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11 - Direito à Vida, à Privacidade, Princípio da Isonomia

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LFG – CONSTITUCIONAL – Aula 11– Prof. Marcelo Novelino – I�ntensivo I – 29/05/2009
	A ADPF n.º 54
	Essa ADPF foi proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Área da Saúde. O STF ainda não julgou o mérito. Houve apenas a concessão da medida cautelar pelo Ministro Marco Aurélio, só que essa medida cautelar foi cassada pelo Pleno do STF.
	Vamos ver porque foi cassada. Nas ações de controle concentrado (ADI, ADC, ADPF), em regra, quem concede a medida cautelar não é o relator. Ela deve ser concedida pelo Pleno do tribunal. Essa é a regra. Só excepcionalmente pode ser concedida pelo relator (durante o recesso, as férias ou diante de um perigo de grave lesão). Assim, a cautelar na referida ADPF deveria ter sido medida concedida pelo Plenário e não pelo relator. Mas o Min. Marco Aurélio achou que a medida era de extrema urgência e acabou concedendo a medida cautelar neste caso.
	Por que o Plenário cassou? O principal motivo não foi nem o mérito da questão em si, mas porque entendeu que a questão era demasiadamente importante para que apenas um ministro decidisse. Houve a concessão da medida cautelar autorizando o aborto pelo Ministro Marco Aurélio e, logo em seguida o Plenário do STF cassou a cautelar.
	A questão não foi julgada no mérito, mas essa questão já vem sendo cobrada em algumas provas de concurso público. Então, a gente vai ver aqui quais são os três principais argumentos que a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Área da Saúde sustenta para que o aborto não seja considerado crime:
1º Argumento: “Antecipação terapêutica do parto não é aborto (atipicidade da conduta)”
	Segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Área da Saúde, o crime de aborto visa a tutelar um bem jurídico que é a vida e, no caso da acrania, a morte é um acontecimento certo e inevitável que decorre exatamente desse problema. Ele falece logo após o parto. O que se sustenta é que a morte não decorre necessariamente do aborto. O que se faz é uma antecipação terapêutica que necessariamente irá ocorrer após o nascimento. Um dos argumentos que se utiliza para se sustentar que neste caso não haveria crime aborto, pois não haveria vida em sentido jurídico a ser tutelado, é a Lei 9434/97.
	No ordenamento brasileiro não há norma jurídica dizendo a partir de que momento começa a vida humana. Mas a lei 9434 diz quando termina a vida humana em termos jurídicos: quando se dá a morte encefálica. Então, a vida, em termos jurídicos, terminaria com a morte encefálica. E aí a Confederação argumenta que se não há norma fixando o início da vida humana, mas fixando quando ela termina, que é com a morte encefálica, a contrario sensu, se a vida termina com a morte encefálica, ela só começa com a formação do sistema nervoso central. No caso da acrania, isso não acontece. O sistema nervoso não chega a se formar, há apenas vestígio de massa encefálica. Ou seja, em termos estritamente jurídicos (não em termos morais, filosóficos, religiosos), não haveria o bem da vida a ser tutelado porque não haveria formação de vida humana nos termos consagrados no nosso ordenamento.
	É um argumento interessante porque o próprio Ministro Carlos Ayres usou esse argumento. Parece que é um argumento que o supremo tende a aceitar, de que a vida humana começaria a partir da formação do sistema nervoso central. Esse argumento foi adotado por Carlos Britto na ADI 3510, que trata da pesquisa com células-tronco embrionárias. 
	Portanto, é esse o primeiro argumento: antecipação terapêutica do parto não é aborto, mas conduta atípica, já que não haveria vida em sentido jurídico a ser preservada.
2º Argumento: Ainda que fosse considerada aborto, essa conduta não seria punível segundo a Interpretação Evolutiva do Código Penal. 
	Há no Código Penal, no art. 128, duas excludentes de punibilidade no caso do aborto. No inciso I, temos o chamado aborto terapêutico, ou aborto necessário. No inciso II, temos a hipótese conhecida como aborto sentimental:
Art. 128, I, CP – Aborto terapêutico – A má-formação do feto coloca em risco a vida da gestante (o aborto não é criminoso nesse caso). Fácil entender: colisão entre dois direitos: à vida do feto e à vida da gestante de quem não se pode exigir o sacrifício da própria vida em proveito do feto. Não deixa de ser um estado de necessidade. É excludente de antijuridicidade (estado de necessidade), e não de punibilidade. É hipótese mais simples.
	
Art. 128, II, CP – Aborto sentimental – É objeto de controvérsia. O sentimental é aquele que pode ocorrer quando a gravidez é decorrente de estupro e o CP admite que a mulher realize o aborto. 
	O legislador ponderou, de uma lado a vida do feto e, do outro lado ele colocou, segundo a jurisprudência, a liberdade sexual da mãe e a dignidade da pessoa humana da mãe. A mulher não poderia ser obrigada a gerar um filho fruto de violência sexual e olhar para ele o resto da vida, seria tortura psicológica. Se a mulher tiver condições psicológicas de conviver com isso é problema dela. Mas o próprio legislador disse que, nesse caso, não se pode punir. 
	Há alguns juízes que dizem que esse dispositivo não foi recepcionado pela CF/88. Prova no RJ (MP ou Magistratura) perguntou isso. As pessoas que fizeram a prova entenderam que o examinador estava querendo dizer que não havia sido recepcionado. Pela correção parece que foi isso mesmo. Esse entendimento, contudo, é minoritário. A maioria entende como integralmente recepcionado, nas duas hipóteses, tanto no terapêutico quanto no sentimental. 
	O segundo argumento diz o seguinte: Quando o Código Penal foi feito, na sua parte especial, em 1940, não havia os meios técnicos e científicos, para se determinar com precisão a hipótese de acrania. Se nós considerarmos que essa hipótese é de aborto, devemos colocá-la como hipótese de não punibilidade ao lado do aborto terapêutico e do sentimental. Ainda que fosse considerado aborto, não seria punível.
	Observem aqui a questão interessante que surge com este entendimento: Se o STF considerar que esta hipótese seria terceira hipótese de excludente de punibilidade do aborto, será que ele estaria legislando? Essa questão foi levantada na ADPF. Houve uma questão de ordem levantada nesse sentido. A questão de ordem foi resolvida por sete votos a quatro. Sete ministros entenderam que não estariam legislando, mas apenas fazendo uma interpretação conforme a Constituição. Os outros quatro entenderam que, não que o Supremo estaria atuando como legislador positivo. 
3º Argumento: Dignidade da pessoa humana, analogia à tortura, interpretação conforme a Constituição.
	Você obrigar a gestante a gerar por nove meses um feto com a certeza de que não sobreviverá é uma violação de ambas as vertentes da dignidade da pessoa humana, tanto da dignidade no seu aspecto físico, como no seu aspecto psicológico. No seu aspecto físico, seria violação da dignidade da pessoa humana porque há um sério risco de morte intrauterina a colocar em risco a própria vida da gestante. No aspecto psicológico, seria uma espécie de tortura você obrigar uma mulher a gerar por nove meses um feto inviável.
	Nesse contexto, existe uma expressão da filosofia que Roberto Barroso comenta que é o chamado desacordo moral razoável. Ele ajuda a resolver várias questões difíceis de serem resolvidas. O que seria o desacordo moral razoável? Ocorre quando não existe consenso entre posições racionalmente defensáveis. Há argumentos a favor e contra defensáveis moral e racionalmente. E qual deve ser a posição dos Poderes Públicos diante de um desacordo moral razoável? Deve ser o de não impor condutas externas. O papel do Estado, nesses casos, deve ser o de não impor condutas externas imperativas. Se, há argumentos moral e racionalmente defensáveis dos dois lados, o papel do Estado deve ser o de não se intrometer. Ele deve deixar que a pessoa decida de acordo com a sua consciência. Não é o Estado que vai dizer se o mais correto é fazer o aborto ou deixar defazer o aborto. É a visão moral de cada um que deve determinar isso.
	Esses então, são os argumentos favoráveis colocados na ADPF 54. Os argumentos contrários são os mesmos que os colocados para o aborto, então não vou repetir aqui.
	Vamos agora falar de um aspecto que está diretamente ligado ao direito à vida, que é o direito à privacidade.
	
	1.1	DIREITO À PRIVACIDADE (Art. 5º, X)
	Como não existe consenso terminológico na doutrina e na jurisprudência sobre privacidade, vamos falar de direito à privacidade no seguinte sentido: vamos entender que o direito a privacidade é um gênero dentro do qual vamos trabalhar com quatro subespécies:
Intimidade
Vida Privada
Honra
Imagem
	
	O art. 5º, X, assegura indenização, por danos materiais ou morais, quando houver violação a esse direito:
	X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
	Observe que a CF fala que esses direitos são invioláveis. Mas nós vimos que não há direitos absolutos. Em algumas situações, poderá haver uma restrição a estes direitos e é isso que vamos analisar. Em que hipóteses, mesmo havendo uma certa violação a esses direitos, essas violações são consideradas legítimas.
	Vamos trabalhar com uma teoria desenvolvida no direito alemão, chamada Teoria das Esferas. Essa teoria trabalha da seguinte forma: quanto mais próxima das opções dessa pessoa estiverem as esferas, maior vai ser a proteção dada a essa esfera. Quanto mais próxima do indivíduo, maior será a proteção dada a ela.
	
A esfera mais próxima do indivíduo, seria a esfera da intimidade: confidências, segredos pessoais, anotações de um diário. As informações de um diário não fazem parte da vida privada. São sigilosas. Esses segredos fazem parte da intimidade da pessoa.
	A segunda esfera, seria a esfera da vida privada que compreende os momentos em que a pessoa compartilha com outras mais próximas (aniversários de um amigo, ambiente de trabalho, clube recreativo, ambiente doméstico). Até pessoas públicas devem ter proteção à vida privada. Filmar o Lula jogando bola é violar sua vida privada. Não poderia haver a divulgação da imagem. Não são momentos de segredo, nem de confidência, mas que você não quer expor ao público de forma geral.
	A terceira esfera é da publicidade, que já não teria essa proteção constitucional. Quem faz parte da esfera da publicidade? Alguns exemplos: A pessoa que participa de passeada na cidade reivindicando direito, ao estar ali, naquele evento público, não pode alegar direito à vida privada. Ali, ela está renunciando temporariamente à sua privacidade. Se alguém a fotografa naquele evento ou em outro evento cultural, artístico, histórico ou de interesse público, e publica, houve uma restrição legítima porque aquilo não faz parte da intimidade daquela pessoa. Informações contidas em processo judicial. Qualquer informação que faça parte de um processo judicial, se esse processo não tramita em segredo de justiça, não se pode alegar que a divulgação dessa informação viola a intimidade porque os atos processuais são públicos. O jornalista pode divulgar informações de processos judiciais, informações que caíram no domínio público, fatos que acontecem em locais abertos ao público, são o mesmo exemplo.
	Um outro esclarecimento importante que o próprio STJ faz confusão é com relação à honra e a imagem das pessoas. A CF trata o direito à honra e o direito à imagem de forma autônoma. É possível haver uma violação à imagem e não necessariamente à honra da pessoa. Ainda que se entenda que não há violação à honra, existe um direito à imagem. Uma pessoa pública não pode ter sua imagem estampada em uma propaganda, isso viola o direito à imagem se ela não autorizou a utilização dessa imagem, ainda que seja propaganda que a eleve. Se não autorizou, haveria o uso indevido. Nem toda violação do direito à imagem precisa ser proteção ao direito à honra. São direitos autônomos.
	Existem determinadas restrições ao direito à imagem que são legítimas. Em acontecimento de interesse público, como uma enchente, um desabamento, um acidente, a pessoa não pode alegar direito à privacidade ou à imagem para que não seja filmada porque há interesse público àquela informação. 
	Imagens captadas por radar eletrônico são consideradas captações legítimas e não ferem o direito à imagem.
	Câmeras de segurança – São restrições legítimas ao direito à imagem. São gravações legítimas. O que se protege nesse caso, é o uso sem justa causa. É pegar uma câmera no momento de intimidade e divulgar sem justa causa. Isso não pode.
	Feitos esses esclarecimentos vamos àquilo que realmente cai em concurso e falar de três situações que as pessoas às vezes confundem, e analisar quando serão legítimas e quando não:
Gravação clandestina
Quebra de sigilo
Interceptação telefônica
Gravação Clandestina
	“Consiste em uma gravação ambiental pessoal ou telefônica feita por um dos interlocutores sem o conhecimento dos demais.”
	A situação é a seguinte: 
Gravação ambiental – É colocada uma câmera escondida no ambiente. Uma delas sabe o que está acontecendo.
Gravação pessoal – Alguém leva um gravador no bolso e grava a conversa sem que a outra pessoa saiba.
Gravação telefônica – Uma pessoa liga para outra e grava a conversa sem que o outro saiba.
	Essas gravações são clandestinas porque são feitas sem o conhecimento da outra pessoa. Agora, não significa (e prestem bastante atenção nisso) que toda gravação clandestina é ilícita. Há gravações que, mesmo feitas clandestinamente, não são consideradas ilícitas. 
	Quando uma gravação feita clandestinamente não será considerada ilícita? Vamos usar o conceito aberto e tentar concretizá-lo com a jurisprudência do Supremo.
	Uma gravação clandestina será admitida como prova no processo quando houver justa causa. Há situações em que o uso como prova de uma gravação clandestina será admitida. Lembrem-se que trabalhamos aqui nos direitos fundamentais, na maioria das vezes, com princípios e não com regras. E os princípios tem que ser ponderados diante do caso concreto e diante de outros princípios envolvidos. No caso concreto, outros princípios, outros valores justificam uma restrição ao direito de privacidade. 
	Em que casos, a jurisprudência do Supremo já sedimentou o entendimento de que há uma restrição legítima ao direito de publicidade?
	
1ª Hipótese de justa causa para o uso da gravação clandestina - Gravação utilizada pelo réu no processo penal. Essa é uma hipótese pacífica porque há colisão de direitos fundamentais que pode ser resolvida de forma simples: de um lado o direito à privacidade da pessoa que teve sua conversa gravada sem o consentimento e do outro o direito à liberdade do réu e o direito à ampla defesa. Nesta ponderação privacidade X liberdade e ampla dessas, essas últimas têm um peso maior, admitindo-se a gravação.
2ª Hipótese de justa causa para o uso da gravação clandestina - Gravação feita em legítima defesa. O que seria isso? É aquela gravação que a vítima faz em face de um sequestrador, de um chantagista, de um estelionatário. Se são feitas em legítima defesa, há excludente de atipicidade. A gravação, neste caso, será lícita. Há uma justa causa para que ela seja feita e utilizada. 
3ª Hipótese de justa causa para o uso da gravação clandestina - Gravação feita contra agentes públicos. A ponderação aqui vai ser feita com o art. 37, da CF. A ponderação que o STF faz nesse caso, é a seguinte: Direito à privacidade vs. Princípios da moralidade e publicidade dos atos da Administração Pública. A moralidade a publicidade têm, neste caso, peso maior. Esse não é o raciocínio mais correto par a questão. A meu ver, os atos administrativos não fazem parte da esfera intimidade e nem da vida privada. Os atos administrativos são pautados no princípio da publicidade e, na verdade, estariamfora da privacidade. Estariam, na verdade, na publicidade e não haveria, sequer, uma colisão neste caso. Não dá para dizer que a privacidade dele foi violada ao praticar um ato administrativo, pautado pela publicidade.
4ª Hipótese de justa causa para o uso da gravação clandestina - Gravação feita para documentar uma conversa para futuramente utilizá-la como prova (direito de defesa). O STF tem considerado como justa causa a gravação de conversa para documentar determinado assunto e, futuramente, caso haja uma negativa da outra parte, essa gravação possa ser usada como prova. O Supremo tem entendido que há justa causa na gravação feita com fim de documentar conversa a ser eventualmente usada no futuro como meio de prova.
	Enfermeira agredindo idoso cego e surdo na TV. Sem dúvida que uma gravação feita por essas câmeras são legítimas, ainda que o outro não saiba porque são meios de proteção legítima. E o uso como meio de prova, pode ser usado? Claro. A babá, a enfermeira, não pode dizer que a intimidade dela foi violada com a gravação dessas imagens. Questão mais complexa é: 
	Pode haver a divulgação dessas imagens na televisão? Eu não vejo nenhum tipo de motivo razoável que não justifique a exibição. Nesse caso, a divulgação das imagens têm um grade interesse público, que é alertar a população para esse tipo de conduta e as pessoas tomem as precauções necessárias. O interesse público em saber que aquilo existe e tomar as providências justificam-se as exibições das imagens.
	São, pois, quatro hipóteses em que o STF aceita como meio de prova a gravação clandestina. Isso significa que não há outros meios? De forma alguma. Mas essas são hipóteses fáticas em que já houve uma ponderação por parte do STF e são aceitas.
Quebra de Sigilo
	Normalmente envolve:
Sigilo Bancário
Sigilo Fiscal
Sigilo de Dados
Sigilo Telefônico
	São, basicamente, esses quatro sigilos que são os protegidos contra quebra. A quebra do sigilo é a que envolve maiores controvérsias. Há Ministros que entendem que a quebra estaria protegida pelo art. 5º, X, outros ministros entendem que a quebra estria protegida pelo art. 5º, XII e outros, como Francisco Resek (que já se aposentou) que entendia que não havia proteção constitucional contra a quebra do sigilo bancário, por exemplo. Segundo ele, a proteção é apenas infraconstitucional. Vamos analisar o que seriam esses sigilos.
	Sigilo bancário – Envolve as informações bancárias de determinada pessoa. É o acesso aos dados da conta bancária que se protege. Dados bancários fazem parte da intimidade de alguém? Não. Não fazem parte da intimidade porque, se fizessem, estariam sido violados a todo instante por seu gerente de banco, por exemplo. As pessoas do banco, geralmente, têm acesso à sua conta bancária. Ela não faz parte da intimidade, mas faz parte da vida privada porque não podem ser divulgadas para qualquer pessoa. O que faria parte da intimidade seria alguém ter acesso à seguinte informação: Você fez uma transferência para determinada empresa que fornece determinados medicamentos que são utilizados por pessoas que têm determinados problemas. Este tipo de informação pode violar a intimidade. Agora, quanto você tem na conta, quanto foi depositado, quanto você transferiu, são dados, são números. Faz parte da vida privada. Não podem ser divulgados, mas não fazem parte da intimidade.
	
	Sigilo Fiscal – Declaração de IR faz parte da intimidade de alguém? Também não. Você tem que declarar o seu imposto de renda. Assim que você passar no concurso você vai ter que declarar, não só para a receita, mas também para o órgão que você trabalha. Então, isso não faz parte da intimidade de ninguém. 
	Caso italiano – O ministro da economia mandou divulgar na internet todas as declarações dos contribuintes. Isso causou estardalhaço. O governo mandou retirar, mas os jornais já tinham captado aqueles dados e divulgaram a declaração de renda das pessoas famosas na primeira página. Neste caso, a divulgação não é devida. É violação indevida da privacidade das pessoas.
	Sigilo de Dados – informações contidas no computador, no pendrive, no cd. 
	Sigilo telefônico (ou sigilo de dados telefônicos) – Dados telefônicos são os registros das ligações telefônicas. É o histórico das ligações feitas por uma pessoa. Sigilo, telefônico, não tem nada a ver com o conteúdo do diálogo. Não se sabe o que foi dito. Só se sabe que uma pessoa ligou para a outra, do telefone A para o telefone B, no dia tal, na hora tal e que tal ligação durou tantos minutos. Houve violação da privacidade, mas não tão profunda quanto a da interceptação telefônica.
	O delegado pode requisitar ao juiz que peça à operadora de telefonia celular o registro das ligações do suspeito de um assassinato para poder investigar mais profundamente.
	Quem pode, legitimamente, solicitar a quebra desses sigilos? Quando eu digo isso, significa que ela pode diretamente solicitar a quebra, não precisando pedir ao juiz. É importante não confundir. A autoridade policial não pode diretamente, mas pode pedir ao juiz e quem quebra é o juiz. Quem pode, diretamente, quebrar esses sigilos? 
	O juiz pode determinar de forma fundamentada a quebra de todos esses sigilos.
	CPI pode determinar? Art. 58, §3º, que fala que a CPI tem poder de investigação próprio de autoridade judicial.
		§ 3º - As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.
	Então, a CPI, para fazer a investigação parlamentar, pode usar alguns poderes que são próprios dos magistrados. Dentre esses poderes que são atribuídos à CPI, está a quebra de sigilo. A CPI pode determinar a quebra de sigilo bancário, de sigilo fiscal, de sigilo de dados e quebra de sigilo telefônico. Ela não pode determinar (veremos depois) interceptação telefônica.
	E se fosse CPI estadual? A Assembléia Legislativa de um Estado pode criar CPI. Admite-se quebra de sigilo bancário (estou falando em sigilo bancário porque foi o que o STF decidiu) por CPI estadual? Há decisão do STF (vou colocar no material) proferida na ação cível originária n.º 730 e o tema discutido foi exatamente esse: Se CPI estadual poderia determinar quebra de sigilo bancário. A decisão foi bastante apertada: Por seis votos a cinco, o Supremo entendeu que SIM, admitindo quebra de sigilo bancário por CPI estadual. 
	Abrindo um parêntesis para analisar especificamente a questão de CPI municipal.
	Pode uma Câmara Municipal criar uma CPI? Nessa ação cível originária, apesar de não ser tido o objeto discutido, incidentalmente, cinco ministros acabaram discutindo a questão. Isso que eu vou colocar aqui não é uma decisão do Supremo. Foram algumas colocações trazidas por alguns ministros dentro daquela decisão. Dois ministros entenderam que Município não poderia criar CPI ao seguinte argumento: Não existe poder Judiciário Municipal. Como a CPI tem poderes de investigação próprios de autoridade judicial, e não havendo Judiciário Municipal, não poderia ser criada CPI no âmbito do Município. Três ministros disseram que sim, em razão do princípio da simetria. Esse segundo entendimento, me parece, é o mais correto. A CPI é instrumento de investigação importantíssimo e de defesa das minorias. A CPI não tem só poderes de investigação das autoridades judiciárias. Ela tem outros poderes. Veja que a própria CF fala que,além dos poderes de investigação, pode ter outros, previstos no regimento interno (vide § 3º, art. 58, retro).
	Agora, uma CPI municipal pode quebrar sigilo? Neste particular, os cinco que falaram do temaforam unânimes. Quebrar sigilo bancário, a CPI municipal não pode, porque ela pode ter outros poderes, mas não poderes de autoridades judiciárias. No que tange aos poderes próprios das autoridades judiciárias, não poderia. Exemplo: CPI pode determinar condução coercitiva, mas não CPI municipal. 
	CPI em Juiz de Fora – Não tinha o poder de obrigar as pessoas a depor. Se intimada a pessoa não fosse, ela solicitava à autoridade judicial competente. Nada impede que ela solicite ao juiz que o faça.
	
	Ministério Público pode requisitar diretamente informações bancárias sobre alguém a uma instituição bancária? Segundo o STF, não. O MP não pode requisitar diretamente informações bancárias. Esta é a regra. Existe uma decisão do Supremo que é uma exceção que confirma essa regra. Teve um caso em que o BB fez um empréstimo de dinheiro do erário público. O MP requereu informações e o Banco do Brasil recusou, dizendo que estava protegido pelo sigilo bancário. O MP recorreu ao Judiciário. Neste caso, o SFT entendeu o seguinte: Como o Banco do Brasil é sociedade de economia mista, e como o dinheiro envolvido era dinheiro público, o Banco não poderia negar as informações requeridas pelo MP. Se nesse caso não se pode negar, é porque nos outros casos, se poderia, exigindo a necessidade de se solicitar ao juiz. Ele não pode diretamente requisitar, salvo se houve dinheiro público envolvido. Há provas de MP que podem adotar entendimento contrário.
	Além do Ministério Público, Tribunal de Contas pode determinar quebra de sigilo? Segundo o STF, não. Nem o MP, nem o TC.
	Há duas leis que têm causado polêmica e têm sido objeto de várias ADI's no STF: A LC 104/01 e a 105/01. Essas leis, em um de seus dispositivos, permitem que autoridade fazendária, que é autoridade administrativa, possa ter acesso às informações bancárias. Para fins de comparação com a declaração de IR (se houve fraude, se não houve). O STF está analisando. Não há decisão de mérito, nem cautelar. As leis, então, por enquanto, são válidas. Se perguntarem se pode uma autoridade fazendária, de acordo com a lei, ter acesso a dados, a resposta é: pode. Numa prova subjetiva, é possível trazer os argumentos de que autoridade administrativa não deveria ter acesso porque seria uma intromissão indevida ao direito de privacidade. O Supremo sempre disse que autoridade administrativa não pode quebrar sigilo, mas não tinha nenhuma lei específica autorizando isso. Agora existe essa lei.
	Quando a lei permite que algumas autoridades fazendárias tenham acesso a contas bancárias, não é qualquer pessoa da Receita Federal que pode ter acesso, não é qualquer analista, nem qualquer técnico. A lei diz que a pessoa que tem acesso aos dados tem que ter motivo justificado e está obrigada a manter o sigilo desses dados, sob pena de responsabilidade. As pessoas que tem esse acesso, segundo a regulamentação da lei, não são quaisquer fiscais. Da última vez que li esse regulamento, apenas 30 pessoas, no Brasil todo tinham essa senha. Então, existe uma preocupação com o sigilo da informação e com a finalidade. Não é algo escancarado.
	Interceptação das Comunicações
	O art. 5º, XII diz o seguinte:
	XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;
	Vamos analisar apenas as três mais importantes que são:
Correspondência
Dados e
Interceptação Telefônica
	
	Interceptação das comunicações não se confunde com quebra de sigilo e nem com gravação clandestina. 
	“Interceptação das comunicações consiste na intromissão por parte de terceiros em uma comunicação.”
	Na gravação clandestina há duas pessoas: A e B e um deles grava a conversa sem que o outro interlocutor saiba. Na interceptação é diferente. Um terceiro, que não faz parte dessa comunicação se intromete. Ou interceptando a comunicação (correspondência) ou grampeando telefone. Essa interceptação pode ser sem o conhecimento dos interlocutores ou com o conhecimento de apenas um deles. 
	Neste caso, vocês podem perceber que o que está protegido não é apenas o conteúdo da comunicação, mas a liberdade da comunicação. Segundo o Supremo o que esse dispositivo está protegendo é a liberdade de comunicação. Por que é importante saber esse entendimento do Supremo? Eu leio uma matéria na Folha, recorto o jornal e mando para um amigo que mora em outro Estado. Antes de chegar, alguém intercepta. Nesse caso, há violação do art. 5º, XII? O conteúdo da correspondência é sigiloso? Ao jornal, qualquer um poderia ter tido acesso. Mas isso é violar o art. 5º, XII? Sim porque houve uma interferência na liberdade de comunicação. Então, o art. 5º, XII foi violado. A violação desse dispositivo não passa, necessariamente por violação de privacidade. Mesmo que o conteúdo não seja sigiloso, a comunicação estaria protegida pelo dispositivo.
	(Fim da 1ª parte da aula)
	Correspondência – Há situações em que o Supremo tem admitido que uma correspondência seja interceptada. Quais seriam essas situações, ou seja, que mesmo o sigilo de correspondência sendo inviolado poderia haver uma legítima interceptação ou intromissão nessa comunicação?
	1º Caso – Se a correspondência estiver sendo utilizada para práticas ilícitas. Se o presidiário, por exemplo, a usa como meio para praticar crimes, essa correspondência poderia ser violada. O STF diz que a inviolabilidade do conteúdo epistolar não pode servir de cunho protetivo para salvaguardar práticas ilícitas. Então, se a carta é usada para práticas ilícitas, poderia ser violada.
	2º Caso – Questões de segurança pública. O Supremo tem admitido, por exemplo, que uma administração penitenciária possa violar a correspondência do preso em determinadas situações. Isso não deve ser a regra. Violação de correspondência do presidiário não é permitida em regra, mas excepcionalmente admite-se a violação por questões de segurança pública.
	3º Caso – Hipótese de outros princípios constitucionais justificarem essa violação e aí teríamos que fazer a ponderação em cada caso específico com outros princípios. Uma correspondência na qual haja suspeita de conter material explosivo, ou substancia que coloque em risco a integridade das pessoas. É lógico que aquela correspondência pode ser interceptada de forma legítima.
	Além desses casos, há duas situações extraordinárias, que a própria Constituição prevê onde a restrição ao sigilo de correspondência deve se considerar legítima. No caso, o Estado de Defesa: art. 136, § 1º, I, “b”, da CF e também no caso de Estado de Sítio: art. 139, III. Durante o Estado de Defesa ou Estado de Sítio também poderá haver uma restrição legítima à inviolabilidade do sigilo de correspondência.
	Dados – Antes de 1988, não tinha previsão constitucional para a proteção ao sigilo de dados. E há divergência sobre que dados estariam protegidos. Há autores como Tércio Sampaio Ferraz Jr. e Manoel Gonçalves Ferreira Filho que sustentam que esses dados protegidos no art. 5º, XII, seriam apenas dados de informática. Não seriam quaisquer dados. Eu, sinceramente, não vejo razão para restringir. Um dos princípios que informam os direitos fundamentais é o princípio da máxima efetividade, então, eu acho que a proteção deva ser abrangida e não restringida. 
	O STF diz o seguinte: O que o art. 5º, XII protege não são os dados em si, mas apenas a sua comunicação.
	O Supremo diz que como o dispositivo protege a liberdade de comunicação, ele não está protegendo o dado em si. Se, por exemplo, uma empresa tem um computador com determinados dados que foram transmitidos, a apreensão do computador não seria uma interceptação porque, neste caso, é a liberdade de informação que está protegida, não os dados. Eu discordo porque quando a CF fala em sigilo dos dados ela quer proteger a liberdade de comunicação e os dados emsi. Mas ainda que não se entender dessa forma, vocês tem que raciocinar da seguinte maneira: O art. 15, XII, protege a comunicação dos dados, mas se esses dados tiverem um caráter íntimo ou se forem relacionados à vida privada, aí a proteção é do art. 5º, X.
	
Interceptação das Comunicações Telefônicas – É o chamado grampo telefônico. Ocorre quando a conversa é interceptada por um terceiro.
Quais são os requisitos que a Constituição exige para que uma interceptação telefônica seja considerada legítima? São três:
1º Requisito: Só pode haver interceptação telefônica se for por ordem judicial.
2º requisito: Só pode haver interceptação telefônica nas hipóteses previstas em lei. E a lei que regulamenta essa hipótese é a Lei 9296/96. Antes dessa lei, a interceptação não poderia ocorrer porque dependia de regulamentação. Só era permitida em casos excepcionalíssimos.
3º Requisito: Só pode haver interceptação para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
Ordem Judicial
O STF formulou uma cláusula chamada cláusula da reserva de jurisdição. Pelo nome, vocês já podem deduzir o que seja. Lembra da cláusula da reserva de plenário? A declaração da declaração de inconstitucionalidade no âmbito dos tribunais é reservada ao plenário. Por isso, chama reserva de plenário. Aqui, o raciocínio é o mesmo. Determinadas matérias são reservadas apenas ao poder Judiciário. Só ele pode tomar aquela medida. Nenhum outro órgão tem aquela legitimidade. Por isso diz-se reserva de jurisdição. E que medidas são essas reservadas ao Judiciário que a CF expressamente diz que cabe ao Judiciário tomar.
Conceito de cláusula da reserva de jurisdição: “Abrangem as medidas nas quais cabe ao Judiciário dar, não apenas a última palavra, mas também a primeira sobre o assunto”.
	Determinadas matérias somente podem ser tratadas pelo Judiciário. Matérias que a Constituição expressamente reservou ao Judiciário. Nenhum outro Poder, nem MP, nem autoridade judicial, autoridade administrativa Tribunal de Contas e nem mesmo CPI podem tratar desses temas. Quais são as medidas reservadas à reserva de jurisdição?
Interceptação telefônica – Art. 5º, XII (CPI não pode determinar interceptação telefônica).
Inviolabilidade de domicílio – art. 5º, XI (salvo flagrante delito ou durante o dia por determinação judicial).
Prisão, salvo flagrante delito – Art. 5º, LXI. (ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente). Quando a CF fala em autoridade judiciária competente, ela está reservando a prisão apenas ao Poder Judiciário. Não pode CPI determinar prisão de ninguém. Existe um regulamento da CPI que diz que a CPI pode determinar prisão em determinados casos por ordem escrita e fundamentada, mas o STF entende que isso não foi recepcionado pela CF/88.
Sigilo imposto legal ou constitucionalmente a processo judicial - Essa hipótese foi acrescentada recentemente. Aqueles processos judiciais que tramitam em segredo de justiça, esse segredo não pode ser quebrado. A CPI não pode quebrar segredo de Justiça. Quem pode fazer isso é apenas o Poder Judiciário. Só o Judiciário pode quebrar o sigilo do processo judicial. Essa medida faz parte, segundo o Supremo, da reserva de jurisdição. Uma CPI não teria essa legitimidade.
	Atualmente, essas são as quatro que o STF diz que fazem parte da reserva da jurisdição. Quer dizer que são só essas? Não. Da mesma forma que o Supremo acrescentou essa quarta hipótese no ano passado, ele pode acrescentar uma quinta, uma sexta. Não 
Hipóteses Previstas em Lei: 9296/96
	Não vamos analisar a lei aqui, ela é mais rigorosa do que a Constituição, prevendo hipóteses puníveis com reclusão, inclusive.
	Aqui é importante que vocês saibam o seguinte: a Constituição só autoriza a interceptação telefônica se for para esta finalidade, para fins de investigação criminal ou para fins de instrução processual penal. No entanto, apesar de admitir apenas para essas finalidades, o STF, desde 2007, vem advertindo que interceptação feita para esses dois casos, possa ser usada em caso de processo administrativo disciplinar. O STF tem admitido que numa interceptação feita para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, seja utilizada em parte para o processo administrativo disciplinar contra servidor público.
	Atenção para não confundir: O STF não admite para processo administrativo disciplinar. A interceptação é só feita para as duas hipóteses supra que podem ser usadas como prova emprestada em processo administrativo disciplinar.
	Bastante atenção: Na primeira decisão que o STF deu sobre o tema, que foi a que ficou mais conhecida em 2007, ele disse que essa gravação só poderia ser usada contra os mesmos servidores, que estavam sendo investigados criminalmente. A primeira decisão foi essa: Apenas contra os mesmos servidores. Numa decisão posterior, contudo, o Supremo admitiu que essa gravação fosse usada contra outros servidores.
	Resumindo, o Supremo admite a utilização contra os mesmos ou contra outros servidores. No início, só admitia contra os mesmos servidores. Não admitia contra outros, que não fizeram parte da investigação criminal. Por que o Supremo passou a admitir? Quais são os princípios que fundamentam essa possibilidade? Princípio da moralidade e da publicidade dos atos administrativos. Por isso, ele vem admitindo. Mas como fica a defesa se os servidores não fizeram parte da investigação no processo penal? Essa ampla defesa vai ser assegurada no processo administrativo. Isso caiu na prova da AGU no último concurso do Cespe e muita gente errou porque a primeira decisão do Supremo foi só para os mesmos servidores e só recentemente se pronunciou favoravelmente quanto aos demais.
	INVIOLABILIDADE DO DOMICÍLIO
	É assegurada pela Constituição porque está diretamente relacionada à privacidade das pessoas. É na casa onde as pessoas tem o seu momento de maior privacidade, de intimidade. Daí a gente colocar o estudo da inviolabilidade do domicílio dentro do direito à privacidade.
	Quem vai fazer prova para delegado: é comum cair alguma questão relacionada com essa matéria, inviolabilidade de domicílio, notadamente as provas para DPF.
	A CF protege o domicílio contra a entrada de alguém sem o consentimento do morador. É uma coisa óbvia, mas há quem não perceba que a proteção é apenas se não houver consentimento de nenhum dos moradores. Se um dos moradores consentir na entrada, não há violação de domicílio. A proteção é para os casos em que não há consentimento do morador. E, neste casos, são duas as situações:
Situação emergencial, na qual a casa poderá ser invadida por qualquer pessoa a qualquer hora. São os casos de desastre (ônibus perdeu o controle e invadiu a casa, por exemplo), para prestar socorro (alguém passa mal. Pode quebrar a porta, entrar e ajudar) e no caso de flagrante delito.
Quando o domicílio é invadido por autorização judicial. Havendo autorização judicial, não é emergência. Neste caso, só pode haver invasão durante o dia. Não pode ser feita durante a noite.
Art. 5º, XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;
	Conceito de Casa – O que devemos entender como sendo casa para fins de proteção constitucional? Deve ser interpretado de forma literal, extensiva ou restritiva? Vai ser interpretado de forma extensiva. Vai ter interpretação próxima do art. 150, do Código Penal. A casa não é só onde a pessoa mora. É entendida como abrangendo escritórios, consultórios, quartos de hotel habitados (com hóspede), estabelecimentos comerciais e industriais (entra no conceito de casa, na parte reservada, onde não é aberto ao público: escritório onde fica o gerente, por exemplo), o quartinho no prédio que está sendo construído onde dorme o vigia entra no conceito de casa, aboléia do caminhão onde dorme o motorista estacionado no posto de gasolina. Casa é o local particular, protegido pela privacidade. O motorista em trânsito pode ser abordado para uma vistoria. Diferente de o motorista que está na beira da estrada, dormindo. O oficial de justiça teria que esperar amanhecer para entrar no caminhão com a ordem judicial. Não poderia durante a noite, durante o período de descanso, cumprir o mandado. Barraca de camping é a casa do indivíduo naquele momento.
	Conceito de dia para fins de proteção constitucional – Existem três critério que são usados pela doutrina e pela jurisprudência:
Critério cronológico – O mais tradicional, usado pela maioria dos tribunais. Dia é o período compreendido entre 06h e 18h. É como entende, por exemplo José Afonso da Silva. Isso não coincide com o CPC, onde você pode cumprir os mandados até as 20h. Me parece que para nossa realidade, um país de dimensões continentais, o segundo critério seria mais adequado.
Critério físico-astronômico – Por esse critério, o dia vai da aurora (nascer do sol) e o crepúsculo (pôr-do-sol). Isso não é muito subjetivo? Não porque é possível determinar com precisão a hora do nascer e do pôr-do-sol em cada região do país. 
Critério misto – Proposto, por exemplo, por Alexandre de Moraes. Ele propõe a conjugação dos dois critérios anteriores. Vamos imaginar que seja 7h, mas ainda é escuro. Não dá para invadir. Há que esperar a aurora. São 17h e já escureceu, não poderia porque já é escuro. 20h e ainda está claro, não poderia porque já passa das 18h. Esse critério, segundo ele, confere maior proteção, mas o primeiro é o mais comum na jurisprudência.
	Questão de prova do Cespe: Polícia Federal cumpre mandado judicial numa ação de grande complexidade. Entrou no domicílio durante o dia e a ação se prolongou após o anoitecer. As provas obtidas nessa operação após o anoitecer são lícitas ou não? Na prática, quando é assim, a Polícia Federal se desloca para os locais e espera o nascer do sol para começar bem cedo. Vamos imaginar que numa dessas operações, não conseguiu recolher todas as provas durante o dia. Neste caso, as provas colhidas após o horário serão ilícitas? Neste caso, não. Não tem sentido chegar 18h e todo mundo parar o que está fazendo. Então, pode haver esse prolongamento durante a noite. 
Mas aqui estaremos trabalhando não com regras, e sim com princípios e com princípios nós temos que ponderar o caso concreto. Suponhamos o seguinte: A Polícia Federal, às 17h50minh resolve cumprir o mandado e fica lá até o amanhecer. As provas obtidas devem ser consideradas ilícitas? Será que o fim constitucional de proteção ao domicílio durante o período noturno foi atendido nesse caso? Me parece que nesse caso, não. Nessa hipótese, houve uma clara fraude ao objetivo constitucional que é a proteção ao domicílio durante a noite. Você tem que analisar sempre o caso concreto, ponderando com os princípios.
A polícia, quando foi prender o Elias Maluco, cercou a casa durante a noite e só invadiu quando já era de manhã. Atuou com cuidado para que depois não fosse arguida qualquer nulidade no procedimento. 
Um último aspecto: Eu disse que esse conceito deve ser interpretado ampliativamente. Pode um fiscal entrar no estabelecimento para fiscalizar sem o consentimento do proprietário? Ele pode requisitar a força policial e entrar com o uso da força? Se você perguntar a um fiscal, ele vai dizer que sim. De fato, existe uma lei que diz que o fiscal tem poder de polícia, autoexecutoriedade e, se chegar no estabelecimento e não for permitida a entrada, ele pode requisitar força policial e entrar. Só que o Supremo entende que após a CF/88, essa parte não foi recepcionada.
STF: “A autoexecutoriedade da administração tributária cedeu lugar à inviolabilidade do domicílio”.
É claro que estou me referindo a esses casos, de invasão de domicílio. Agora, em outros casos, não. Se for necessário, para fiscalizar, invadir um estabelecimento, tem que ter ordem judicial, se não houver autorização judicial e o proprietário não consentir de forma clara, as provas colhidas serão consideradas ilícitas. É claro que vai ter que provar isso. Na maioria dos casos julgados pelo Supremo ficou patente a permissão para entrar. Mas se ele provar que o fiscal entrou com o uso da força, as provas serão consideradas ilícitas.
Esse entendimento, o STF tem com relação à administração tributária. É diferente, por exemplo, na fiscalização da saúde, onde se apreende determinado alimento com prazo de validade vencido colocando em risco o saúde. Isso é diferente da administração tributária. Da mesma forma, construções com risco de desabar. Essas questões do Supremo são para a fiscalização tributária. Não é comum o proprietário se opor. Não vai querer comprar briga com o fiscal.
	Agora vamos falar de um outro valor, que também está previsto no caput do direito à vida, que é a igualdade. 
2.	PRINCÍPIO DA ISONOMIA ou PRINCÍPIO DA IGUALDADE (Art. 5º, caput)
	Há autores que diferenciam isonomia de igualdade, mas no direito constitucional esses dois termos são usados como sinônimos, têm o mesmo sentido.
	Este princípio está consagrado em vários dispositivos da Constituição e só no art. 5º ele é consagrado três vezes:
Todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza (caput)
Garantindo-se o direito à vida e à igualdade (caput)
Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações (inciso I)
	Quando a Constituição fala que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, isso significa que uma lei não possa diferenciar situações de pessoas? Uma das finalidades da lei é tratar de forma diferente, pessoas diferentes. Como você vai analisar se aquela lei ou aquele ato do poder público, ao estabelecer aquela diferença é inconstitucional ou não? Que critério você vai usar? 
“O que você deve analisar é se o elemento discriminador utilizado naquele ato está a serviço de um fim constitucionalmente protegido.”
	Ou seja, se aquela discriminação é uma discriminação que a constituição consagra, prevê, permite. E aí você vai analisar se esse elemento discriminador possui alguma justificativa racional para ser utilizado. Se não houver isso, não se justifica a discriminação. E mais: você deve analisar ainda se o critério usado para aquela discriminação é um critério razoável, proporcional, objetivo. Não são permitidos critérios subjetivos, preconceituosos, arbitrários, discriminatórios. Por que estou falando em razoável e proporcional como se fossem coisas distintas? 
	Quando eu fazia faculdade, havia um rapaz que não tinha as duas pernas e nem os dois braços. Imagine a dificuldade dele para ter acesso ás coisas. Será que se justifica num concurso público que pessoas com determinado tipo de deficiência tenham um número de vaga reservado para elas? Isso é razoável. Não é legítimo você colocar alguém com esse grau de dificuldade pra concorrer com os outros que não têm qualquer problema. Agora, vamos considerar que o concurso público estabeleça que 80% das vagas devam ser preenchidas por deficientes. Isso é proporcional? Não. Apesar de ser razoável separar as vagas, esse limite não seria proporcional. Por isso, é preciso analisar a razoabilidade daquela distinção e se a distinção foi feita de forma proporcional porque senão haverá inconstitucionalidade. 
	Uma das questões que mais são cobradas são nesse sentido. Se poderia um concurso público estabelecer distinção com base em altura, idade, sexo, cor, estado civil. O primeiro parâmetro que vocês devem ter para resolver isso é o art. 7º, XXX:
	Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;
	A regra é que não pode haver critério de admissão baseado nesses atributos. No entanto, admite-se quehaja esse requisito quando dois critérios sejam atendidos. Segundo o STF, para que o concurso possa estabelecer isso, exige:
1º requisito: Previsão legal anterior. O edital só pode estabelecer limite de altura, de idade, distinção quanto ao sexo, se houver lei anterior prevendo isso.
	
2º Requisito: Razoabilidade da exigência decorrente da natureza da atribuição a ser exercida. A lei só vai poder estabelecer esses limites se a natureza da atribuição a ser exercida se justificar. Concurso público para agente penitenciário para revista de mulheres (presas): neste caso é razoável fazer a distinção quanto ao sexo. Não teria sentido colocar homem para revistar uma mulher. Limite de idade: O STF tem admitido como legítimo em alguns concursos, desde que justificado. A súmula 683 se refere ao limite de idade, mas esse raciocínio serve para os outros casos.
STF Súmula nº 683 - DJ de 13/10/2003, p. 5. Limite de Idade - Inscrição em Concurso Público - Natureza das Atribuições do Cargo a Ser Preenchido - O limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face do art. 7º, XXX, da , quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido.
	Exemplo: atribuição que exija muito esforço físico (policial em atividade de rua). 
	E quanto à cor? Será que há alguma hipótese que o critério baseado na cor poderia ser constitucional? Tem um livro do Celso Antônio (O conteúdo jurídico do princípio da igualdade), que diz que não podemos analisar a cor da pessoa, há que se analisar o contexto. Imagine que uma determinada universidade resolva fazer um estudo no sentido cultural para descobrir por que as pessoas daquela raça têm um desempenho muito melhor em determinadas atividades esportivas do que outras pessoas. E resolve fazer concurso público restringindo os candidatos às pessoas daquela raça ou cor. O critério por si pode não ser inconstitucional. Se o motivo for arbitrário, não poderia.
	Questão de prova recente do Cespe: Exercício de função pública pode ser contado para fins de pontuação em concurso público? Por exemplo, aquele que teve cartório durante um tempo, terá mais pontos. Segundo o STF, não. Fere o princípio da isonomia contar exercício de função pública como pontuação. No caso dos cartórios, eles tentaram usar um artifício para beneficiar aquelas pessoas que eram donas de cartório. O Supremo considerou isso inconstitucional. A aprovação em concurso público pode ser contada para efeito de pontuação em títulos. Mas o exercício de função como pontuação é inconstitucional porque fere a isonomia.
	Distinção extremamente importante é aquela entre igualdade formal e a igualdade material
Igualdade FORMAL – É também chamada de igualdade civil, ou igualdade jurídica ou igualdade perante a lei. É aquela consagrada no caput do art. 5º (todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza).
	“Igualdade formal consiste no tratamento isonômico conferido a todos os seres que se encontrem em uma mesma categoria essencial.”
	Há determinadas pessoas que pertencem àquela categoria devem ser tratadas de forma igual. Por exemplo, trabalhadores que exercem atividades insalubres têm tratamento diferenciado. Igualdade é você tratar as pessoas igualmente desde que façam parte e uma categoria igual.
	O critério de justiça de Aristóteles, segundo o qual “justiça é tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual, na proporção de suas desigualdades”, justiça equitativa, trata de uma igualdade formal ou material? Há divergência na doutrina quanto a isso e caiu na prova do Cespe. Apesar de haver divergência na doutrina, na prova e para JAS, esse critério de justiça do Aristóteles estaria ligado a uma igualdade formal e não à igualdade material. O conceito de igualdade material não se encaixe nisso. Esse critério de Aristóteles justificava que amos e escravos fossem tratados de forma diferente porque eram pessoas diferentes. Nem sempre seria justo esse tratamento, mas poderia ocorrer. A legislação do IR prevê alíquotas diferenciadas. Essa diferença de alíquotas confere um tratamento desigual a pessoas desiguais. Neste caso, a lei está tratando pessoas diferentes de forma diferente. Essa não é uma igualdade material, é igualdade formal. 
Igualdade MATERIAL – É conhecida como igualdade real, ou fática ou perante os bens da vida. É igualdade perante, não a lei, mas perante os bens da vida.
	“A igualdade material exige atuações positivas do Estado a fim de promover a igualização de desiguais por meio da concessão de direitos sociais substanciais.”
	Observem a diferença: Na formal, se você ganha salário mínimo, está isento do IR, mas vai ficar na mesma posição, não vou te dar nada para que você saia dessa condição. Na igualdade material, não. Se você ganha só um salário mínimo, você não tem uma igualdade real com aquela pessoa que ganha muito mais. Então, eu vou tomar determinadas medidas como, por exemplo, o acesso gratuito à educação e à saúde, para que você possa ter igualdade de condições com a pessoa que tem isso tudo.
	Nossa Constituição consagra a igualdade material? Ou só a formal? A igualdade material não está consagrada em um dispositivo especifico. Ela é consagrada na conjugação de vários princípios: Art. 5º, c/c, art. 3º, III e c/c direitos sociais. Direitos sociais econômicos e culturais são direitos de primeira, de segunda ou de terceira geração? De segunda geração, ligados à qual valor? Igualdade. E são ligados à igualdade material. Não são ligados à igualdade formal porque eles visam exatamente à redução dessas desigualdades. Se todos tivessem uma condição ideal, o Estado não precisaria se preocupar com os direitos sociais, poderia ser um Estado mínimo. Quando você tem uma situação de desigualdade, o Estado intervir.
	O art. 3º, III fala que um dos objetivos da República é a redução das desigualdades:
Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
	Dentro do estudo da igualdade material entra o estudo das ações afirmativas, também chamadas de discriminações positivas. Vamos analisá-las na próxima aula. Quando se fala isso no Brasil, todos associam a sistema de cotas. A noção de ações afirmativas é mais ampla. O sistema de cotas é apenas uma de suas vertentes, aliás, a mais criticada de todas elas. Há várias outras ações que são afirmativas, como cursinho pré-vestibular para alunos carentes. Ensino profissionalizante. 
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