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FENÓMENOS DE TRANSPORTE I (Apontamentos) Cursos: Engª Química, Engª Mecânica Departamento de Engenharias e Tecnologias Professor Responsável: Sílvia Santos 1º Semestre/2016 Fenómenos de transporte I - Apontamentos 55 6.3. Fluidos Não Newtonianos A Lei de Newton da viscosidade não é aplicável a todos os fluidos. De facto, os fluidos podem ser classificados como Newtonianos ou não Newtonianos dependendo da relação existente entre a tensão de corte e a deformação (variação da velocidade na direcção normal ao escoamento). (Welty et al., 2008) Os fluidos Newtonianos são aqueles que seguem a Lei de Newton da viscosidade, e que pode ser representada de forma simplificada por: 𝜏 = −𝜇 𝑑𝑣 𝑑𝑟 = 𝜇�̇� (�̇� = − 𝑑𝑣 𝑑𝑟 ) O que se traduz graficamente por uma recta com ordenada na origem, sendo a constante de proporcionalidade a viscosidade, também chamada de viscosidade dinâmica. Existem inúmeros fluidos em que não se observa uma proporciponalidade entre a tensão de corte e a variação da velocidade na direcção normal ao escoamento. Na Figura seguinte estão representadas as relações existentes entre a tensão de corte e a a deformação para várias categorias de fluidos Newtonianos e não Newtonianos. Figura 26: Curvas de tensão-deformação para vários tipos de comportamento reológico. A Reologia é a ciência que estuda a deformação e o fluxo. Esta ciência engloba o comportamento dos sólidos elásticos e dos fluidos Newtonianos e não-Newtonianos. Recorde-se que todos os gases são Newtonianos, pelo que os não-Newtonianos são sempre líquidos. São fluidos não-Newtonianos as suspensões coloidais, polímeros e soluções poliméricas. Ou seja, são fluidos não-Newtonianos aqueles que apresentam na Dilatante Newtoniano Pseudoplástico Plástico de Bingham Plástico de Casson Deformação Tensão mínima Fenómenos de transporte I - Apontamentos 56 sua estrutura moléculas maiores do que as da água, ou que têm na sua composição uma elevada concentração de partículas sólidas em suspensão. (Campos, 2013) Existem dois tipos de classificação para os fluidos não Newtonianos: relativamente à variação da viscosidade com o tempo e com a tensão de corte. 6.3.1. Classificação relativamente à tensão de corte Como foi referido, os fluidos não-Newtonianos apresentam deformações quando sujeitos a determinada tensão que diferem do previsto pela lei de Newton da viscosidade (vide Figura 26). Na realidade, um comportamento não Newtoniano é descrito por dois parâmetros característicos, e não por um único, como acontece para os fluidos Newtonianos. Assim, no que diz respeito à classificação quanto à tensão de corte, os fluidos podem ser: PSEUDOPLÁSTICOS Nestes fluidos a razão (𝜏/�̇�) diminui para valores crescentes da tensão de corte aplicada, i.e., o declive em cada ponto da curva representada na Figura 26 diminui à medida que a tensão de corte aumenta.(Campos, 2013) A lei que descreve o comportamento destes fluidos é a lei da potência e traduz-se por: 𝜏 = 𝑘�̇�𝑛 𝑜𝑢𝜏 = 𝑘 (− 𝑑𝑣 𝑑𝑟 ) 𝑛 Sendo k o coeficiente de consistência, e n (n<1)o coeficiente de comportamento. Um fluido pseudoplástico (também designado por reofluidificante) possui cadeias longas que se encontram com orientações aleatórias em repouso, mas que em movimento se alinham entre si, facilitando a deformação do fluido. Assim, estes fluidos oferecem maior resistência à deformação quando em repouso, do que quando em escoamento, logo a sua consistência diminui à medida que a tensão de corte aumenta. Este comportamento é o mais comum dos fluidos não Newtonianos e pode ser observado em fluidos como a maioria das soluções poliméricas, a maionese, muitos fluidos biológicos, como o sangue, e a maioria das tintas. Mais especificamente para Engª Mecânica: os óleos pesados apresentam características pseudoplásticas que permitem que sejam usados quer como Fenómenos de transporte I - Apontamentos 57 lubrificantes, quer como vedantes. Nos apoios de motores, onde as tensões de corte são elevadas, os óleos pesados são pouco viscosos permitindo a lubrificação, e nas juntas, onde as tensões de corte são reduzidas, são muito viscosos, permitindo a vedação. (Campos, 2013) DILATANTES Nos fluidos dilatantes (também designados por espessantes), a razão (𝜏/�̇�) aumenta para valores crescentes da tensão de corte aplicada, i.e., o declive em cada ponto da curva representada na Figura 26 aumenta à medida que a tensão de corte aumenta.(Campos, 2013) Aplica-se de novo a lei da potência: 𝜏 = 𝑘�̇�𝑛 𝑜𝑢𝜏 = 𝑘 (− 𝑑𝑣 𝑑𝑟 ) 𝑛 mas desta vez com n>1. Este comportamento, contrariamente ao que foi referido para o caso dos pesudoplásticos, é pouco comum entre os fluidos não-Newtonianos. Verifica-se geralmente em suspensões de sólidos como é o caso da areia movediça. Para baixas tensões de corte, o fluido tem um comportamento lubrificante, enquanto, à medida que as tensões aplicadas aumentam, o efeito lubrificador deixa de se verificar e a viscosidade da suspensão aumenta. PLÁSTICO DE BINGHAM Um plástico de Bingham possui uma estrutura que lhe permite resistir a pequenas tensões de corte, mas entra em escoamento assim que a tensão de cedência é ultrapassada. O seu comportamento pode ser descrito pela seguinte lei: { 𝜏 = 𝜏0 + 𝐾𝐵�̇�, 𝑠𝑒 𝜏 ≥ 𝜏0 �̇� = 0, 𝑠𝑒 𝜏 < 𝜏0 Significa que, abaixo da tensão de cedência (𝜏0), o fluido não deforma, ou seja, se estiver contido num recipiente ele não escoa. Acima de 𝜏0 , o comportamento é descrito pela equação de 1º grau, com declive KB. Fenómenos de transporte I - Apontamentos 58 São exemplos bem conhecidos a pasta de dentes e algumas geleias. PLÁSTICO DE CASSON Estes fluidos apresentam uma lei que pode ser interpretada com um desvio à lei de Bingham, e consiste na existência de uma pequena curvatura na linha de comportamento reológico, com a concavidade voltada para baixo. A lei de Casson pode ser escrita na forma de: {√ 𝜏 = √𝜏0 + 𝐾𝐶√�̇�, 𝑠𝑒 𝜏 ≥ 𝜏0 �̇� = 0, 𝑠𝑒 𝜏 < 𝜏0 Sendo de novo 𝜏0 a tensão de cedência. De salientar que, mais do que tipos de fluidos, estas leis descrevem tipos de comportamento. Assim, por exemplo, um fluido pode ter um comportamento pseudoplástico a baixos valores de tensão de corte, seguido de um comportamento dilatante, como é o caso representado na Figura 27. Figura 27: Fluido com comportamento pseudoplástico, seguido de dilatante. Se se medir um par de valores tensão/deformação, obtém-se apenas um ponto na curvatura de comportamento reológico. Se o fluido for Newtoniano, a razão entre os referidos parâmetros é a viscosidade: 𝜏 �̇� = 𝜇 Para qualquer fluido podemos generalizar a equação anterior, chamando a esta razão “viscosidade aparente” ou consistência, a. Fenómenos de transporte I - Apontamentos 59 De facto, se o fluido for Newtoniano, a será a mesma para qualquer valor de �̇�. Para um dilatante, a viscosidade aparente aumenta com �̇� , i.e., com a deformação e, portanto, com a tensão de corte, conforme se apresenta na Figura seguinte: Figura 28: Viscosidade aparente para diferentes situações de tensão de corte. A viscosidade aparente seria então a viscosidade de um fluido Newtoniano que intersectasse a curva de comportamento reológicodo fluido em causa no ponto de realização da medida. 6.3.2. Classificação relativamente ao tempo Num agitador colocado no seio de um fluido, para o mesmo gradiente de velocidades, i.e., para a mesma velocidade do agitador, a força a aplicar será tanto maior quanto maior for a viscosidade aparente. Se, líquidos há em que esta força não sofre alterações com o tempo, para outros, ela aumenta ou diminui durante a agitação. Assim, podemos ter: TIXOTRÓPICOS São fluidos com partículas alinhadas quando em escoamento, como os fluidos pseudoplásticos, mas este alinhamento necessita de um certo tempo após o início da aplicação da tensão. Ou seja, são fluidos em que a a diminui com o tempo durante a agitação. (Campos, 2013) Este comportamento é bastante comum no caso das tintas. De facto, enquanto está a ser aplicada a tinta torna-se menos consistente, o que facilita a sua aplicação. Após a interrupção da força, a viscosidade aparente aumenta, pelo que a tinta se torna mais consistente durante a secagem. Também, quando se agita uma lata de tinta que esteve armazenada, nos primeiros instantes o líquido é muito viscoso, mas a agitação Fenómenos de transporte I - Apontamentos 60 torna-se gradualmente mais fácil. Este comportamento é geralmente associado à quebra de ligações entre as cadeias poliméricas. Quando se pára a agitação, as ligações restabelecem-se gradualmente, repondo a consistência inicial. REOPÉCTICOS Designam-se por fluidos reopécticos aqueles cuja viscosidade aparente aumenta com o tempo de agitação. Este comportamento deve-se a um melhor arranjo das moléculas como consequência do movimento, sendo que, normalmente só ocorre para velocidades baixas. Trata-se de um comportamento pouco comum. Na Figura seguinte faz-se uma comparação entre fluidos tixotrópicos e reopécticos no que diz respeito à variação da viscosidade aparente com o tempo de agitação. Figura 29: Variação da viscosidade aparente com o tempo. Se um fluido é tixotrópico ou reopéctico, ele não é Newtoniano, e, como tal, terá também uma classificação em função da tensão de corte. No entanto, um fluido pode ter uma classificação em função da tensão de corte (ser pseudoplástico ou dilatante), mas apresentar uma viscosidade aparente independente do tempo de agitação. VISCOELÁSTICOS Além do comportamento viscoso (consistente), há fluidos que apresentam um comportamento elástico, ou seja, têm a capacidade de retomar parcialmente a sua forma inicial quando é interrompida a aplicação da força. Apresentam portanto alguma elasticidade à semelhança dos sólidos. É o caso das colas de borracha. Se começarmos a despejar cola de borracha a partir do recipiente e depois dermos impulso no sentido contrário, o líquido regressa ao frasco (retoma a posição inicial). A Fenómenos de transporte I - Apontamentos 61 clara de ovo também apresenta este comportamento, embora, quando batida em castelo passa a ter um comportamento de plástico de Bingham. 6.4. Exercícios propostos 1. Água está em escoamento no interior de um tubo circular, sendo o perfil de velocidades dado por: 𝑣𝑥(𝑟) = 𝛽 4𝜇 (𝑅2 − 𝑟2) Sendo b uma constante, r a distância radial medida a partir do eixo, R o raio interno do tubo e vx(r) a velocidade do fluido ao longo da direcção x na posição r. Calcule a tensão de corte na parede do tubo e no interior do fluido na posição r=R/2. Se o perfil persisteir numa distância de tubo L, calcule a força exercida pela água sobre o tubo ao longo deste comprimento. 2. Os fluidos pseudoplásticos e os fluidos dilatantes seguem a lei da potência. a) Determine o perfil de velocidades num tubo cilíndrico horizontal, em escoamento laminar, para estes fluidos, quando sujeitos a um gradiente de pressão. b) Determine a expressão do caudal volumétrico. Fenómenos de transporte I - Apontamentos 62 Bibliografia Azevedo, E.G., Termodinâmica Aplicada, 3ª Ed., Escolar Editora, 2011. Bird, R., Stewart, W., Lightfoot, E.,Transport Phenomena, John Wiley & sons, 2006. Campos, J.M., Notas Para o Estudo da Mecânica do Fluidos, FEUP edições, 2013. Coulson, J.M. and Richardson, J. F., Chemical Engineering, Fluid Flow, Heat Transfer and Mass Transfer – Vol 1, 6th Edition, Butterworth –Heinemann, 1999. Geankoplis, C.J., Transport Processes and Unit Operations, 3rd Edition, Prentice Hall International Editions, 1993. Massey, B.S., Mechanics of Fluids, 8th Edition, Taylor & Francis, 2006. Welty, J.R., Wicks, C. E., Wilson, R. E., Rorrer, G. L. Fundamentals of Momentum, Heat and Mass Transfer, 5th Edition, John Wiley & Sons, Inc., 2008. Páginas de Internet commons.wikimedia.org, última consulta em Abril de 2016
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