 MIRABETE, Julio Fabbrini. Juizados Especiais Criminais: comentários, jurisprudência, legislação. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p. 58. Quando o autor do fato é preso e encaminhado pela autoridade policial ao Juizado Especial Criminal, deve esta alertá-lo para que constitua o defensor de sua escolha. Embora não conste expressamente da lei tal deter- minação, o direito à ampla defesa e a regra de que lhe deve ser assegurada a “assistência da família e advogado” a isso obriga (art. 5o, LXIII, da CF). Essa mesma obrigatoriedade existe quando, não sendo encaminhado imediatamente ao Juizado, o autor do fato se compromete a comparecer ao Juizado Especial Criminal em data agendada. É dever do advogado nomeado pelo juiz aceitar a indicação para defender e assistir ao indigitado autor do fato, pois constitui infra- ção disciplinar “recusar-se a prestar, sem justo motivo, assistência jurí- dica, quando nomeado em virtude de impossibilidade da Defensoria Pública” (art. 34, XII, da Lei no 8.906/94). O artigo 264 do Código de Processo Penal também obriga a prestação desse patrocínio aos acusados, quando o advogado é no- meado pelo juiz. A recusa, porém, pode ser justificada, conforme se verifica do artigo 15 da Lei no 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, que esta- belece normas para a concessão de assistência aos necessitados e que especifica os motivos que podem ser alegados pelo nomeado. REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT22 Vige para o Juizado Especial Cri- minal a regra subsidiária do processo no Juízo comum, de que, quando da nomeação de defensor ou advogado dativo, fica ressalvado o direito de, a todo tempo, o acusado nomear outro de sua confiança, ou a si mesmo de- fender-se, caso tenha habilitação (art. 263, do Código de Processo Penal). 2. O Juiz lEigO E O COnCiliaDOR O Juiz leigo e o Conciliador são auxiliares da Justiça, recrutados os primeiros, preferentemente, entre os bacharéis em Direito, e os segundos, dentre advogados com mais de cinco anos de experiência, nos termos do artigo 7o da Lei no 9.099/95. Os juízes leigos são conciliadores que, auxi- liares da Justiça, estarão sempre sob orientação do juiz (art. 73, caput e parágrafo único, da Lei no 9.099/95). O Juiz leigo poderá, conforme artigo 37 da Lei no 9.099/95, presidir a co- lheita de prova no Juizado Especial Cível, a qual, entretanto, deverá ser submetida à homologação do juiz togado, em face da exclusividade da magistratura de carreira de proferir decisão.10 Aos leigos, chamados con- ciliadores, caberá conduzir o entendi- mento das partes com vista a um ato 10 TOSTES, Natacha Nascimento Gomes; CARVALHO, Márcia Cunha Silva Araújo de. Juizado Especial Cível: estudo doutrinário e interpretativo da Lei no 9.099/95 e seus reflexos processuais práticos. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 84. final de composição.11 A presença e a atuação constante dos conciliadores permite uma inequívoca agilidade e dinamismo processual com a efetiva solução de um número extraordinário de demandas contribuindo valorosa- mente para a eficiência dos Juizados e a realização da Justiça cidadã. Os conciliadores são peças fundamentais para o bom desempenho dos Juizados Especiais. Lembra Ada Pellegrini Grino- ver, que “no Brasil-Império, os Juízes de Paz, honorários e leigos, foram investidos da função conciliativa prévia, como condição obrigatória para o início de qualquer processo, pela Constituição de 1824.”12 Atu- almente, os Juízes de Paz apenas estão incumbidos de habilitação e celebração de casamento, podendo exercer atribuições conciliatórias - sem caráter jurisdicional (art. 98, inciso II, da Constituição Federal).13 Com as Ordenações Filipinas, a Lei no 000000 de 15 de outubro de 1827 (Lei Ordinária), assinada por sua Ma- jestade Imperial D. Pedro I, ao criar os Juízes de Paz, conferiu-lhes também competência para “conciliar as partes, que pretendessem demandar por todos os meios pacíficos, que estivessem ao 11 MIRABETE, Julio Fabbrini. Juizados Especiais Criminais: comentários, jurisprudência, legislação. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p. 30. 12 GRINOVER, Ada Pellegrini. Deformalização do processo e deformalização das controvérsias. Revista de Informação Legislativa. Brasília, n. 97, jan.- mar./88., p. 208. 13 SALOMÃO, Luis Felipe. Roteiro dos Juizados Especiais Cíveis. Rio de Janeiro: Destaque, 1997. p. 42. DOUTRINA 23 seu alcance: mandando lavrar termo do resultado, que assignará com as partes e Escrivão” (art. 5o). Tal Lei criava em cada uma das freguezias e das capelas curadas um Juiz de Paz e suplente.14 Em 20 de setembro de 1829, um decreto dispôs em seu arti- go 4o que “os termos de conciliação, quando esta se verificar, terão força de sentença”. Esse resultado da concilia- ção é que se denominou de ‘termo de bem viver’ (art. 12 da aludida Lei Or- dinária) e que foi largamente usado no Brasil-Colônia e, posteriormente, nas delegacias de polícia.15 Com o passar dos tempos, salvo algumas iniciativas louváveis, mas isoladas, pouco se tem notícia da utilização, como regra, das vias conciliatórias. É verdade que hou- ve um grande avanço, instituindo-se canais de mediação para tentativa de conciliação, prévia e facultativa, como a existente nos Órgãos Estaduais de Defesa do Consumidor (Defensoria Pública do Consumidor, Procon etc.) e nos Conselhos ou Juizados de Con- ciliação (criados a partir de 1982 no Sul do País), além das Câmaras de Arbitragem. A Lei de Arbitragem no 9.307 de 23 de setembro de 1996 re- presentou grande passo para democra- tizar o acesso à Justiça, desafogando as vias convencionais de composição 14 Lei no 000000, de 15.10.1827. In: COLEÇÃO DE LEIS DO BRASIL (CLBR), pub. 1827, v. 1, p. 67, col. 1, Brasília: Senado Federal. 15 SOUSA, Lourival de J. Serejo. O acesso à Justiça e aos Juizados Especiais: o Princípio da Conciliação. Revista dos Juizados de Pequenas Causas – Doutrina e Jurisprudência, Porto Alegre, n. 20, ago. 97, p. 31. dos conflitos. O interesse pela conci- liação e a importância de que as vias conciliativas se revestem na sociedade contemporânea foram considerados pelo legislador e os Juizados Especiais são mais uma dessas alternativas. Afinal, como conciliar? O dia-a- dia, a experiência dos casos concretos, o tirocínio de cada um e as técnicas de mediação e composição já consa- gradas na teoria levarão à resposta.Deve o conciliador, árbitro ou Juiz leigo, estar em contato permanente com o Juiz togado, responsável pelo Juizado, sendo que os conciliadores ficam investidos da imparcialidade, equidistância e, principalmente, da ponderação de agir e de proceder com reflexão, pois conciliador e árbitro falam em nome da Justiça que deve, antes de tudo, prevenir e promover o bem-comum. As formas de recruta- mento dos conciliadores e árbitros são diversas, valendo citar os convênios que podem ser firmados com Uni- versidades, Escolas da Magistratura e Ministério Público, além da OAB e as próprias Associações de Magistra- dos para indicação de bacharéis ou estagiários do curso de Direito, sem embargo de magistrados aposentados que desejam ainda colaborar no fun- cionamento do Juizado. Segundo a lei, os conciliadores devem ser recrutados preferentemente entre bacharéis em Direito. A contrario sensu, na impos- sibilidade ou dificuldade de serem REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT24 recrutados os profissionais, permite-se a nomeação de leigos para o exercício dessa importante tarefa. A experiên- cia tem demonstrado que leigos são eficientes como mediadores. Os conciliadores exercem munus público. A função do conciliador pode e deve ser considerada pelo legislador estadual como altamente relevante, propiciando ainda vantagem como título honorífico em eventuais con- cursos para ingresso em carreiras jurídicas. A Lei no 9.099/95, no artigo 7o, dispõe que os Juízes leigos ficarão impedidos de exercer a advocacia pe- rante os Juizados Especiais, enquanto no desempenho de suas funções. Por analogia com este artigo, devem ficar impedidos de exercer a advocacia perante os Juizados Especiais os ba- charéis que forem nomeados quando no desempenho de suas funções. Vale destacar o Enunciado 40: “O conciliador ou juiz leigo não está incompatibilizado nem im- pedido de exercer a advocacia, exceto perante o próprio Juiza- do Especial em que atue ou se pertencer aos quadros do Poder Judiciário.”16 Segundo Julio Fabrini Mirabete, 16 Enunciados do Cíveis e Criminais do Forum Permanente de Juízes Con- ciliadores dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Brasil, atualizado até novembro de 2001. “o conciliador tem como função presidir, sob orientação do juiz, a tentativa de conciliação entre as partes, como auxiliar da Justiça que é, nos limites exatos da lei. Não há possibilidade que inter- fira, por exemplo, na tentativa de transação, já que esta implica imposição de pena, matéria ex- clusivamente de ordem pública a cargo do Ministério Público e do juiz. Violar-se-ia com sua inter- ferência preceito constitucional (art. 5o, LIII, da CF).”17 Discordo do posicionamento acima transcrito, visto que no termo conciliação constante no artigo 73 da Lei no 9.099/95 está inserto o acordo civil e a transação penal, pelo que não haveria vulneração do artigo 5o, LIII da Carta Constitucional, mormente considerando o disposto no artigo 98, I, da Constituição Federal que prevê que “os Juizados Especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação 17 MIRABETE, Julio Fabbrini. Juizados Especiais Criminais: comentários, jurisprudência, legislação. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p.73. DOUTRINA 25 e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau.” Neste sentido, é o Enunciado 47: “A expressão conciliação previs- ta no art. 73 da Lei no 9.099/95 abrange o acordo civil e a tran- sação penal, podendo a pro- posta do Ministério Público ser encaminhada pelo conciliador, nos termos do art. 76, § 3o da mesma lei.”18 O juiz leigo e o conciliador são funções relevantes que contribuem com a sua participação para a racio- nalização da Justiça. 3. as PaRTEs nO JuizaDO EsPECial CívEl E CRiMinal As partes no processo civil, autor e réu, que figuram no processo ativa e passivamente, trazem elementos fáti- cos que são apreciados e valorados ou pelo juiz, ou pelo conciliador, que, com prudência, num juízo de razoabilidade, procuram encontrar a solução mais justa para a contenda. Estabelece o artigo 8o, da Lei no 9.099/95, que não poderão figu- rar como partes no Juizado Especial Cível, o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as empre- sas públicas da União, a massa falida 18 Enunciados Cíveis e Criminiais do Forum Permanente de Juízes Conci- liadores dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Brasil, atualizado até novembro de 2001. e o insolvente civil. A intenção do legislador foi, neste caso, de valorizar a conciliação e a celeridade. As pessoas jurídicas também não podem ser autoras no Juizado Especial Cível (§ 1o, art. 8o). Assim também os entes formais (Massa Falida, Con- domínio, Espólio, Herança Vacante ou Jacente), que, embora não sendo pessoas jurídicas, mas universalidade de bens, muito se assemelham a elas. A lei, nesse particular, foi taxativa: somente as pessoas físicas capazes serão admitidas a propor ação peran- te o Juizado Especial. Exceção a esta regra ocorreu com as microempresas, uma vez que a Lei no 9.841, de 05 de outubro de 1999, que instituiu o Es- tatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, em seu artigo 38, possibilitou que as mesmas pudessem ingressar como parte autora nos Juiza- dos Especiais Cíveis, senão vejamos: Art. 38: “Aplica-se às microem- presas o dispositivo no parágrafo primeiro do artigo 8o da Lei no 9.099/95, de 26 de setembro de 1995, passando essas empresas, assim como as pessoas físicas capazes, a serem admitidas a pro- porem ação perante o Juizado Es- pecial, excluídos os cessionários de direito de pessoas jurídicas. Questionou-se se persiste aplicá- vel a regra do artigo 9o, § 3o, da Lei no REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT26 9.099/95, diante do Estatuto da OAB. A controvérsia não pode ser apreciada isoladamente. As partes podem se fazer acom- panhar por advogados no Juizado Es- pecial. A assistência pelo profissional, contudo, não é impositiva nas causas até 20 salários mínimos (art. 3o, caput), mas obrigatória nas demais hipóteses. Cabe ressaltar que o mandato pode ser até verbal, salvo quanto aos po- deres especiais (art. 9o, § 3o, da Lei no 9.099/95). A Lei no 9.099/95 teve nítida inspiração de facilitar o acesso à Justiça nas causas que menciona, em cumprimento a preceitos constitu- cionais (repetidos no art. 5o, incisos XXXIV e XXXV da C.F./88, por isso, outra lei, que regula matéria diversa (Estatuto da Advocacia e OAB), não poderá alterá-la, sob pena de vulnerar a Constituição. Até porque lei nova que estabeleça disposições gerais ou especiais, a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei ante- rior. Com efeito, a Lei no 9.099/95 é posterior ao Estatuto da OAB, e, no artigo 9o, caput, estabeleceu claramen- te quais as hipóteses em que cabe a dispensa do advogado. Em nossa opinião, o referido artigo não prejudicou os advogados - indispensáveis à administração da Justiça - contudo veio permitir às pessoas hipossuficientes, pobres, sem um mínimo de condições para arcar com honorários advocatícios, o acesso à Justiça, sendo também um direito e uma garantia constitucional. Por outro lado, afigura-se essencial, ainda, a existência efetiva de órgão da Defen- soria Pública atuante junto ao sistema do Juizado Especial Cível, mormente em razão da regra contida no artigo 9o, § 1o, da Lei no 9.099/95, que estabele- ce que “sendo facultativa a assistência, se uma daspartes comparecer assistida por advogado, ou se o réu for pessoa jurídica ou firma individual, terá a outra parte, se quiser, assistência ju- diciária prestada por órgão instituído junto ao Juizado Especial, na forma da lei local.” O objetivo de tal dispo- sitivo legal foi possibilitar o equilíbrio jurídico entre as partes. É importante destacar que, consoante o § 2o, “o juiz alertará as partes da conveniência do patrocínio por advogado, quando a causa o recomendar.” Releva notar que a lei permite que ao réu pessoa jurídica ou titular de firma individual, que possa ser re- presentado por preposto credenciado (§ 4o). Ora, preposto é aquele que mantém vínculo empregatício com a ré. É que a lei exige e faz questão do comparecimento pessoal das partes, de modo a desenvolver melhor o processo com a tomada eventual de depoimento pessoal, viabilizando ain- da, e principalmente, eventual com- posição do litígio (caput do art. 9o). Além do mais, aquele que outorgou DOUTRINA 27 a carta de preposição ao empregado deve estar autorizado pelos estatutos da empresa. Tais elementos devem ser comprovados pelo réu ou seu representante-preposto por ocasião da audiência. A omissão implicará revelia (art. 21, Lei no 9.099/95). Anote-se que a lei não permite, no processo de conhecimento ou de execução, qualquer forma de inter- venção de terceiro. Há uma impreci- são técnica na redação do artigo 10, da Lei no 9.099/95, pois a assistência repelida isoladamente é também for- ma de intervenção de terceiro. No processo penal, temos as ações penais de natureza pública in- condicionada, na qual figuram como partes - o promotor, o acusado e a víti- ma. O primeiro representa o Estado na persecução penal e como fiscal da lei. O segundo é o sujeito nuclear do pro- cedimento e do processo. O terceiro passou a ser alvo de preocupação que refletiu ao longo da Lei no 9.099/95, que se ocupou da reparação de danos civis, como um dos seus objetivos preponderantes. Nos Juizados Especiais Crimi- nais, as funções de que estão incum- bidos o juiz e o promotor, a despeito de serem distintas e independentes, estão imbrincadas na análise da conduta do suposto acusado, possibilitando, sempre que possível, tanto a reparação dos danos sofridos pela vítima, quanto a proposição do Ministério Público da aplicação imediata, pelo juiz, de pena restritiva de direitos ou multa, a ser especificada na proposta. Trata-se de um exercício de tutela de cidadania e de um esforço despenalizador, em compasso harmônico com os novos ideais, princípios e valores contempo- râneos do Estado Democrático Social de Direito. A despeito de eventuais falhas, o modelo do Juizado Especial representa um avanço extraordinário para a realização da Justiça. COnClusõEs A sociedade vem reclamando uma postura cada vez mais ativa do Judiciário, não podendo este ficar distanciado dos debates sociais, de- vendo assumir seu papel de partícipe no processo evolutivo das nações, eis que é também responsável pelo bem comum, notadamente em temas como a dignidade da pessoa humana, a redução das desigualdades sociais e a defesa dos direitos de cidadania. O Juizado Especial representa, verdadeiramente, o símbolo vivo da luta pela realização dos direitos de cidadania visto que, se não dermos a mesma dignidade a todo e qualquer di- reito, estaremos longe de nos conside- rarmos como partícipes de um Estado Democrático Social de Direito. Ele é um fenômeno nascido da democracia participativa, do amadurecimento da cidadania, da compreensão do Di- REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT28 reito como instância que extrapola a função de instrumento de prevenção/ composição de conflitos para pôr em prática a pacificação e a solidariedade social. A Lei no 9.099/95 tem como principal característica a humanização democrática das relações entre Poder Público e particulares, na medida em que concede à vítima e ao agente o po- der de deliberação na solução de seus conflitos, sem a imposição de fórmulas legais rígidas e preconcebidas, de apli- cação genérica, as quais presumem, de forma difusa, a igualdade de todas as situações fáticas, desconsiderando o caso concreto e a individualidade dos cidadãos. São objetivos primordiais dos Juizados Especiais a conciliação, a reparação dos danos sofridos pela víti- ma, a aplicação de pena não privativa de liberdade e a transação. A possibi- lidade de “transação” e de suspensão do processo nas infrações de menor potencial ofensivo representam duas importantes vias despenalizadoras, reclamadas há tempo pela moderna criminologia, pois procuram evitar a pena de prisão e estão proporcionando benefícios nunca antes imaginados, principalmente em favor das vítimas dos delitos dado que, em muitos ca- sos, permitem a reparação dos danos imediatamente ou mesmo a satisfação moral. De outro lado, deve-se ressal- tar que a cada cidadão é assegurado o direito de provar sua inocência, mediante a garantia constitucional do due process of law, no qual exercerá o contraditório e sua ampla defesa porque “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Verifica-se que através do instituto da transação penal, nos Juizados Es- peciais Criminais há proposição, pelo Ministério Público, de aplicação de pena restritiva de direitos (prestação de serviços à comunidade, pagamento de cestas básicas a entidades carentes, etc.), contudo é preciso registrar que tal instituto processual não fere o devido processo legal. A uma, pois não há assunção da culpabilidade pelo autor do fato. A duas, visto que tal instituto despenalizador, obedece o preceito constitucional do artigo 98, I da Constituição Federal. Graças à flexibilidade da Lei no 9.099/95, é possível a sua aplicação de uma forma socioeducativa, inclu- sive permitindo o desenvolvimento de projetos e parcerias que levem ao envolvimento da comunidade para a solução eficaz dos litígios. Nesse sentido, a prestação gratuita de serviços à comu- nidade e o encaminhamento dos agres- sores envolvidos em violência doméstica para acompanhamento psicossocial, bem como a utilização de tratamento especializado nos casos de alcoolismo e de envolvimento com drogas, têm se mostrado eficazes para consecução des- se objetivo. Portanto, o Juizado Especial deve pautar-se pela transdisciplinarieda- DOUTRINA 29 de, isto é, pela necessidade de agregar o conhecimento de outras ciências na aplicação do Direito, como a Psicologia, a Sociologia, etc., com o escopo de realizar uma abordagem que atenda de maneira mais eficaz a problemática das pessoas envolvidas. Os Juizados Especiais se apre- sentam como um novo modelo de Judiciário, mais consentâneo com o perfil de Estado Democrático de Direi- to plasmado na Constituição de 1988. Trata-se de uma revolução em termos de mentalidade dos Operadores do Direito (juízes, promotores de justi- ça, advogados, defensores públicos, conciliadores, etc.) Constituem-se, ao nosso entender, na proposta mais efe- tiva dos constituintes de modificação estrutural do Poder Judiciário desde a proclamação da República, de cunho político-filosófico-pragmático voltado para a aproximação desse segmento do Poder das camadas sociais mais sofridas, para melhor satisfação dos anseios dos jurisdicionados. REFERênCias CARVALHO, Ivan Lira de. Eficá- cia e democracia na atividade judicante. Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados. v. 171, jul./ago. 1999, p. 54. FERNANDES, Raimundo Nonato. Justiça e Ideologia. Revista do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Natal, v. 19 - 24, n. 1, 1965, p. 12. FRIGINI, Ronaldo. Comentários à Lei de Pequenas Causas. São Paulo: Li- vraria eEditora de Direito, 1995. GRINOVER, Ada Pellegrini. Defor- malização do processo e deforma- lização das controvérsias. Revista de Informação Legislativa. Brasília, n. 97, jan.-mar./88., p. 208. MIRABETE, Julio Fabbrini. Juizados Especiais Criminais: comentários, jurisprudência, legislação. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997. NAVARRO, Antonio Pleinador. Tra- tado de moral profesional. Madri: BAC, 1969. SALOMÃO, Luis Felipe. Roteiro dos Juizados Especiais Cíveis. Rio de Janeiro: Destaque, 1997. SALSMANS, José. Deontología jurídi- ca. Bilbao: El Mensajero, 1953. SOUSA, Lourival de J. Serejo. O acesso à Justiça e aos Juizados Especiais: o Princípio da Con- ciliação. Revista dos Juizados de Pequenas Causas - Doutrina e Ju- risprudência, Porto Alegre, n. 20, ago. 97, p. 31. REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT30 SOUZA, Carlos Aurélio Mota de. Pode- res éticos do juiz: a igualdade das partes e a repressão ao abuso no processo. Porto Alegre: Fabris, 1987. TARUFFO, Michele. La motivazione della sentenza civil. Pádua: CE- DAM, 1975. TOSTES, Natacha Nascimento Gomes; CARVALHO, Márcia Cunha Silva Araújo de. Juizado Especial Cível: estudo doutrinário e interpretativo da Lei no 9.099/95 e seus reflexos processuais práti- cos. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. —— • —— JURISPRUDÊNCIA CÍVEL – ACÓRDÃOS 31 Jurisprudência Cível REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT32 JURISPRUDÊNCIA CÍVEL – ACÓRDÃOS 33 Acórdãos aCiDEnTE DE TRÂnsiTO aCiDEnTE DE TRÂnsiTO - Pa- RaDa ObRigaTÓRia, DEsREs- PEiTO - vElOCiDaDE suPE- RiOR aO PERMiTiDO - CulPa COnCORREnTE ACÓRDÃO Nº 372.918. Relato- ra: Juíza Lucimeire Maria da Silva. Apelante: Eunice Teixeira Machado. Apelado: Luiz Vieira da Silva. EMEnTa JUIZADOS ESPECIAIS. CO- LISÃO DE VEÍCULOS. CULPA EXCLUSIVA DA RÉ POR DES- RESPEITAR SINAL DE PARADA OBRIGATÓRIA RECONHECIDA EM SENTENÇA. VELOCIDADE DESENVOLVIDA PELO VEÍCULO DO RÉU SUPERIOR AO LIMITE PERMITIDO DEMONSTRADA PELA RÉ EM CONTRAPOSIÇÃO À CONSTANTE DE LAUDO PE- REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT34 RICIAL. NÃO VINCULAÇÃO DO JUIZ AO LAUDO. APLICAÇÃO DO ART. 436 DO CPC. CULPA CONCORRENTE DO AUTOR RECONHECIDA. 1. O juiz não se vincula ao teor do laudo pericial, podendo divergir do seu teor para formar sua convic- ção com base em outros elementos constantes dos autos, nos termos do art. 436 do CPC. 2. Não obstante do laudo pe- ricial conste a informação de que o limite de velocidade máxima permi- tida no local de colisão é de 60 km/h, pode a informação ser desconsiderada se constatado ser o limite diverso, de 40 km/h, com base em fotografias do local e em regra de experiência, a fim de se conferir à lide decisão justa e equânime. Aplicação dos artigos 5º e 6º da Lei dos Juizados Especiais. 3. Demonstrado nos autos que o veículo do autor trafegava em ve- locidade superior ao limite permitido para o local, impõe-se reconhecer a sua culpa concorrente no evento em face da contribuição do excesso de velocidade para a extensão dos danos que sofreu, os quais, por tal razão, não podem ser atribuídos unicamente à ré. aCÓRDÃO Acordam os Senhores Juízes da 1ª Turma Recursal dos Juizados Espe- ciais Cíveis e Criminais do Distrito Federal, LUCIMEIRE MARIA DA SILVA - Relatora, FLÁVIO FER- NANDO ALMEIDA DA FONSECA - Vogal, LUIS EDUARDO YATSU- DA ARIMA - Vogal, sob a presidên- cia do Juiz FLÁVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA, em CONHECER. PROVER PARCIAL- MENTE O RECURSO. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas. Brasília/DF, 30 de junho de 2009. RElaTÓRiO EUNICE TEIXEIRA MACHA- DO interpôs recurso contra a sen- tença proferida pelo MM. Juiz de Direito do Segundo Juizado Especial Cível da Circunscrição Judiciária de Taguatinga, nos autos da ação que lhe foi movida por LUIZ VIEIRA DA SILVA, a qual julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial, condenando a ré ao pagamen- to da importância de R$ 5.000,00, a título de danos emergentes, corrigidos desde 19.10.2007, e acrescida de juros moratórios a partir de 07.07.2007, bem como ao pagamento do importe de R$ 3.000,00, a título de lucros cessantes, corrigidos da forma retro mencionada. Interpôs a ré o presente recurso sustentando, nas razões recursais, que o juiz sentenciante não analisou ade- quadamente a dinâmica do acidente JURISPRUDÊNCIA CÍVEL – ACÓRDÃOS 35 ocorrido na QS 03, no sentido norte/ sul, no balão atrás do Taguatinga Shopping, uma vez que deixou de considerar a culpa concorrente do autor, que trafegava à velocidade de 70 km/h, quando a permitida para a via era de 40 km/h (fl. 46), não obs- tante a perícia ter constatado que a velocidade máxima permitida para o local é de 60 km/h (fl. 23). Sustenta que o juiz sentenciante deixou de considerar que a velocidade praticada pelo autor, correspondente a quase o dobro da permitida para a via, contribuiu para a ocorrência do acidente, uma vez que, se estivesse em menor velocidade, teria tido maior controle do veículo, cuja consequên- cia presumida seria a frenagem com maior segurança, de forma a evitar ou, na pior das hipóteses, a amenizar os resultados dele advindos. Afirma, em decorrência, a culpa corrente do autor, na mesma proporção dada por si, para o acidente e que não houve conclusão lógica entre a motivação da sentença e as razões do convenci- mento do juízo quanto à exclusão da culpa concorrente. Requer o reexame dos fatos para dar provimento ao recurso e reformar a sentença. Pugna pela concessão dos bene- fícios da justiça gratuita. Nas contrarrazões, o autor afir- ma que a ré foi a causadora do aci- dente, uma vez que a sua conduta foi determinante para a ocorrência do evento, circunstância devidamente constatada pela perícia, única prova trazida aos autos, que ressaltou a velocidade máxima para a via como sendo 60 km/h. Pugna pela impro- cedência do recurso, bem como pela manutenção da sentença. É o relatório. vOTOs A Senhora Juíza LUCIMEIRE MARIA DA SILVA - Relatora Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Interpôs a ré o presente recurso para o fim de postular a divisão pro- porcional dos danos materiais e lucros cessantes impostos na sentença, ao argumento de ter o acidente ocorrido por culpa concorrente do autor e não exclusivamente sua, como entendeu o julgador. Para tanto, sustenta, como fundamento do recurso, que a velocidade de 70 km/h empreendida pelo autor era superior ao limite de velocidade de 40 km/h permitida para a via. Para corroborar a afirmativa, co- laciona fotografias, que foram impug- nadas pelo autor, durante a audiência de instrução e julgamento. O laudo da perícia realizada no local evidencia, às fls. 21/23, que ‘... a pista (...) é devidamente sinalizada com placa de parada obrigatória. Quando dos exames, a pista estava seca e não apresentava deformações ou obstáculos REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT36 que impedissem ou mesmo dificultassem o deslocamento normal de veículos. A velocidade máxima no local é de 60 km/h, estabelecida por placas de sinalização”. A informação constante do laudo, porém, se encontra incorreta, pois a velocidade máxima permiti- da no local é de 40 km/h e não de 60Km/h, o que é demonstrado pelas fotografias acostadas pela ré em seu recurso. Além disso, o limite de ve- locidade de 40 km/h na referida via é de conhecimento geral dos que já transitaram pelo local, de forma que, por decorrer de experiência, pode tal dado ser aplicado nos autos, em face da permissão expressa contida no art. 5º da Lei 9.099/95. Diante disso, a informação constante do laudo não pode ser con- siderada, sendo aquele afastado, nesse ponto,para o julgamento da demanda na presente fase recursal. É oportuno salientar inexistir óbice para tanto, já que o julgador não se encontra adstrito ao laudo, nos termos do art. 436 do Código de Processo Civil, do seguinte teor: Art. 436. O juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos. Assim, não obstante a ré tenha dado causa ao acidente, por não ter observado a parada obrigatória para os veículos oriundos da pista sentido oeste/leste em que trafegava, para adentrar a via em que trafegava o veículo do autor sem verificar, confor- me exigido pelo art. 34 do Código de Trânsito, se as condições para fazê-lo lhe eram favoráveis, sua conduta não deve ser a única a ser considerada quanto aos efeitos do acidente, eis que houve, também, culpa do réu no fato, já que seu veículo trafegava com velocidade superior ao limite admitido na via. Com efeito, conforme constata- do pela perícia, a velocidade do veícu- lo do autor no momento da colisão era de 70 km/h, muito superior, portanto, ao limite de 40 km/h admitido para o local. Por tal razão, deve-se considerar que o excesso de velocidade desenvol- vida contribuiu para o resultado do acidente, ou seja, para os danos dele decorrentes, pois, à evidência, que uma colisão em velocidade menor tem impacto menor e, portanto, produz danos menores. Ora, conforme dispõe o art. 944 do Código Civil, a indenização por ato ilícito mede-se pela extensão. Logo, quanto maior a extensão, maior a indenização. Assim, se uma veloci- dade maior contribui para uma maior extensão dos danos, razoável se mos- tra a conclusão de que o excesso de velocidade desenvolvida pelo veículo do autor contribuiu para a extensão dos danos, razão pela qual não pode ser menosprezado. Por tal razão, não se mostra justo responda a ré inte- JURISPRUDÊNCIA CÍVEL – ACÓRDÃOS 37 gralmente pelos danos decorrentes da colisão. Em outras palavras, a ré deu causa ao acidente, mas o autor con- tribuiu para a extensão dos danos dele decorrentes. Assim, não obstante a ré deva ser responsabilizada pelos danos sofridos pelo autor, sua responsabi- lidade deve ser mitigada de forma a permitir que indenize proporcional- mente à extensão dos danos para os quais contribuiu diretamente, caben- do ao autor arcar com a diferença, correspondente à parte da extensão daqueles a que deu causa, em face de sua culpa concorrente no evento. Nesse diapasão, diante da im- possibilidade, nos presentes autos, de aferir a exata contribuição que o excesso de velocidade desenvolvida pelo veículo do autor deu para a extensão dos danos, deve-se tomar como parâmetro a própria velocidade desenvolvida por seu veículo: como esta era quase o dobro da permitida para o local, afigura-se razoável que a ré responda por metade dos danos sofridos pelo veículo do autor. Trata- se, no caso, de aplicação da regra pre- vista no art. 6º da Lei 9.099/95, como forma de aplicar ao caso uma decisão equânime e mais consentânea com os fatos narrados na inicial. Ante o exposto, DOU PROVI- MENTO AO RECURSO para refor- mar a sentença e reduzir a condenação imposta à ré a 50% dos valores dos danos naquela estabelecidos. É o voto. O Senhor Juiz FLÁVIO FERNAN- DO ALMEIDA DA FONSECA - Vogal Com a Relatora. O Senhor Juiz LUIS EDUAR- DO YATSUDA ARIMA - Vogal Com a Turma. DECisÃO Conhecido. Provido parcial- mente. Unânime. (aCJ 2007071034629-7, 1ª TRJE, Publ. EM 03/09/09; DJE, P. 79) —— • —— COnDOMíniO COnDOMíniO - CRiaÇÃO DE aniMal DOMÉsTiCO - REgi- MEnTO inTERnO, PROibi- ÇÃO ACÓRDÃO Nº 366.947. Relator: Juiz Asiel Henrique de Sousa. Apelante: Cláudio Ferreira Magalhães. Apelado: Condomínio do Edifício Rio Negro. EMEnTa DIREITO CIVIL E PROCES- SUAL CIVIL. CRIAÇÃO DE ANI- REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT38 MAL DOMÉSTICO EM UNIDADE RESIDENCIAL DE CONDOMÍNIO. ALEGAÇÃO DE COMPROMETI- MENTO À SAÚDE E SOSSEGO NO EDIFÍCIO. NORMAS IN- TERNAS RESTRITIVAS E PROI- BITIVAS. PREVALÊNCIA DA VONTADE DA MAIORIA. 1 - O Código Civil de 2002 e a Lei 4.591/64 contemplam a prevalência do direito da maioria quando em contraposição a postulações minoritárias que não te- nham conotação jurídica de proteção à identidade, à consciência e a valores étnicos de minorias. 2 - Havendo nas previsões normativas internas condominiais disposições proibitivas e restritivas à criação de animais do- mésticos, afigura-se afronta à vontade da maioria a permanência de cão em unidade residencial. 3 - Recurso co- nhecido e improvido. aCÓRDÃO Acordam os Senhores Juízes da 1ª Turma Recursal dos Juizados Espe- ciais Cíveis e Criminais do Distrito Fe- deral, ASIEL HENRIQUE DE SOU- SA - Relator, FLÁVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA - Vogal, LUIS EDUARDO YATSUDA ARI- MA - Vogal, sob a presidência do Juiz FLÁVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA, em CONHECER. IMPROVER O RECURSO. UNÂ- NIME, de acordo com a ata do julga- mento e notas taquigráficas. Brasília/DF, 23 de junho de 2009. RElaTÓRiO Trata-se de ação de conhe- cimento proposta por CLÁUDIO FERREIRA MAGALHÃES em face de CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO RIO NEGRO, visando à autorização de permanência de animal de esti- mação nas dependências do Condo- mínio, à suspensão da cobrança de multas pela manutenção do referido animal, bem como a condenação do Condomínio no pagamento de vinte salários mínimos a título de danos morais. Narrou que possui um cachorro Yorkshire Terrie e que o Condomínio, por possuir Convenção e Regimento Interno que proíbem a permanência de animais em suas dependências, exigiu a saída do animal, impondo- lhe multa. Alegou que as normas do Con- domínio estão em desacordo com a Constituição Federal e outras normas legais. A liminar foi deferida às fls. 43/44, determinando ao Condomí- nio que se abstivesse de qualquer ato impeditivo do direito do autor de manter em sua unidade residencial o animal de estimação descrito, sob pena de multa. Em contestação (fls. 53/56), o réu alegou que a proibição de manter JURISPRUDÊNCIA CÍVEL – ACÓRDÃOS 39 animais está prevista na Conven- ção do Condomínio, aprovada pela maioria dos condôminos, e que so- mente a assembléia tem o poder de modificá-la. Realizada a sessão de concilia- ção, restou essa infrutífera, passando- se à audiência de instrução e julga- mento (fl. 52). Sentenciando (fls. 76/79), o MM. Juiz a quo julgou improcedente o pedido do autor, revogando a decisão liminar que antecipou os efeitos da tutela. Irresignado, apelou o autor (fls. 83/90), alegando que os termos das convenções condominiais que proí- bem a presença de animais devem ser relativizados, uma vez que tais normas objetivam impedir a permanência de animais que causem incômodos, perturbem o sossego e se constituam ameaça à saúde e à segurança dos demais moradores. Afirmou que é necessária a investigação sobre o animal a fim de esclarecer se este causará ou não transtornos aos condôminos, ou, de- vido a sua raça ou tamanho, oferecerá perigo aos moradores. Requereu a reforma da sentença monocrática para que seja permitida a permanência do cão no Condomínio e a extinção das multas decorrentes desta infração. Preparo regular à fl. 90. Contrarrazões às fls. 94/96. É o relatório. vOTOs O Senhor Juiz ASIEL HENRI- QUE DE SOUSA - Relator Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso do autor. Trata-se de ação de conhe- cimento visando à autorização de permanência de animal de estimação nas dependências do Condomínio, à suspensão da cobrança de multas pela manutenção do referido animal, bem como a condenação do Condomínio no pagamento de vinte salários míni- mos a títulode danos morais. Julgado improcedente o pedido do autor, foi apresentado o presente recurso. Do compulsar dos autos, obser- va-se que o Regimento Interno do Condomínio, aprovado por 2/3 dos condôminos (fl. 38), estabelece que é norma “não criar ou manter animais de qualquer natureza, ou pássaros silvestres, nas respectivas unidades autônomas” (item 6.0 - fl. 24). No mesmo sentido, a Conven- ção do Condomínio estabelece em seu art. 5º, alínea “j”, que são deveres dos condôminos manter animais nas respectivas unidades autônomas (fl. 30). Cumpre ressaltar que as normas estabelecidas na Convenção e no Regimento Interno do Condomínio estão acobertadas pelos arts. 1.277 e REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT40 1.336 do Código Civil de 2002, bem como pelos arts. 10 e 19 da Lei dos Condomínios - Lei 4.591/64. Assim, ao adquirir o imóvel em Condomínio o autor ficou vinculado ao estabelecido nas normas do Con- domínio, conforme previsto no art. 1.333 Código Civil e art. 9º, § 2º, da Lei 4.591/64, não podendo recusar-se ao seu cumprimento. Observa-se, ainda, que o Re- gimento Interno do Condomínio foi aprovado, ressalte-se, por 2/3 de seus membros, em 1997, e que as penalida- des aplicadas ao autor referem-se ao ano de 2008, de onde se conclui que o autor, ao mudar-se para o referido Condomínio, já sabia das regras e proibições lá existentes, tendo ciência que as alterações só podem ser reali- zadas com a concordância de 2/3 das frações que compõem o Condomínio (fl. 39). A alegação de que o cão causa incômodos aos vizinhos também não merece ser acolhida, uma vez que, apesar de o autor juntar declaração do veterinário sobre a boa saúde e docilidade do animal (fl. 11) e os respectivos comprovante de vacina- ção e vermifugação (fls. 12/13), estes documentos nada atestam sobre o sossego, salubridade e segurança dos outros moradores. Por sua vez, a declaração de bom comportamento do cão entregue pelo autor (fl. 15) também não contribui para atestar o incômodo aos outros moradores, uma vez que apresenta a assinatura de apenas 13 (treze) con- dôminos, sendo que o Condomínio possui 42 apartamentos (fl. 29), ou seja, o número de moradores que aceita a permanência do animal é bem inferior à metade dos moradores, não servido para comprovar a vontade da maioria, muito menos para alterar o Regimento Interno, onde o quorum necessário é de 2/3 dos condôminos em assembléia específica designada com esse fim. Nesse sentido já se manifestou esta Corte: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. REVELIA. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DOS FATOS ALEGADOS PELO AUTOR. OCORRÊNCIA. CRIAÇÃO DE ANIMAL DOMÉSTICO EM UNIDADE RESIDENCIAL DE CONDOMÍNIO. ALEGAÇÃO DE COMPROMETIMENTO À SAÚDE E SOSSEGO NO EDI- FÍCIO. NORMAS INTERNAS RESTRITIVAS E PROIBITIVAS. PREVALÊNCIA DA VONTADE DA MAIORIA. SENTENÇA RE- FORMADA. (...) 2 - O ordenamento jurídico contempla a prevalência do direito da maioria quando em contraposição a postu- lações minoritárias que não tenham conotação jurídica de proteção à identidade, à consciência e a valores étnicos de minorias. JURISPRUDÊNCIA CÍVEL – ACÓRDÃOS 41 3 - Havendo nas previsões normativas internas condominiais disposições proibitivas e restritivas à criação de animais domésticos, afigura-se afronta à vontade da maioria a permanência de cão em unidade residencial (APC 20030710032857, 4ª Turma Cível, Relator Des. Angelo Passareli, julgado em 29/08/2007, DJU 13/09/2007). Assim, apesar de toda irresigna- ção do autor, há de ser preservada a vontade da maioria, que decidiu, com um quorum qualificado, a proibição de animais no Condomínio. A violação às normas do condo- mínio dá ensejo à aplicação das pena- lidades previstas nelas mesmas, não havendo espaço para a intervenção do Poder Público, a não ser quando as referidas normas convencionadas se sobrepujam à lei. A flexibilização dessas normas tem lugar quando para proteger interesse de outra grandeza, como em razão de saúde, o que não é o caso. Diante do exposto, conheço do recurso e NEGO-LHE PROVIMEN- TO, mantendo incólume a sentença atacada. Nos termos do artigo 55 da Lei dos Juizados especiais (Lei nº 9.099/95), condeno o apelante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação. É o voto. O Senhor Juiz FLÁVIO FER- NANDO ALMEIDA DA FONSECA - Vogal Com o Relator. O Senhor Juiz LUIS EDUAR- DO YATSUDA ARIMA - Vogal Com a Turma. DECisÃO Conhecido. Improvido. Unâ- nime. (aCJ 2008061005884-8, 1ª TRJE, Publ. EM 27/07/09; DJE, P. 207) —— • —— DanO MORal - Cia. aÉREa DanO MORal - Cia. aÉREa - EXTRaviO DE bagagEM ACÓRDÃO Nº 376.287. Relator: Juiz César Loyola. Apelante: Gol Transportes Aéreos S/A. Apelado: James Maxwell Brito Coelho. EMEnTa DANO MORAL. EXTRAVIO DE BAGAGEM. ATRASO INJUS- TIFICADO EM VOO. DANO MORAL VERIFICADO. NÃO REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT42 COMPROVAÇÃO DE QUE NA BAGAGEM EXTRAVIADA HA- VIA UMA CÂMERA FOTO - GRÁFICA. RESSARCIMENTO INCABÍVEL. O extravio da baga- gem, ficando o passageiro, em solo estrangeiro, privado de seus per- tences pessoais, bem como o atraso injustificável, por longas horas, no embarque, são fatos que refletem de forma negativa causando angús- tias e sofrimentos, evidenciando o dano moral. Incabível o pedido de ressarcimento se o passageiro não comprova que na bagagem havia uma câmera fotográfica, haja vista que tal objeto deve ser transportado na bagagem de mão, conforme as normas da empresa aérea. Recurso parcialmente provido. aCÓRDÃO Acordam os Senhores Juízes da 2ª Turma Recursal dos Juizados Espe- ciais Cíveis e Criminais do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Ter- ritórios, CÉSAR LOYOLA - Relator, TAVERNARD LIMA - Vogal, EDI MARIA COUTINHO BIZZI - Vogal, sob a presidência do Juiz TAVER- NARD LIMA, em CONHECER E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, POR UNANIMIDADE, de acordo com a ata do julgamento. Brasília (DF), 25 de agosto de 2009. RElaTÓRiO JAMES MAXWELL BRITO COELHO propôs ação de indeniza- ção por danos materiais e morais em contra de GOL LINHAS AÉREAS INTELIGENTES S.A, em face de extravio de bagagem, sumiço e danifi- cação de objetos embarcados, e atraso injustificado no embarque. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para condenar a ré a pagar ao autor a importância de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de indenização por danos morais, e R$ 631,37 (seiscentos e trinta e um reais e trinta e sete centavos), pelos danos materiais. Inconformada, a recorrente alega que o Código de Defesa do Consumidor não é aplicável ao caso, mas sim o Código Civil e o Código Brasileiro de Aeronáutica; que o recorrido não comprovou que os ob- jetos mencionados na inicial estavam dentro da mala, ou que embalou as garrafas de vinho de forma adequada, sendo descabida a inversão de provas. Afirma que o recorrido assinou termo de limite de responsabilidade, pelo qual estava ciente que a Gol não se responsabilizaria por prejuízos com a caixa de bebidas. Alega que não estão presentes os elementos caracterizado- res da responsabilidade civil, seja no tocante aos danos materiais ou morais. Pede, ao final, a reforma da sentença para que a condenação seja afastada JURISPRUDÊNCIA CÍVEL – ACÓRDÃOS 43 ou então que o valor da indenização seja reduzido. A parte contrária não apresen- tou contrarrazões. vOTOs O Senhor Juiz CÉSAR LOYO- LA - Relator Presentes os requisitos legais, conheço do recurso. O autor chegou ao destino, Santiago-Chile, às15hs e 30min, e sua bagagem somente foi entregue no hotel na madrugada. Ao receber a mala,percebeu a ausência do cadeado. Ao abri-la, verificou que seus objetos estavam revirados, e faltava uma câ- mera digital. Na volta ao Brasil, após esperar mais de 10 horas no aeroporto de Santiago, embarcou com uma mala e uma caixa contendo 4 garrafas de vinho. Depois de 20 horas, chegou a Brasília. Ao pegar a caixa de vinhos, na esteira de bagagem, verificou que a mesma estava danificada. Posterior- mente, em casa, constatou que uma garrafa estava quebrada. Inicialmente, destaco que incide à hipótese o Código de Defesa do Con- sumidor, haja vista que o passageiro insere-se no conceito de consumidor, e a companhia aérea na condição de prestadora de serviços. Nesse sentido é a iterativa ju- risprudência das Turmas Recursais, do Tribunal de Justiça e do Superior Tribunal de Justiça: TRANSPORTE AÉREO - ATRA- SO DE VOO E EXTRAVIO DE BAGAGEM - DANO MORAL - CÓDIGO DE DEFESA DO CON- SUMIDOR E CONVENÇÃO DE VARSÓVIA - DANOS MATE- RIAL E MORAL FIXADOS EM PRIMEIRO GRAU - APELAÇÃO - REFORMA DA SENTENÇA - RECURSO ESPECIAL - PRETEN- DIDA REFORMA - SENTENÇA DE 1º GRAU RESTABELECIDA - RECURSO ESPECIAL CONHE- CIDO E PROVIDO EM PARTE. I - Prevalece o entendimento na Seção de Direito Privado “de que tratando-se de relação de consumo, em que as autoras figuram inques- tionavelmente como destinatárias finais dos serviços de transporte, aplicável é à espécie o Código de Defesa do Consumidor” (REsp 538.685, Min. Raphael de Barros Monteiro, DJ de 16/2/2004). II - De igual forma, subsiste orientação da E. Segunda Seção, na linha de que “a ocorrência de problema técnico é fato previsível, não caracterizando hipótese de caso fortuito ou de força maior”, de modo que “cabe indeniza- ção a título de dano moral pelo atraso de voo e extravio de bagagem. O dano decorre da demora, desconforto, afli- ção e dos transtornos suportados pelo passageiro, não se exigindo prova de REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT44 tais fatores” (Ag. Reg. No Agravo n. 442.487-RJ, Rel. Min. Humberto Go- mes de Barros, DJ de 09/10/2006). III - Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido tam- bém em parte, para restabelecer-se a sentença de primeiro grau, fixada a indenização por dano material em R$194,90 e, por seu turno, a relativa ao dano moral na quantia de R$5.000,00, atualizáveis a contar da data da decisão do recurso especial. (REsp 612.817/MA, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, QUARTA TURMA, julgado em 20/09/2007, DJ 08/10/2007 p. 287) CIVIL. CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁUTICA. CÓDIGO DO CONSUMIDOR. BILHETE ÁEREO. EXTRAVIO DE BAGA- GEM, LOCALIZADO QUATRO DIAS APÓS O AUTOR CHEGAR AO SEU DESTINO, EM LOCAL TURÍSTICO. DANO MATERIAL E DANO MORAL EXISTENTE. INDENIZAÇÕES CABÍVEIS. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. A ação envolve relação de consumo entre o hipossuficiente e a empresa de transporte aéreo. Responsabilidade objetiva. 2. Não se aplicam as disposições do Código Brasileiro de Aeronáutica, no presente caso, posto que patente a relação de consumo havida ente o autor e a ré no contrato de transpor- te de pessoa. Aplicação do CDC. 3. É cabível o ressarcimento das des- pesas feitas pelo autor para adquirir novos objetos pessoais contidos na mala extraviada, uma vez que se en- contrava em hotel, em local turístico, não dispondo de outro meio para suprir a ausência desses bens. 4. Há dano moral indenizável, diante do fato da angústia do autor em ficar sem seus pertences por quatro dias, em local turístico em período de férias, privado de suas roupas e acessórios adequados para o veraneio. 5. Pela sucumbência, arcará a recor- rente com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios calculados à razão de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, devidamente corrigidos. 6. Recurso conhecido e improvido. Sen- tença mantida na forma que foi lança- da, fl 05/07.(20080110040777ACJ, Relator LEONOR AGUENA, Segunda Turma Recursal dos Juiza- dos Especiais Cíveis e Criminais do D.F., julgado em 24/03/2009, DJ 04/05/2009 p. 222) Rejeito, pois, a alegação. Na contestação, a Recorrente não nega ter havido o extravio da bagagem, que somente de madrugada foi entregue no hotel em que se en- contrava o Recorrido. Não contesta, também, que a bagagem foi entregue avariada, e que na viagem de retorno, teve o recorrido que amargar longas JURISPRUDÊNCIA CÍVEL – ACÓRDÃOS 45 horas de espera para embarcar de retorno ao Brasil. Esses dois fatos acima menciona- dos, incontroversos, haja vista que não foram impugnados, tem aptidão para interferir na esfera psíquica e certa- mente causaram angústias e situação desconfortável ao autor/recorrido, que ficou privado de seus pertences pessoais em solo estrangeiro, presu- mindo-se, pelas regras de experiência, a ocorrência do dano moral. Nesse sentido, o precedente abaixo: EXTRAVIO DE BAGAGEM. DA- NOS MORAIS. VALOR. 1.No caso de extravio de bagagem, o dano moral é presumido, não sendo necessária a prova do prejuízo e nem a intensidade do sofrimento experi- mentado pelo ofendido, sendo certo que o extravio de bagagem, por si só, mostra-se hábil a configurar dano moral, passível de ser indenizado. 2.O valor da indenização deve ser fixado considerando-se a lesão sofrida, a condição financeira do réu e o cará- ter pedagógico e punitivo da medida, ponderando-se pela proporcionali- dade e razoabilidade, evitando-se o enriquecimento sem causa do autor. (20080810004225ACJ, Relator ASIEL HENRIQUE, Primeira Tur- ma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do D.F., julgado em 16/12/2008, DJ 30/06/2009 p. 159) Saliento que o fato de ter ado- tado todos os procedimentos neces- sários para a localização da bagagem não isenta a companhia aérea de responsabilidade pelos danos gerados pelo fato, ou seja, pela não entrega da mala no momento do desembarque do passageiro. Tenho que o valor fixado para a indenização pelos danos morais, R$ 2.000,00, está adequado, consideran- do o grau de culpa e a inexistência de repercussões mais graves. No tocante aos danos materiais, a pretensão do autor/recorrido diz res- peito ao sumiço de uma câmera digital e um cartão de memória, que estariam na bagagem extraviada, e à garrafa de vinho, quebrada durante o transporte no retorno ao Brasil. É incontroverso que a bagagem foi entregue avariada, mas o recorrido não comprovou que entre os perten- ces estava a câmera fotográfica. No caso, não há como inverter o ônus probatório, haja vista que é impossí- vel à companhia aérea provar que o objeto não estava na mala. Demais disso, em se tratando de produto eletrônico, deveria ter sido conduzido na bagagem de mão, conforme as normas da companhia aérea. Portanto, cabia ao recorrido, nos termos do artigo 333, I, do CPC, provar que havia, entre os pertences, uma máquina fotográfica, não tendo se desincumbido desse ônus. REVISTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – TJDFT46 Quanto a quebra da garrafa de vinho, os argumentos do apelante são improcedentes. Se as garrafas de vinho não estavam embaladas corretamente, como afirma, a empresa não deveria tê-las admitido quando do despacho. Note-se que nas próprias razões re- cursais constam informações extraídas do site da empresa (fl.98), no sentido de que artigos frágeis “somente serão aceitos como bagagem se estiverem devida e adequadamente embaladas”. Sendo assim, se a caixa contendo as garrafas de vinho foi aceita e des- pachada, presume-se que estavam adequadamente embaladas quando recebida. Em face do exposto, quanto aos danos materiais a sentença deve ser mantida apenas no tocante ao valor da garrafa de vinho quebrada durante o transporte, excluindo-se o valor da câmera fotográfica e do
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