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TEXTO FINAL ARTIGO BERGSON LECOQ

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A INTUIÇÃO EM BERGSON: 
NOÇÕES DE DURAÇÃO E TEMPO NA FORMAÇÃO DO ATOR
mARIA APARECIDA FERREIRA DE ALMEIDA �
resumo:
O presente trabalho trata de registrar a Intuição como método e principal fenômeno para o trabalhado no ator, tirando-lhe a ideia do senso comum e elevando-lhe à qualidade primordial para uma prática criativa do artista de teatro. Focaremos principalmente nos conceitos de duração e tempo, buscando identificar a possível correlação destes com algumas definições teatrais como Prontidão e Presença cênica.
palavras-chave:
Intuição ; duração ; tempo ; Jacques Lecoq ; Henri Bergson ; método intuitivo; movimento.
INTRODUÇÃO
Durante o trabalho de formação de artistas em artes cênicas, mais especificamente no Teatro, muito frequentemente nos deparamos com “questões abstratas”, como por exemplo, explicar o que seria intuição e sua importância para o ator. E maneiras técnicas possíveis de ensinar o ofício de interpretar com espontaneidade e verdade. [mesmo parágrafo] Anos de prática com uma determinada linguagem teatral, mais especificamente a Comédia e em especial o uso das Máscaras teatrais do Método Lecoq, foram trazendo algumas questões que este artigo se propõe a investigar mais atentamente. 
Teremos como principio dialógico o conceito de Intuição como método filosófico e o fenômeno de duração da Teoria de Henri Bergson, buscando uma visão complementar com o Método Lecoq para a formação de artistas. [mesmo parágrafo]Questões como “o que é estar presente?”, “qual o momento exato que podemos nos dispor a captar uma ideia e compartilha-la?”, “o que é o aqui e agora?”, “O que vem a ser deixar fluir?”; enfim, poderiam aqui ser enumeradas muitas outras perguntas relacionadas ao que em teatro se chama prontidão, presença cênica, improvisação. 
Este trabalho pauta-se principalmente nas obras O Pensamento e o Movente: Ensaios e conferencias de Henri Bergson e O Corpo Poético de Jacques Lecoq, servindo de anteparo e substrato para responder a esses fenômenos artísticos. [mesmo parágrafo] Trata-se de uma tentativa primeira de dar à intuição, própria da arte, um método para a criação artística e buscar o equilíbrio da dicotomia crida entre intuição e inteligência. 
[ok, ótima introdução]
MÉTODOS
	A pedagogia para a criação teatral, concebida por Jacques Lecoq, se transformou em um dos métodos mais importantes para a formação do artista criador na contemporaneidade. Servindo-nos assim da complexidade do conceito aqui abordado, foi se organizando, observando o relato do seu criador ao início do seu livro, de uma maneira intuitiva e prática, fruto das experiências profissionais vividas e magistralmente tornadas práticas teatrais. Afirma Lecoq que nem se deu conta de quando ocorreu a mudança do esporte para o Teatro, já que para ele esporte, movimento e teatro estavam intimamente ligados. Bergson e Lecoq: estamos diante de dois grandes criadores, de dois grandes homens que em seus pensamentos e práticas aparentemente nada têm em comum, a não ser a compreensão e abordagem acerca de conceitos sobre movimento, duração e tempo.
	A abordagem de Lecoq,
... não foi a de um filósofo ou antropólogo: ele não estabeleceu um conjunto de teorias que pudesse ser explorado na forma discursiva. o homem de teatro que tinha sido atleta passou à história, mas como professor. Ao contrário da motivação de outros expoentes das artes cênicas, ‘o que primordialmente guiou Lecoq não foi uma tentativa auto-consciente de se inserir em alguma tradição do teatro europeu, mas uma curiosidade preponderante sobre o corpo e sobre como esse se movia.’ (Murray, 2003, 2) Justamente por isso, a metodologia de 
Lecoq é abrangente a ponto de poder ser considerada um conjunto completo de técnicas inseridas em um sistema universal capaz de servir a qualquer tipo de evento teatral.(MELO, 2012, p.32-33)
Para Bergson, o filósofo não deve usar o mesmo método da ciência, assim sendo ele desenvolve a intuição como Método, um método de apreensão direta do conhecimento que extrapola o sensível, do conceito. Em um trabalho de parceria, Intuição e Inteligência poderiam dar conta do Tempo. O tempo para Bergson é o da experiência vivida somente apreendida através da intuição. O Tempo da realidade aparente, mensurável e mecanizado é apreendido pela inteligência por um mecanismo ilusório que se assemelha com os frames de um filme, dando-nos a ilusão de movimento. 
[letra 10]
		A inteligência só guarda do movimento uma série de posições: um ponto atingido de início, depois um outro... da transição ela desvia seu olhar...representação intelectual do movimento, que o desenha como uma série de posições... (BERGSON, pág 8, 2006)
O movimento é justamente o conceito que une esses dois mestres que em um esforço para que num exercício de pensamento alargado possamos compreender ambos os métodos como complementares e não antagônicos. Para Bergson o movimento não existe. Para Lecoq ele se desenha no espaço!
No livro O CORPO POÉTICO – Uma pedagogia para a criação teatral, de Jacques Lecoq ( 1921 – 1999 )�·, nos chama bastante atenção uma frase do próprio autor que transcrevo aqui em palavras que guardo em minha memória: “Quando eu era atleta gostava de imaginar o desenho que o meu corpo fazia no espaço”. Ele se referia a um tempo em que, ao mesmo tempo em que ele realizava a ação, ele se permitia “ver”, poeticamente, o desenho, a trajetória do seu corpo no espaço, como se “um outro ele” observasse sua ação e convivessem juntos naquela duração de uma ação de poucos segundos... quem seria esse observador? Com quem ele conversava e quem era aquele que podia descrever ou desenhar esse tempo de execução do salto do atleta? 
	Disso vivem os poetas, entrando e saindo de um espaço imensurável, que os permite criar. A questão é: como manter o frescor desse exato momento, se a arte do ator é marcada pela repetição? Esse mesmo Sr. Lecoq, dá o nome de rejouer a essa possibilidade de repetir. O termo rejouer foi traduzido em português para “retomada”, que considero uma inexatidão. Rejouer significa literalmente “re-jogar” ou “jogar novamente”. Parece-me mais coerente, pois não retomamos o tempo ido, mas podemos qualquer momento jogar de novo... Tal a capacidade do artista de lidar com o imensurável Tempo, ele se conecta com a Duração. 
Não se pretende aqui que o problema apresentado se reduza a um problema linguístico, mas indo em direção a outra via, por meio da reflexão verificar a influência que alguns textos e pensamento de Henri Bergson, filósofo francês (1859 – 1941), conseguem provocar associações entre os dois métodos e conjugar melhor com o tipo de assunto que é a Criação e a Prática Criativa do ator. Além de nos parecer existir uma influência de ideias bergsonianas no trabalho do artista e pedagogo, também francês e contemporâneo, Jacques Lecoq, que na verdade se diz influenciado por outro filósofo e poeta contemporâneo seu que é Gaston Bachelard� (1884-1962).
Como atrelar uma Arte a um método, aprisionar o ímpeto criativo, sujeitando-o ao rigor e submissão de regras? A princípio temos essa leitura, principalmente no caso da arte do ator, qual matéria sua de expressão e ferramenta de trabalho é seu próprio Ser. 
Nesse ponto encontramos a convergência com os pensamentos do Método Intuitivo proposto pelo Bergson à Filosofia e ao que se propõe esse artigo que é o Método de Jacques Lecoq. Ambos têm uma mesma preocupação que é o Movimento. O primeiro oferece a intuição como o meio pelo qual o Filósofo pode apreender a duração, o tempo não espacializado, e “admitir a priori de que o movimento coincide com a imobilidade” (BERGSON, EC, 1941,p.274); Já o segundo nos oferece o rigor do treinamento e domínio de habilidades físicas e repertório gestual e seu desenvolvimento no tempo espaço. E onde estaria o ponto de convergência, afinal, já que parece que ambos estão caminhando em sentido contrário?
Parece-nos que esses dois métodosnão se excluem, mas que aparentemente em caminhos opostos, se complementam:
 Em uma conferência proferida em 1911, Bergson diz que a intuição se comporta em “matéria especulativa”, tanto em seu início quanto em suas manifestações mais nítidas, como uma proibição, “ela proíbe”, opondo-se até mesmo à razão científica: Diante de ideias aceitas habitualmente, diante de teses que pareciam evidentes, de afirmações que até então haviam passado por científicas, ela sopra na orelha do filósofo a palavra: impossível. Bergson se refere à intuição tanto como uma faculdade quanto como um modo de conhecimento distinto do intelectual, em que não caberia a interpretação metodológica. ( COELHO, 2011)
Aqui no Brasil, por muitas vezes a Metodologia Lecoq vem fracionada, como se cada parte dela fosse independente da outra. Dentro da sua prática metodológica está o trabalho com os grandes territórios dramáticos: a Tragédia, o Melodrama, a Commedia Dell’art e o Clown. Mas também todo um ano, que antecede aos territórios, de trabalho que tem como start justamente o processo de analogias de natureza sensorial, que busca traçar esse trabalho que sabiamente Lecoq chama de Psicologia da vida silenciosa e a Máscara Neutra, aquela que é capaz de permitir deixar de ser para passar a “Sendo”:
 Utilizamos uma Mácara de couro criada por Ameleto Sartori�, que deriva da Máscara Nobre de Dasté. A Nobre tem feição um pouco japonesa, mas tem em comum com a Neutra o fato de ser uma máscara de calma, sem expressão particular, em estado de equilíbrio. ( LECOQ, 2003, p.52)
Esta Máscara é considerada a Máscara de todas as Máscaras e a qual considero de suma importância para a prática atoral, pois ela irá colocar o ator à disposição do devir, da intuição da duração e fio condutor. Pode-se conhecer de duas maneiras alguma coisa: rodeando ou entrando. O modelo Analítico tem a ver com o “rodear”; e o modelo Intuitivo com o adentrar, ser. 
Em A intuição Filosófica, Bergson faz a seguinte pergunta o mesmo tempo que aponta caminhos: Podemos nós recuperar essa intuição ela própria? Só temos dois meios de expressão, o conceito e a imagem (2006,p.138). Presumo que o trabalho com a Máscara Neutra possa nos colocar acessíveis a elas, que quando experimentada, entenda-se "vestida", pelo artista impõe a necessidade de se encontrar outros caminhos para a comunicação, pois o uso da palavra e as expressões faciais são nulos.
O fato é que a consciência no homem é, sobretudo inteligência... a intuição acha-se completamente sacrificada à inteligência (BERGSON,EC, p.267). Um pensamento elucidativo do próprio tempo histórico a que está atrelado: início do século XX, quando a Teoria da Relatividade veio a modificar todo um olhar da ciência sobre o mundo. No exercício e experimentação com a Máscara Neutra, criada exclusivamente para fim pedagógico por Ameleto Sartori, escultor e mascareiro contemporâneo e parceiro de Lecoq, pode-se encontrar um trabalho no sentido de buscar um equilíbrio e cooperação desses dois universos aparentemente antagônicos: Inteligência e intuição.
[boa complementação]
TEMPO E INTELIGÊNCIA – DURAÇÃO E INTUIÇAO
	Na Introdução de O Pensamento e o Movente, Henri Bergson, logo na primeira linha afirma que “O que mais faltou à Filosofia foi a precisão” (2006, p.3), para comunicar a difícil arte de apreender o real, não podendo se igualar à Ciência, que fraciona o Tempo numa tentativa de apoderar-se de um objeto aplicável ao saber empírico, submetendo-o a sua doutrina , um “conjunto de concepções tão abstratas e por conseguinte tão vastas, que nele caberia todo o possível e mesmo o impossível ao lado do real” (BERGSON, p.3, 2006). As convenções se fazem necessárias para estabelecer os cálculos e justificativas do apreensível, da fração, do recorte observável. A Filosofia não se dá por satisfeita com uma única resposta pura e simples, portanto, o que seria essa precisão colocada por Bergson, sendo que:
 A intuição distingue-se por características que se contrapõem às características da inteligência. Órgão do homo sapiens, a intuição não está ao serviço da prática; seu objeto é o fluente, o orgânico, o que está em marcha; só ela pode captar a duração. Enquanto a inteligência analisa, decompõe, para preparar a ação, a intuição é uma simples visão, que não decompõe nem compõe, mas vive a realidade da duração (BOCHENSKI,1968) 
Em 1911, em sua Conferência A Intuição Filosófica no Congresso Filosófico de Bologna, Henri Bergson apresenta a faculdade da Intuição como método, o Método da Filosofia. Uma tentativa de buscar o simples, espontâneo e aproximar a metafísica e o pensamento filosófico da vida. 
A Intuição viria a substituir o modelo Analítico, sendo a maneira de entrar em contato com o interior de nós mesmos, onde uma sucessão de camadas de fatos, fenômenos se misturam e “são”. A ação pragmática da Ciência, que usa a Inteligência para aclarar sobre as coisas, perde a novidade, a transição, a mudança, a passagem. Desviando-se da Duração, está preocupada com o Tempo, espacializado, mas em sua substância Movente. A Metafísica se ocupa da Duração e nesse fluxo, nesse caudal graças à Intuição é possível se ver o Ser.
	Na primeira página do seu livro Bergsonismo, Deleuze (2012, p.9) afirma ser a intuição para Bergson o próprio método filosófico, muito bem elaborado e não é um sentimento nem uma inspiração, uma simpatia confusa. 
Agora mesmo, aqui, neste ato de escrita percebemos a dificuldade e cuidado em não aprisionar determinados fenômenos em conceitos engessados, ademais por tratarmos aqui da semelhança existente tanto na Filosofia como na Arte, que é o uso da Intuição. 
...a verdade é que, acima da palavra e acima da frase, há algo bem mais simples que uma palavra: o sentido, que é menos uma coisa pensada do que um movimento, um movimento do pensamento, menos um movimento do que uma direção (BERGSON, 2006, p.139)
Retornando ao teatro, a partir da experiência com a Máscara Neutra, que busca justamente o sentido das expressões do corpo, sentido este que advém de imagens provocadas pela impossibilidade da palavra e das expressões faiais, obriga aquele que a usa um caminho para a comunicação do observado ou melhor, daquilo que ele lê como expressão. 
Com o uso pedagógico da Máscara Neutra, no sentido de obtenção de um estado de origem, um ponto de partida para a exploração de um universo movente criou a possibilidade para o artista que a veste “se permitir observar sendo”. Construir uma determinada “inação” para que ele, o artista de uso da máscara, possa se perceber esse ser que observa e ao mesmo tempo é. Nessa aparente ambiguidade, se estabelece a dialética, percebe-se um corpo vivo e disponível à descoberta e construção de novos conceitos. Uma máscara onde se é proibido falar, onde essa suposta neutralidade é o ponto de partida para uma viagem repleta de imagens corporeificadas, que derivam da relação do corpo e esse atrito e integração com o que Bergson chama de Duração, colocar-se no lugar, dentro do objeto. Para o Filósofo o método intuitivo inverterá o percurso do pensamento para poder ir da realidade aos conceitos, pois a intuição como todo pensamento, acaba por se alojar em conceitos (BERGSON, p. 139,2006). [ok, ficou mais clara essa parte]
O trabalho com a máscara neutra busca-se a construção de um estado de receptividade, integração e observação, onde o artista se percebe vivo e integrado a uma dimensão eu muitas vezes ele não teve a oportunidade de experimentar. A intuição se dá na coincidência, na empatia com o objeto estudado, o sujeito e o objeto são um só. Quando falamos em vocação acima estávamos nos direcionando a esse tipo de experiência.
A primeira preocupação da máscara é com o tempo, para que se permita ao aluno entrar em contato com a outra noção de tempo, um tempo não mecânico, não mensurável, mais um estado, uma entrega do que supostamente se cria com o uso da máscara.
Um estado de suspensão para daí o artista poder se dispor física e mentalmente a outro tipo de “observação”,essa experiência, traduzida aqui com bastante cuidado, pois esta é o cerne da discussão que se traz a tona sobre o método pedagógico, faz-se necessário tomar as palavras de MELO: 
 Primeiramente, o aluno-ator está consciente de que seu rosto, a principal marca de sua identidade no mundo exterior, está anulado. Em segundo lugar, se for confeccionada com apuro, a máscara neutra fica a uma distância de alguns milímetros do rosto, o que cria um interstício entre o corpo fenomenal do aluno-ator e a extensão quase protética de seu rosto. Esse interstício faz com que o aluno-ator entre num estado de duplicidade; ele passa a se ver enquanto vê o espaço cênico e passa a perceber a própria respiração com mais nitidez através do fluxo de ar que passa entre a superfície traseira da máscara e a sua região nasal. Essa circunstância de duplicidade é especialíssima e possibilita a geração de um efeito de encapsulamento da psique, que se sente comprimida em seus limites físicos e tende a um impulso de transcendência da persona através do vigor criativo que impele o aparecimento de outras personas, cuja multiplicidade depende exclusivamente da expressão corporal. (2012,p.37e 38)
Pensamos que por esta razão, muito bem definida por MELO, que em nenhum momento aquele que usa a máscara está inconsciente, ou tomado, em transe. 
O olhar da máscara se pressupõe um artista inteligente através dela, nesta relação entre o objeto e quem a usa impõe-se outro estado, permitindo-se a construção de um jogo dialógico entre eles. Construindo-se assim uma dinâmica, onde a inteligência e a intuição trabalham em conjunto, proporcionando ao artista experienciar o estado de criação, tempo e duração, conceitos do Bergsionismo que se correlacionam com estas faculdades acima expressas. 
Diante de um quadro cada vez mais repleto de jovens que chegam à Universidade com um perfil de total vazio e desconhecimento do sensível, seja pela pouca idade, seja pela época em que vivemos onde estamos sendo sempre estimulados a não pensar e a produzir, pensamos que o exercício com a máscara possibilita o despertar da intuição e abre um canal para sua expressão criativa. Mais uma vez, é possível encontrar uma convergência com o conceito bergsoniano:
A intuição de que falamos, então, versa antes de tudo sobre a duração interior. Apreende uma sucessão que não é justaposição, um crescimento por dentro, o prolongamento ininterrupto do passado num presente que avança no porvir... ao invés de estados contíguos a estados, que se tornarão palavras justapostas a palavras, eis a continuidade indivisível...Intuição portanto significa consciência, mas consciência imediata. (BERGSON, p.29, 2006).
[agora sim!]
Os princípios fundamentais da máscara neutra estão ligados a estes conceitos, uma possibilidade metodológica pra criar-se uma apreensão de um método intuitivo, possível ao artista, que substitui uma analise cartesiana de uma experiência muito particular, que é o ato de ensinar o artista de ser artista. Tarefa deveras árdua, já que este pressupõe à própria vocação.
 Há séculos que surgem homens cuja a função é justamente a de ver e de nos fazer ver o que não percebemos naturalmente. São os artistas, 
a arte é como espelho do pensamento filosófico, o esforço criador próprio da arte, é algo que rompe com a finalidade pragmática da inteligência, a inteligência deixada a si mesma nada pode criar, representando-se assim o que já existe. A arte afasta os símbolos, trabalha naturalmente com a intuição. (BERGSON, 2006)
[ok, boa complementação]
O MOVIMENTO
O movimento para Lecoq não é o mesmo que para Bergson. Como Arte não é Filosofia, mas uma se espelham à outra na compreensão e expressão do humano. Lecoq dá início, ainda jovem, ao pensar no desenho do seu corpo no espaço, a um longo e interminável percurso no sentido da compreensão e expressão do movimento, através de uma aparente fixdez nada comum ao fazer artístico. 
Mas o fato é que “nossa ação só se exerce comodamente sobre pontos fixos” (BERGSON, 2006, p.8), esta é a realidade apreensível da inteligência. A “fixidez”, palavra que Bergson se utiliza para caracterizar a Inteligência, incessantemente busca o momento da passagem, quando exatamente se dá a transição de um movimento a outro só consegue perceber a simultaneidade das paradas: o do móvel observado e do móvel trajetória do tempo. Não é capaz de captar a duração, a fluidez. ]
Pode-se perceber a preocupação de Jacques Lecoq quanto ao espírito do conceito de movimento e duração:
O movimento não é um percurso, mas uma dinâmica, diferente de uma simples mudança de um ponto a outro. O que importa é como você o executa. A poética da duração� que gera uma dramaturgia é o que mais me fascina. (LECOQ, p. 34, 2000)
Em sua Escola Lecoq criou o LEM (Laboratório de estudo do movimento) em 1976, onde se estende o trabalho da sua Pedagogia para o estudo, inevitavelmente, do espaço. Parte a investigação em relação do corpo com o espaço. Cenógrafos e arquitetos, além de artistas do mundo inteiro, conferem a esta Escola um dos espaços mais consagrados ao estudo do movimento, onde se dá a “representação intelectual do movimento que o desenha como uma série de posições” (BERGSON, 2006,p.8).
Com sua fluidez característica, a Intuição se liquefaz tornando-se a própria duração, entendida por Bergson por experiência vivida. Só assim o Tempo pode ser alargado, estendido. E o movimento, livre da fixidez da inteligência, desenha-se em instante poético, nos arrebatando e nos conduzindo para a experiência fora do mensurável tempo.
[ok, boa citação]
CONCLUSÃO
	Ambos os métodos, Bergson e Lecoq, buscam a precisão e o rigor oriundos do espírito científico, mas buscam acima de tudo uma identidade em seus universos de atuação. A Filosofia com seu método intuitivo negando a rigidez da ciência positivista e a Pedagogia da Criação Teatral buscando no rigor do método científico a base necessária para poder de fora dar condições ao artista o meio de entregar-se. É como se ambos seguissem seus opostos expressivos, para poderem compreender sua trajetória. 
Em nosso exercício de pensar, percebemos que através da experiência provocadora e intermediadora do uso da máscara neutra podemos traçar algumas correlações importantíssimas para a formação do intérprete criador, tais como: Prontidão e Intuição, Presença cênica tempo e inteligência, improvisação e duração. Conceitos esses que uma vez potencializados pela experiência com a máscara e buscando a intuição como método e primazia para o intérprete criador se efetivará nesse corpo físico a substância necessária para a espontaneidade e verdade da atuação.
	Estamos em tempos de novos caminhos e maneiras de se pensar. Acreditamos que a Arte ainda é esse sopro de vida sobre o inevitável devir e o artista é este ser capaz de mergulhar nesse caudaloso rio, o qual nesse momento chama-se de intuição criadora para nos propiciar o Belo e provocar essa suspensão do tempo.
O exercício de 30 anos com a Metodologia Lecoq e a observação de alguns outros professores que trabalham com o método, nos tem mostrado que existe uma leitura muito dura, onde se busca a precisão quase mecânica do movimento, uma polidez precisa dos gestos que acabaram por esvaziarem-se em uma relação mínima de causa-efeito, deixando de lado toda a existência entre esses dois pontos da duração, que pode oferecer a poesia do movimento desenhado continuamente e incessantemente no espaço. 
Parece-nos que essa performance “dura” talvez possa gerar uma total exaltação à maestria da mecânica do relógio e de uma ansiosa e desesperadora necessidade de ocupar o espaço nessa rigorosa luta do ser ou não ser, parodiando apropriadamente a arte em questão e sua afinidade à Filosofia.
Pensamos que talvez falte um pouco da práxis filosófica à arte do ator contemporâneo. Falta-lhe recuperar algo que lhe é particular e único da sua arte: entregar-se ao Devir.
Nas últimas seis décadas o virtuosismo esvaziou o sentidodo ato teatral. Ensinou-se a mecânica, mas não o libertou do espaço. Uma Indústria “criativa” vem tratando o Teatro, consequentemente o seu artista, como um reprodutor da realidade, um infinito agente para se passar bem o tempo que sobra para o divertimento. Claro que não podemos jogar na mesma vala todos os artistas e todo o teatro, pois muitos deles carregam um vínculo com a Arte Teatral, aqui entendida não somente como uma atividade de lazer. Mas o fato é que impera a mediocridade da reprodução que esvazia a manifestação da Arte que não pode pressupor a inexistência do Ser. 
Dentro desta perspectiva e indo na direção contrária do mundo embrenhado pelo positivismo científico, procuro afirmar, que da mesma maneira que Bergson propõe a Intuição como Método da Filosofia compreendendo o modus operandi da própria Filosofia, a Arte não pode se afastar da sua Intuição Poética, pois ela é a própria Arte: a intuição. Em COELHO, 2011, 
...para o filósofo as diversas artes constituem-se como uma "visão mais direta da realidade" (PM, p.152), um exemplo privilegiado de expressão de uma intuição apreendida pelos artistas os quais são "homens cuja função é justamente ver e nos fazer ver o que nós não percebemos naturalmente" (PM, p.149), Os artistas são reveladores, à medida que são capazes de mostrar, "fora de nós e em nós, coisas que não impressionavam explicitamente os nossos sentidos e nossa consciência" (PM, p.149) E se nós os admiramos é porque já havíamos percebido "alguma coisa do que eles nos mostram", ou seja, "nós havíamos percebido sem perceber (PM, p.149) 
Henri Bergson foi capaz de superar, de uma só vez, o positivismo e o idealismo do século XIX e suas ideias chegaram até nós, o que não deixa, pra muitos, de ser uma novidade, principalmente diante de uma época onde ainda a faculdade da inteligência é colocada em choque frente à intuição. É um dos pioneiros do espírito novo de nosso tempo.
 Em O Pensamento e o Movente, o filósofo nos revela que,
... A matéria e a vida que preenche o mundo estão igualmente em nós; as forças que trabalham igualmente em todas as coisas, sentimo-las em nós; seja lá qual for a essência íntima daquilo que é daquilo que se faz, somos parte disso... a intuição filosofia é esse contato, a filosofia é esse élan.Reconduzidos para fora por uma impulsão vinda do fundo,alcançaremos a ciência à medida que nosso pensamento for desabrochando ao se espalhar.(BERGSON, 2006, p.144)
		Concluindo, levando em consideração a incapacidade que temos da apreensão do que nos acomete e diante da dificuldade se sua expressão em palavras, pois quando imaginamos perceber, já se foi, encerramos com uma imagem poética, capturando da Arte essa possibilidade de expressão:
Tudo se move.
Tudo evolui, progride.
Tudo ricocheteia e reverbera.
De um ponto a outro, nada de linha reta.
De um porto a um porto, uma viagem.
Tudo se move, também eu!
A alegria e a tristeza, e também o embate.
Um ponto indeciso, desfocado, confuso, se desenha,
Ponto de convergências,
Tentações de um ponto fixo,
Numa calma de todas as paixões,
Ponto de apoio e ponto de chegada,
Naquilo que não tem nem começo, nem fim.
Nomeá-lo, Torná-lo vivo,
Dar-lhe autoridade Para compreender melhor aquilo que se move,
Para compreender melhor o Movimento.
Jacques Lecoq
Belle-Ile-en-Mer, agosto de 1997. 
abstract
This study comes to record the intuition as a method and main phenomenon for the actor worked on , taking away the idea of common sense and bringing him to the prime quality for a creative practice of theater artist. We will focus mainly on the concepts of duration and time in order to identify the possible correlation of these with some theatrical settings as readiness and scenic presence.
keywords
Intuition ; duration; time; Jacques Lecoq; Henri Bergson; intuitive method; movement.
referências
BERGSON, Henri. O Pensamento e o Movente: Ensaios e conferencias. Tradução Bento Prado Neto. – 1ª. Edição. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
______. Matéria e Memória: Ensaio da relação do corpo com o espírito. Tradução Bento Prado Neto. – 3ª. Edição. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
 ______. A evolução criadora. Tradução de Pedro Elói Duarte – Lisboa/Portugal: EDIÇÕES 70
DELEUZE, Gilles. Bergsonismo. Tradução de Luiz B. L. Orlandi. São Paulo: Ed. 34, 2012.
LECOQ, Jacques. IL Corpo Poetico, un insegnamento dela creazione teatrale. In collaborazione com Jean-Gabriel Carasso e Jean-Claude Lallias. Traduzione di Renata Mangano. Milano, Itália: Ubulibri, 2000.
MELO, Sérgio Nunes. A abordagem atorial de Lecoq: um vocabulário completo e universal para todos os idiomas performativos. Mimus – Revista online de mímica e teatro físico. Ano 2, no.4. Salvador: Padma Produções, 2012. p. 29-40. Disponível em: www.mimus.com.br. Acesso em: 14 maio 2015.
MONTEIRO, Geovana da Paz. A medida do tempo: intuição e inteligência em Bergson - Dissertação (mestrado) – Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, 2008. 110 f. Orientador: Prof. Dr. Olival Freire Júnior. Co-orientador: Prof. Dr. João Carlos Salles Pires da Silva. 
RIBEIRO, Eduardo - Bergson e a Intuição como Método na Filosofia. Marília/UNESP: Revistas Eletrônicas Kinesis, acesso em 17/03/2015.
COELHO, Jonas Gonçalves - Bergson: Intuição e Método Intuitivo.- Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31731999000100012 Acesso em: 14 maio 2015
HENRI BERGSON por J. M. Bochenski - Tradução de Antônio Pinto de Carvalho.
in A Filosofia Contemporânea Ocidental. Herder, São Paulo, 1968Disponível em: http://www.consciencia.org/bergsonbochenski.shtml Acesso em: 14 maio 2015
Cida, o texto já estava ótimo. Acertados estes pequenos detalhes e com as complementações que vc fez ficou ainda melhor. Meus parabéns; uma produção filosófica de ótima qualidade. Como eu disse, é um tema promissor para pesquisas futuras.
Valeu!
Nota 10
Dante
� Artista diplomada pela Escola de Arte Dramática-ECA USP e aluna do 6º. Período do curso de Graduação em Filosofia da UNISUL Virtual - Universidade do Sul de Santa Catarina.
� Artista e pedagogo francês fundou sua Escola, o Laboratório e Estudo do Movimento, LEM, em 1956 em Paris, onde permanece até os dias de hoje com uma pedagogia própria sobre o estudo do movimento e o jogo físico do artista.Faleceu em 1999.
� Filósofo e Poeta francês,dedicou-se criação de um novo espírito científico, que acompanhasse às mudanças provocadas pela Teoria da Relatividade.
� Escultor italiano nascido em Pádua em 1915 e morreu ainda muito jovem, em 1962. Conheceu Lecoq e com ele colaborou criando a Máscara Neutra, especialmente para o trabalo pedagógico da Escola. Seu filho, Donato Sartori continuou seu trabalho e é um do grandes artistas na arte do Ca confecção das máscaras.
� No livro, edição em italiano por mim utilizado, a palavra utilizada é permanenze que literalmente podemos traduzir por estadia, permanência. Em franês, a palavra séjours quer dizer “ação de demorar certo tempo em um lugar”. Aqui traduzi livremente para duração, palavra em português que se aproxima em sentido dessas duas.

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