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“As tuas forças naturais, que estão dentro de ti, serão as que curarão as suas enfermidades.” Palavras de Sabedoria Hipócrates (460 a.C. - 370 a.C.) Conhecer a história para não repetir os erros Por que você precisa aprender A imunologia é uma ciência relativamente nova. Sua origem costuma ser atribuída a Edward Jenner, que observou, no fim do século XVIII, que a doença da varíola bovina, ou vaccínia, relativamente branda, parecia conferir proteção contra a doença da varíola humana, em geral fatal. Em 1796, ele demonstrou que a inoculação com varíola bovina poderia proteger contra a varíola humana. Jenner deu a esse procedimento o nome de vacinação, termo que ainda hoje é usado para descrever a inoculação de amostras enfraquecidas ou atenuadas de agentes patológicos em indivíduos sadios, a fim de obter proteção contra doenças. Embora o audacioso experimento de Jenner tenha tido sucesso, passaram- se quase dois séculos até que a vacinação contra a varíola se tornasse universal. Esse progresso permitiu que a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciasse a erradicação da varíola em 1979, possivelmente o maior triunfo da medicina moderna. G U I A D E P R I M E I R O S S O C O R R O S | 2 0 2 0 A história da imunologia 1796 1885/ 1889 1890 1882 Jenner Robert Koch Pasteur von Behring e KitasatoVacina da varíola Soros antitóxicos para difteria e tétano (anticorpos) Doenças são causadas por microorganismos Vacina da cólera e antirrábica 1882 Metchnikoff Descoberta da fagocitose - Imunidade inata I m u n o l o g i a c l í n i c a A R A 0 8 5 8 IMUNOLOGIA CLÍNICA – ARA0858 CONSTITUIÇÃO CELULAR E MOLECULAR DO SISTEMA IMUNOLÓGICO. IMUNIDADE PROTETORA. IMUNOHEMATOLOGIA. MÉTODOS LABORATORIAIS. DIAGNÓSTICO SOROLÓGICO E CONTROLE DE QUALIDADE. IMUNOPATOLOGIA E DISTÚRBIOS DA IMUNIDADE. • Articular os eventos celulares e moleculares das respostas imunológicas envolvidos com as principais doenças causadas por disfunções imunológicas sistêmicas. • Identificar os mecanismos efetores envolvidos com a eliminação de agentes infecciosos e destacar as medidas imunoprofiláticas e imunoterápicas no tratamento de doenças. • Compreender os fundamentos da imunohematologia, com base nos testes imunológicos realizados, para entender suas implicações no diagnóstico prétranfusional. • Empregar as principais técnicas de diagnóstico imunológico, entendo os diferentes métodos tanto no contexto das doenças infecciosas e inflamatórias humanas, a fim de que o profissional tenha domínio de suas atividades exercidas no laboratório clínico, sendo capaz de realizála com segurança e qualidade. • Validar boas práticas de laboratório (BPL) no contexto do diagnóstico imunológico dos ensaios de medicina laboratorial, para um diagnóstico seguro e confiável ao paciente. • Distinguir os aspectos da ontogenia de componentes celulares do sistema imunológico, sobretudo em relação aos eventos moleculares que permitem a diversidade clonal de receptores para as respostas imunes adaptativas. O que tem de diferente? Microbiologia e Imunologia x Imunologia clínica IMUNOLOGIA CLÍNICA – ARA0858 CONSTITUIÇÃO CELULAR E MOLECULAR DO SISTEMA IMUNOLÓGICO Introdução à imunologia - propriedades gerais do SI NA AULA DE HOJE Os objetivos mais importantes 1: Compreender como os componentes envolvidos na resposta imune são formados 2: Identificar as funções e morfologia desse sistema para entender o funcionamento da resposta imune I m u n o l o g i a c l í n i c a A R A 0 8 5 E st ru tu ra d o si st em a im u n e O sistema imunológico é composto por órgãos, tecidos e células característicos organizados de modo que as respostas imunológicas se efetuem eficientemente. Os órgãos linfoides geradores, também chamados órgãos linfoides primários ou centrais, incluindo a medula óssea e o timo, são os sítios onde os linfócitos expressam pela primeira vez os receptores antigênicos e alcançam a maturidade fenotípica e funcional. Os órgãos linfoides secundários (ou periféricos), incluindo os linfonodos, baço e componentes do sistema imune de mucosa, são os locais onde as respostas dos linfócitos a antígenos estranhos são iniciadas e desenvolvidas . I m u n o l o g i a c l í n i c a A R A 0 8 5 • Recentemente, um paciente buscou atendimento no posto de saúde, relatando estar com febre, dor no corpo, perda de apetite e sonolência durante três dias. Foi solicitado a realização de um hemograma, e este exame identificou aumento no número de neutrófilos, entretanto, não foi verificado alterações em outras células, como linfócitos e eosinófilos. Atualmente, o paciente se encontra recuperado e seus exames não mostram mais nenhuma alteração. Considerando que o aumento de determinados leucócitos pode sugerir o tipo de microrganismo causador da infecção, o aumento de neutrófilos verificado no hemograma indica que a infecção foi causada por qual microrganismo? Timo O timo é o local de maturação da célula T. Trata- se de um órgão bilobado situado no mediastino anterior, que involui após a puberdade de modo a se tornar indetectável nos adultos. Elabora várias substâncias: timosina alfa, timopoetina, timulina e o fator tímicos circulante. A timosina mantém e promove a maturação de linfócitos e órgãos linfóides como o baço e linfonodos. A timulina, que exerce função na placa motora sendo considerada grande responsável pela miastenia grave. O baço é um órgão altamente vascularizado, cujas principais funções são remover da circulação as células sanguíneas envelhecidas e danificadas, bem como as partículas (como imunocomplexos e microrganismos opsonizados), e iniciar respostas imunes adaptativas a antígenos transportados pelo sangue (não participa da circulação linfática). S is te m a li n fá ti co O sistema linfático é uma grande rede de capilares, que coletam a linfa nos variados órgãos e tecidos do organismo e a encaminham dos capilares linfáticos para a circulação sanguínea Os linfonodos são órgãos linfoides secundários, vascularizados e encapsulados, que exibem características anatômicas favoráveis à iniciação de respostas imunes adaptativas a antígenos transportados dos tecidos pelos linfáticos, uma vez que ficam ao longo dos canais linfáticos no corpo inteiro. Os linfócitos B e T são sequestrados em regiões distintas do córtex dos linfonodos atraídas por quimiocinas específicas. A segregação anatômica das células B e T garante que cada população de linfócitos esteja em estreito contato com as APCs apropriadas I m u n o l o g i a c l í n i c a A R A 0 8 5 Na medula óssea são encontradas as células-tronco que dão origem às células sanguíneas circulantes, incluindo hemácias, granulócitos e monócitos, bem como o sítio de maturação da célula B. A geração de todas as células sanguíneas é chamada hematopoiese. Quando a medula óssea é lesada ou quando há uma demanda excepcional pela produção de novas células sanguíneas, o fígado e o baço frequentemente se tornam sítios de hematopoiese extramedular. A proliferação e maturação de células precursoras na medula óssea são estimuladas por citocinas produzidas por células estromais e macrófagos na medula óssea, assim como por por linfócitos T antígeno-estimulados e macrófagos ativados, fornecendo um mecanismo para reposição dos leucócitos durante as reações imunes e inflamatórias As células do sistema imune Leucócitos Granulócitos x Agranulócitos Os leucócitos granulócitos são células de defesa que apresentam grânulos ao serem observados em microscópio óptico. Esses grânulos podem ser específicos de cada tipo celular (grânulos específicos), mas também podem ser lisossomos (grânulos azurófilos) ou proteínas que atuam na degradação das macromoléculas (grânulos terciários). A classificação dos granulócitos ocorre de acordo com sua acidez (reconhecida pelacoloração durante a preparação histológica) e pelo núcleo. • Neutrófilos – Aparecem na microscopia coloridos por corantes neutros • Eosinófilos ou Acidófilo – Na microscopia aparecem coloridos por corantes ácidos (eosina). • Basófilo – Aparecem na microscopia coloridos por corantes básicos (hematoxilina). • Mastócito – Semelhança histológica com os basófilos, mas encontrados desta forma apenas em outros tecidos que não o sanguíneo. Já os leucócitos agranulócitos não apresentam grânulos visíveis na microscopia óptica, mesmo que essas estruturas também estejam presentes, porém são menores e estão em menor quantidade. • Linfócitos • Monócitos • Macrófago A linhagem mielóide Os fagócitos Os fagócitos, incluindo neutrófilos e macrófagos, são células cuja função primária é ingerir e destruir microrganismos e remover tecidos danificados. Adicionalmente, os fagócitos se comunicam com outras células de maneira a promover ou regular as respostas imunes. recrutamento das células para os sítios de infecção reconhecimento e ativação por microrganismos ingesta dos microrganismos através do processo de fagocitose destruição dos microrganismos ingeridos Resposta rápida Expectativa de vida curta Resposta baseada em rearranjo do citoesqueleto e montagem enzimática Resposta lenta Expectativa de vida longa Resposta baseada em transcrição de novos genes MacrófagosNeutrófilos Fagócitos mononucleares • O sistema de fagócitos mononucleares inclui células circulantes chamadas monócitos que se transformam em macrófagos ao migrarem para os tecidos, e macrófagos residentes teciduais, derivados principalmente de precursores hematopoiéticos durante a vida fetal Monócito • Células grandes (10-15 µm de diâmetro) e jovens • Núcleo em formato de C (rim/feijão) • Possuem subpopulações que se diferenciam por marcadores celulares e funções, mas não por morfologia • Os mais comuns são os clássicos (CD14+, CD16- e CCR2), que são fagocíticos e produtores de mediadores inflamatórios • Os não clássicos são recrutados após a infecção ou lesão e contribuem para o reparo tecidual (CD14-, CD16+, CXCR1 Macrófagos Neutrófilos (leucócitos polimorfonucleares ou granulócitos) • Células esféricas de 12-15µm de diâmetro • Os mais abundantes leucócitos (1 × 1011 por dia) • Reações inflamatórias agudas • Núcleo com 2 a 5 lóbulos conectados • 2 tipos de grânulos: – Específicos (lisozima, colagenase e elastase), não se coram nem com hematoxilina (básico) e nem eosina (ácido) –Azurófilos (defensinas e catelicidinas) • Sobrevivem poucas horas na circulação e até 2 dias nos tecidos com foco de infecção • Fagocitam microrganismos opsonizados e células necróticas e os destroem nos fagolisossomos • O conteúdo de seus grânulos pode ser secretado para matar microrganismos extracelulares, mas que também vão danificar os tecidos sadios Eosinófilos • Núcleo bilobado • Se coram por corantes ácidos (eosina) • Atuam em processos alérgicos e ao ataque de parasitas grandes que não podem ser fagocitados • Seus grânulos contém enzimas e substâncias tóxicas que danificam a parede celular dos parasitas e dos tecidos saudáveis ao redor • São células circulantes, mas alguns são encontrados fixos em tecidos periféricos, em especial nas mucosas Basófilos • Glóbulos brancos menos numerosos (menos de 1%) • Se coram com corantes básicos (hematoxilina) • Apresentam grânulos numerosos e grandes que podem encobrir o núcleo lobulado • Ação similar à do mastócito: liberar os mediadores inflamatório histamina e heparina (choque anafilático) • Possuem receptor de IgE, o complexo basófilo-IgE-antígeno ativa essas células Mastócitos • Presentes na pele e mucosas • Citoplasma contém grande quantidade de grânulos que secretam histamina e heparina • Se coram com corantes básicos • Expressam IgE de membrana Células dendríticas • Prolongamentos de membrana semelhantes aos dendritos dos neurônios • Fagocitam antígenos, o que a induz a se modificar para apresenta-los aos linfócitos T, fazendo o elo entra a imunidade inata e a adaptativa Linfócitos • Os linfócitos B são formados quando a diferenciação e maturação das células linfoides ocorre no baço. Têm função de produzir anticorpos (proteínas imunoglobulinas) específicos para cada tipo de antígeno, e são os responsáveis pela memória imunológica. Quando estão em outros tecidos, além do sanguíneo, sofrem diferenciação e são chamados de plasmócitos (ou células plasmáticas), produzindo então os anticorpos. Linfócitos B • A diferenciação e maturação das células linfoides forma linfócitos T quando ocorre no timo. São os principais coordenadores da resposta imune e o tipo de linfócito mais abundante. • Linfócitos T CD4: Também pode ser chamado de auxiliador, ou T- auxiliar. Coordenam a resposta imune, estimulando os linfócitos B a produzirem anticorpos. São o alvo do vírus HIV. • Linfócito T CD8: Também podem ser chamados de citotóxicos, pelas substâncias tóxicas que produzem. Apresentam receptores específicos a determinado antígeno e podem destruir células infectadas ou nocivas (ex.: cancerígenas). • Linfócitos T inibidores: Inibem o sistema imune, evitando a produção de anticorpos do Linfócito B. Linfócitos T • São conhecidos como Natural Killers. Eles reconhecem diferentes tipos de antígenos e os atacam diretamente, podendo destruir também células infectadas por vírus ou tumores. Linfócitos NK • São os agranulócitos mais comuns, e apresentam o citoplasma praticamente todo ocupado por um grande núcleo. • Esses glóbulos brancos são responsáveis por controlar a resposta imune. São células que funcionam somente na resposta adaptativa. • Linfócitos T – TCR (T Cell Receptor) – reconhecem antígenos específicos e atuam na resposta contra agentes extracelulares e intracelulares. • Linfócitos B – BCR (B Cell Receptor) – são responsáveis pela produção de anticorpos, sua diferenciação leva a formação de plasmócitos e células B de memória. • Tipos: - Linfócito Helper (TCD4+) - Linfócito Citotóxico (TCD8+) - Linfócito Supressor (TREG) - Células Natural Killer - são responsáveis pelo combate de células tumorais e células infectadas por vírus Responde quase imediatamente a microrganismos e células lesadas, e repetidas exposições invocam respostas praticamente idênticas. Os receptores são específicos para estruturas que comuns a grupos de microrganismos e não distinguem pequenas diferenças entre eles. Apresenta células sentinelas em busca de microrganismos invasores na maioria dos tecidos. Imunidade inata Combate microrganismos por meio de duas reações principais — o recrutamento de fagócitos e outros leucócitos, no processo inflamatório; e pelo bloqueio da replicação viral ou pelo killing de células infectadas por vírus, sem a necessidade de uma reação inflamatória. Resposta adaptativa A resposta imune adaptativa é mediada por células chamadas linfócitos e seus produtos. Especificidade e diversidade São específicas para antígenos distintos, chamados determinantes ou epítopos. Pela seleção clonal, indivíduos não imunizados são capazes de reconhecer e responder aos antígenos estranhos por possuírem clones de linfócitos antígeno-específicos já previamente desenvolvidos de modo independentemente da exposição ao antígeno. Ao ser ativado por um antígeno, esse clono específico se multiplica em um processo chamado expansão clonal. Memória As respostas imunes secundárias são normalmente mais rápidas, de maior magnitude e quantitativamente diferentes da resposta primária àquele antígeno. isso e deve à memória imunológica conferida pela geração de células de memória de vida longa específicas para o antígeno, após a resposta primária. Células de memória extrapolam as células naives em número e velocidade de resposta. Autotolerância O sistema imune não reage prejudicialmente aos antígenos do próprioindivíduo. Essa tolerância é mantida pela eliminação ou inativação de linfócitos que expressam receptores específicos para autoantígenos, ou suprimindo essas células pela ação de outras células (reguladoras). Falhas nos mecanismos de tolerância levam à doenças autoimunes. Imunidade inata x adaptativa A defesa contra microrganismos é mediada por respostas sequenciais e coordenadas que são denominadas imunidade inata e adaptativa I m u n o l o g i a c l í n i c a S D E 3 9 1 3 ADAPTATIVAINATA Para moléculas compartilhadas por grupos de microrganismos relacionados e moléculas produzidas por células lesadas do hospedeiro ESPECIFICIDADE DIVERSIDADE MEMÓRIA AUTORREATIVIDADE Características PROTEÍNAS SANGUÍNEAS BARREIRAS CELULARES E QUÍMICAS C A R A C T E R IS T IC A S C O M P O N E N T E S CÉLULAS Limitada; reconhecimento de moléculas codificadas por genes herdados (da linhagem germinativa) Nenhuma ou limitada Não Para antígenos microbianos e não microbianos Muito ampla; genes dos receptores são formados por recombinação somática de segmentos gênicos nos linfócitos Sim Não Pele, epitélios de mucosa; moléculas antimicrobianas Complemento, várias lectinas e aglutininas Fagócitos (macrófagos, neutrófilos), células dendríticas, células natural killer, mastócitos, células linfoides inatas Linfócitos nos epitélios; anticorpos secretados nas superfícies epiteliais Anticorpos Linfócitos Imunidade adaptativa A imunidade humoral é mediada por moléculas no sangue e em secreções mucosas, denominadas anticorpos, os quais são produzidos pelos linfócitos B. Ao reconhecerem os antígenos, os anticorpos os neutralizam e atuam como marcadores que facilitam sua eliminação pelos fagócitos e pelo sistema complemento. A imunidade celular, é mediada pelos linfócitos T. Quando o patógeno é inacessível à anticorpos (sobrevivem nos fagócitos ou são vírus), é necessária a sua destruição dentro dos fagócitos ou da célula infectada para eliminar os reservatórios da infecção Imunidade humoral e celular Imunidade humoral e adaptativa Imunidade ativa x passiva A forma de imunidade induzida pela exposição a um antígeno estranho é chamada imunidade ativa, porque o indivíduo imunizado tem papel ativo na resposta ao antígeno. A imunidade também pode ser conferida pela transferência de anticorpos de um indivíduo imunizado para outro que nunca encontrou o antígeno, é a chamada imunização passiva. O receptor se torna imune a um antígeno ao qual nunca foi exposto (gestação). Bibliografia Imunologia clínica Ribeiro, Helem Ferreira Microbiologia e imunologia médica Warren Levinson Imunobiologia de Janeway Kenneth Murphy Imunologia celular e molecular Abbas; Lichtman e Pillai IMUNOLOGIA CLÍNICA – ARA0858