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Direito das Obrigações
Professor: Nilson Disconzi da Silva
OBRIGAÇÕES NATURAIS
1. NOÇÕES CONCEITUAIS
As obrigações classificam-se, tradicionalmente, em civis e naturais, na medida em que sejam exigíveis ou apenas pagáveis (desprovidas de exigibilidade jurídica).
A obrigação natural é, portanto, um debitum em que não se pode exigir, judicialmente, a responsabilização patrimonial (obligatio) do devedor, mas que, sendo cumprido, não caracterizará pagamento indevido. 
Sendo dívida, a ela se aplicam, a priori, todos os elementos estruturais de uma obrigação, com a peculiaridade, porém, de não poder ser exigida a prestação, embora haja a irrepetibilidade do pagamento. 
Entendamos as premissas históricas de tal obrigação, para poder compreendê-la no nosso ordenamento jurídico positivo.
2. UMA RÁPIDA VISÃO DAS OBRIGAÇÕES NATURAIS NO DIREITO ROMANO
A concepção de obrigação natural remonta ao primeiro século da era Cristã, quando, por influência da filosofia grega, o Direito Romano se espiritualizou e passou a aceitar princípios do ius gentium.
Embora seja o berço do Direito Civil, o fato é que, nos seus primórdios, o Direito Romano era extremamente formal e elitista, como fruto de uma sociedade familiar e agrária, cuja atividade negocial se limitava aos cidadãos romanos, nos quais não se incluíam, por exemplo, os estrangeiros
e os escravos.
Assim, a aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações era limitada, não podendo contratar validamente quem não tivesse capacidade para isso.
Da mesma forma, as obrigações, em número bastante limitado e tipificadas, derivavam fundamentalmente do mútuo (que se realizava através do nexum) ou do contrato literal, sendo protegidas por ação judicial, desde que cumpridas as necessárias regras formais para a produção do vínculo.
Todavia, como observa SÉRGIO CARLOS COVELLO:
“os indivíduos desprovidos de capacidade jurídica faziam acordos entre si e com outras pessoas, e os cidadãos romanos nem sempre seguiam à risca as solenidades contratuais em seus negócios, resultando daí que os atos praticados ficavam sem nenhuma proteção da lei, situação esta que repugnava à consciência jurídica de um povo especializado no direito”.
SÍLVIO VENOSA, por sua vez, ensina que entre:
“os fatos que impediam o nascimento do direito de ação, colocava-se a incapacidade do devedor. O filho da família de escravo geralmente contraía obrigações naturais. Ocorria o mesmo se entre devedor e credor havia uma relação de pátrio poder: nenhuma ação era possível entre uma pessoa que estivesse sob o poder de outra, que estivessem ambas sob o poder do mesmo pater familias”.
Para situações como essas, construiu-se, pela jurisdição pretoriana, a doutrina da obrigação natural, reconhecendo, à luz da equidade, a existência de tal vínculo que, embora não amparado pela actio romana, tinha certos efeitos jurídicos, notadamente o de dar causa a um pagamento válido.
Essa ideia atravessou séculos e gerações, chegando à maioria das legislações modernas, mantendo-se esse seu principal efeito, que é a retenção do pagamento (soluti retentio), ou seja, a irrepetibilidade da prestação feita espontaneamente.
3. FUNDAMENTOS E NATUREZA JURÍDICA DA OBRIGAÇÃO NATURAL
Em essência e na estrutura, a obrigação natural não difere da obrigação civil: trata-se de uma relação de débito e crédito que vincula objeto e sujeitos determinados. 
Todavia, distingue-se da obrigação civil por não ser dotada de exigibilidade.
Tal inexigibilidade é derivada de algum óbice legal com finalidade de preservação da segurança e estabilidade jurídica, como ocorre, por exemplo, na prescrição de uma pretensão decorrente de uma dívida (em que o direito não se satisfaz com obrigações perpétuas) ou na impossibilidade de cobrança judicial de dívida de jogo (pelo reconhecimento social do caráter pernicioso de tal conduta).
O fundamento primeiro, portanto, para o reconhecimento da justiça da retenção do pagamento de uma obrigação natural é de ordem moral. 
Por um determinado motivo, A contraiu uma dívida em face de B, mas, por um obstáculo jurídico, não a pode exigir judicialmente, embora o objeto da relação obrigacional não deixe de existir.
Trata-se, portanto, de um dever de consciência, em que cada um deve honrar a palavra empenhada, cumprindo a prestação a que se obrigou.
Na autorizada opinião de GEORGES RIPERT, a “obrigação natural não existe enquanto o devedor não afirmou essa existência pelo seu cumprimento. Ela nasce do reconhecimento do dever moral pelo devedor.
É, de resto, o que diz o Código Civil quando se limita a indicar que a repetição do pagamento é impossível”.
É esse também o fundamento destacado por SERPA LOPES:
“A obrigação natural, tenha ela uma causa lícita ou ilícita, baseia-se nas exigências de regra moral. Apesar de o direito positivo ter legitimado uma determinada situação em benefício do devedor, este pode, a despeito disso, encontrar-se em conflito com a sua própria consciência, e nada obsta a que, desprezando a mercê recebida da lei, realize a prestação a que se sente moralmente obrigado. Assim acontece, por exemplo, se o indivíduo é liberado pela prescrição do respectivo título creditório, ou se é beneficiado com a fulminação de nulidade do negócio jurídico de que seria devedor, se válido fosse. Além disso, a realização de uma obrigação natural constitui um ato intimamente ligado à vontade do devedor. 
Não se deve imaginar, porém, que o fundamento moral, de dever ético da consciência, das obrigações naturais confunde-se com as regras morais em geral.
Normas de ordem religiosa, doméstica ou simplesmente de cortesia não compreendem obrigações naturais (a exemplo do dever cristão de amar ao próximo), por não gerarem efeito algum na órbita do direito. 
Por isso, a obrigação natural não se identifica com o mero dever moral, pois representa uma dívida efetiva, proveniente de uma causa precisa. O objeto de sua prestação pertence, do ponto de vista ideal, ao patrimônio do credor, de modo que, não cumprida a obrigação, sofre ele um prejuízo, o que não se verifica quando há o descumprimento de um dever moral.
Saliente-se, por fim, que tais obrigações naturais não se confundem com as obrigações nulas. Com efeito, o que é nulo, nenhum efeito deve produzir; a obrigação natural, ao contrário, produz o efeito jurídico da possibilidade de retenção da prestação, em caso de pagamento voluntário (irrepetibilidade). 
4. CLASSIFICAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES NATURAIS
Toda classificação doutrinária pode variar de acordo com a visão metodológica de quem a expõe. Em relação às obrigações naturais, a situação não é diferente, havendo alguns critérios distintos propostos pela doutrina especializada.
Três critérios são relevantes, a saber:
a) quanto à tipicidade: a obrigação natural poderá ser típica ou atípica,na medida em que é prevista em texto legal como relação obrigacional inexigível.
No primeiro caso, tem-se a dívida de jogo e a prescrita; no segundo, tínhamos a dívida residual após a concordata, antes da vigência da Lei n.11.101/2005 (a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas);
b) quanto à origem: a obrigação natural poderá ser originária, quando é inexigível desde o início, como a dívida de jogo, ou derivada ou degenerada,quando nasce como obrigação civil, perdendo depois a exigibilidade, como a dívida prescrita;
c) quanto aos efeitos produzidos: sob essa ótica, a obrigação natural será comum ou limitada.
A primeira é a que admite todos os efeitos da obrigação civil, salvo os que se refiram à exigibilidade judicial. Já a segunda é a que se restringe à retenção do pagamento, negando-lhe a lei outros efeitos como a novação, a fiança e a promessa de pagamento. Ex.: a dívida de jogo lícito.
5. DISCIPLINA DAS OBRIGAÇÕES NATURAIS NO DIREITO BRASILEIRO
A legislação brasileira não dispensou, ao contrário de outros países, às obrigações naturais uma disciplina própria.
Todavia, em função de previsões esparsas no ordenamentojurídico, é possível fazer uma sistematização acerca do tema.
De fato, estabelece, por exemplo, o art. 882 do CC-02 :
“Art. 882. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita,
ou cumprir obrigação judicialmente inexigível”.
De tal regra legal, é possível se estabelecer a premissa, no nosso sistema, da irrepetibilidade da prestação na obrigação natural, sendo irrelevante, inclusive, se o devedor conhecia tal incoercibilidade.
Nessa mesma linha, no que se refere às dívidas de jogo ou aposta, preceitua o art. 814 do CC-02 :
“Art. 814. As dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a pagamento; mas não se pode recobrar a quantia, que voluntariamente se pagou, salvo se foi ganha por dolo, ou se o perdente é menor ou interdito.
§ 1.º Estende-se esta disposição a qualquer contrato que encubra ou envolva reconhecimento, novação ou fiança de dívida de jogo; mas a nulidade resultante não pode ser oposta ao terceiro de boa-fé.
§ 2.º O preceito contido neste artigo tem aplicação, ainda que se trate de jogo não proibido, só se excetuando os jogos e apostas legalmente permitidos.
§ 3.º Excetuam-se, igualmente, os prêmios oferecidos ou prometidos para o vencedor em competição de natureza esportiva, intelectual ou artística, desde que os interessados se submetam às prescrições legais e regulamentares”.
Registre-se, em tal previsão, que embora se reconheça a validade da retenção do pagamento da dívida de jogo ou aposta, proíbe-se qualquer estipulação contratual em relação a tais obrigações naturais, admitindo-se a sua natureza limitada.
 Destaque-se, por fim, que a irrepetibilidade do pagamento existe na obrigação natural ainda que se trate de caso de erro quanto à incoercibilidade da dívida (ou dolo do credor, nesse sentido), sendo irrelevante o fato de o devedor ter realizado a prestação na convicção de que podia ser compelido a pagar. O pagamento, todavia, deve ser realizado sem coação ou qualquer outro vício de consentimento que não importe em uma falsa percepção da realidade, pois, do contrário, a repe tição é cabível. Ou seja, se o dolo do credor for só no sentido de fazer o devedor acreditar que o débito é exigível, não há que se falar em repetição, mas, se a conduta de cumprimento da obrigação natural for viciada em qualquer outro sentido, aí, sim, caberá a repetição.

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