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RESUMO NP2 – PSICOLOGIA CONSTRUTIVISTA UNIDADE 1 1. O que é a Psicologia Construtivista? A Psicologia Construtivista estuda como o ser humano constrói o conhecimento ao longo do seu desenvolvimento, com destaque para os aspectos cognitivos, afetivos e sociais, especialmente na infância e adolescência. Seu principal expoente é Jean Piaget, que criou a Epistemologia Genética, uma teoria do desenvolvimento baseada na interação entre o sujeito e o meio. 2. Jean Piaget – Vida e Contribuições • Nasceu em 1896, na Suíça, em uma família culta. • Aos 10 anos, publicou seu primeiro artigo sobre um pardal albino. • Formou-se em Biologia e Filosofia, o que influenciou seu olhar científico e filosófico sobre o desenvolvimento humano. • Trabalhou com Binet e Simon na padronização de testes de inteligência. • Criou o conceito de Epistemologia Genética: um estudo sobre como o conhecimento é construído desde o nascimento. • Fundou o Centro Internacional de Epistemologia Genética, dirigiu o Instituto Jean-Jacques Rousseau e atuou na Unesco. • Faleceu em 1980, tendo escrito mais de 90 livros e centenas de artigos científicos. Piaget buscou entender como o ser humano constrói, organiza e transforma o conhecimento, e como a inteligência se desenvolve com o tempo. 3. Epistemologia – As Correntes Teóricas sobre o Conhecimento A Epistemologia é a área da filosofia que estuda a origem, estrutura e validade do conhecimento. Três correntes principais explicam como adquirimos conhecimento: 1. Inatismo – “O saber está dentro” • Defende que o conhecimento é inato, já nasce com o sujeito. • O desenvolvimento se dá por maturação biológica. • Ex: Sócrates e Platão. • Analogias: “Pau que nasce torto, morre torto.” 2. Empirismo – “Aprender é viver” • O sujeito nasce como uma “folha em branco” (tábula rasa). • O conhecimento vem do ambiente, da experiência sensorial. • Ex: Aristóteles, Locke, Skinner. • Analogias: “Diga-me com quem andas e te direi quem és.” 3. Construtivismo / Interacionismo – “Conhecer é construir” • O conhecimento é construído ativamente pelo sujeito na interação com o meio. • Há uma relação dinâmica entre o sujeito (S) e o objeto (O): S ↔ O. • Ex: Immanuel Kant, Jean Piaget. Piaget adotou essa perspectiva interacionista, dizendo que a inteligência não é inata nem totalmente adquirida, mas construída. 4. Epistemologia Genética – A Teoria de Piaget A Epistemologia Genética é a teoria piagetiana que busca explicar a gênese (origem) do conhecimento, entendendo como ele se desenvolve desde a infância. Sujeito Epistêmico: • É o sujeito do conhecimento: ativo, curioso, explorador. • Constrói conhecimento ao agir sobre o meio e refletir sobre sua ação. Objeto Cognoscível: • É o mundo externo, os estímulos, os símbolos e experiências com os quais o sujeito interage. A interação entre sujeito e objeto transforma ambos: o sujeito evolui cognitivamente e o objeto adquire sentido. 5. Principais Conceitos Piagetianos Adaptação: • Processo fundamental para o desenvolvimento da inteligência. • Envolve duas funções complementares: 1. Assimilação • Quando o sujeito encaixa uma nova informação em esquemas mentais já existentes. • Ex: Um bebê que mama e depois tenta sugar uma colher. 2. Acomodação • Quando o sujeito precisa modificar seus esquemas mentais para lidar com uma nova situação. • Ex: O mesmo bebê aprende que precisa abrir a boca ao invés de sugar. ➡ A assimilação mantém o que já se sabe; a acomodação transforma o que se sabe. Equilibração Majorante • Processo dinâmico de desequilíbrio → conflito → nova adaptação. • Cada vez que o sujeito se depara com um desafio, ele tenta se equilibrar cognitivamente. • A equilibração é o que impulsiona o desenvolvimento mental, levando a formas de pensamento mais complexas. 6. O que é Inteligência para Piaget? A inteligência é a capacidade de se adaptar ao meio por meio da ação e da reflexão, reorganizando o pensamento frente a novos desafios. Características da inteligência em Piaget: • É ativa: constrói e reconstrói estruturas mentais. • É dinâmica: evolui por estágios. • Tem finalidade adaptativa: busca manter o equilíbrio com o meio. • É construtiva: não é recebida pronta, mas se forma a partir da ação. 7. Modelos Pedagógicos e Epistemológicos Cada corrente epistemológica gera um modelo de ensino diferente: Epistemologia Pedagogia Relação Empirismo Diretiva (A ⇐ P) Professor transmite o saber Inatismo Não Diretiva (A ⇒ P) Aluno se desenvolve sozinho Construtivismo Relacional (A ⇔ P) Troca entre aluno e professor Pedagogia Relacional: o professor cria condições para que o aluno construa ativamente o conhecimento, respeitando o seu tempo e nível de desenvolvimento. 8. Aplicações e Casos Práticos (Interatividade) • Pedro de 6 meses suga a colher como se fosse uma mamadeira e depois muda a forma de segurar. o Isso é um processo de adaptação, com assimilação seguida de acomodação. • Fábio tem dificuldade na escola. O pai diz que ele vai amadurecer com o tempo. o O pai tem uma visão inatista da inteligência (baseada na maturação). • Duas professoras acham que o aluno está indo mal por causa das amizades. o É uma perspectiva empirista, focada na influência do ambiente (meio social). UNIDADE 2 I. Estádios do Desenvolvimento Cognitivo segundo Piaget Conceito de Estádio (≠ Estágio) • Estádio: fase qualitativamente distinta e estruturada do desenvolvimento. As aquisições de um estádio são necessárias para o próximo, mas permanecem integradas. • Os estádios não são fixos nem lineares: o desenvolvimento é em espiral, com saltos e reorganizações cognitivas. • Cada criança pode avançar em seu ritmo individual, mas a sequência é invariável. 1. Estádio Sensório-Motor (0 a 2 anos) Construção da inteligência prática a partir das ações motoras e dos sentidos. Características Gerais: • O bebê nasce com reflexos inatos e automáticos. • Aos poucos, transforma essas ações em esquemas motores voluntários. • Aprende com o corpo: olhar, tocar, sugar, jogar, empurrar. Subestádios (segundo Piaget): 1. Exercício dos reflexos (0–1 mês): reflexos como base dos primeiros esquemas. 2. Reações circulares primárias (1–4 meses): repetições centradas no próprio corpo (ex: chupar dedo). 3. Reações circulares secundárias (4–8 meses): repetições voltadas ao ambiente externo (ex: sacudir chocalho). 4. Coordenação de esquemas (8–12 meses): início da intencionalidade e da permanência do objeto (entende que objetos continuam a existir mesmo sem vê-los). 5. Reações circulares terciárias (12–18 meses): experimenta diferentes ações para ver efeitos (ex: empurrar objetos para diferentes lados). 6. Interiorização dos esquemas (18–24 meses): surge o pensamento simbólico – a criança resolve problemas mentalmente, sem agir fisicamente primeiro. 2. Estádio Pré-Operatório (2 a 6 anos) A inteligência passa a ser representativa e simbólica, mas ainda não é lógica. Função simbólica ou semiótica: • Imitação diferida: repete comportamentos na ausência do modelo. • Jogo simbólico: faz de conta (usar uma caixa como fogão). • Imagem mental: representação interna de algo. • Linguagem: fala como forma simbólica de pensamento. • Desenho: representação gráfica com intenção simbólica. Pensamento da criança pré-operatória: • Egocentrismo: pensa a partir de si mesma, sem considerar o outro. • Centradação: foca em um único aspecto da situação (ex: altura da água em um copo). • Pensamento transdutivo: liga eventos sem lógica causal (ex: "choveu porque briguei"). • Sincretismo: mistura elementos desconexos sem coerência. • Animismo: atribui vida e intenções a objetosinanimados. • Intuitivo: raciocínio baseado na aparência, sem reversibilidade (ex: "tem mais porque está mais comprido"). Exemplo: Heloisa brinca de casinha com caixa de sapato como fogão → uso de função simbólica → estádio pré-operatório. 3. Estádio Operatório Concreto (7 a 11 anos) Desenvolvimento do pensamento lógico, mas ainda ligado a situações concretas. Características cognitivas: • Descentralização: compreende que há outros pontos de vista. • Conservação: entende que quantidade não muda com aparência. • Reversibilidade: pode imaginar ações em sentido contrário. • Classificação: agrupar objetos com base em critérios. • Seriação: ordenar elementos (ex: do menor ao maior). • Inclusão de classes: entende que uma classe pertence a outra maior (ex: rosas são flores). Lógica Indutiva: • Constrói regras gerais a partir de exemplos concretos. Exemplo: Jorge, 7 anos, diz que precisa jogar sem valer para aprender → uso da lógica concreta → estádio operatório concreto. 4. Estádio Operatório Formal (12 a 15 anos) Capacidade de raciocinar sobre conceitos abstratos, hipóteses e proposições. Características cognitivas: • Pensamento abstrato: compreende ideias como justiça, amor. • Raciocínio hipotético-dedutivo: formula hipóteses e testa possibilidades ("se... então..."). • Combinatória: combina variáveis mentalmente. • Probabilidade: avalia possibilidades e riscos. • Metacognição: pensa sobre o próprio pensamento. Lógica Dedutiva: • Parte de uma regra geral para deduzir casos específicos. II. O Desenho Infantil como Expressão Cognitiva O desenho é uma forma de pensamento simbólico, não só expressão artística. Georges-Henri Luquet – Etapas do Desenho Infantil 1. Realismo Fortuito (2–3 anos): o Rabiscos aleatórios, aos quais a criança atribui um significado depois (ex: “isso é um cachorro!”). 2. Realismo Malsucedido (3–4 anos): o Intenção de representar, mas com erros – braços saem da cabeça (“badameco girino”). 3. Realismo Intelectual (4–8 anos): o A criança desenha o que sabe, e não o que vê. o Uso de transparência, plano deitado, rebatimento. 4. Realismo Visual (9–12 anos): o Desenha o que vê com fidelidade, mas perde espontaneidade. Viktor Lowenfeld – Fases do Grafismo 1. Garatujas (2–4 anos): o Rabiscos desordenados, depois controlados e nomeados. 2. Pré-esquemática (4–7 anos): o Figura humana aparece (cabeça com pernas). o Desenhos com justaposição de elementos. 3. Esquemática (7–9 anos): o Uso de técnicas próprias: plano de base, raio-x, exageros. o Desenhos mais estruturados, mas ainda infantis. 4. Realismo (9–12 anos): o Perda da espontaneidade; desenhos estereotipados. Integração Luquet & Lowenfeld Faixa Etária Luquet Lowenfeld 2–3 anos Realismo Fortuito Garatujas 3–4 anos Realismo Malsucedido Pré-esquemática 4–8 anos Realismo Intelectual Esquemática 9–12 anos Realismo Visual Realismo UNIDADE 3 I. Avaliação da Inteligência: Psicogenética × Psicométrica Abordagem Psicométrica Origem: • Desenvolvida por Binet e Simon (QI, 1905) e depois por Wechsler (WAIS e WISC). Objetivo: • Quantificar a inteligência por meio de respostas corretas, sob condições padronizadas (tempo, ambiente, material, instruções). Características: • Uso de testes com perguntas fixas. • Controle do ambiente, tempo e material. • Foco em médias populacionais e comparação de desempenho. Limitações: • Não considera como a criança pensa, apenas se ela acerta ou erra. • Interpreta o erro como falha, não como parte do processo cognitivo. Abordagem Psicogenética (Jean Piaget) Objetivo: • Compreender como a criança constrói seu raciocínio e por que ela pensa daquela forma. Método utilizado: Método Clínico Piagetiano • Desenvolvido a partir de entrevistas abertas e provas operatórias. • Valorização da argumentação da criança. • O foco está na forma de pensar, não no acerto. “O erro é construtivo” — ele revela o nível de desenvolvimento cognitivo da criança. II. Método Clínico Piagetiano (avaliação psicogenética) Fundamentos: • Investigação da inteligência como processo em desenvolvimento. • O adulto precisa conhecer profundamente a teoria para adaptar perguntas e interpretar respostas. Estrutura: • Uso de entrevistas verbais e de materiais concretos (copos, palitos, massas, figuras etc.). • O experimentador não segue um roteiro rígido, mas adapta-se às respostas da criança. Tipos de Erros (Níveis de Compreensão) Nível Características Nível I Erro absoluto. A criança não entende o problema ou responde com convicção errada. Nível II Erro instável. A criança oscila, hesita, erra e tenta. Há conflito cognitivo. Nível III Erro consciente. A criança quase acerta, compreende parcialmente, pode corrigir-se. Reações Comuns das Crianças nas Provas Tipo de reação Descrição Não importismo Responde qualquer coisa, sem preocupação. Fabulação Inventa uma história. Crença sugerida Fala o que acha que o adulto quer ouvir. Crença espontânea Responde com base em seus próprios recursos. Crença desencadeada Responde depois de refletir profundamente. III. Provas Operatórias (Aplicações do Método) Piaget elaborou diversas situações-problema para investigar estruturas cognitivas: Prova O que avalia Conservação de líquido Compreensão de quantidade constante apesar da aparência. Conservação de massa Entendimento de que forma não altera a quantidade. Seriação Capacidade de ordenar objetos por tamanho. Inclusão de classes Ex: “Há mais flores ou mais rosas?” – exige classificação hierárquica. Intersecção de classes Exige coordenação de duplas categorias. O foco está na explicação da criança, e não na resposta final. Mesmo a resposta errada pode mostrar um raciocínio correto para o estágio dela. IV. O Jogo na Perspectiva Psicogenética O jogo, para Piaget, é uma forma privilegiada de expressão do pensamento infantil. Tipos de Jogo: Tipo de jogo Estádio Características Jogo de exercício Sensório-motor (0–2 anos) Repetição de movimentos motores por prazer (ex: sugar, balançar). Jogo simbólico Pré-operatório (2–6 anos) Brincadeiras de “faz de conta” (casinha, super-heróis). Jogo de construção Pré-operatório – transição Mistura de ação e imaginação (quebra- cabeça, blocos). Jogo de regras Operatório (7– 12+ anos) Brincadeiras com normas, papéis, competição (ex: futebol, xadrez). Os jogos permitem à criança desenvolver estruturas cognitivas, sociais e morais. V. Desenvolvimento Moral em Piaget O juízo moral se desenvolve em paralelo ao desenvolvimento cognitivo. Fases do Desenvolvimento Moral: Período Idade Características Anomia 0–2 anos Sem noção de regra. Heteronomia 2–6 anos Obediência cega às regras impostas por adultos. Respeito unilateral. Semiautonomia 6–12 anos Início da consciência sobre regras. Ainda depende do meio. Autonomia 12+ anos Regras compreendidas e aceitas com base no respeito mútuo. Evolução da Regra e da Justiça • Realismo moral (heteronomia): o Regra = ordem imutável. o Justiça = punição. o Obediência à autoridade, não à razão. • Autonomia moral: o Regras são acordadas e podem ser revistas. o Justiça é baseada em reciprocidade e intenção. o Há cooperação, reflexão e diálogo. Tipos de Punição: • Expiação: castigo sem conexão com o erro. • Reciprocidade: punição com propósito educativo. VI. Aplicações na Educação e Intervenção Ações recomendadas: • Valorizar o erro como ferramenta de construção. • Incentivar reflexão, diálogo eautonomia. • Criar ambientes onde a criança possa explorar, argumentar e negociar. • Aplicar o método clínico para avaliar a forma de pensar, não o desempenho absoluto.