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Direito resumo das materias

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NOÇÕES INTRODUTÓRIAS DO DIREITO ADMINISTRATIVO
1 – Conceitos fundamentais relacionados ao direito administrativo
1.1 – Direito Público e ordem pública
O conceito de Direito Público não é sinônimo de ordem pública. Regra de ordem pública é aquela imperativa e inafastável pela vontade das partes (ex.: regras que determinam o pagamento de tributos ou a exigência de licitação).
O Direito Público é de ordem pública, mas o conceito de ordem pública extrapola o de Direito Público. É mais abrangente, na medida em que há regras de ordem pública também no Direito Privado (ex.: capacidade civil, impedimentos para o casamento). Portanto, toda regra de Direito Público é também de ordem pública, mas nem toda a regra de ordem pública é de Direito Público.
1.2 – Estado
Estado é a pessoa jurídica (quem tem personalidade tem aptidão para ser sujeito de direitos e obrigações) de direito público.
Isso nem sempre foi assim no Brasil. Já vigorou, aqui, a teoria da dupla personalidade, segundo a qual o Estado, enquanto atuando em atividades públicas, teria personalidade de direito público, e, enquanto desempenhando atividades de direito privado, teria personalidade de direito privado.[2: A ESAF pergunta com frequência acerca dessa teoria.]
A responsabilidade civil do Estado (e não da Administração) está prevista no art. 37, § 6º, da CR:[3: Isso já foi questão de prova.]
Art. 37 (...) § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
1.3 – Estado de Direito
Estado de Direito é o Estado politicamente organizado, que obedece às suas próprias leis. O Direito Constitucional estuda os elementos constitutivos do Estado: povo, território, governo soberano e, para alguns autores, finalidades específicas.[4: A esse respeito, ver em direito constitucional a diferenciação feita entre Estado de Direito e Estado Democrático de Direito. Este, ligado ao constitucionalismo contemporâneo; aquele, ao constitucionalismo clássico (ou liberal).]
1.4 – Funções típicas do Estado
Na tripartição de poderes de Montesquieu, o Estado exerce as funções típicas (principais de cada poder) e as atípicas (secundárias). Exercer função pública significa exercer uma atividade em nome e no interesse do povo.
1.4.1 – função legiferante
A função típica do Poder Legislativo é a legiferante. Alguns autores mais modernos incluem na função típica do Legislativo a de fiscalizar, em virtude da existência dos Tribunais de Contas e das CPI’s.
No Brasil, o legislador não cumpre bem o seu papel: muitos direitos previstos na Constituição não estão sendo exercidos em virtude da ausência de lei. Isso traz sérios problemas à segurança nacional, pois os espaços vazios vêm sendo ocupados por outros poderes, como o CNJ e o STF, que acabam por praticar outros abusos e, de certo modo, desequilibrar o poder e subverter suas funções.
Excepcionalmente, o Legislativo julga e o Judiciário administra. Quando o legislador exerce seu papel principal, ele tem o poder de inovar o ordenamento jurídico. Somente a função legislativa poderia em tese ter esse caráter. Trata-se de uma função, em regra, direta (independe de provocação). É abstrata e geral, disciplinando, em regra, todos os que se encontrem em determinada situação (erga omnes).
1.4.2 – função jurisdicional
A função típica do Poder Judiciário é a jurisdicional. Excepcionalmente ele administra e normatiza.
Essa função em tese não deve inovar o ordenamento jurídico (ainda que hoje não se tenha muita certeza disso). É indireta, na medida em que depende de provocação. Em regra, é concreta (pode ser abstrata, em sede de controle concentrado de constitucionalidade).[5: Exemplo de inovação do Poder Judiciário no ordenamento é a Súmula Vinculante nº 13.]
A função jurisdicional produz a chamada intangibilidade jurídica (imutabilidade, efeitos da coisa julgada).
1.4.3 – função administrativa
A principal função do Poder Executivo é administrar (aplicando coativamente o ordenamento). Nessa função típica, ele não inova o ordenamento jurídico. A Medida Provisória e o Decreto Regulamentar Autônomo inovam, mas não são funções típicas do Poder Executivo.
A atuação administrativa é direta (independe de provocação), concreta e revisível pelo Poder Judiciário. Coisa julgada administrativa não significa a verdadeira coisa julgada, mas somente a impossibilidade de mudança na via administrativa.
1.5 – Função de governo (ou função política do Estado)
Há determinadas funções que não se enquadram perfeitamente em nenhuma das três funções típicas, tais como a sanção e o veto, a declaração de guerra e a celebração de paz, a declaração de estado de defesa e de sítio etc.
Daí que alguns autores mais modernos (Celso Antonio Bandeira de Mello) entendem haver uma quarta função: a função de governo ou política do Estado. São situações excepcionais, de conteúdo político, que não se confundem com o simples administrar, legislar ou julgar. Há outros exemplos na doutrina.
1.6 – Governo
Governo significa comando, a direção daquela pessoa jurídica de direito público. Para que o Estado seja independente, é condição que o governo seja soberano.
1.7 – Governo soberano
Governo soberano significa independência na ordem internacional, com supremacia na ordem interna.
1.8 – Administração
Administração é o aparelhamento estatal, a máquina administrativa, a estrutura física do Estado. Os autores conceituam a administração segundo vários critérios, mas, em resumo, há basicamente dois conceitos: o formal e o material.
1.8.1 – critério formal (orgânico ou subjetivo)
Sob o enfoque formal, fala-se dos órgãos, agentes e bens que compõem a administração. É o conceito de “máquina administrativa”.
1.8.2 – critério material (ou objetivo)
Sob o enfoque material, fala-se na atividade administrativa.[6: A esse respeito, recomendam-se as obras de Celso Antonio Bandeira de Melo, Diógenes Gasparini e outros.]
Os doutrinadores clássicos faziam uma distinção de letra maiúscula para o critério formal (Administração) e minúscula para o material (administração). Hoje não há mais essa distinção.
2 – Conceito de direito administrativo
2.1 – Introdução
“Direito posto” é o conjunto de regras impostas coativamente pelo Estado, que disciplinam a vida em sociedade e permitem a coexistência pacífica dos seres. Direito posto é, portanto, o direito vigente num dado momento histórico.
O Direito Administrativo integra o direito interno, que é aquele que se preocupa com as relações jurídicas existentes dentro do Estado Brasileiro. O direito internacional é o conjunto de normas superiores, acolhidas pelos Estados, que disciplinam as relações internacionais.
É ramo do Direito Público, aquele que se preocupa com a atuação do Estado na satisfação do interesse público. No direito administrativo, praticamente todos os conceitos têm como base a satisfação do interesse público. No Direito Privado, as relações envolvidas são particulares.
2.2 – Teorias acerca do conceito de direito administrativo
Há divergência na doutrina quanto ao conceito de direito administrativo. Tal conceito, em razão disso, deve ser explicado por meio das diversas teorias acerca do Direito Administrativo. A dificuldade está na definição do objeto.
2.2.1 – escola legalista ou exegética
A escola legalista (ou exegética) dizia que o direito administrativo teria como objeto de estudo o conjunto de leis (a lei “seca”). A escola não foi acolhida no Brasil, tendo a doutrina entendido que o direito administrativo estuda princípios e leis. Surgiram daí várias teorias.
2.2.2 – escola do serviço público
Para a escola do serviço público, o objeto de estudo do direito administrativo é o serviço público. Entretanto, naquele momento, serviço público representava toda a atuação do Estado, inclusive nas áreas ligadas às atividades industriais e comercias do Estado. Essa teoria não foiacolhida pela doutrina brasileira, na medida em que o conceito é amplo demais e acabava com os demais ramos do Direito Público.
2.2.3 – critério do Poder Executivo
O critério do Poder Executivo é muito exigido em provas da Fundação Carlos Chagas. Para ele, o direito administrativo somente estuda a atuação do Poder Executivo. Não estuda a atuação dos Poderes Judiciário e Legislativo, ao atuarem administrativamente.
Na verdade, o direito administrativo estuda a atividade administrativa, independentemente do poder que a exerça, razão pela qual esta corrente acabou também por não ser aceita.
2.2.4 – critério das relações jurídicas
Para o critério das relações jurídicas, o direito administrativo rege todas as relações jurídicas entre Estado e administrado.
Todavia, o conceito é bastante amplo, pois o direito administrativo não disciplina todas aquelas relações.
2.2.5 – critério teleológico
Segundo o critério teleológico, o direito administrativo significa um conjunto harmônico de regras e princípios. O critério foi aceito na doutrina por Oswaldo Aranha Bandeira de Mello. Todavia, apesar de acatado, foi tido como insuficiente, dependente de complementação (ex.: regras e princípios com qual objeto?).
2.2.6 – critério residual ou negativo
Segundo o critério residual ou negativo, o conceito de direito administrativo obtém-se por exclusão. O objeto do direito administrativo obtém-se da exclusão das funções jurisdicional e a legislativa. Foi aceito pela doutrina, mas também considerado insuficiente, dependente de complementação.
2.2.7 – critério de distinção entre a atividade jurídica e a atividade social do estado
Para este critério, o conceito de direito administrativo dependia da distinção entre as atividades jurídica e social do Estado. O direito administrativo não se preocupa com a atividade social do Estado, mas somente com a jurídica (a implantação jurídica das políticas públicas). A atividade social seria estudada pela economia, sociologia, psicologia etc. Foi também aceito no Brasil, mas tido por insuficiente.
2.2.8 – critério da Administração Pública (Hely Lopes Meirelles)
Trata-se de uma soma dos critérios anteriores, aceitos, porém considerados insuficientes.
Para este critério, direito administrativo é o conjunto harmônico de regras e princípios (chamado hoje pela doutrina de Regime Jurídico Administrativo) que rege os órgãos e os agentes no exercício da atividade administrativa, tendentes a realizar, de forma direta, concreta e imediata os fins desejados pelo Estado.
É o critério mais aceito no Brasil.
2.3 – Elementos do conceito de Hely Lopes Meirelles
2.3.1 – fins desejados pelo Estado
Quem define os objetivos (fins) do Estado é o direito constitucional (se é o social ou não, se haverá política a favor do idoso, das crianças e adolescentes etc.). Por isso é muito comum a união das disciplinas em provas de concurso.
2.3.2 – realização de forma direta, concreta e imediata
O que significa realizar de forma direta, concreta e imediata os fins desejados pelo Estado?
O que diferencia a função direta da indireta do Estado é o fato de que ela independe de provocação. A função jurisdicional é dependente de provocação, na medida em que inerte (o Juiz só trabalha se instado).
Realizar de forma concreta os fins desejados pelo Estado significa que a função administrativa produz efeitos concretos, com destinatários determinados (ex.: José é nomeado para determinado cargo público; o imóvel de João é desapropriado). Esse raciocínio exclui, dessa forma, a função legislativa (abstrata) do Estado.
Cumpre observar que, quando fala realização dos fins do Estado de forma direta e concreta, Hely está aplicando o critério residual.
Realizar de forma imediata significa realizar de forma jurídica, enquanto que realizar de forma mediata significa se preocupar com a atuação social (a atuação social seria, portanto, mediata). Veja que, aqui, Hely aplica o critério de distinção entre as atividades jurídica e social do Estado.
3 – Fontes do direito administrativo
Fonte do direito administrativo é aquilo que leva à criação de uma regra de direito administrativo.
3.1 – Lei
A primeira fonte do direito administrativo é a lei, entendida aqui como qualquer espécie normativa (ou seja, lei em sentido amplo): Lei Ordinária, Lei Complementar, Emendas Constitucionais, Medidas Provisórias etc.
O ordenamento jurídico brasileiro está organizado de forma escalonada, hierarquizada. Isso significa que há normas superiores e inferiores, numa pirâmide, em cujo topo estão as normas constitucionais e em cuja base estão os regulamentos (atos administrativos).
Acerca dessa estrutura, cabe uma observação importante: segundo o STF, um regulamento tem de ser compatível com a lei e a lei com a Constituição Federal, mas ambos devem ser compatíveis com a Constituição Federal. Essa estrutura escalonada foi definida pelo STF como “relação de compatibilidade vertical”.
3.2 – Doutrina
Doutrina é o resultado do trabalho dos estudiosos. O direito administrativo não possui um código. A legislação é esparsa e a doutrina não se resolve, o que ressalta a importância extrema da jurisprudência.[7: Nem todas as divergências doutrinárias serão estudadas neste curso, somente as principais.]
3.3 – Jurisprudência
Jurisprudência é o entendimento consolidado dos tribunais, decorrente de julgamentos reiterados sobre determinada matéria, sempre no mesmo sentido. Não se trata de uma decisão isolada. A consolidação da jurisprudência leva à edição de uma Súmula. Hoje, há no Brasil há aquelas que indicam (sinalizam uma orientação) e as que obrigam (Súmulas Vinculantes).[8: Recomenda-se a leitura das Súmulas Vinculantes, pois várias são de direito administrativo. Muitos concursos estão simplesmente copiando os textos nas provas.]
No Brasil, a partir da reforma do Judiciário, passou despercebido o instituto da repercussão geral, que possui efeito vinculante. Esse tema é importantíssimo, e será estudado em processo civil. Quando determinada matéria de repercussão geral chega ao STF, a repercussão é declarada e o mérito é julgado. São duas decisões, e a segunda é vinculante.[9: No site do STF, no ícone jurisprudência, há uma linha repercussão geral e outra chamada mérito julgado. Esta linha deve ser acompanhada. Há também uma ferramenta que explica a decisão, no próprio site.]
3.4 – Costume
Costume é a prática habitual de determinada conduta, acreditando-se ser ela obrigatória. No Brasil, o costume não cria nem exime a obrigação (ex.: pagamento de imposto não pode ser eximido pelo costume).
3.5 – Princípios Gerais do Direito
Princípios gerais do direito são regras previstas no alicerce da ciência. Muitas vezes, estão implícitas no ordenamento jurídico, mas devem ser respeitadas pelos diversos ramos (ex.: quem causar dano a outrem deve indenizá-lo, é vedado o enriquecimento ilícito, ninguém pode beneficiar-se da própria torpeza etc.).
4 - Sistemas administrativos (ou mecanismos de controle)
Praticado um ato administrativo, quem pode revê-lo, controlá-lo? No direito comparado, encontram-se os sistemas do contencioso administrativo e da jurisdição única.
4.1 – Contencioso Administrativo (ou Sistema Francês)
No Contencioso Administrativo (ou Sistema Francês), o ato administrativo é controlado ou revisto pela própria Administração. Mas a administração controla o ato como regra.
Nos países que adotam esse sistema, excepcionalmente o Poder Judiciário realiza tal controle, por exemplo: i) nas atividades públicas de caráter privado (atividades realizadas pelo Estado, sujeitas a regime jurídico privado, como um contrato de locação entre e Estado e particular); ii) nas ações que envolvam estado e a capacidade das pessoas; iii) nas relações ligadas à propriedade privada; iv) nos atos que dizem respeito à repressão penal.
4.2 – Jurisdição Única (ou Sistema Inglês)
Na Jurisdição Única (ou Sistema Inglês), quem pode rever ou controlar o ato administrativo é o Poder Judiciário. Nesse caso, o controle definitivo é do Poder Judiciário, masa Administração também controla seus atos (controle esse, vale ressaltar, revisível pelo Poder Judiciário).
Conforme será visto adiante, o controle judiciário é um controle de legalidade. O Sistema Inglês é o adotado no Brasil desde o início da história da administração brasileira até hoje. Houve somente uma experiência de contencioso administrativo, em 1977, com a EC nº 7. A despeito de haver sido introduzido o Sistema Francês, a regra nunca saiu do papel, nunca foi implantada.
5 – Regime jurídico administrativo
5.1 - Conceito
Regime jurídico administrativo é o conjunto harmônico de regras e princípios que compõem o direito administrativo.
Não há consenso acerca de quais e quantos seriam os princípios de direito administrativo. É tema incipiente, que merece ainda bastante discussão. Para que um princípio seja incluído na lista, ele deve guardar correlação lógica, coerência, coincidência com os demais. Eles estão sempre de braços dados.
O administrador que realiza propaganda pessoal, por exemplo, viola vários princípios de direito administrativo: legalidade, moralidade, impessoalidade, eficiência, indisponibilidade do interesse público, supremacia do interesse público. Isso ocorre justamente em virtude dos vários pontos de coincidência entre os princípios.
5.2 – Teoria da ponderação dos interesses
Os doutrinadores mais modernos já começam a aplicar a teoria da ponderação dos interesses no direito administrativo.
No ordenamento jurídico há regras e princípios. Quando aplicada na situação concreta uma regra, ela exclui a aplicação das demais. Ou seja, se para o caso concreto aplica-se a regra “A”, as demais estão automaticamente excluídas.
Em se tratando de princípios, não há um de direito administrativo que seja absoluto, verdadeiro, se sobreponha aos demais. Todos são importantes. No mesmo caso concreto, pode haver vários princípios incidentes. Aqui, não há exclusão, eliminação, nulidade. É possível que, verificado o caso concreto, a partir da ponderação dos interesses haja prevalência ou predominância de um deles. Esta é uma teoria que está surgindo, é recente, nova, não aceita pela totalidade dos doutrinadores.
A partir de 1988, o concurso público tornou-se obrigatório para o preenchimento de cargo público. A nomeação de um servidor para cargo público sem concurso será ilegal, inválida. A anulação desse ato de nomeação é aplicação do princípio da legalidade.
Agora, pode ser mantido no cargo o servidor, nomeado em 1989 (sem concurso) que chega 20 anos depois ao STJ, sem que tenha dado causa à ilegalidade? Como deixará de ser servidor público 20 anos depois da ilegalidade a que ele não deu causa? Em virtude da prevalência dos princípios da segurança jurídica e boa-fé sobre a própria legalidade, o STJ, num caso concreto, manteve os servidores no cargo.
Essa é a ideia da ponderação de interesses. Não há princípio absoluto. A questão será discutida com mais cuidado adiante.
5.3 – Interesse público
5.3.1 – conceito
Segundo Celso Antônio Bandeira de Melo, público é o interesse dominante dentro da relação social, que predomina entre os seres da sociedade, que representa a vontade coletiva. É o somatório dos interesses individuais, dos seres em sociedade (sem egoísmo), desde que represente a vontade da maioria.[10: Além do próprio livro de Celso Antonio, ver, acerca do conceito de interesse público, o artigo de Alice Gonzáles Borges, “Supremacia do Interesse Público”, que pode ser encontrado nos sites Injur e www.marinela.ma.]
5.3.2 - interesse público primário e secundário
Interesse público primário significa a vontade social, a vontade do povo propriamente dita. É aquilo que quer o povo, a sociedade. Interesse público secundário é a vontade do Estado enquanto pessoa jurídica.
Ex.: tanto o indivíduo quanto o Estado desejam uma carga tributária justa. O ideal é a coincidência dos interesses públicos, primário e secundário. Na prática, todavia, os interesses nem sempre coincidem, devendo prevalecer, nesse caso, sempre o primário (CESPE).
5.4 – Dos princípios administrativos
Segundo Celso Antonio Bandeira de Melo, a supremacia do interesse público e a indisponibilidade do interesse público são os mais importantes princípios de direito administrativo. São as bases, as colunas, a “pedra de toque” da disciplina.
No caput do art. 37 da CR, encontram-se os princípios mínimos do direito administrativo: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (“LIMPE”):
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (...)
O dispositivo foi objeto de alteração pela Reforma Administrativa do Estado (EC 19/1998), tendo sido, na ocasião, inserido o princípio da eficiência. A administração pública, direta ou indireta, de todas as pessoas jurídicas de direito público (de todos os Poderes), está sujeita àqueles princípios.
Há outros princípios, igualmente importantes, que não estão no caput do art. 37 da CR, mas serão também estudados neste tópico.
5.4.1 – princípio da supremacia do interesse público
Supremacia do interesse público é a superioridade do interesse público em face dos interesses individuais, particulares.
Em razão desse princípio, o ordenamento jurídico brasileiro traz algumas prerrogativas à administração pública, um tratamento diferenciado. Quase todos os institutos de direito administrativo têm um fundamento na supremacia do interesse público.
Exemplos:
i) o ato administrativo possui auto-executoriedade justamente em virtude da supremacia do interesse público. O Poder Público pode realizar a interdição de uma padaria que descumpre normas sanitárias sem ordem judicial;
ii) poder de polícia de fechar uma boate que descumpre normas de emissão de som. Poder de policia também reflete a supremacia do interesse público;
iii) cláusulas exorbitantes do contrato administrativo;
iv) poder de requisição de bens particulares, mediante indenização, se houver dano (art. 5º, XXV, CR):
Art. 5º (...) XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;
v) desapropriação de bens particulares.
Importante destacar que a supremacia é do interesse público, não do administrador ou da máquina estatal (CESPE).
Para corrente doutrinária minoritária, o princípio da supremacia do interesse público deveria ser eliminado, desconstruído, pois justifica a arbitrariedade do administrador, que, valendo-se dele, pratica abusos.[11: Marçal Justen Filho e Gustavo Amorim.]
A maioria dos autores, todavia, entende que o problema não é de eliminação ou desconstrução, mas de aplicação correta e efetiva do princípio. Aplicado devidamente, não haverá a ilegalidade e, por consequência, a eliminação da supremacia do interesse público.
5.4.2 – princípio da indisponibilidade do interesse público
O princípio da indisponibilidade funciona como freio às prerrogativas conferidas pelo princípio da supremacia do interesse público. O interesse público não está no âmbito de liberdade e disponibilidade do administrador. Ele exerce função pública (exercício de atividade em nome o no interesse do povo). O interesse não pertence ao administrador, que é um mero representante daquele interesse.
Há um princípio geral de direito que determina que o administrador de hoje não pode criar obstáculos à futura administração, como deixar dívidas e celebrar contratos inexequíveis no final do mandado. O município de São Paulo ficou quase uma semana sem energia elétrica, pois o administrador anterior não deixou dinheiro para o pagamento da dívida pelo posterior.
Exemplos de aplicação prática do princípio:
i) se a administração contrata com fraude ao dever de licitar, ela inviabiliza a melhor proposta e, por consequência, a indisponibilidade do interessepúblico;
ii) a fraude ao dever de concurso público também viola o princípio, pois a administração está jogando fora a oportunidade de escolha dos melhores agentes públicos.
5.4.3 – princípio da legalidade
Estado de Direito é o Estado politicamente organizado que obedece às próprias leis. O princípio da legalidade é, portanto, a base do Estado Democrático de Direito, princípio fundamental dentro do ordenamento jurídico brasileiro.
Caminhando pela CR, observa-se uma repetição bastante grande do princípio (arts. 5º, II, 37, caput, 150, I). A redundância na descrição do princípio serviu justamente para evitar que ele fosse inobservado:
Art. 5º (...) II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
O princípio da legalidade possui dois enfoques diferentes:
i) para o direito privado:
Segundo o enfoque do princípio da legalidade para o direito privado, o particular pode tudo, salvo o que estiver vedado na lei (critério de não contradição à lei).
ii) para o direito público:
Para o direito público, o princípio da legalidade significa que o administrador só pode fazer o que está previsto ou autorizado na lei. Ele não tem liberdade. É o chamado “critério de subordinação à lei”. Segundo Seabra Fagundes “administrar é aplicar a lei de ofício”. Essa é a descrição do princípio da legalidade para o direito público. Ex.: o administrador não pode dar aumento aos seus servidores por meio de decreto ou prever pena de prisão para o caso de descumprimento de contrato administrativo.[12: Texto exigido em concurso organizado pela Fundação Carlos Chagas.]
O princípio da legalidade não é sinônimo do princípio da reserva legal. Para a legalidade, o administrador só pode fazer o que a lei determina. Reserva de lei significa a escolha de determinada espécie normativa. Quando o constituinte reserva matéria a determinada espécie de lei (ex.: lei complementar, lei ordinária) está fazendo reserva legal. A doutrina diz que a legalidade é muito mais ampla que a reserva legal. Escolher a espécie normativa (reserva de lei) é somente um pedaço da legalidade.
Hoje, quando se fala em controle de legalidade ou revisão da legalidade do ato administrativo, fala-se em legalidade no sentido amplo: controle do ato não somente em face da lei, como das regras e princípios constitucionais. Dizer que um ato administrativo viola o princípio da eficiência é realizar controle de legalidade. Essa informação é fundamental para a compreensão da matéria relacionada ao controle de mérito do ato administrativo, que será analisada adiante.
5.4.4 – princípio da impessoalidade
De acordo com o princípio da impessoalidade, o administrador não pode buscar interesses pessoais, próprios, dos parentes ou dos amigos. Ou seja, tem de agir com ausência de subjetividade. Há diversos exemplos de institutos expressos na CR que representam o princípio da impessoalidade, como a exigência de licitação e de concurso público. [13: Vale observar que concurso público, segundo o STJ, não é modalidade de licitação, pois tem por objetivo o provimento de cargo público. O concurso a que se refere a Lei 8.666/1993 serve para a escolha de trabalho técnico ou científico, com prêmio como contraprestação.]
A impessoalidade, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, traduz a ideia de que a administração tem que tratar a todos sem discriminações, benéficas ou detrimentosas, não sendo toleráveis favoritismos ou perseguições. Simpatias ou animosidades, pessoais, políticas ou ideológicas não podem interferir na atividade administrativa.
A ideia da não discriminação também agrega a de isonomia, mas, como dito, os princípios interpenetram-se. O princípio da impessoalidade está ligado ao da isonomia ou igualdade constitucional, assim como o da moralidade está ligado ao da lealdade e boa-fé.
A certidão negativa de débitos da Fazenda Municipal é expedida pelo Município, e não pelo servidor que a forneceu. A impessoalidade, portanto, traduz a ideia de que os atos administrativos não são do agente, mas da pessoa jurídica a que o agente pertence. Adiante, será analisada a responsabilidade civil da pessoa jurídica de direito público.
Já foi exigida em prova de concurso (MP/PE) dissertação acerca da diferença entre os princípios da impessoalidade e da finalidade.
Há divergência na doutrina acerca do conceito de finalidade. Para a doutrina clássica (Hely Lopes Meirelles), o princípio da impessoalidade é sinônimo da finalidade, tendo aquele vindo com a CR para substituir os velhos princípios da finalidade e da imparcialidade.
Celso Antônio Bandeira de Mello, um bom nome da doutrina moderna, entende que os princípios são autônomos, separados. Impessoalidade é a ausência de subjetividade. Finalidade é a busca, pelo administrador, do objetivo, do espírito, da vontade maior da lei.
É possível ao administrador aplicar a lei sem obedecer ao seu espírito? Dá pra separar? Parece que não. Na verdade, os autores modernos dizem que cumprir o espírito da lei liga-se à ideia de legalidade, de modo que a finalidade estaria ligada a esse princípio.
Reforçando essa posição, o art. 2º da Lei 9.784/1999 (lei que regula o processo administrativo federal), trata do princípio da finalidade enquanto princípio autônomo, ligado à legalidade:
Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. (...)
É a posição que prevalece hoje, para fins de concurso. Hely Lopes Meirelles faleceu em 1990 (antes da Lei de Processo Administrativo, portanto). Em prova da Fundação Carlos Chagas (concurso técnico), já foi exigida a corrente tradicional.
5.4.5 – princípio da moralidade
Segundo a doutrina brasileira, o princípio da moralidade tem conceito vago, indeterminado. Isso traz grande dificuldade ao julgador na hora de aplicar o princípio de forma isolada. Dificilmente são encontrados julgados anulando ato administrativo somente com base nesse princípio. Ele vem sempre amarrado a outros.
Todavia, apesar de vago, o princípio da moralidade traduz a ideia de honestidade, ética (obediência aos princípios éticos), probidade administrativa (sem corrupção, safadeza), lealdade (aos princípios, ao interesse público), boa-fé, correção de atitudes (ser uma pessoa correta).
A violação à moralidade caracteriza improbidade administrativa (art. 11 da Lei 8.429/1992, que veda a violação a princípios da administração):
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: (...)
A moralidade administrativa é igual à comum? Moralidade comum, na vida em sociedade, envolve a correção de atitude dentro das regras do convívio social (que disciplinam o certo e errado). Ex.: minissaia na igreja e adultério violam a moral comum. A moral administrativa, entretanto, é mais rigorosa do que a comum. Além da correção de atitude, o administrador tem de ser o melhor administrador possível. Ele tem de agir sempre de acordo com a boa administração. Entre três escolhas permitidas pela lei, a que ele faz tem de ser a melhor. Boa administração liga-se também e principalmente ao princípio da eficiência. É, mais uma vez, a ideia da interpenetração dos princípios.
O nepotismo é a proibição do parentesco dentro da administração pública. Praticamente todos os estatutos de servidores proíbem o nepotismo. A história, todavia, começa a ganhar repercussão a partir da EC 45/2004, que introduziu a reforma do poder judiciário e criou o CNJ e o CNMP. São dois órgãos que exercem o controle da atividade administrativa nos âmbitos do Judiciário e doMP, respectivamente. Uma das primeiras providências tomadas por esses órgãos foi a proibição do nepotismo[14: Acerca do nepotismo, ver as Resoluções nºs 7, 9 e 21 do CNJ e 1, 7, 21 e 28 do CNMP.]
A vedação do nepotismo caiu como uma bomba no Poder Judiciário, pois os Tribunais simplesmente se recusaram a cumprir as Resoluções. Além disso, na ocasião, começou a haver nepotismo cruzado (“ajuste mediante designações recíprocas”), inclusive entre poderes (Judiciário com Executivo).
O CNJ passou então a determinar a exoneração de servidores. A matéria foi sujeita a controle de constitucionalidade através da ADC 12, que resolveu três questões importantes sobre nepotismo:
i) a proibição de nepotismo é regra constitucional, na medida em que representa a aplicação de princípios constitucionais, fundamentando-se em, pelo menos, quatro deles: moralidade, impessoalidade, eficiência e isonomia;[15: Vale observar que, antes da decisão, era admitida como correta a assertiva segundo a qual o nepotismo derivaria apenas do princípio da moralidade. Por isso, deve-se atentar para as provas mais antigas, que estão desatualizadas no tema.]
ii) o CNJ foi criado justamente para controlar a atividade administrativa, e nomear servidor é atividade administrativa, de modo que o CNJ pode realizar esse controle;
iii) Resolução é o ato normativo de que o CNJ dispõe para a realização do controle, de modo que a matéria pode ser tratada por meio desse tipo de ato normativo.
Por ocasião do julgamento da ADC 12, restou no STF uma grande vontade de legislar sobre o assunto. Todavia, como o tribunal não tem esse poder, editou a Súmula Vinculante nº 13:
Súmula Vinculante nº 13 – A NOMEAÇÃO DE CÔNJUGE, COMPANHEIRO OU PARENTE EM LINHA RETA, COLATERAL OU POR AFINIDADE, ATÉ O TERCEIRO GRAU, INCLUSIVE, DA AUTORIDADE NOMEANTE OU DE SERVIDOR DA MESMA PESSOA JURÍDICA INVESTIDO EM CARGO DE DIREÇÃO, CHEFIA OU ASSESSORAMENTO, PARA O EXERCÍCIO DE CARGO EM COMISSÃO OU DE CONFIANÇA OU, AINDA, DE FUNÇÃO GRATIFICADA NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA EM QUALQUER DOS PODERES DA UNIÃO, DOS ESTADOS, DO DISTRITO FEDERAL E DOS MUNICÍPIOS, COMPREENDIDO O AJUSTE MEDIANTE DESIGNAÇÕES RECÍPROCAS, VIOLA A CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
Súmula Vinculante foi criada para resolver grandes controvérsias (milhões de ações no mesmo sentido), depois de um posicionamento cristalizado na jurisprudência. O grande precedente da Súmula foi, na verdade, a ADC 12. Não tem nada de consolidado e o enunciado é extenso e confuso.
O STF também anda interpretando essa Súmula. Não deveria, pois deveria ser o final da interpretação, e não a norma a ser interpretada. Segundo o texto, não pode ser nomeado o cônjuge ou companheiro, o parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o 3º grau, inclusive. A ideia do nepotismo é proibir o parentesco dentro do concurso. Não pode haver parentesco entre a autoridade nomeante e o nomeado, desde que o nomeado vá exercer cargo em comissão (ou de confiança) ou função gratificada.
Cargo em comissão era antigamente chamado de cargo de confiança. A nova nomenclatura veio com a CR/88. Cargo em comissão, portanto, é o baseado na confiança, com livre nomeação e exoneração. Pode ser preenchido por qualquer pessoa, que receberá a remuneração correspondente ao cargo. Ele serve para direção, chefia ou assessoramento. Função gratificada é a função de confiança, baseada, evidentemente, na confiança. Pode ser ocupada somente por quem tem cargo efetivo, por haver prestado concurso e estar na carreira. O sujeito recebe a remuneração do cargo, acrescida de uma gratificação em virtude da função de confiança. Essa função também serve para direção, chefia e assessoramento.
Não importa o cargo que o nomeante exerça. Se entre ele e o nomeado houver parentesco, a nomeação está proibida.
A Súmula Vinculante nº 13 também proíbe a hipótese em que há relação de parentesco, na mesma pessoa jurídica, entre servidores que ocupem cargos em comissão e função gratificada (de direção, chefia ou assessoramento). Segundo a Marinela:
i) cargo x cargo: vedado;
ii) cargo x função: vedado;
iii) função x função: não é vedado (há autores que dizem que também é vedado).
A proibição independe de quem vá nomear.
A parte final da Súmula veda o ajuste mediante designações recíprocas (troca de parentes). É o nepotismo cruzado.
Não há ferramentas no país para a fiscalização da Súmula. Ela se tornou uma piada. O Prefeito pode nomear um irmão Secretário de Saúde e outro irmão Secretário de Educação? Para o STF, pode. Os agentes políticos estão fora da proibição. Quando um dos ex-presidentes do STF assumiu, nomeou marido e mulher para dois cargos em comissão dentro do próprio STF. A resposta dele para a sociedade foi: a Súmula tem enunciado péssimo, tendo de ser revista. E o marido e a mulher continuam lá. Moral da história: nem o STF está cumprindo a Súmula por ele criada. Que dirá o resto do país.
5.4.6 – princípio da publicidade
Publicidade significa dar conhecimento ao titular do direito do que está acontecendo com os direitos e interesses dele.
O administrador está lá para representar dos interesses do povo. A publicidade vem da ideia de que o poder emana do povo. Publicidade é, portanto, ciência, conhecimento ao titular do direito. Além de ciência, a publicação é condição de eficácia dos contratos administrativos (dele depende o início de produção de efeitos). Um contrato administrativo não publicado é ineficaz. A regra está escrita de forma expressa no art. 61, parágrafo único, da Lei 8.666/1993:
Art. 61 (...) Parágrafo único. A publicação resumida do instrumento de contrato ou de seus aditamentos na imprensa oficial, que é condição indispensável para sua eficácia, será providenciada pela Administração até o quinto dia útil do mês seguinte ao de sua assinatura, para ocorrer no prazo de vinte dias daquela data, qualquer que seja o seu valor, ainda que sem ônus, ressalvado o disposto no art. 26 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)
Consequência dessa regra é que a publicidade representará o termo inicial da contagem de determinados prazos. Na verdade, o conhecimento é sempre o marco inicial da contagem de prazos (ex.: notificação da lavratura de auto de infração de trânsito).
A publicidade é, portanto, o instrumento que viabiliza o controle dos atos da administração pública. As contas públicas, por exemplo, têm de estar disponíveis por 60 dias para conferência, fiscalização, controle e cobrança. A licitação, na modalidade convite, tem publicidade. O que não há é publicação de edital, de instrumento convocatório. Publicidade é algo muito mais amplo que publicação. A licitação de portas abertas, a ciência pessoal ao interessado e a fixação de carta-convite no átrio do edifício da administração representam outras formas de publicidade.
São exceções ao princípio da publicidade: 
i) art. 5º, X, da CR:
Art. 5º (...) X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
Intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas são direitos que devem ser preservados, se em contraposição com a publicidade dos atos administrativos.
ii) art. 5º, XXXIII, da CR:
Art. 5º (...) XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; 
Há certas informações, como a descoberta de um ataque terrorista, que podem ser negadas em nome da segurança da sociedade e do Estado. É a hipótese mais aceita na doutrina e a que mais cai em concurso.
iii) art. 5º, LX, da CR:
Art. 5º (...) LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;
Atos processuais correm em sigilo, na forma da lei. Normalmente, as pessoas relacionam o inciso LX aos atosjurisdicionais, mas a hipótese ocorre também no caso de processos administrativos. Ex.: o médico processado por suposto erro médico, em decorrência do qual houve morte, terá sua carreira destruída, antes mesmo da condenação. O processo ético corre em sigilo para evitar que a carreira do profissional seja comprometida até o final do processo administrativo, em vista da presunção de inocência.
Importante ressaltar que o remédio constitucional que permite ao cidadão a obtenção de informações de seu interesse nos órgãos públicos, como a de uma empresa que pretende adquirir, não é o habeas data, que serve para a obtenção ou correção de informações da sua pessoa, mas o Mandado de Segurança, que tutela direito líquido e certo à informação.
Segundo Marinela, o art. 37, § 1º, da CR é uma das piadas da disciplina administrativa constitucional brasileira:
Art. 37 (...) § 1º - A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.
A publicidade é um dever do administrador público. A não publicação dos atos é hipótese expressa de improbidade administrativa (art. 11 da Lei 8.429/1992). O ato não publicado, em geral, envolve uma violação legal (uma “maracutaia”). O dever de publicidade tem de ter caráter educativo, informativo e de orientação social. A propaganda que trata de realizações da administração é permitida. O dispositivo veda, todavia, a promoção pessoal. Símbolos próprios da campanha não podem ser transferidos para as publicações da administração. O administrador que, durante a campanha, usa determinada cor, se utilizar a mesma cor para pintar a cidade toda, praticará campanha pessoal.[16: Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: (...) IV - negar publicidade aos atos oficiais;]
Exemplos:
i) o número “8” que ficava pulando no canto da tela em propaganda do governo federal, na época da reeleição;
ii) o agradecimento anônimo feito em placas iguais espalhadas ao longo do estado é promoção pessoal, ainda que o político as tenha pago com o dinheiro próprio;
iii) o administrador não pode se utilizar de algo que é obrigação dele, como a execução de determinada obra, para promoção pessoal;
iv) prefeito que coloca o nome dele no prédio da Procuradoria do Município também comete improbidade. 
Segundo a jurisprudência do STJ, constar o nome do administrador na placa informativa de determinada obra não caracteriza promoção pessoal. É preciso que haja efetivamente intenção de se promover. Deve-se aplicar o bom senso na solução desses casos.
5.4.7 – princípio da eficiência
O princípio da eficiência ganhou status de princípio expresso na CR a partir da EC 19/1998 (Reforma Administrativa). Antes de 1998, ele já estava na CR, enquanto princípio implícito. Sempre houve o dever e obrigação de eficiência. [17: Questão cruel do CESPE previu em determinada questão que o princípio da eficiência teria sido introduzido na CR pela EC 20/1998. A EC 20/1998, na verdade, é a Reforma da Previdência, que mexeu com a administração, mas com aspectos relacionados à aposentadoria dos servidores.]
A exigência de eficiência já era regra expressa na lei infraconstitucional (art. 6º, § 1º, da Lei 8.987/1995, que cuida de concessão e permissão de serviço público):
Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.
§ 1º Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas. (...)
Eficiência significa produtividade, economia, ausência de desperdícios, agilidade, presteza, boa administração. 
Não bastou, entretanto, introduzir o princípio no caput do art. 37 da CR. O constituinte tinha consciência da necessidade da criação de mecanismos com o objetivo de efetivá-lo, concretizá-lo, torná-lo realidade. Importa destacar três dessas medidas:
i) mudança da regra de estabilidade do servidor (art. 41,da CR, realizada pela EC 19/1998):
Art. 41 (...) § 4º Como condição para a aquisição da estabilidade, é obrigatória a avaliação especial de desempenho por comissão instituída para essa finalidade. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
Para adquirir estabilidade, o servidor deve ser aprovado em concurso, ser nomeado para cargo efetivo, ter três anos de exercício e ser aprovado em avaliação especial de desempenho. Essa avaliação veio juntamente com a ideia de eficiência. Foi a primeira medida na busca da eficiência. O problema é que no Brasil a avaliação não é feita, pois depende da regulamentação na lei da carreira, e muitas das leis não têm ainda tal previsão.
O servidor perde a estabilidade através de: processo administrativo, com contraditório e ampla defesa; processo judicial, com trânsito em julgado; e uma avaliação periódica de desempenho (próxima medida);
ii) perda da estabilidade através de avaliação periódica de desempenho (condição para permanência no cargo):
Art. 41. (...) § 1º O servidor público estável só perderá o cargo: 
III - mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
A avaliação periódica de desempenho já existia no serviço público, mas era mera formalidade, não tinha força de retirar a estabilidade do servidor. Até hoje, contudo, essa avaliação não foi regulamentada nas leis das carreiras. As mudanças foram boas, mas não foram ainda implantadas.
iii) previsão de um limite para gastos com pessoal:
O administrador não pode gastar tudo o que arrecada com pessoal. Não sobraria para investimentos, infraestrutura e demais gastos. Muitos municípios chegavam a se endividar para pagar folha de pagamento. Eram verdadeiros cabides de emprego. Em razão disso, outra alteração para a efetivação da regra da eficiência foi a alteração do art. 169 da CR, prevendo limite de gastos com pessoal:
Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar. (...)
A CR remeteu a matéria à lei complementar, que, no caso, é a Lei de Responsabilidade Fiscal, que prevê um limite de gastos com pessoal de até 50% do orçamento, para a União, e de até 60% do orçamento, para estados, DF e municípios.
Com a edição da lei, muita gente teve de ser mandada embora, tendo o novo art. 169 da CR determinado a forma de limpeza de pessoal, para a adequação à nova realidade legal. O primeiro critério da lista era a dispensa dos cargos em comissão e funções de confiança. Determinou-se que seria feito o corte de pelo menos 20% dos cargos daquela natureza. Os segundos a serem exonerados seriam os servidores não estáveis, quantos e quais o administrador bem entender, de acordo com a desnecessidade daquele funcionário. O cargo seria extinto e não seria colocada outra pessoa no lugar. Depois de esgotados todos os não estáveis é que o administrador poderia passar à categoria dos servidores estáveis (quantos fossem necessários, de acordo com a desnecessidade).
O servidor, nesses casos, não foi demitido, mas exonerado. Demissão é pena, sanção para a prática de infração grave. Cuidado com os erros da imprensa a esse respeito. A sequência descrita acima é obrigatória. A classe seguinte só poderia ser atingida depois de esgotada a anterior. Para evitar vinganças e perseguições do administrador ao enxugar a máquina, foi editada regra segundo a qual o cargo extinto somente poderia ser recriado de forma idêntica ou com funções assemelhadas,quatro anos após a extinção. Somente o servidor estável teria direito à indenização.
A eficiência tem de se apresentar em dois momentos diferentes: i) quantos aos meios: gastar o menos possível; e ii) quanto aos resultados: obter o melhor resultado possível. O equacionamento entre os meios e resultados é aplicação da eficiência.
Apesar de todos esses instrumentos, a doutrina entende que o conceito é fluido demais, muito vulnerável, o que dificulta a sua aplicação. Tudo não passou de uma utopia, um sonho do constituinte de 1998, que até agora não se tornou realidade no Brasil, ainda que a situação já esteja muito melhor do que antes, em termos de eficiência da administração.
5.4.8 – princípio da isonomia[18: Os princípios que serão estudados adiante estão fora do caput do art. 37.]
Isonomia significa tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual, na medida das suas desigualdades. Quem são os iguais? E os desiguais? E a medida da desigualdade? O difícil do princípio não é conceituar, mas preencher o seu conteúdo.
Deve-se verificar o fator de discriminação e sua eventual compatibilidade com a finalidade, o objetivo da norma. Em caso afirmativo, haverá isonomia; caso não haja, não haverá isonomia. Ex.: determinado município faz concurso para salva-vidas, excluindo a possibilidade de participação de um deficiente físico de cadeira de rodas. Essa previsão não viola a isonomia, na medida em que o deficiente não desenvolveria bem a função. Há compatibilidade com o objetivo da norma. O concurso da policia civil, para função administrativa, que exclui o deficiente físico de cadeira de rodas compromete a isonomia, em virtude da incompatibilidade com o objetivo da norma. Isso porque o deficiente, nessa hipótese, poderá exercer o cargo administrativo sem problemas. Não viola a isonomia o concurso para a polícia feminina que exclui homens do certame.
Para que o requisito conste no edital, tem de estar na lei da carreira e ser compatível com as atribuições do cargo que será exercido. Concurso que estabelece limite mínimo ou máximo de idade é constitucional, desde que previsto na lei da carreira, compatível com as atribuições do cargo e previsto no edital.
Exemplos:
i) concurso para delegado da policia em São Paulo proibiu participantes com menos de 1 metro e meio. A regra viola a isonomia e foi retirada do edital, após várias ações;
ii) concurso para gari previa que o candidato deveria possuir ao menos cinco dentes nas arcadas superior e inferior. A regra viola a isonomia e foi retirada do edital;
iii) exame psicotécnico: além de previsão legal e ser compatível com as atribuições do cargo, o exame, para não ferir a isonomia, deve ter previsão no edital, com a devida publicidade dos critérios objetivos fixados e permitir a apresentação de recurso (Informativo 535 do STJ, REsp 1.429.656). Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, ninguém garante que o psicólogo examinador não é mais maluco que o próprio candidato.
iv) prova física: o concurso para Delegado da Policia Federal previa a necessidade de segurar a barra por 10 segundos, para mulheres, e fazer 10 barras, para homens. A exigência não viola o princípio da isonomia, pois estudos técnicos demonstram que a mulher não consegue fazer barras como o homem (isso é tratar os desiguais de forma desigual).
5.4.9 – princípio do contraditório e da ampla defesa
Os princípios do contraditório e da ampla defesa andam sempre juntos. Estão previstos no art. 5º, LV, da CR, inclusive para o processo administrativo:
Art. 5º (...) LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
No processo judicial, não há discussão acerca da existência e da aplicação dos princípios (são princípios já cristalizados). Todavia, na via administrativa os princípios somente surgiram com a CR/88. São recentes para o processo administrativo, ainda representando o maior índice de nulidades nos processos.
Contraditório é a ciência, conhecimento da existência do processo. É o chamamento da parte a integrar o processo. Através dele constitui-se a bilateralidade da relação processual. Citação é a ferramenta que dá ciência no processo civil. A legislação não tem o mesmo primor técnico da via judicial. A lei ora fala em citação, notificação ou intimação. 
O princípio do contraditório é fundamental, está na estrutura do Estado Democrático de Direito. Não dá pra imaginar que alguém perderá o cargo efetivo sem ter ciência do processo contra si ajuizado.
Mas não basta trazer a parte ao processo. Ela precisa participar da tomada de decisão, precisa estar dentro daquela construção. E o faz apresentando defesa. Daí a importância do princípio da ampla defesa. Ele envolve a previsão da oportunização de defesa, num prazo razoável. Mas isso não basta. Há algumas exigências (ou desdobramentos) para que a ampla defesa se concretize, saia do papel:
i) ela deve ser prévia, antecedendo a tomada de decisão.
Para que a defesa anteceda a tomada de decisão, os procedimentos e as penas devem estar predeterminados. Durante muitos anos, no processo penal brasileiro, a defesa prévia dizia basicamente que o réu não cometera o crime. A construção jurídico-teórica vinha nas alegações finais. Se o advogado não soubesse da existência de tal previsão, ele não jogaria bem com as possibilidades do processo, guardando as melhores alegações para o final.
ii) a parte precisa ter direito às informações do processo (ter acesso ao processo).
A jurisprudência determina que a parte tem direito à viabilização da extração de cópias, mediante a reprodução no local ou com vista do processo, em papelaria próxima, com o funcionário acompanhando a parte (a lei veda a realização de carga do processo administrativo).
iii) produção de provas, com a possibilidade de interferência no convencimento do julgador.
Trata-se do direito de produção e de avaliação da prova. A produção probatória não pode ser meramente formal.
iv) direito de recurso (art. 5º, LV, parte final, da CR).
A parte em processo administrativo tem de recorrer, independentemente de previsão de um recurso específico. É garantia de revisão da decisão. A regra do edital que veda recurso em determinada hipótese é inconstitucional.
Situação concreta, julgada pelo STJ: edital previa o prazo de 24 horas para recurso, sem que fosse dado acesso ao candidato do espelho da prova (nota sem motivação). O Judiciário determinou que o candidato tem direito à motivação, que permita a elaboração do recurso. Conceder vista da prova por 15 minutos, no balcão da repartição, não é conceder direito de recurso, não é motivação. O direito de recurso está, portanto, atrelado à motivação, as razões, o motivo para a tomada de determinada decisão.
Houve um exame da OAB em que a 2ª fase vinha corrigida com rabiscos e comentários desagradáveis. Alguns candidatos chegaram a ajuizar ação de indenização contra o examinador.
Em processo administrativo, não se exige defesa técnica.
A presença do advogado durante o processo administrativo sempre foi facultativa. Essa regra está prevista na maioria dos estatutos. A discussão começa a aparecer no processo administrativo disciplinar (PAD). Como ele tem uma finalidade condenatória, sempre se buscam bases, ideias do Direito Penal.
No decorrer dos anos, o STJ consolidou a jurisprudência segundo a qual o advogado contribuía com a regularidade do processo administrativo disciplinar. Começou-se a perceber o aumento das nulidades quando havia advogado nos autos. Evoluiu a tese ao longo dos anos, passo a passo, culminando na edição da Súmula 343:
Súmula 343 - É obrigatória a presença de advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar.
Em razão dessa regra, a ausência do advogado no PAD passou a gerar nulidade. Passou-se a entender que a demissão de servidor em PAD sem advogado era ilegal, de modo que ele teria direito a ser reintegrado no cargo de origem, com todas as vantagens do período em queesteve afastado. Todos os servidores demitidos nos últimos cinco anos que antecederam a Súmula teriam direito a retornar ao cargo de origem, com “poupança”.
A matéria chegou ao STF, que começou a fazer as contas. Por iniciativa mais econômica que jurídica, o STF editou a Súmula Vinculante nº 5:
Súmula Vinculante nº 5 - A FALTA DE DEFESA TÉCNICA POR ADVOGADO NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR NÃO OFENDE A CONSTITUIÇÃO.
Ou seja, a Súmula diz que a defesa técnica é facultativa. A consequência da edição dessa Súmula foi acabar com o entendimento do STJ. Por ser vinculante, ainda que não tenha sido expressamente retirada, a Súmula 343 do STJ não pode ser mais aplicada. Perceba que o STF matou e enterrou uma construção de mais de 10 anos do STJ. 
Na verdade, talvez a grande saída devesse ter sido modular os efeitos da Súmula do STF. Reintegrar todos os servidores traria um problema grave e injusto, mas a matéria não precisaria ter sido morta dessa forma.
O ato administrativo nada mais é que o resultado de um processo. Sempre que ele interfira no direito de alguém, esse sujeito tem o direito de participar dessa tomada de decisão. Ex.: num processo apurando nulidade de concurso, o aprovado tem o direito de dele participar. Esse raciocínio é o que prevalece hoje na jurisprudência (Súmula Vinculante nº 3):
Súmula Vinculante nº 3 - NOS PROCESSOS PERANTE O TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO ASSEGURAM-SE O CONTRADITÓRIO E A AMPLA DEFESA QUANDO DA DECISÃO PUDER RESULTAR ANULAÇÃO OU REVOGAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO QUE BENEFICIE O INTERESSADO, EXCETUADA A APRECIAÇÃO DA LEGALIDADE DO ATO DE CONCESSÃO INICIAL DE APOSENTADORIA, REFORMA E PENSÃO.
O administrador, no final de cada exercício financeiro, presta contas ao Tribunal de Contas. Se o TC percebia alguma irregularidade, chamava o administrador para prestar informações. Ficavam ambos discutindo a regularidade do ato. No final da discussão, por exemplo, de um contrato administrativo, eventual empresa contratante seria diretamente atingida, sem que tivesse participado da discussão. Em razão disso, o STF determinou que o interessado teria de participar daqueles processos, com contraditório e ampla defesa. Essa é a primeira parte da Súmula.
A segunda parte da Súmula prevê uma exceção: “excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão.” Ou seja, o interessado não terá ampla defesa e contraditório no Tribunal de Constas da União, mas terá perante a administração.
O ato administrativo que concede aposentadoria, reforma e pensão é complexo, pois para se aperfeiçoar depende de duas manifestações de vontade, que acontecem em órgãos diferentes: a administração e o TCU. O servidor faz o requerimento, a administração decide e a matéria é levada ao TCU. Se o pedido é indeferido, o contraditório e a ampla defesa acontecem no âmbito da administração.
Não há dois atos no ato complexo, mas um só, que se aperfeiçoa com a segunda manifestação. Logo, haverá somente um contraditório e uma ampla defesa, que, assim como o ato, acontecerão na administração, e não no Tribunal de Contas, não obstante o ato precise da manifestação do TCU para se aperfeiçoar. 
Quando o TCU se manifesta, ele não está retirando o direito do servidor (que ainda não está aperfeiçoado, pois há mera expectativa). Ele está participando da tomada da decisão, da definição da história, da construção do direito. Essa parte final vem sendo bastante criticada, por conta do tempo que o Tribunal de Contas normalmente demora para essa participação na tomada de decisão (até 5 anos).
Na prática, o servidor vai à administração e pede a aposentadoria. Se a decisão da administração for pelo deferimento (1ª manifestação de vontade), o servidor passa a receber a aposentadoria, mas o ato ainda não está perfeito. Ocorre que o TC vinha demorando muitos anos para essa manifestação.
Dois casos foram levados recentemente ao STF (MS 25.116 e MS 26.053). No primeiro, dez anos haviam se passado e o TC não havia realizado ainda o controle. Realizado o controle, o TC apurou irregularidade e mandou o servidor voltar a trabalhar. O STF entendeu que dez anos seria muito tempo para o controle. Entendeu que um prazo razoável para a análise seria de cinco anos (com base na maioria dos prazos prescricionais). Passados os cinco anos, o STF determinou que o TC deveria abrir contraditório e ampla defesa para tomar a decisão. O STF esclareceu que estava, nesse caso específico, temperando a aplicação da Súmula, não tendo ela sido modificada. O segundo julgado foi no mesmo sentido.
Vide o RE n° 594.296/MG com repercussão geral onde o STF assentou a necessidade de contraditório e ampla defesa para que haja revisão de contagem de quinquênios, mais uma vez, dando efetividade ao contraditório e a ampla defesa.
A sumula vinculante n° 21 também é corolário do principio da ampla defesa nos processos administrativos: É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo.
5.4.10 – princípio da razoabilidade e da proporcionalidade
Razoabilidade significa congruência, coerência, lógica. Segundo o princípio, o administrador público não pode agir de forma tresloucada, despropositada. Tem de agir com equilíbrio.
Para os administrativistas brasileiros, contido na razoabilidade está o princípio da proporcionalidade. Proporcionalidade significa equilíbrio. Agir de forma proporcional é agir de forma equilibrada. O administrador que age de forma equilibrada, portanto, também age de forma razoável.
Proporcionalidade é o equilíbrio entre atos e medidas realizadas. O Estado pode dissolver passeata tumultuosa, mas não pode matar 100 pessoas para tanto.
O servidor que pratica uma infração leve deve receber pena leve. Se o Estado aplica pena de demissão a servidor que pratica infração leve, está agindo desproporcionalmente. Deve haver equilíbrio entre atos e medidas.
Proporcionalidade envolve também equilíbrio entre benefícios e prejuízos. Em Maceió, há um projeto para a instalação de um lixão a beira-mar, o que é claramente desproporcional. A providência que causa prejuízo deve, necessariamente, fazer com que a sociedade ganhe mais do que perca.
Razoabilidade e proporcionalidade são princípios implícitos na CR, mas expressos na norma infraconstitucional (art. 2º da lei 9.784/1999):
Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. (...)
Alguns autores sustentam que o art. 5º, LXXVIII (EC 45) traria em seu texto o princípio da razoabilidade, de modo que ela seria expressa na CR. Todavia, o dispositivo refere-se ao prazo razoável do processo. Na verdade, apesar da palavra razoável, para a maioria dos autores o dispositivo não significa princípio da razoabilidade, mas da celeridade do processo, sendo o princípio da razoabilidade ainda implícito na CR.
Razoabilidade e proporcionalidade são hoje dois princípios muito importantes no direito administrativo. Eles estão limitando a liberdade, a discricionariedade do administrador, que só tem a liberdade se duas decisões forem razoáveis, proporcionais.
Imagine que determinado Município necessita de escola e hospital e não possui dinheiro para ambos. O administrador toma a decisão por construir o hospital. Essa decisão é razoável, equilibrada. Caso o mesmo município, em vez de escola e hospital, decidisse construir uma praça, poder-se-ia concluir que a decisão por ele tomada seria violadora dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
Nesses casos de violação do princípio da proporcionalidade, pode o Poder Judiciário controlar a decisão? Para a resposta, é necessária a colocação de duas premissas: i) o Poder Judiciário pode controlar qualquer ato administrativo, no que tange à legalidade, entendida, como visto, em sentido amplo (CR e lei); ii) o Poder Judiciário não pode controlar o mérito(conveniência e oportunidade) do ato administrativo.
O administrador que constrói o hospital em vez da escola, ou a escola em vez do hospital, toma decisão razoável, de modo que o Judiciário não poderá controlá-la. Caso opte por construir a praça, em vez da escola ou hospital, a decisão violará princípios implícitos na CR, de modo que o Poder Judiciário poderá rever o ato, por estar realizando controle de legalidade.
Por vias tortas (caminhos inversos), portanto, o Poder Judiciário acaba atingindo o mérito do ato administrativo. Daí a importância desses princípios. Mas isso não é controle de mérito, ainda que ele acabe atingido.
No Brasil, havia o problema da escolha de política pública: o administrador escolhia a política pública de forma bastante livre. Prevalecia no Judiciário que ele não poderia realizar o controle, por entender que se tratava de controle de mérito do ato administrativo. Depois de tantos desmandos, o Judiciário mudou seu entendimento e passou a entender que, se a política pública for irrazoável ou desproporcional, é possível o controle de legalidade. A esse respeito, ver a ADPF 45, uma decisão muito rica.
5.4.11 – princípio da continuidade
Celso Antônio Bandeira de Mello entende que o Estado tem o dever de prestar a atividade pública. E a atividade administrativa não pode ser interrompida (o serviço público tem de ser prestado de forma contínua e ininterrupta). Assim, se o Estado tem o dever de prestar a atividade pública e ela não pode ser interrompida, esse dever estatal ocorre todos os dias de forma contínua. Dessas afirmações decorre o princípio da continuidade.
Discussão importante diz respeito à relação entre o princípio da continuidade e o direito de greve do servidor público. O servidor público tem direito de greve no Brasil (art. 37, VII, da CR):
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (...)
VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
O dispositivo, todavia, diz que o direito deve ser exercido na forma da lei específica. Lei específica é uma lei ordinária, pois sempre que o constituinte quer lei complementar ele diz expressamente. Até 1998, o dispositivo falava em “lei complementar”. A EC 19/1998 substitui a expressão por lei específica. Específica é a lei criada para disciplinar somente esse assunto. Não pode ela tratar de outros que não o direito de greve dos servidores. Essa lei até hoje não foi criada.
Frente à ausência da lei, pergunta-se: trata-se de norma de eficácia plena, contida ou limitada? Norma de eficácia plena é a que tem aplicação imediata (sem necessidade de lei); norma de eficácia contida é a que possui aplicação imediata, mas a lei poderá restringir ou limitar seu alcance (é também chamada de norma de eficácia restringível ou resolúvel); norma de eficácia limitada é a que garante o direito, o qual, entretanto, não pode ser exercido enquanto não aprovada a lei que o regulamente. O art. 37, VII, da CR é, segundo o STF, é norma de eficácia limitada (o direito de greve somente pode ser exercido se aprovada a lei).
Na verdade, no Brasil, a greve do servidor público foi por muitos anos considerada ilegal. A consequência era, portanto, o desconto dos dias não trabalhados. Muitos mandados de injunção foram ajuizados. O STF entendia que o mandado tinha efeitos declaratórios: ele comunicava ao Congresso Nacional a omissão, o qual acabava se mantendo inerte. O STF entendia que não poderia obrigar o Legislativo a legislar, de modo que o mandado de injunção acabava esvaziado de sentido.
Num episódio de crise de muitos servidores em greve, Lula vai à imprensa e, em rede nacional, diz que seria necessário acabar com o direito de greve (justo ele). Nesse contexto, havia no STF três mandados de injunção a serem julgados. O STF então resolveu dar um basta na situação de omissão. Muda seu entendimento acerca do mandado de injunção, para lhe conferir efeitos concretos, entendendo que aos servidores públicos seria aplicável a Lei de Greve dos trabalhadores comuns, no que coubesse (Lei 7.783/1989). Recomenda-se a leitura das ementas dessas decisões (Mandados de Injunção nºs 670, 708 e 712), que marcaram a história do país e desse remédio constitucional.
Todavia, importante reconhecer que a lei foi elaborada com vistas ao serviço privado, disciplinando situações de particulares, inadequadas à greve dos servidores públicos. É necessária a realização de muitas conciliações, de modo que ainda há muitos problemas a serem resolvidos. Hoje, quem os resolve é o STF, que tem alguns posicionamentos bem delineados, que devem ser acompanhados.[19: Acerca do tema, ver vídeo de Marinela.]
Os mandados de injunção citados trouxeram outro posicionamento que escapa dos que vinham sendo até então adotados. Os mandados de injunção sempre tiveram efeitos inter partes, para o STF. Em razão disso, além do efeito concreto, o Supremo resolveu dar ao remédio efeitos erga omnes, para evitar milhões de ações no mesmo sentido. Todavia, não é todo o mandado de injunção que terá tais efeitos. O STF admitiu a possibilidade de concessão desses efeitos, mas não será sempre assim.
Servidor público que exerce o direito de greve não pode ser demitido do serviço. Demissão é pena por infração grave. Não pode haver publicação de ato determinando demissão coletiva. Se, durante a greve, o servidor pratica infração grave, nesse caso ele pode ser demitido.
Há diversas decisões recentes do STJ no sentido de que não é possível o desconto dos dias no salário do servidor.
Acerca da relação entre o corte do serviço e o princípio da continuidade, a posição que prevalece hoje é a prevista no art. 6º, § 3º, da Lei 8.987/1995 (lei que disciplina a concessão e a permissão de serviço público):
Art. 6º (...) § 3o Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:
I - motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; e,
II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.
Hipóteses:
i) é possível o corte do serviço em situação emergencial (ex.: cidades do Rio de Janeiro ficaram sem energia em virtude do risco de incêndios ou outras situações graves, em decorrência das chuvas de verão);
ii) interrupção do serviço com prévio aviso, quando o usuário desrespeitar normas técnicas, comprometendo a segurança das instalações, e com prévio aviso, em caso de inadimplemento do usuário. 
Relativamente ao inadimplemento, surge o ponto mais crítico do estudo do princípio da continuidade. Há divergência na jurisprudência acerca dos serviços essenciais:
1ª corrente: para a minoria da jurisprudência, o corte não é possível, com base nos arts. 22, caput, e 42, caput, do CDC:
Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. (...)
Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. (...)
2ª corrente (posição majoritária): o corte é possível, mesmo para os serviços essenciais. A ideia é a seguinte: se o Estado é obrigado a prestar o serviço a quem não paga, certamente a prestadora de serviços quebrará, de modo que todos ficarão sem o serviço. Assim, entre o mau-pagador e toda a coletividade ficar sem a o serviço, prefere-se o mau pagador. Isso em virtude da aplicação da supremacia do interesse público e da continuidade do serviço à sociedade. Outro fundamento é a quebra da isonomia: trata-se da prestação do serviço aos desiguais (pagadores e nãopagadores) de forma igual (ambos recebem o serviço).
Há, entretanto, algumas situações excepcionais em que o corte não será possível. Caso o não pagador seja o Estado, o serviço pode ser cortado, para a jurisprudência, resguardados, todavia, os logradouros públicos, hospitais. Além disso, o inadimplente com problema de saúde que necessita de aparelho eletrônico para se manter vivo não pode ter sua energia cortada.
5.4.12 – princípio da autotutela
Pelo princípio da autotutela, a administração pode realizar a revisão de seus próprios atos, quando eles são ilegais (via anulação) ou inconvenientes (via revogação). O princípio está resguardado nas Súmulas 346 e 473 do STF. Uma complementa a outra:
Súmula 346 - A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PODE DECLARAR A NULIDADE DOS SEUS PRÓPRIOS ATOS.
Súmula 473 - A ADMINISTRAÇÃO PODE ANULAR SEUS PRÓPRIOS ATOS, QUANDO EIVADOS DE VÍCIOS QUE OS TORNAM ILEGAIS, PORQUE DELES NÃO SE ORIGINAM DIREITOS; OU REVOGÁ-LOS, POR MOTIVO DE CONVENIÊNCIA OU OPORTUNIDADE, RESPEITADOS OS DIREITOS ADQUIRIDOS, E RESSALVADA, EM TODOS OS CASOS, A APRECIAÇÃO JUDICIAL.
Também decorre do art. 53 da Lei 9.784/1999:
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.
Essa é a ideia central do princípio da autotutela. Todavia, Maria Sylvia Zanella di Pietro entende que o princípio também caracteriza dever de cuidar dos seus próprios bens e do seu patrimônio. É o dever de cuidado, de zelo.
No Informativo n° 763 do STF foi veiculada decisão demonstrando que o principio da autotutela pode ser exercido desde que observado o contraditório e a ampla defesa. 
5.4.13 – princípio da especialidade
O princípio da especialidade foi definido, num primeiro momento, com o foco na administração indireta.
A administração direta (entes políticos: União, Estados, Municípios e DF) depende de lei para criar as pessoas jurídicas da administração indireta (autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista). Ora a própria lei cria a pessoa jurídica, ora ela autoriza. Quando autoriza, a lei já define a finalidade específica dessa pessoa jurídica.
As pessoas jurídicas da administração indireta ficam, portanto, vinculadas a essa finalidade específica. Esse é o conceito do princípio da especialidade: ele vincula as pessoas da administração indireta às finalidades específicas para as quais foram criadas.
Esse princípio, que tinha relação com as pessoas da administração indireta, hoje foi estendido para outras situações, como a de órgãos públicos, que ficam vinculados às finalidades para as quais foram criados.
Para a modificação daquelas finalidades, deve haver lei. A mesma forma de criação deve ser usada para a modificação.
5.4.14 – princípio da presunção de legitimidade
Princípio da presunção de legitimidade, na verdade, abarca não somente a legitimidade, mas a legalidade e a veracidade. Assim, trata-se de presunção de legitimidade (obediência às regras morais), legalidade (obediência à lei) e veracidade (o ato praticado deve corresponder à verdade).
Essa é uma presunção relativa (iuris tantum), pois admite prova em contrário. Se pode ser contestada e afastada, o ônus da prova cabe normalmente a quem alega (o administrado).
Por que os atos administrativos gozam dessa presunção? A presunção de legitimidade decorre do princípio da legalidade (do dever de legalidade do administrador). Se o administrador só pode fazer o que a lei autoriza e determina, em tese o que ele faz é legal.
Consequência prática da presunção de legitimidade é a aplicação imediata dos atos administrativos. Enquanto se discute acerca da validade, o ato produzirá efeitos.
ORGANIZAÇAO DA ADMINISTRAÇÃO
1 – Formas de prestação da atividade administrativa no Brasil: descentralização e desconcentração
Quando a atividade é prestada pelo núcleo, pelo centro da administração, ela é prestada pela administração direta, pelos entes políticos (União, Estados, DF e Municípios).
Com vistas à eficiência, ao aperfeiçoamento dos serviços públicos, alguns desses serviços foram retirados do núcleo e transferidos a outras pessoas. Nesse caso, fala-se em administração descentralizada. A atividade pode ser descentralizada, por exemplo, para a administração indireta ou para particulares.
Entretanto, pode ocorrer de, dentro de uma mesma pessoa jurídica, determinadas atividades serem transferidas de um órgão a outro. Esse deslocamento é chamado de desconcentração. A desconcentração é a divisão da atividade dentro da mesma pessoa.
Portanto, retirado o serviço do centro, há descentralização. Descentralização administrativa (retirar da administração direta e transferir à indireta ou aos particulares) é transferência da atividade administrativa. Isso é diferente da distribuição de competência que a CR faz aos entes políticos. Nesse caso, fala-se em descentralização política, deslocamento da atividade política, matéria estudada pelo Direito Constitucional.
Se por um lado a descentralização pressupõe o deslocamento da atividade a uma nova pessoa, que pode ser jurídica (normalmente) ou física (ex.: autorização de serviço público de taxi), por outro a desconcentração é a distribuição do serviço que ocorre dentro da mesma pessoa.
Além disso, há uma segunda diferença entre as figuras. Quando a administração direta transfere determinado serviço à indireta ou aos particulares, não existe entre eles hierarquia, não obstante a fiscalização da prestação dos serviços. Na desconcentração (ex.: Presidente da República transfere determinado serviço do Ministério “A” para o “B”), que acontece na mesma pessoa, a prestação do serviço ocorre com hierarquia, relação de subordinação.
2 – Formas de descentralização da atividade administrativa
A descentralização da atividade administrativa pode ocorrer por meio de outorga ou de delegação.
2.1 – Outorga
Outorga é a descentralização transferindo a titularidade e a execução do serviço. Titularidade é a “propriedade” do serviço. Quem recebe o serviço passa a ter o “domínio” sobre ele. A ferramenta com a qual se realiza a outorga é a lei.
Para a maioria, a outorga de serviço público não pode ser feita a qualquer pessoa, mas a uma pessoa da administração indireta de direito público (autarquias e fundações públicas). Mas a questão não é pacífica. Há orientação minoritária entendendo que a outorga pode ser feita a pessoa da administração indireta, seja ou não de direito público.
2.2 – Delegação
Na delegação, o Estado retém a titularidade e transfere a execução do serviço. Essa transferência pode ocorrer através de três instrumentos diferentes:
i) lei (delegação legal): é feita para as pessoas da administração indireta de direto privado (empresa pública, sociedade de economia mista e fundação pública de direito privado);
ii) contrato (delegação contratual): é feita aos particulares. Ex.: concessionárias e permissionárias de serviços públicos, como nos casos de transporte coletivo, telefonia.
iii) ato unilateral: também é feita ao particular. Exemplo de ato unilateral é a autorização de serviço público, como o serviço de taxi ou o de despachante. Nesses exemplos, a descentralização é realizada à pessoa física.
O serviço notarial (art. 236 da CR) não se encaixa em nenhuma dessas hipóteses. O Oficial do Cartório é um particular em colaboração, e se trata de delegação de função pública. É uma situação ímpar na CR:
Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. (...)
3 – Órgãos Públicos
3.1 – Relação entre o Estado e os agentes públicos: teorias
Como ocorre a relação entre o Estado e um agente público? Quem assina um contrato pelo Município é o Prefeito. Mas quem deu a ele esse poder? Como se constitui essa relação? Ela é contratual, como entre o cliente e o advogado? É o que será estudado a seguir.
Várias teorias foram criadas para a definição dessa relação entre o Estado os agentes públicos,

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