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O expansionismo da República Romana e sua rede de conseqüências

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O expansionismo da República Romana e sua rede de consequências
Ao longo do período republicano (509-27 a.C), Roma deixara de ser apenas uma pequena cidade de pastores e agricultores como muitas outras para se tornar a maior potência expansionista no cenário do mundo mediterrânico. Após conquistar a península itálica, vencer os cartagineses nas Guerras Púnicas e derrotar os antigos reinos macedônicos do Oriente helenístico, Roma tornava-se o centro de um gigantesco império multinacional. As célebres vitórias da máquina de guerra legionária acarretaram uma série de conseqüências que transformariam profundamente a sociedade romana. Algumas delas contribuiriam para tornar Roma uma cidade extremamente rica e poderosa; outras, menos previsíveis, lançariam os romanos no abismo do conflito social que encaminhou a crise da República.
As conseqüências mais diretas do expansionismo romano são bastante previsíveis, afinal, eram frutos do espólio de guerra tomado dos adversários vencidos ou das exigências feitas aos Estados que se tornavam aliados e submissos ao poder de Roma. Em primeiro lugar, havia as pesadas indenizações impostas àqueles que resistiam. Tais indenizações eram pagas em dinheiro, mas também em terras e homens. Um grande influxo de riquezas e terras anexadas e um vasto contingente de escravos formavam o espólio de guerra republicano. Em seguida, os povos submetidos eram obrigados a pagar tributos e, seguidamente, fornecer homens para o exército romano. Entretanto, o expansionismo ocasionaria algumas conseqüências imprevistas e menos lisonjeiras: a emergência de uma nova classe social que intensificou os conflitos políticos em Roma, classe dos “Homens Bons”, ou Cavaleiros; uma crise dos pequenos proprietários rurais diante do crescimento dos latifúndios; o surgimento de um proletariado urbano empobrecido e descontente.
A verdade é que as conquistas romanas não enriqueceram somente os cofres do Estado republicano e da nobreza senatorial, mas também beneficiaram o grupo social emergente dos Cavaleiros. A Roma republicana não procurou ou não teve sucesso em articular um aparato burocrático capaz de administrar os novos territórios que eram constantemente anexados. Tal recusa beneficiou uma série de negociantes e traficantes que adquiriam contratos para explorar as novas áreas e prestar serviços em nome da República. Essas figuras, também conhecidas como negotiatores e publicanos, enriqueciam explorando essa confusão entre o público e o privado em benefício próprio e fazendo rentáveis negócios nas novas províncias. Eram oriundos em grande parte da classe dos Cavaleiros e lidavam com atividades mercantis proibidas à nobreza senatorial, tornando-se os grandes banqueiros do final da República. Ou seja, as conquistas contribuíram para enriquecer uma ampla rede de particulares formada por negociantes, traficantes de escravos, comerciantes e prestadores de serviços, figuras que não compartilhavam o estatuto de nobreza da ordem senatorial, mas que formavam um grupo social poderoso e enriquecido.[2: O grupo dos Cavaleiros também era composto por oficiais do exército, igualmente enriquecidos no cotidiano das conquistas romanas.]
Já a situação dos pequenos proprietários rurais tornara-se crítica com o expansionismo, pois eram frequentemente convocados para campanhas militares em territórios distantes, vendo-se obrigados a abandonar suas propriedades por longos anos. Eles formavam a infantaria: o grosso do exército romano e sua base mais sólida. Muitas vezes, suas terras eram apropriadas ilegalmente por grandes proprietários ou levadas à falência pela falta de cuidados. Sofreram ainda os efeitos da Segunda Guerra Púnica, com o exército de Aníbal arrasando as propriedades rurais do sul da Itália. Paralelamente, em decorrência das conquistas, a República passou a importar trigo das províncias, rebaixando cada vez mais o seu preço e tornando impossível aos camponeses italianos competirem no mesmo nível. Alguns conseguiram diversificar a produção, investindo na criação bovina, na indústria do vinho ou do azeite, contudo, a grande maioria não detinha os capitais necessários para operar essa conversão; muitos foram obrigados a migrar para a cidade ou a oferecer seus serviços a um grande proprietário latifundiário. A pequena propriedade recuava diante do grande latifúndio escravista e a cidade passava a receber uma massa cada vez maior de descontentes. 
No período final da República, um imenso proletariado urbano se avolumava em Roma. As listas de distribuição gratuita de trigo batiam o impressionante número de 320.000 pessoas inscritas. Imigrantes empobrecidos do campo e das províncias se somavam a escravos libertos formando uma massa heterogênea e, por vezes, perigosa. Embora essa massa comportasse trabalhadores corajosos e obstinados que enriqueceram fundindo-se com a classe rica, ela abrigava também um perigoso conjunto de indivíduos ociosos e desafortunados, sujeitos a condições de extrema miséria e endividamento. No cotidiano corrupto e violento do final da República, este proletariado tornava-se um elemento explosivo, sendo arrebanhado pelos poderosos em seus séquitos de capangas e mergulhando a “cidade eterna” numa atmosfera de medo e insegurança. Armava-se o cenário para as guerras civis do final da República - e fora o próprio movimento expansionista que o engendrara.
As conquistas romanas geraram uma realidade complexa e repleta de contradições. A República agora regia os destinos de um território imenso, mas mantinha-se aferrada às suas características aristocráticas. Diante deste quadro, a classe enriquecida dos Cavaleiros exigia maior participação política; as elites estrangeiras dos territórios aliados e conquistados almejavam compartilhar da cidadania romana e seus benefícios; os camponeses e os legionários queriam terras e condições menos vis de remuneração e de vida; a plebe urbana reivindicava pão e diversões; um número alarmante de escravos se avolumava nas grandes propriedades dos ricos cidadãos italianos. As contradições engendradas pelo expansionismo e as necessidades de tomar providências ante o quadro acima esboçado dividiram os romanos em duas facções políticas opostas: os “optimates” e os “populares”. Os primeiros representavam os interesses da diminuta aristocracia e se opunham ferozmente às tentativas dos segundos em realizar movimentos reformistas. A tentativa de reforma agrária e a distribuição de trigo a preços mais baratos propostas pelos irmãos Graco foram exemplos desta disputa. A reforma do exército realizada pelo cônsul Mário também, pois abria as fileiras do exercito romano para os mais pobres e garantia-lhes um soldo e a expectativa de participar no espólio de guerra.
As disputas entre o grupo dos populares e dos optimates ultrapassaram rapidamente as paredes do Senado romano, espalhando um clima de violência generalizado entre os cidadãos. Ao mesmo tempo, os escravos agitavam-se no interior italiano promovendo uma série de revoltas que ficaram conhecidas como “Guerras Servis”. A plebe urbana, empobrecida, servia aos mais escusos desígnios, envolvendo-se em grupos armados que serviam a figurões corruptos. Ao longo do século I a.C a situação tornou-se incontrolável e a aristocracia romana, impotente diante do conflito, se socorreu na figura forte dos generais. Neste momento, nomes como Cornélio Sula, Pompeu, Júlio Cesar, Marco Antônio, Otávio começam a se sobressair e uma série de guerras civis trata de transformar os restos mortais de uma República moribunda em cinzas. É a crise final da República romana. É o início do período imperial.

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