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ApostilaUsinagem-Aula16-p123-130

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AULA 16 
ACABAMENTO DA SUPERFÍCIE USINADA 
 
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Prof. Dr. André João de Souza 
16. VARIÁVEIS DEPENDENTES DE SAÍDA: 
ACABAMENTO DA SUPERFÍCIE USINADA 
16.1. Introdução 
Acabamento é um termo coloquial largamente usado para designar a qualidade geral de uma 
superfície usinada. A Figura 16.1 esquematiza a classificação de acabamento. 
 
Figura 16.1 – Classificação de acabamento. 
A textura está relacionada com as irregularidades presentes na superfície de materiais sólidos e 
com as características dos instrumentos de medição; é definida em termos de rugosidade, ondulação, 
marcas e falhas. 
A integridade é a característica através da qual podem ser relacionadas ou identificadas as diversas 
exigências ou alterações metalúrgicas que poderão se desenvolver devido à usinagem como: 
transformações de fases, distribuição e tamanho de grão, recristalização, inclusões no material etc.. 
O objetivo da usinagem é obter uma superfície técnica que apresente fatores superficiais e 
subsuperficiais apropriados, a fim de garantir segurança, confiabilidade e longa vida ao componente 
fabricado – principalmente quando vidas humanas estão em jogo. Por esse motivo, a importância do 
estudo do acabamento aumenta à medida que crescem as exigências do projeto. Por exemplo, as 
superfícies dos componentes deslizantes, como eixos de um mancal, devem ser lisas para que o atrito seja 
o menor possível. Já as exigências de acabamento das superfícies externas da tampa e da base do mancal 
são menores. A produção de superfícies lisas exige, em geral, custo de fabricação mais elevado. 
16.2. Textura da Superfície Usinada 
O acabamento não está especificamente ligado à textura ou padrão característico da superfície 
técnica, nem a valores específicos de rugosidade. Contudo, um “bom” acabamento implica baixos valores 
de rugosidade, e vice-versa. Assim, a aptidão de um processo de usinagem em produzir um acabamento 
específico depende das características da ferramenta, da peça, da máquina e da operação. 
 
— Mecânicos 
Fatores 
Subsuperficiais 
(integridade) 
— Metalúrgicos 
• Deformação plástica 
• Rebarbas 
• Microdureza 
• Trincas 
• Tensões residuais 
• Recristalização 
• Transformações metalúrgicas 
Fatores 
Superficiais 
(textura) 
— Rugosidade 
— Ondulações 
— Marcas 
— Falhas 
Acabamento 
da Superfície 
Usinada 
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Os diferentes processos de fabricação mecânica determinam acabamentos diversos nas superfícies. 
As superfícies por mais perfeitas que sejam, apresentam irregularidades. E essas irregularidades 
compreendem dois grupos de erros: erros macrogeométricos e erros microgeométricos (Fig. 16.2). 
 
Figura 16.2 – Irregularidades presentes na superfície usinada. 
Os erros macrogeométricos em usinagem são desvios geométricos (ondulação, ovalização, 
retilineidade, planicidade, circularidade etc.) que afetam as dimensões nominais das peças e podem ser 
ocasionados por diversos fatores (6M), principalmente: 
 material da peça: usinabilidade, conformação ou dureza; 
 máquina-ferramenta: ferramenta de corte, defeitos nas guias, erros de posicionamento; 
 método: processo de fabricação para obtenção da peça, parâmetros de corte. 
 medição: incerteza de medição, adequação do instrumento ao mensurando; 
 mão de obra: erros de interpretação, falta de treinamento; 
 meio ambiente: variação de temperatura, limpeza do local de trabalho. 
Estes erros são verificados por meio de instrumentos convencionais de medição tais como 
micrômetros, relógios comparadores, projetores de perfis etc. 
Os erros microgeométricos são conhecidos como rugosidade. Rugosidade é o conjunto de 
irregularidades, ou seja, pequenas saliências e reentrâncias que caracterizam uma superfície. Essas 
irregularidades podem ser avaliadas com aparelhos eletrônicos, a exemplo do rugosímetro (Fig. 16.3). 
 
Figura 16.3 – Rugosímetro portátil Mitutoyo modelo SJ-201. 
A rugosidade desempenha um papel importante no comportamento dos componentes mecânicos. 
Ela influi na: qualidade de deslizamento; resistência ao desgaste; transferência de calor; qualidade de 
superfícies ópticas; possibilidade de ajuste do acoplamento forçado; resistência oferecida pela superfície 
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ao escoamento de fluidos e lubrificantes; qualidade de aderência que a estrutura oferece às camadas 
protetoras; resistência à corrosão e à fadiga; vedação; aparência. 
Para dar acabamento adequado à superfície da peça necessita-se, portanto, determinar o nível em 
que ela deve ser usinada, isto é, deve-se adotar um parâmetro que permita avaliar a rugosidade. O 
parâmetro de medição aplicável à maioria dos processos de fabricação baseia-se nas medidas de 
profundidade da rugosidade: Ra (roughness average). 
Define-se Ra como o desvio médio aritmético dos valores absolutos das ordenadas de afastamento 
(yi), dos pontos do perfil de rugosidade em relação à linha média, dentro do percurso de medição (m). 
Essa grandeza pode corresponder à altura de um retângulo, cuja área é igual à soma absoluta das áreas 
delimitadas pelo perfil de rugosidade e pela linha média, tendo por comprimento o valor m, Figura 16.4. 
 
Figura 16.4 – Definição da rugosidade média Ra 
Ra é o parâmetro de medição mais utilizado em todo o mundo, sobretudo em superfícies onde: 
 o controle contínuo da rugosidade nas linhas de produção faz-se necessário; 
 o acabamento apresenta sulcos de usinagem bem orientados; 
 exige-se pouca responsabilidade, como no caso de acabamentos com fins apenas estéticos. 
A norma NBR 8404/1984 de indicação do Estado de Superfícies em Desenhos Técnicos esclarece 
que a característica principal (o valor) da rugosidade Ra pode ser indicada pelos números da classe de 
rugosidade correspondente. A Figura 16.5 mostra a classificação dos acabamentos superficiais – 
geralmente encontrados na indústria metal mecânica – em 12 grupos, e os organiza de acordo com o grau 
de rugosidade e o processo de usinagem que pode ser usado em sua obtenção. Permite, também, 
visualizar uma relação aproximada entre as classes e os valores de Ra [m]. 
16.3. Integridade da Superfície Usinada 
Tradicionalmente, a textura da superfície tem sido aceita como critério que controla a qualidade de 
uma superfície usinada. Assume-se, amplamente, haver relacionamentos diretos entre rugosidade e 
Tribologia, capacidade de carga, transferência de calor etc. Amplos dados foram acumulados para indicar 
que a textura é apenas uma parte da consideração. Alterações de natureza mecânica ou metalúrgica abaixo 
da camada mais externa da superfície exercem também importante influência sobre o desempenho do 
material. Isto se torna particularmente importante, onde a peça usinada é solicitada a altas tensões (em 
particular, tensões alternadas) ou ambientes severos (em altas temperaturas ou ambientes corrosivos), 
visto que a resistência à fluência e outras propriedades mecânicas podem ser afetadas. 
Embora a maioria das alterações ocorra nos primeiros 38 m sob a superfície, tal distância pode 
compreender uma parte significativa de um componente de precisão que está sendo projetado. Além 
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disso, salienta-se que muitas falhas em componentes mecânicos originam-se nos primeiros milésimos de 
milímetros abaixo da superfície efetiva (obtida por instrumentos de medição). Estas situações enfatizam a 
necessidade de que os engenheiros encarregados do projeto, da fabricação e da garantia de qualidade 
devam compreender ambos os aspectos da tecnologia de superfície (textura e integridade), a fim de 
produzir componentes seguros, confiáveis e de longa vida. 
 
Figura 16.5 – Classificaçãodo acabamento das superfícies usinadas de acordo com o processo de fabricação. 
Como durante a usinagem as energias (do processo) misturam-se com as propriedades do material 
da peça, podem consequentemente surgir efeitos superficiais tais como rugosidade, trincas e tensões 
residuais. A combinação destes efeitos pode gerar desgaste ou fadiga na peça. Além disso, todo processo 
possui alguma variabilidade inerente que se modifica com quase todas as variáveis de entrada. Assim, é 
necessário selecionar apropriadamente os níveis das variáveis de entrada para se obter um componente 
com as tolerâncias (especificadas pelo projeto) e propriedades (técnicas superficiais) satisfatórias. 
As superfícies usinadas são bem mais complexas do que parecem ser, já que seu desempenho pode 
ser influenciado por uma camada externa (transformações químicas e deformações plásticas) e por 
camadas internas (transformações metalúrgicas e tensões residuais). 
A Figura 16.6 mostra um desenho esquemático das camadas internas abaixo da superfície. A 
camada limite externa (1 e 2) é considerada como aquela onde ocorrem as reações químicas (adsorção, 
oxidação etc.) na superfície recém-usinada. Logo abaixo, camada limite interna (3 a 5), encontra-se uma 
camada que sofre transformações metalúrgicas e deformações plásticas devido à ação de corte da 
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ferramenta e variação de temperaturas envolvidas durante a usinagem. A intensidade da deformação 
plástica e transformação metalúrgica diminuem gradativamente à medida que se distancia da superfície 
usinada até que não seja mais percebida. 
 
Figura 16.6 – Camadas superficiais de corpos sólidos. 
16.4. Influência dos Parâmetros de Entrada no Acabamento Usinado 
16.4.1. Material da peça 
A fim de se garantir um bom acabamento superficial, o controle do estado microestrutural do 
material é tão importante quanto o controle dos parâmetros de usinagem. Seções metalográficas de alta 
magnitude, tomadas paralelamente e perpendicularmente às marcas de avanço, podem ser usadas no 
controle efetivo de alterações microestruturais que podem causar falhas. 
16.4.2. Geometria da ferramenta 
Basicamente a rugosidade é decorrente da forma geométrica da quina da ferramenta e do 
movimento relativo entre a peça e a ferramenta de corte. 
No processo de torneamento, se o avanço f [mm/volta] é menor que o raio de quina r [mm] da 
ferramenta, o valor de Ra [m] é calculado aproximadamente pela Equação 16.1: 
 2 2
a
1000 f f
R 32,075
r18 3 r 

 

 (16.1) 
Para uma operação de fresamento tangencial, o valor de Ra [m] é calculado teoricamente em 
função do avanço por dente fz [mm] e pelo diâmetro da fresa D [mm], conforme Equação 16.2: 
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 2 2
z z
a
1000 f f
R 64,15
D9 3 D

  

 (16.2) 
Para uma operação de fresamento frontal, o valor de Ra [m] é determinado pela Equação 16.3: 
 
 2 2a zR 500 r r 0,25 f     
 (16.3) 
Pode-se constatar pelas Equações 16.1 a 16.3 que Ra diminui com o aumento de r. 
Para operações de fresamento, as ferramentas com r  90
o
 geram superfícies com acabamento 
superior àqueles obtidos com ferramentas com r  90
o
. Estudos mostraram que as melhores condições de 
rugosidade são obtidas com r  95
o
. Um acabamento superficial insatisfatório foi obtido com r  75
o
. 
Isto se deve ao aumento da força passiva, que faz com que o sistema ferramenta-peça fique menos rígido 
e mais suscetível a trepidações. 
Além de r e r, outro parâmetro geométrico da ferramenta de corte exerce influência marcante no 
acabamento superficial: o ângulo de posição secundário (’r). 
A ocorrência de trepidações pode ser controlada pela adoção apropriada do ângulo de posição 
secundário na geometria da ferramenta. Sendo assim, o valor de ’r pode afetar diretamente o acabamento 
superficial e a exatidão dimensional da peça e a vida da ferramenta de corte. Além disso, ’r protege a 
aresta secundária de corte contra arranhões e cortes, reduzindo o atrito entre a superfície secundária de 
folga e a superfície usinada da peça. 
Outro fator importante a ser observado, é que o decréscimo em ’r contribui para aumentar a 
resistência da ponta da ferramenta de corte devido ao consequente aumento do ângulo de quina (r). 
Todavia, devido à condição dinâmica do processo de usinagem, ’r  3
o
. Mas quando ’r é incrementado 
a rugosidade máxima (Rmax) aumenta, o que significa que a qualidade da superfície tende a piorar. Porém, 
uma redução neste ângulo aumenta a força passiva porque a aresta de corte secundária torna-se mais ativa 
e pode causar trepidações. Assim, os melhores resultados encontrados para o acabamento foram obtidos 
com 5
o
  ’r  15
o
. 
As Figuras 16.7a e 16.7b mostram um esquema da geometria da superfície usinada por ferramentas 
com ’r grande e pequeno, respectivamente, procurando ressaltar as marcas de avanço e as partículas 
aderidas à superfície. Estes esquemas sugerem que para ’r grande (maior que 15
o
), partículas aderidas à 
superfície da peça “camuflam” a profundidade real dos vales, fazendo com que a leitura do rugosímetro 
indique valores de Ra menores que o teórico. Já para ’r pequeno, estas partículas agem de forma oposta e 
a leitura do rugosímetro indica valores de Ra maiores que o teórico. 
16.4.3. Processo de usinagem 
Os diferentes processos de fabricação de componentes mecânicos determinam acabamentos 
diversos nas suas superfícies. Pela Figura 16.5 pôde-se perceber que há uma relação entre a rugosidade e 
o processo de usinagem empregado na peça. A melhor ou pior qualidade decorre das condições da 
ferramenta, do estado da máquina, dos parâmetros de usinagem, da qualidade de trabalho, etc. 
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(a) (b) 
Figura 16.7 – Esquema da geometria da superfície usinada por ferramentas com ’r: (a) grande; (b) pequeno. 
16.4.4. Parâmetros de corte 
Os parâmetros de corte exercem uma influência decisiva na integridade superficial da peça usinada. 
Condições severas podem causar danos à superfície usinada, assim como às camadas diretamente abaixo 
desta, o que pode conduzir à quebra da peça em serviço. Portanto, quando se seleciona os parâmetros de 
um processo de usinagem, a vida do componente deve ser levada em consideração. 
Os parâmetros de corte mais influentes no acabamento superficial são: o avanço (f), a profundidade 
de corte (ap) e a velocidade de corte (vc). Um aumento do avanço tende a aumentar a rugosidade da 
superfície, pois a altura dos picos e a profundidade dos vales das marcas de avanço são proporcionais ao 
quadrado desse avanço. A profundidade de corte praticamente não tem influência sobre a qualidade 
superficial, quando a profundidade for superior a um valor mínimo. Entretanto, um acréscimo de ap 
promove um aumento das forças, podendo incrementar as vibrações e, por consequência, gerar superfícies 
mais rugosas. Em baixas velocidades de corte o mau acabamento superficial pode ser explicado pela 
presença da aresta postiça de corte (APC), uma vez que pequenas partículas desta são perdidas durante o 
processo de corte e ficam aderidas na superfície da peça, deteriorando imensamente o acabamento. 
Portanto, o acabamento melhora quando vc aumenta, uma vez que a APC desaparece. 
16.4.5. Meio lubrirrefrigerante 
O melhoramento conhecido do acabamento superficial pelo meio lubrirrefrigerante, quando se 
usina em baixas velocidades de corte, é frequentemente atribuído ao efeito da lubrificação da superfície 
de saída da ferramenta que previne a formação ou reduz as dimensões da APC. Entretanto, estudos 
mostraram que o lubrirrefrigerante não tem um efeito sobre o tamanho e a formada APC, pois o fluido 
não penetra na interface cavaco/ferramenta e, portanto, não evita a formação da APC. Assim, a melhoria 
no acabamento ocorre devido à ação lubrificante após a superfície usinada ter sido formada, prevenindo a 
aderência de partículas de APC comprimidas contra a peça durante a operação de usinagem. 
A permanência do cavaco na região de corte pode comprometer o acabamento da superfície 
usinada ou ainda promover avarias nas ferramentas de corte. Assim, sempre que possível, o cavaco deve 
ser retirado desta região com a utilização de fluido lubrirrefrigerante em alta pressão. A sua capacidade de 
expulsar os cavacos depende da viscosidade e da vazão do fluido, além, é claro, do tipo de operação de 
usinagem e do tipo de cavaco que está sendo formado. 
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16.4.6. Tipos e formas do cavaco 
Além da forma geométrica da quina da ferramenta e do movimento relativo entre a peça e a 
ferramenta de corte, o acabamento superficial na operação de usinagem depende também do tipo de 
cavaco formado. Sabe-se que a formação do cavaco depende das condições de corte e do material da 
peça. A formação de cavacos descontínuos ou de cavacos contínuos com a presença de APC pode causar 
trincas, as quais se estendem na superfície da peça usinada e cria flutuações nas forças. Estas forças 
desviam a ferramenta e iniciam vibrações que afetam o acabamento superficial. Entretanto, a ocorrência 
de cavacos contínuos sem a presença de APC é a condição de corte mais desejável para se obter um 
melhor acabamento superficial. 
16.4.7. Estado da ferramenta 
O desgaste de flanco causa deterioração do acabamento superficial da peça porque altera 
totalmente a forma geométrica da aresta de corte original, muda as dimensões da peça, podendo a mesma 
sair de sua faixa de tolerância. 
O desgaste de cratera modifica a geometria da superfície de saída da ferramenta, alterando o valor 
do ângulo de saída e modificando a curvatura do cavaco, facilitando o seu escoamento. Por isso, a 
rugosidade da peça diminui, visto que o cavaco não colide com a superfície usinada da peça. Entretanto, 
um aumento da cratera fragiliza a quina, podendo causar a quebra da ferramenta. 
A deformação plástica provoca deficiência no controle dos cavacos e deterioração do acabamento 
superficial da peça. Seu crescimento pode gerar lascamentos na aresta de corte. Se os lascamentos 
continuarem crescendo, provocam a quebra da ferramenta. 
A aresta postiça de corte (APC) aderente à aresta de corte se deforma e se encrua, aumentando sua 
resistência mecânica e fazendo às vezes de aresta de corte. Ela cresce gradualmente até romper-se 
bruscamente. Parte da APC que rompe é carregada com o cavaco e parte adere à peça, prejudicando 
sensivelmente seu acabamento superficial.

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