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A ética nas negociações Apresentação Nesta Unidade de Aprendizagem, exploraremos a questão da necessidade de se adotar padrões éticos de comportamento nas negociações. Nos últimos anos, a ética vem recebendo mais atenção dos pesquisadores das negociações. Para nós, questões importantes sobre a ética são parte natural desses processos. O negociador competente precisa reconhecer quando as questões são relevantes e quais fatores precisam ser considerados. Identificaremos, ainda, as principais dimensões éticas das negociações, descreveremos a opinião geral sobre essas escolhas éticas e apresentaremos uma estrutura que auxilia a tomar decisões éticas fundamentadas. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Explicar as abordagens mais tradicionais a padrões e raciocínios éticos.• Analisar como a ética afeta os processos de negociação.• Identificar os diferentes tipos de táticas antiéticas e as percepções sobre elas.• Infográfico Veja no infográfico a seguir as principais questões relacionadas à ética nas negociações. Conteúdo do livro Discorrer sobre ética é sempre uma atividade fascinante e relevante, pois permite compreender como os princípios e valores orientam a conduta humana. Nas negociações, isso é especialmente importante, uma vez que essas práticas envolvem interações entre duas ou mais partes, que buscam um acordo justo e benéfico para todos. No capítulo A ética nas negociações, base teórica desta Unidade de Aprendizagem, você vai conhecer as abordagens mais tradicionais a padrões e raciocínios éticos. Além disso, vai ver como a ética afeta os processos de negociação, bem como identificar os diferentes tipos de táticas antiéticas e as percepções sobre elas. Boa leitura. NEGOCIAÇÃO OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Explicar as abordagens mais tradicionais a padrões e raciocínios éticos. > Analisar como a ética afeta os processos de negociação. > Identificar os diferentes tipos de táticas antiéticas e as percepções sobre elas. Introdução A ética nas negociações é um tema fundamental que deve ser levado em consideração em todas as relações comerciais. Inicialmente, é importante lembrar que a negociação deve ser vista não como um processo de confronto, em que cada parte tenta tirar vantagem da outra, mas como um processo de cooperação, em que se busca um acordo que atenda aos interesses de todas as partes envolvidas. Neste capítulo, você poderá compreender os princípios norteadores de práticas éticas empresariais, aspectos éticos e as nomenclaturas utilizadas no tema. Também estudará como a ética afeta os processos de negociação, destacando o papel da governança corporativa. Por fim, conhecerá os dife- rentes tipos de ações antiéticas nas rotinas das atividades empresariais e as percepções sobre elas. A ética nas negociações Reny Aparecida Galvão Abordagens tradicionais a padrões éticos A ética empresarial é um conjunto de valores e normas que orientam o com- portamento das empresas em relação aos seus stakeholders, ou seja, todas as partes interessadas, incluindo os colaboradores, os clientes, os fornecedores, as comunidades locais e o meio ambiente (BONOTTI, 2022). É importante ressaltar que a ética empresarial não se limita apenas ao cumprimento das leis e regulamentos; ela também engloba questões como responsabilidade social, sustentabilidade e transparência nas relações com seus stakeholders. A opinião dessas partes interessadas pode influenciar significativamente a reputação da empresa. Até a década de 1960, a ética empresarial não tinha em alta consideração a discussão pelos valores sociais e expectativas da sociedade em relação às empresas. No entanto, à medida que a sociedade passou por mudanças significativas nos valores e nas normas, as empresas começaram a sentir a necessidade de repensar sua relação com a sociedade (FERRELL; FRAEDRICH; FERRELL, 2001). Na década de 1960, houve nos Estados Unidos um movimento crescente de ativistas que lutavam pelos seus direitos, incluindo direitos civis, ambientais e dos consumidores. Isso levou à criação de várias associações e grupos de pressão que buscavam mudanças no comportamento empresarial. Essas organizações tiveram como reflexo mudanças na forma de agir, e as empresas começaram a dar mais atenção às questões sociais (FERRELL; FRAEDRICH; FERRELL, 2001). Nos anos 1970, a imagem pública foi o foco central, e as empresas come- çaram a se preocupar mais com essa questão. Além das demandas sociais, houve aumento na regulamentação governamental, especialmente nos setores financeiros e ambientais. A necessidade de gerenciar a imagem e a reputação levou as empresas a enfrentarem de maneira mais direta questões éticas e considerar seu impacto na sociedade como um todo (FERRELL; FRAEDRICH; FERRELL, 2001). Foi na década de 1980 que as grandes empresas passaram a se preocupar de fato com a ética empresarial. Isso se deu em parte devido às mudanças vertiginosas nas regras do mundo dos negócios, incluindo escândalos cor- porativos, fusões e aquisições e um aumento no ativismo dos acionistas. As empresas perceberam que precisavam de padrões mais altos de conduta ética para manter a confiança dos investidores e do público em geral (FERRELL; FRAEDRICH; FERRELL, 2001). A ética nas negociações2 Na década de 1990, houve uma institucionalização da ética empresarial, com empresas buscando prevenir atitudes condenáveis e instituir valores empresariais. As empresas começaram a criar códigos de conduta, comitês de ética e programas de treinamento para promover a conduta ética (FERRELL; FRAEDRICH; FERRELL, 2001). Já no início dos anos 2000, a tendência foi em direção a iniciativas cujas raízes estevam na cultura ou na integridade das empresas em que a ética era um dos valores fundamentais. As empresas perceberam que a ética deveria ser vista não como uma questão meramente legal, mas como um valor fundamental que orienta todas as atividades da empresa (FERRELL; FRAEDRICH; FERRELL, 2001). Essa mudança ocorreu em parte devido ao reconhecimento de que empre- sas com forte cultura ética tendem a ser mais bem-sucedidas. Empresas que são percebidas como éticas costumam ter uma imagem positiva e ser mais admiradas pelos clientes e investidores, o que pode levar a maiores retornos. Além disso, as empresas perceberam que os custos de atos antiéticos ou fraudulentos são muito altos. A ética é uma disciplina teórica, não devendo ser confundida com moral, que é seu objeto de estudo. A ética consiste em um conjunto de princípios e valores que orientam o comportamento humano em determinado contexto, ao passo que a moral é uma forma de expressão concreta da ética que se refere a normas e regras específicas que regulam o comportamento humano (SROUR, 2013). A ética é uma reflexão filosófica sobre o que é certo ou errado, bom ou mau, justo ou injusto, em termos gerais e abstratos. Pode ser entendida como uma busca pela compreensão e aprimoramento dos valores fundamentais que devem orientar as ações e decisões em todas as esferas da vida. Já a moral é um conjunto de normas e regras de conduta que se baseiam em valores éticos. Ela pode variar de acordo com as crenças, os costumes, as tradições e as normas de cada sociedade ou grupo social (SROUR, 2013). Filosofias morais na ética de negócios A ética nas negociações é um tema cada vez mais relevante em um mundo em que as empresas enfrentam crescente pressão para agir de forma responsável e sustentável. Os indivíduos que trabalham em grandes empresas enfrentam desafios éticos significativos todos os dias, quando devem tomar decisões A ética nas negociações 3 que afetam não apenas suas próprias vidas, mas também as de seus colegas, clientes e stakeholders. O que é considerado certo ou errado pode ser influenciado por fatores como a cultura, a religião, a educação e a experiência de vida de cada indi- víduo. Por trás das decisões que as pessoas tomam,muitas vezes há uma filosofia moral subjacente que orienta essas escolhas. Cada filosofia moral apresenta uma visão diferente sobre o que é certo e o que é errado e sobre quais valores devem ser priorizados na tomada de decisões éticas (FERRELL; FRAEDRICH; FERRELL, 2001). A ética da virtude se concentra no desenvolvimento de virtudes pessoais, como coragem, sabedoria e justiça. As ações corretas são aquelas que refle- tem o desenvolvimento dessas virtudes e ajudam a promover o bem-estar pessoal e coletivo. As pessoas podem ter diferentes perspectivas sobre o que é moralmente correto em uma determinada situação, e as virtudes que alguém tem podem influenciar sua visão do que é certo e errado. A ética da virtude considera que o caráter e as virtudes de uma pessoa são mais im- portantes do que a conformidade com normas sociais ou jurídicas (FERRELL; FRAEDRICH; FERRELL, 2001). A justiça é um conceito amplo que pode ser dividido em diferentes tipos, cada um com seu foco específico. A justiça distributiva é fundamental para garantir que as transações comerciais sejam realizadas de forma justa e equitativa, considerando os interesses de todos os envolvidos. Por sua vez, a justiça processual é fundamental para garantir que os processos de tomada de decisão, os procedimentos e as atividades que geram consequências ou resultados sejam realizados de forma justa e transparente, respeitando os direitos e interesses de todos os envolvidos. Já a justiça inter-relacional requer que a empresa estabeleça e promova um ambiente de comunicação aberto e transparente, em que todos os stakeholders possam expressar suas opiniões e preocupações de forma construtiva e respeitosa (FERRELL; FRAEDRICH; FERRELL, 2001). No ambiente de trabalho, é importante que as empresas estabeleçam uma cultura ética clara e definam seus valores fundamentais para ajudar os indivíduos a tomar decisões éticas. No entanto, a decisão final sempre dependerá da perspectiva moral individual de cada pessoa e do contexto em que se encontra. A ética nas negociações4 O papel da ética nos processos de negociação A ética desempenha um papel fundamental nos processos de negociação, pois define os limites de comportamento aceitáveis e as regras de conduta que devem ser seguidas pelos negociadores. A ética nos processos de negociação se refere ao conjunto de princípios e valores que devem orientar as ações dos negociadores. Isso significa que, mesmo que um acordo pareça vantajoso para uma das partes, ele não deve ser aceito se violar os princípios éticos que regem a negociação. Dessa forma, a ética deve estar presente em todas as etapas da negociação, garantindo que o processo seja justo, transparente e confiável para todas as partes envolvidas (MELLO, 2012): � na etapa de preparação, é fundamental que os negociadores obtenham informações de forma ética, respeitando a privacidade e os direitos das partes envolvidas; � na etapa de abertura, as regras básicas da negociação devem ser estabelecidas com transparência e clareza, para que todas as partes entendam o processo; � na etapa de exploração, os negociadores devem ser éticos em relação à troca de informações, evitando a manipulação ou distorção dos fatos para obter vantagens indevidas; � na etapa de proposta, as ofertas devem ser feitas com base em critérios justos e transparentes, e não em estratégias que possam prejudicar a outra parte; � na etapa de conclusão, o acordo deve ser estabelecido de forma justa e equitativa, levando em consideração os interesses e necessidades de todas as partes envolvidas. Entre as práticas éticas que devem ser consideradas nos processos de negociação, está a transparência, pois todas as informações relevantes devem ser compartilhadas com as partes envolvidas, de forma clara e precisa, para que todos tenham uma compreensão completa do acordo. Todas as partes devem agir de forma honesta e confiável, cumprindo com seus compromissos e responsabilidades com integridade. As negociações também devem ser conduzidas com respeito mútuo entre as partes, levando em conta suas necessidades e interesses, e devem buscar um acordo justo para todas as partes envolvidas (MELLO, 2012). A ética nas negociações 5 Qualquer tentativa de impor condições injustas ou desonestas pode comprometer a credibilidade e a integridade da negociação. Como afirmam Rodighero, Olczevski e Briancini (2022, documento on-line), “[...] para esta- belecer relações de confiabilidade entre o negociador, a gerência, o cliente e a sociedade, o profissional deve agir conforme o código de ética de sua profissão e da empresa, assim como as leis vigentes”. Por isso, a organização deve estabelecer uma política ou um código de conduta ética para promover uma cultura dentro da empresa. Essa política deve estabelecer padrões claros de conduta ética para todos os colaboradores da empresa, independentemente do nível hierárquico ou da área de atuação. O código de conduta ética deve ser baseado nos valores e princípios éticos da empresa, como integridade, honestidade, transparência, responsabilidade social e ambiental, entre outros. Esse documento deve ser claro e objetivo, estabelecendo diretrizes sobre como os colaboradores devem se comportar em diversas situações, como no relacionamento com clientes, fornecedores e outros stakeholders; no uso de recursos da empresa; no respeito às leis e normas regulatórias; entre outras questões relevantes. Para garantir o cumprimento da política de ética, é importante que a empresa tenha um comitê de ética composto por grupos de executivos com a função de criar e fiscalizar a conduta ética empresarial. Esse comitê deve estar sempre atento para identificar desvios de conduta e promover ações corretivas, quando necessário. Além disso, é importante que a empresa invista em treinamentos e capacitações para seus colaboradores, para que todos possam entender a importância da ética e como colocá-la em prática no dia a dia (MOREIRA, 2002). Como exemplo, imaginemos uma empresa que adota o critério de que todos os presentes recebidos pelo setor de compras, indepen- dentemente do valor, são listados e catalogados. Na confraternização de fim de ano, todos esses presentes são sorteados. Essa empresa está adotando uma conduta ética exemplar ao garantir a transparência e a imparcialidade nos processos de compras e presentes. Tais práticas podem ajudar a construir uma cultura organizacional ética e promover a confiança entre os stakeholders da empresa. Ao sortear os presentes na confraternização de fim de ano, a empresa está afastando a possibilidade de que esses presentes tenham influência sobre as decisões de compras. Essa prática é importante para manter a isenção e a imparcialidade no processo de aquisição de bens e serviços. A ética nas negociações6 Governança corporativa e compliance A necessidade de normas de definição dos papéis das organizações surgiu em resposta aos abusos de poder da alta administração das empresas, que muitas vezes privilegiava seus próprios interesses em detrimento dos interesses dos acionistas e da empresa como um todo. Essa situação tornou-se cada vez mais preocupante com a evolução da economia mundial e a crescente sistematização empresarial, que trouxeram consigo a abertura do mercado ao capital externo (SILVA, 2022). A governança corporativa pode ser compreendida como o conjunto de práticas, regras e processos que uma empresa adota para garantir que suas atividades sejam conduzidas de maneira transparente, responsável e ética, com a finalidade de maximizar a criação de valor e a sustentabilidade de longo prazo. Ela é especialmente importante em empresas de capital aberto, em que há uma grande quantidade de investidores e deve haver muita transparência e prestação de contas (IBGC, 2023). O caso Enron, um dos maiores escândalos corporativos da história, teve um impacto significativo no desenvolvimento das práticas de governança corporativa em todoo mundo e ajudou a promulgar a Lei Sarbanes-Oxley, ou SOx. Para atender às exigências da SOx, as empresas precisam adotar práti- cas de compliance, ou seja, seguir rigorosamente as leis e regulamentações aplicáveis e manter processos internos que garantam a conformidade com os requisitos exigidos. A Enron Corporation era uma empresa de energia com sede em Hous- ton, Texas, que se tornou uma das maiores empresas dos Estados Unidos durante os anos 1990. Em 2001, ela declarou falência em meio a uma fraude financeira que envolvia a manipulação de dados contábeis para ocultar dívidas e inflar lucros. A SOx foi promulgada em 2002 e introduziu várias medidas para promover a ética empresarial. Por exemplo, ela requer a implementação de controles internos mais robustos para garantir a precisão e integridade das informações financeiras, ajudando a evitar fraudes e práticas antiéticas nas operações empresariais. A lei também exige a divulgação de transações e pagamentos significativos feitos a executivos e diretores, promovendo a transparência e a prestação de contas. A ética nas negociações 7 Por sua vez, podemos definir compliance como um conjunto de atividades e controles que buscam garantir que as empresas cumpram suas obrigações legais e éticas, além de prevenir e detectar possíveis violações e irregulari- dades. Essa prática “[...] transcende a ideia de ‘estar em conformidade’ com as leis, regulamentações e autorregulamentações, abrangendo aspectos de governança, conduta, transparência e temas como ética e integridade” (FEBRABAN, 2018, documento on-line). Nessa perspectiva, os dirigentes das empresas devem estar cientes do que está acontecendo na saúde financeira da empresa que gerenciam e nas ações de seus colaboradores. Isso porque, se um funcionário sob seu comando cometer um ato ilícito, o dirigente poderá ser responsabilizado em âmbito civil, administrativo e criminal. A implementação de programas de compliance e integridade empresarial passou a ser uma prioridade e envolve a criação de políticas e procedimentos internos destinados a prevenir, detectar e corrigir violações éticas e legais, conforme apresentado no Quadro 1. Quadro 1. Nove passos essenciais para fortalecer o compliance e a gover- nança corporativa O tom que vem de cima: disseminando a cultura do compliance. A autoavaliação por parte da alta administração identifica o que precisa ser alterado e como as mudanças serão conduzidas. O compromisso e as ações condizentes com o discurso são fundamentais para a credibilidade do programa. Deve haver um comunicado formal por parte da alta administração para endossar o comprometimento da organização com condutas éticas e transparentes e a observância aos processos de compliance, bem como uma comunicação contínua, clara e consistente em todos os níveis da organização para garantir que o compliance seja uma prioridade diária e parte do padrão de comportamento da organização. Implemente a área: demonstre os benefícios e elimine os mitos para obter apoio. É preciso definir o foco da área de compliance, que deve ser estratégico em vez de burocrático, com incentivo da alta administração. Para criar a área, é necessário elaborar um plano de negócios que contemple soluções inovadoras alinhadas aos objetivos estratégicos da organização, abordando temas sensíveis e prioritários e destacando as vantagens para o negócio, como a valorização da reputação da organização e o aumento de seu valor de mercado. A área de compliance existe não para se responsabilizar pelo cumprimento das obrigações, mas para auxiliar a administração na responsabilidade de cumprimento. (Continua) A ética nas negociações8 Implemente a área: demonstre os benefícios e elimine os mitos para obter apoio. É necessário ser habilidoso em convencer que a área representa um investimento que se paga e buscar evidências, destacando os benefícios inquestionáveis de programas bem-planejados e adequados e os custos imensuráveis do não compliance. Forme o time: busque as pessoas certas e os recursos adequados. Se uma organização não tem recursos financeiros ou autorização para contratar um profissional especializado, é recomendável terceirizar. É fundamental que o time seja composto por perfis diferentes que agreguem olhares inovadores, levando em conta a complexidade e a natureza das tarefas. A falta de recursos adequados, incluindo tecnológicos, e de uma equipe multidisciplinar e preparada pode resultar em descrédito, ineficiência, vulnerabilidade e más condutas, sujeitando a organização a infrações legais e regulatórias. Mapeie e monitore: estabeleça metas de redução de riscos. É importante compreender os tipos de risco de compliance que podem ameaçar o negócio e adotar uma abordagem baseada em risco, concentrando-se nas atividades que apresentam os impactos e riscos regulatórios mais significativos. É essencial analisar as circunstâncias operacionais, legais e históricas do setor para integrá-las à matriz de riscos da organização. Comunique e treine: promova a transparência. A comunicação e o treinamento constantes são essenciais para o processo de conscientização e internalização de novos valores. Isso criará uma consciência coletiva favorável e deve incluir a comunicação direta e frequente com a alta administração. É importante definir conceitos e estabelecer um cronograma para abordar os temas relevantes e comprovar claramente os benefícios dos processos e das ferramentas de treinamento para obter apoio e aderência. Dê voz a todos: garanta um canal de denúncias, investigue, resolva e reporte. É importante garantir um canal de comunicação efetivo entre os principais públicos da organização e a área de compliance. Isso permite que denúncias e manifestações espontâneas sejam feitas de maneira segura e sigilosa, o que pode fornecer informações importantes sobre o negócio. É importante que as investigações sejam conduzidas de maneira profissional e bem-treinada e que as denúncias sejam relatadas periodicamente à alta administração, com ações corretivas tomadas e devidamente documentadas. (Continua) (Continuação) A ética nas negociações 9 Calibre as condutas: incentivos e sanções, os mecanismos- chave. O cumprimento do programa de compliance deve ser incentivado e disciplinado de maneira consistente em toda a organização, com medidas proporcionais à gravidade da conduta. É importante que todos os funcionários saibam que o não cumprimento ou a omissão das informações causará punições. É fundamental alinhar o processo de elaboração da política de execução do programa de compliance, a direção das investigações e a aplicação das medidas com a área de recursos humanos e/ou com o jurídico. Em caso de infrações repetidas, os programas de treinamento devem ser reforçados ou reavaliados, e comportamentos inadequados devem ser corrigidos para evitar riscos à missão, à reputação e à segurança jurídica da organização. Avalie e evolua: estabeleça critérios de métrica e promova melhorias no seu programa. O programa de compliance deve ser monitorado e avaliado continuamente, com revisões anuais das políticas e dos procedimentos para garantir que estejam em conformidade com as leis e regulamentos. Estabeleça metas de crescimento, adote mecanismos de métricas e indicadores e crie parcerias internas para análise crítica e regulação do projeto. Fique atento a sinais de que o planejamento não está funcionando, como falta de recursos, baixo comprometimento da alta administração e conflitos de interesse. Liste e acompanhe todos os fatores que possam comprometer a eficiência do programa. Prove que você tem um programa: fórmula de sucesso e abrandamento de sanções. O aumento da quantidade de tratados e leis internacionais que visam a combater a corrupção faz com que as empresas estejam cada vez mais sujeitas a penalidades e fiscalizações. Programas eficientesde compliance são fundamentais para garantir a redução de penalidades e evitar prejuízos. A segurança dos registros da organização é fundamental, e deve haver uma política interna que regule o assunto. Fonte: Adaptado de Os nove... ([201-?]). Conforme apresentado no Quadro 1, os programas podem incluir a criação de um código de conduta, treinamento de funcionários, sistemas de denún- cias anônimas, auditorias internas regulares e investigações imediatas de quaisquer alegações de comportamento inadequado. (Continuação) A ética nas negociações10 Além disso, esses programas podem ser adaptados às necessidades es- pecíficas de cada empresa, levando em consideração fatores como o setor em que atuam, a geografia e a cultura organizacional. O objetivo final é criar uma cultura de ética e integridade dentro da empresa, o que, por sua vez, pode ajudar a melhorar a reputação e a confiança dos clientes e investidores. Tipos e percepções de táticas antiéticas A tomada de decisão ética é complexa e influenciada por diversos fatores, como a personalidade, os valores, as experiências, o contexto social e cultu- ral, as pressões externas, entre outros. Algumas pessoas podem estar mais dispostas a agir de forma antiética para alcançar seus objetivos, ao passo que outras podem ser mais resistentes a essas tentações. Os atos antiéticos são ações que violam os princípios éticos e morais que regem uma determinada profissão, organização ou sociedade. Esses atos podem incluir, por exemplo, o suborno, o conflito de interesse, o conluio e o uso de informações privilegiadas (ONU, 2013). O suborno é a oferta ou aceitação de dinheiro, presentes ou outras formas de compensação em troca de um favor ou vantagem indevida. Geralmente, o suborno envolve oferecimento de dinheiro ou de outros benefícios a uma pessoa em posição de poder ou influência, como um funcionário público, um executivo de negócios ou um político, para obter algo que não seria concedido de outra forma. Por exemplo, um empresário pode oferecer suborno a um funcionário do governo para garantir um contrato ou a aprovação para um projeto (ONU, 2013). Por sua vez, o conflito de interesse é uma situação em que uma pessoa ou organização enfrenta um conflito entre seus interesses pessoais e seus deveres ou responsabilidades profissionais. Essa situação ocorre quando há uma possibilidade de que os interesses pessoais de uma pessoa possam in- fluenciar suas ações ou decisões profissionais, prejudicando a imparcialidade, a transparência e a integridade dessas ações ou decisões. Por exemplo, um médico pode enfrentar um conflito de interesse se ele próprio ou um membro da família tiver uma participação financeira em uma empresa farmacêutica e, ao prescrever medicamentos, puder ser influenciado por esse interesse pessoal (ONU, 2013). A ética nas negociações 11 Já o conluio é um acordo secreto entre duas ou mais pessoas ou organiza- ções para praticar uma atividade ilegal ou antiética em conjunto, geralmente com o objetivo de obter vantagens indevidas. É uma forma de conspiração em que as partes envolvidas trabalham juntas para enganar outras pessoas ou empresas em benefício próprio. Por exemplo, um conluio pode ocorrer entre empresas concorrentes para fixar preços artificialmente altos, dividir o mercado entre si ou excluir novos concorrentes do mercado (ONU, 2013). Por fim, o uso de informações privilegiadas é a prática de utilizar infor- mações não públicas ou confidenciais para obter vantagem financeira ou pessoal. Essas informações podem incluir, por exemplo, informações sobre resultados financeiros, planos estratégicos, negociações em andamento ou outras informações relevantes que não estão disponíveis ao público em geral. Elas podem ser usadas para realizar negociações financeiras, como compra ou venda de ações, ou para tomar outras decisões que possam gerar benefícios financeiros ou pessoais. Por exemplo, um executivo de uma empresa pode utilizar informações privilegiadas para comprar ou vender ações da empresa antes da divulgação pública de um anúncio importante, esperando, assim, obter um lucro pessoal (ONU, 2013). A desigualdade econômica pode aumentar o desejo das pessoas de agir de forma antiética para obter vantagens financeiras e pode levar a compor- tamentos como corrupção, suborno, roubo e fraude. A falta de transparência também pode contribuir para comportamentos antiéticos, pois torna mais difícil detectar as ações antiéticas. Quando as informações são mantidas em segredo, pode ser mais fácil para as pessoas agirem fora das normas éticas sem serem detectadas. A impunidade é outro fator, pois, quando as pessoas percebem que não há consequências para ações antiéticas, isso pode incentivar ainda mais esse tipo de comportamento. Para combater esses problemas, é importante que haja uma cultura de transparência e responsabilização, em que as pessoas sejam incentivadas a relatar comportamentos antiéticos e haja consequências claras para essas ações. Além disso, é importante que as instituições trabalhem para reduzir a desigualdade e aumentar o acesso a oportunidades econômicas para todos, buscando diminuir a pressão para agir de forma antiética a fim de obter vantagens financeiras. Portanto, para enfrentar esses problemas éticos de forma eficaz, é ne- cessário abordar tanto os fatores individuais quanto os sistêmicos. Isso pode envolver a promoção de uma cultura ética, a implementação de regulamenta- ções mais rígidas e a criação de sistemas de responsabilização mais eficazes. A ética nas negociações12 A ética empresarial tornou-se cada vez mais importante e está presente em todos os aspectos dos negócios, incluindo relações com clientes, fornece- dores e funcionários, bem como questões ambientais e de responsabilidade social corporativa, sendo vista como fundamental tanto para o sucesso a longo prazo de uma empresa quanto para sua reputação e imagem pública. Por fim, é importante lembrar que a ética é uma questão relacionada não apenas com a escolha individual, mas também com a responsabilidade coletiva. As empresas e organizações devem estabelecer políticas e procedimentos que motivem as práticas éticas em todos os processos de negociação, e devem tomar medidas adequadas em casos de violação desses princípios. Referências BONOTTI, R. V. A ética empresarial como instrumento de efetivação dos direitos sociais: o desafio diante à atuação das empresas transacionais no mercado globalizado. 2022. 117f. Dissertação (Mestrado em Direito) — Universidade Nove de Julho, São Paulo, 2022. Disponível em: http://bibliotecatede.uninove.br/handle/tede/2968. Acesso em: 29 maio 2023. FEBRABAN. Guia: boas práticas de compliance. São Paulo: Febraban, 2018. Disponível em: https://cmsarquivos.febraban.org.br/Arquivos/documentos/PDF/febraban_ma- nual_compliance_2018_2web.pdf. Acesso em: 29 maio 2023. FERRELL, O. C.; FRAEDRICH, J.; FERRELL, L. Ética empresarial: dilemas, tomadas de decisão e casos. 4. ed. Rio de Janeiro: Reichmann & Afonso, 2001. IBGC. Governança corporativa. São Paulo: IGBC, 2023. Disponível em: https://www.ibgc. org.br/conhecimento/governanca-corporativa. Acesso em: 29 maio 2023. MELLO, J. C. M. F. Negociação baseada em estratégia. São Paulo: Atlas, 2012. MOREIRA, J. M. A ética empresarial no Brasil. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002. OS 9 passos essenciais para fortalecer o compliance e a governança corporativa nas empresas. In: IBE. [S. l.: s. n., 201-?]. 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A ética nas negociações 13 Leituras recomendadas CORTELLA, M. S. Qual é a tua obra? Inquietações propositivas sobre gestão, liderança e ética. São Paulo: Vozes, 2015. SILVEIRA, A. M. Ética empresarial na prática: soluções para gestão e governança no século XXI. Rio de Janeiro: Alta Books, 2017. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os edito- res declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. A ética nas negociações14 Dica do professor Neste vídeo, veremos os aspectos críticos relacionados a ética na negociação. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/cee29914fad5b594d8f5918df1e801fd/6085377e7c2216b144ca388b4c671a8f Na prática A chamada "expressão sincera" existe mesmo? Embora em sua maioria as pessoas não sejam boas em detectar mentiras, algumas acreditam que são capazes de descobrir se uma pessoa é sincera ou não, apenas examinando a sua expressão facial. Porém, qual a exatidão destas avaliações?