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28.A SÉTIMA TROMBETA.pdf

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A SÉTIMA TROMBETA 
 
 
 
 
Três Peças Curtas 
 
 
 
 
Texto de: 
JULIO CARRARA 
 
 
 
 
Escrita em 2009 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 1111 
 
 
GRAPEFRUIT MOON 
 
PERSONAGENS: 
PAULO 
VANESSA 
 
ON THE NICKEL 
 
PERSONAGENS: 
GAROTO 
HOMEM 
 
JUST A PERFECT DAY 
 
PERSONAGEM: 
MULHER 
 
CENÁRIOS: Descrição no texto. Sugiro que trabalhem com poucos 
elementos para facilitar a troca de uma cena para a outra. 
 
OBSERVAÇÃO: Os textos não precisam necessariamente ser encenados na 
ordem que estão escritos. E podem também ser apresentados separadamente. 
 
 
 
 
 
 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 2222 
 
 
GRAPEFRUIT MOON 
 
(Uma kitchenete com poucos elementos: um criado-mudo com o abajur, um puff, um 
colchão no chão ou naquelas camas de armar, um cinzeiro cheio, uma embalagem de 
pizza, uma garrafa de vinho aberta e duas taças. É madrugada. Apenas a claridade da 
lua ilumina a cena escura. Paulo está deitado na cama. O radio relógio marca as horas: 
3:25. A porta se abre e por ela entra Vanessa, cautelosa. Acende o abajur e fica olhando 
pra ele. Tira o salto e procura algo na bolsa. Faz de tudo para não acordá-lo. De repente 
algum objeto cai no chão fazendo um barulhão.) 
 
VANESSA 
(Baixo.) Merda! 
 
PAULO 
Pode acender a luz. 
 
VANESSA 
Desculpa, te acordei? 
 
PAULO 
Não. 
 
(Vanessa acende a luz.) 
 
VANESSA 
Achei que já estivesse dormindo. 
 
PAULO 
To tentando. 
 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 3333 
 
VANESSA 
(Muito constrangida.) Paulo, eu... 
 
PAULO 
Não precisa falar nada. 
 
VANESSA 
Eu te devo uma explicação. 
 
PAULO 
Não, não deve. 
 
VANESSA 
Me desculpa. 
 
PAULO 
Não tô a fim de falar sobre isso, Vanessa. Me deixa dormir. 
 
VANESSA 
Eu perdi a noção do tempo. A gente ficou no barzinho bebendo depois 
da aula. Tava uma turma bem legal. Aí quando olhei pro relógio era quase 
uma hora. Não tinha mais metrô. E só consegui chegar agora porque o Carlão 
me deu uma carona. Senão tinha que esperar o metrô abrir. 
 
PAULO 
(Senta-se na cama.) E aí? 
 
VANESSA 
E aí o que? 
 
PAULO 
O Carlão. 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 4444 
 
VANESSA 
Que é que tem o Carlão? 
 
PAULO 
Ele te comeu? 
 
VANESSA 
Como é que é? 
 
PAULO 
Comeu ou não comeu? 
 
VANESSA 
Ele é meu amigo. 
 
PAULO 
Você deu pra ele, né? 
 
VANESSA 
De onde você tirou essa ideia? 
 
PAULO 
Você ta cheirando sexo. 
 
VANESSA 
Que absurdo. 
 
PAULO 
Fala de uma vez: “Paulo, eu furei com você porque tava dando pro Carlão”. 
 
VANESSA 
Você ta sendo inconveniente! 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 5555 
 
PAULO 
Assume: “Cheguei agora porque o Carlão me comeu até fazer minha buceta 
inchar”. 
 
VANESSA 
Deixa de ser escroto! 
 
PAULO 
Confessa... Ele te fez gozar? 
 
VANESSA 
Você enlouqueceu. 
 
PAULO 
Fez ou não fez? Você gozou com ele como goza comigo? 
 
VANESSA 
Acho melhor você parar, senão... 
 
PAULO 
Você não disse que me devia uma explicação? Mudei de ideia. Agora eu 
quero ouvir. Conta tudo. Com detalhes. 
 
VANESSA 
O Carlão só me deu uma carona. 
 
PAULO 
E como agradecimento você deu pra ele. 
 
VANESSA 
Se você não parar eu vou embora. 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 6666 
 
PAULO 
Demorou. Nem sei por que veio. 
 
VANESSA 
Seu filho da puta. 
 
PAULO 
Liga pro Carlão. Pede pra ele vir te pegar. 
 
VANESSA 
É isso mesmo que vou fazer. E quer saber? É agora que vou dar pra ele. 
Vou dar muito. Muito mesmo. 
 
PAULO 
É isso aí. Vai fundo. 
 
VANESSA 
(Colocando o salto, pegando a bolsa e saindo.) Viado. 
 
PAULO 
Puta. (Voltando para a cama.) E apaga a merda da luz... 
 
VANESSA 
Vá tomar no cu... 
 
(Vanessa sai sem apagar a luz.) 
 
PAULO 
(Gritando.) Deixa as chaves com o porteiro. E não precisa mais voltar... 
 
(Paulo pega o vinho e despeja numa taça. Bebe em silêncio. Depois de um tempo, 
Vanessa volta.) 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 7777 
 
PAULO 
(Forte.) Não ouviu o que eu disse? Vá embora! 
 
(Vanessa puxa Paulo para perto de si e beija-o com violência.) 
 
VANESSA 
Desculpa. (Paulo permanece em silêncio, bebendo.) Você não vai falar nada? 
 
PAULO 
Acha que vai me comprar com um beijo? 
 
VANESSA 
Não foi bom? 
 
PAULO 
Médio. Você sabe fazer melhor. (Pausa. Bebe. Noutro tom.) Por que você 
me machuca tanto, hein? 
 
VANESSA 
Isso não vai mais acontecer. 
 
PAULO 
To cansado de ouvir essa mesma ladainha... 
 
VANESSA 
Eu prometo. 
 
PAULO 
Não prometa o que não pode cumprir. 
 
VANESSA 
Você não confia mais em mim, né? 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 8888 
 
PAULO 
E de que jeito? 
 
VANESSA 
Eu vou mudar. 
 
PAULO 
Quando? 
 
VANESSA 
É que nunca dá certo. Sempre que você marca comigo aparecem outras 
coisas pra eu fazer... Aí eu... 
 
PAULO 
...priorizo “outras coisas”... Sabe qual é o problema, Vanessa? Você 
nunca me deu prioridade. E o meu problema foi dar prioridade a quem me tem 
como opção. 
 
VANESSA 
Não é assim. 
 
PAULO 
É assim, sim. Hoje, por exemplo, você preferiu beber com os amigos 
depois da faculdade e sequer teve a preocupação de me ligar avisando. 
 
VANESSA 
É que acabou a bateria do meu celular. 
 
PAULO 
Ligasse de um orelhão. 
 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 9999 
 
VANESSA 
Tava em cartão. 
 
PAULO 
Ligasse a cobrar. Mandasse sinal de fumaça, sei lá. Mas não me deixasse 
esperando feito um tonto. Assim teria economizado na pizza e no vinho. 
 
VANESSA 
(Tirando dinheiro do bolso.) Não seja por isso. Quanto você gastou? 
 
PAULO 
Ah, não fode! 
 
VANESSA 
Quanto você gastou? Eu faço questão de pagar. 
 
PAULO 
Não quero seu dinheiro. 
 
VANESSA 
Então não fique jogando essas coisas na minha cara. 
 
PAULO 
Não to jogando na sua cara!... (Pausa.) Porra, a gente combinou de sair 
três vezes em menos de um mês. E por três vezes você furou. Eu ligava pra 
confirmar. Você dizia que tava tudo certo e quando chegava na hora, você não 
aparecia. E o bobão aqui ficava te esperando. Esperando, esperando, 
esperando, esperando, esperando com a esperança de que alguma hora você 
aparecesse... E depois que caia a ficha, depois que entendia que você não viria 
mesmo, aí eu ficava com uma sensação horrível, como se alguma coisa 
houvesse quebrado dentro de mim. (Vanessa ficasem resposta.) Mas pode ficar 
tranquila. Não vou te convidar pra mais nada. 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 10101010 
 
VANESSA 
Para, vai. Não seja tão radical. 
 
PAULO 
(Depois de beber um grande gole de vinho.) Já percebeu que você nunca me 
procura? 
 
VANESSA 
Procuro, sim. 
 
PAULO 
Só quando lhe é conveniente, quando lhe interessa, quando precisa de 
alguma coisa. 
 
VANESSA 
Você tá me ofendendo. 
 
PAULO 
Alguma vez você já ligou pra me perguntar: “Oi Paulo, como você ta? To 
com saudade. Vamos fazer alguma coisa? Ver uma peça, um filme, jantar num 
restaurante bacana, dar um rolê no Ibirapuera?” Quando você fez isso, Vanessa? 
Quando? 
 
VANESSA 
Eu... 
 
PAULO 
Você é egoísta demais. 
 
VANESSA 
Tenho que pensar em mim. 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 11111111 
 
PAULO 
Sim, mas não dessa forma. 
 
VANESSA 
Que forma? 
 
PAULO 
Egocêntrica. Como se fosse o centro do universo. 
 
VANESSA 
O que você quer, afinal? 
 
PAULO 
Nem sei mais o que eu quero. 
 
VANESSA 
Eu aceitei o seu jeito vira-lata de ser. Por que não me aceita como eu 
sou? 
 
PAULO 
Não to falando do seu “jeito de ser”, mas da forma como você se 
comporta comigo. O que nós somos afinal? 
 
VANESSA 
Namorados. 
 
PAULO 
E o que os namorados fazem? 
 
VANESSA 
Se beijam, se abraçam, transam. 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 12121212 
 
PAULO 
E...? 
 
VANESSA 
Nós não fazemos isso? 
 
PAULO 
Só isso... 
 
VANESSA 
E não é o suficiente? 
 
PAULO 
Pra mim, não. 
 
VANESSA 
Ah, Paulo. Você sabe que não tenho tempo pra nada. Trabalho o dia 
todo e a noite eu vou pra faculdade. Eu não posso me dedicar a você 
integralmente... 
 
PAULO 
Não te quero por tempo integral. Sabe que não curto isso. Mas quando 
estiver comigo eu te quero inteira, não pela metade! É muito pedir isso? 
 
VANESSA 
(Sem ouvi-lo.) E o pouco tempo que sobra eu... 
 
PAULO 
 ...fico no barzinho bebendo com os amigos e deixo meu namorado 
plantado me esperando. 
 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 13131313 
 
VANESSA 
Eu já te pedi desculpas e prometi que vou mudar... E eu vim, não vim? 
 
PAULO 
Veio. (Irônico.) De carona com o Carlão... 
 
VANESSA 
Não começa. 
 
PAULO 
Sabia que ele morre de tesão por você? 
 
VANESSA 
De onde você tirou isso? 
 
PAULO 
É só reparar no jeito que ele te olha. Nunca percebeu? 
 
VANESSA 
Ele é só meu amigo... 
 
PAULO 
Você disse isso pra ele? 
 
VANESSA 
Nem é preciso dizer. 
 
PAULO 
Precisa, sim. Porque se ele te olhar mais uma vez como tava te olhando 
quando fui te buscar na facul outro dia, eu mato aquele filho da puta... 
 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 14141414 
 
VANESSA 
(Fazendo charminho.) Ah, que bonitinho... Tá com ciúme! 
 
PAULO 
Lógico! 
 
VANESSA 
Relaxa meu dotadinho. Vem cá, vem... 
 
(Vanessa sobe em Paulo, muito excitada.) 
 
VANESSA 
Vamos fazer aquele amorzinho gostoso... 
 
PAULO 
Não quero... 
 
VANESSA 
Quer sim. Olha como o chocante tá duro. Hum! Você tá que tá, hein? 
Vem! 
 
PAULO 
(Livrando-se dela.) Não. 
 
VANESSA 
(Frustrada.) O que houve? Você nunca negou fogo! O que aconteceu? 
 
PAULO 
Deixa pra lá. 
 
VANESSA 
Não. Agora fala. 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 15151515 
 
PAULO 
(Longa pausa.) Eu preciso de você. 
 
VANESSA 
Eu também... Vem... 
 
PAULO 
Não desta forma. Não só dessa forma. Será que é tão difícil pra você 
entender que não quero ser usado e depois jogado fora como um objeto 
descartável? Não é assim que a molecada faz por aí nas baladas, onde 
ninguém é de ninguém? Onde garotos e garotas pegam o primeiro que pintar 
e já beijam, trepam e depois, no dia seguinte, não se conhecem mais? 
 
VANESSA 
Não imaginava que você fosse careta. 
 
PAULO 
Não sou careta. O que não curto é promiscuidade. 
 
VANESSA 
Ah, vai me dizer que nunca foi promíscuo? 
 
PAULO 
Fui não nego. Mas hoje to noutra. 
 
VANESSA 
Então por que essa discriminação? 
 
PAULO 
Não tô discriminando ninguém. Cada um é dono de si e faz o que bem 
entender. Não tenho nada com isso. To falando de mim, eu, Paulo, que ainda 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 16161616 
 
acredita no amor, não nessa banalização toda que tá por aí. Tô cansado de me 
sentir usado. 
 
VANESSA 
Peraí, to tentando entender. Você acha que eu to te usando? 
 
PAULO 
E não tá? 
 
VANESSA 
Não! 
 
PAULO 
Ah, não? Não tá molhadinha de tanto tesão? 
 
VANESSA 
Tô... 
 
PAULO 
Não quer que eu enfie meu pau em você e te faça gozar várias vezes? 
 
VANESSA 
Quero. Quero muito. 
 
PAULO 
E depois? 
 
VANESSA 
Depois, o que? 
 
PAULO 
O que vai fazer? 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 17171717 
 
VANESSA 
Tomar um banho e voltar pra casa. 
 
PAULO 
Aí, tá vendo? Você só quer me usar. 
 
VANESSA 
Você também me usaria. 
 
PAULO 
Não usaria, não! E sabe por quê? Porque eu te amo. Amo como jamais 
amei alguém na vida... Eu preciso ser amado, Vanessa. Será que você não me 
entende? Não, não preciso... Eu necessito ser amado, eu necessito de você, 
necessito do seu amor. 
 
(Pausa. Ele dirige-se até a janela e fica olhando para a lua no céu.) 
 
PAULO 
Enquanto aguardava ansioso pela sua chegada, alguma coisa me trouxe 
até a janela. Não sei explicar, mas algo me atraiu até aqui. Olhei pro céu e vi a 
lua. Uma enorme lua cheia, alaranjada, da cor do pomelo. Grapefruit Moon, 
como a canção do Tom Waits... Fiquei aqui durante horas... 
 
VANESSA 
Só olhando a lua? 
 
PAULO 
E pedindo pra que ela trouxesse você. 
 
VANESSA 
Ela me trouxe... 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 18181818 
 
PAULO 
Sim. 
 
VANESSA 
E o que mais você pediu? 
 
PAULO 
Pra não te esperar nunca mais. 
 
VANESSA 
Não vai mais esperar... E o que mais? 
 
PAULO 
Que você não fosse embora me deixando sozinho no escuro. 
 
VANESSA 
Não irei... E? 
 
PAULO 
E que um dia você me amasse com a mesma intensidade que eu te 
amo... 
 
VANESSA 
Eu... 
 
PAULO 
(Coloca o dedo indicador nos lábios dela.) Psiuuu... 
 
(Ouve-se “Grapefruit Moon” na voz de Tom Waits. Vanessa puxa o puff para a 
direção da janela. Ambos sentam-se. Ela abre a embalagem e começam a comer a pizza 
olhando para a lua. Luz cai em resistência ficando apenas a claridade lunar. Depois de 
um tempo, black-out.) 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA SétimaTrombetaA Sétima Trombeta 19191919 
 
 
ON THE NICKEL 
 
(Estrada deserta. Fim de tarde. Ouve-se a música “Key to the Highway” de Little 
Walter. Garoto entra com uma mochila nas costas, uma garrafa de vodka vagabunda 
nas mãos e com um aparelho sonoro com um fone de ouvido [mp3, diskman ou até 
mesmo um walkman dependendo da encenação]. Para, contempla a linha do horizonte, 
bebe uma grande dose. Tira a mochila das costas colocando-a no chão. Em seguida 
retira o fone de ouvido. A música cessa e ele fica perdido em seus pensamentos. Homem 
sai da barraca em que estava, vai até uma moita e mija de costas para a plateia. Em 
seguida observa o rapaz sem que ele perceba. Permanece assim por um bom tempo.) 
 
HOMEM 
Acho que tá na hora de voltar pra casa. 
 
GAROTO 
Não vou voltar. 
 
HOMEM 
Todos voltam. 
 
GAROTO 
Quem é você? 
 
HOMEM 
Que importância tem isso? 
 
GAROTO 
(Depois de uma pausa.) Pra onde vai essa estrada? 
 
HOMEM 
Siga em frente que vai saber. 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 20202020 
 
GAROTO 
(Mostra a garrafa.) Quer um trago? 
 
HOMEM 
(Reticente.) A sua mãe e seu pai... 
 
GAROTO 
Que é que tem? 
 
HOMEM 
Devem tá te esperando pro jantar. 
 
GAROTO 
Que se foda! 
 
HOMEM 
Tá fugindo por quê? 
 
GAROTO 
Não tô fugindo de nada. 
 
HOMEM 
E o que faz aqui, então? 
 
(Garoto não responde. Homem se afasta, pega um caderno e começa a escrever.) 
 
GAROTO 
Tá escrevendo? 
 
HOMEM 
(Irritado com a obviedade da pergunta.) Não, tô jogando Paciência. 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 21212121 
 
(Volta a escrever, muito concentrado.) 
 
GAROTO 
Você é escritor? 
 
HOMEM 
(Sem olhar para o garoto.) Proctologista. 
 
GAROTO 
(Irônico.) Nossa como você é engraçado! Tô rindo pra caralho... (Pausa 
longa. Clima tenso.) Sobre o que você tá escrevendo? 
 
HOMEM 
Acho melhor pegar o caminho de volta. Daqui a pouco anoitece, e... 
 
GAROTO 
(Cortando) Você não tem que achar nada. Por que não vai cuidar da sua 
vida, escrever suas pornografias baratas e me deixa em paz? 
 
HOMEM 
Então vaza garoto. 
 
GAROTO 
Pra onde? 
 
HOMEM 
Sei lá. Não fugiu de casa? Agora se vira. E cai fora do meu território. 
 
GAROTO 
(Debochando.) Como é que é? Meu território? Essa é boa! A rua é pública. 
E eu fico aonde bem entender. 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 22222222 
 
HOMEM 
Se quiser descansar um pouco, tudo bem, fique à vontade. Mas depois 
dê um rumo pra sua vida. Ou segue adiante ou volta pra trás. Só que aqui 
você não fica. 
 
GAROTO 
Você não é meu pai pra me dar ordens! 
 
HOMEM 
E você não é meu filho pra eu tomar conta! Agora dá o fora, garoto. 
 
(Garoto tira uma gaita do bolso.) 
 
HOMEM 
É surdo, infeliz? On the road. 
 
(Garoto tira uns sons desconexos da gaita só para provocar o homem.) 
 
HOMEM 
Se não parar de tocar isso vou fazer você engolir essa porra! 
 
GAROTO 
Não curte blues, velhote? (Volta a tocar.) 
 
HOMEM 
Você nem sabe o que é blues, seu playboyzinho de merda... 
 
GAROTO 
Ah, não. Então olha só... (Toca o trecho inicial de “Key to the Highway” com 
grande desenvoltura.) 
 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 23232323 
 
HOMEM 
Me dá isso aqui! 
 
GAROTO 
De jeito nenhum... (Toca.) 
 
HOMEM 
Tô perdendo a paciência... 
 
GAROTO 
Caguei pra você! (Toca.) 
 
HOMEM 
É a última vez que vou falar. Me dá essa bosta! 
 
GAROTO 
Não! 
 
(Homem avança no Garoto para tirar-lhe a gaita. Há uma luta violenta entre ambos. O 
homem consegue tirar o instrumento das mãos dele.) 
 
GAROTO 
(Furioso.) Devolve minha gaita, seu velho filho da puta! 
 
HOMEM 
Agora ela é minha! (Guardando a gaita no bolso da calça.) 
 
GAROTO 
Devolve minha gaita, senão... 
 
HOMEM 
(Zombando.) ...eu vou correndo contar pra minha mãe. 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 24242424 
 
GAROTO 
Ta me tirando, seu bosta? Devolve a minha gaita ou eu... 
 
HOMEM 
Eu o que? 
 
GAROTO 
Te encho de porrada! 
 
HOMEM 
To gostando de ver! 
 
GAROTO 
Vá pro inferno! 
 
HOMEM 
Já tô nele há muito tempo. 
 
GAROTO 
Se você não me devolver essa gaita eu vou arrebentar a sua cara. E não 
to blefando. 
 
HOMEM 
Tô morrendo de medo! 
 
GAROTO 
Não me provoca... 
 
HOMEM 
Cai fora, pirralho. Você já me encheu o saco! 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 25252525 
 
(Homem volta para perto da barraca e continua escrevendo deixando o Garoto mais 
puto. Garoto vira o gargalo e bebe um grande gole da vodka. Respira fundo e se 
aproxima do Homem.) 
 
GAROTO 
Ei. 
 
HOMEM 
Ta aqui ainda? 
 
GAROTO 
Devolve minha gaita. 
 
HOMEM 
Eu mando via sedex. 
 
GAROTO 
(Buscando palavras.) Sabe o que você é? 
 
HOMEM 
(Remedando.) Sabe o que você é? Sabe o que você é? 
 
GAROTO 
Um tremendo de um fracassado! 
 
HOMEM 
Eu sei. 
 
GAROTO 
Não tem mulher, nem amigos porque ninguém suporta um cara como 
você. 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 26262626 
 
HOMEM 
Tem razão. 
 
GAROTO 
Um sujeito que chegou aos 40 anos, não conseguiu nada na vida e foi 
parar na lata do lixo. 
 
HOMEM 
É verdade. 
 
GAROTO 
E isso não te incomoda? 
 
HOMEM 
Nem um pouco! 
 
(Pausa. Homem para de escrever.) 
 
GAROTO 
Há quanto tempo você tá aqui? 
 
HOMEM 
Você faz perguntas demais. 
 
GAROTO 
Só tô querendo te ajudar. 
 
HOMEM 
Eu não preciso de ajuda. Se precisasse estaria deitado num divã ao lado 
de uma psiquiatra tesuda. 
 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 27272727 
 
GAROTO 
Eu acho... 
 
HOMEM 
(Cortando.) Blábláblá, blábláblá, blábláblá, blábláblá... 
 
(Homem volta a escrever.) 
 
GAROTO 
Que tanto você escreve aí, hein? 
 
HOMEM 
Dá pra fechar essa latrina? Preciso me concentrar. 
 
(Garoto senta-se no acostamento e acende um cigarro. Fica calado observando a fumaça 
se dissipar no ar. Homem escreve com mais rapidez.) 
 
GAROTO 
(Depois de uma pausa.) Escuta... 
 
HOMEM 
Ai minha pica... Você não consegue ficar quieto mesmo, hein? 
 
GAROTO 
Vamos fazer um trato nós dois? 
 
HOMEM 
Não costumo fazer trato com um desconhecido. 
 
GAROTO 
Mas eu não sou um desconhecido 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 28282828 
 
HOMEM 
Pra mim, é. 
 
GAROTO 
Ta certo. Vamos fazer assim. Você me devolve a gaita, eu vou embora e 
te deixo em paz! Tudo bem? Pode ser? 
 
HOMEM 
Mas como você é cansativo. Puta que o pariu. Já disse que não... Agora 
fazum favor pra mim? Volta pra saia da mamãe... 
 
GAROTO 
Eu não sou criança. 
 
HOMEM 
(Continua.) ...que tá na hora de tomar a mamadeira. 
 
GAROTO 
Seu filho da puta! 
 
(Irado, o Garoto avança para o Homem e começa a esmurrá-lo até derrubá-lo no chão. 
O Homem não reage e o Garoto bate-lhe cada vez mais.) 
 
GAROTO 
Você é um bosta! Lixo! Lixo de gente! Vai, reage seu escroto. Porco 
nojento. Reage desgraçado antes que eu te leve a nocaute... 
 
(Garoto vai ficando impotente ao ver que o Homem apanha sem se manifestar e aos 
poucos, para de bater nele. Levanta-se enquanto o Homem permanece no chão com o 
nariz sangrando. Garoto senta-se do outro lado e bebe mais um pouco de vodka.) 
 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 29292929 
 
HOMEM 
(Sentando-se.) Me passa a garrafa! 
 
GAROTO 
Pra quê? 
 
HOMEM 
Chega de perguntas e me dá logo essa porra! 
 
(Garoto receoso entrega a garrafa para o Homem que despeja um pouco de vodka na 
mão e vai limpando o sangue do rosto. Arranca a página que estava escrevendo no 
caderno e se limpa.) 
 
HOMEM 
(Devolvendo a garrafa.) Toma. 
 
GAROTO 
Por que você não me bateu? 
 
HOMEM 
Eu não bato em criança! 
 
GAROTO 
Mas por que então não se defendeu? 
 
HOMEM 
Porque já to acostumado a levar porrada! 
 
GAROTO 
(Sem jeito.) Desculpa aí... Foi mal... 
 
 
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HOMEM 
Tudo bem. 
 
GAROTO 
(Pausa.) O que você acha? 
 
HOMEM 
Não entendi. 
 
GAROTO 
Eu to fazendo a coisa certa se seguir por essa estrada? 
 
HOMEM 
Sua cabeça é seu guia. 
 
GAROTO 
Mas me diz... o que você acha? 
 
HOMEM 
Não acho nada. 
 
GAROTO 
Eu não quero mais voltar pra casa. Mas tenho medo de seguir por essa 
estrada porque não sei o que vou encontrar. Me responde, por favor. O que 
vou encontrar lá na frente? 
 
HOMEM 
Só cheguei até aqui. 
 
GAROTO 
Por que não seguiu adiante? 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 31313131 
 
HOMEM 
Sei lá. 
 
GAROTO 
E não tem vontade de saber? 
 
HOMEM 
Talvez. 
 
GAROTO 
(Inseguro.) Então vem comigo. Você também precisa de alguém pra... 
 
HOMEM 
(Corta.) Eu não preciso de ninguém porque aprendi a viver sozinho. E qualquer 
lugar onde eu encoste a minha cabeça, eu vou chamar de minha casa... 
 
GAROTO 
Essa frase é sua? 
 
HOMEM 
Quem me dera. É do Tom Waits. (Pausa.) Eu já tomei um rumo na vida. 
E você, garoto? O que vai fazer da sua? Recuar ou avançar? 
 
(Ouve-se a introdução de “On the Nickel” de Tom Waits. Garoto lentamente coloca a 
mochila nas costas. Para no centro do palco, olha para a direção do público e depois 
para o fundo do palco. Está indeciso. Depois de um tempo se decide e caminha para o 
fundo.) 
 
HOMEM 
Ei, garoto. 
 
 
Julio CaJulio CaJulio CaJulio Carrararrararrararrara A Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima TrombetaA Sétima Trombeta 32323232 
 
GAROTO 
O que foi? 
 
HOMEM 
(Tirando a gaita do bolso.) Sua gaita... 
 
(Garoto pega o instrumento e, de súbito, da um forte abraço no homem que não se 
manifesta.) 
 
GAROTO 
Valeu! 
 
(Sobe música. Garoto prossegue viagem. Homem, sem olhar para o garoto, senta-se e 
volta a escrever enquanto o rapaz desaparece na linha do horizonte. Luz cai 
lentamente.) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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JUST A PERFECT DAY 
 
(Noite de natal. Chove torrencialmente. O forte clarão do raio rasga o céu revelando a 
porta de um bar que está fechado. Uma mulher entra em cena toda encharcada da 
chuva procurando um lugar para se esconder. Ao ver o toldo do bar corre para debaixo 
dele. Está visivelmente cansada. Foco sobe em resistência sobre ela.) 
 
MULHER 
 Será que essa chuva não vai parar nunca? (Tremendo.) Por que eu tô 
tremendo? Não tenho nenhum motivo pra tremer. Não to com frio nem com 
fome. Só com um pouco de medo... Que bobagem. Medo! Medo de quê? 
 
(Pausa.) 
 
Por que não tem ninguém na rua? Hoje é noite de Natal... (Alto.) Ei, tem 
alguém aí? (Pausa.) Ninguém responde. Por que ninguém responde? (Alto.) 
Onde vocês estão? Não me deixem sozinha. Eu tenho medo de ficar sozinha. 
(Noutro tom.) Ainda mais com essa chuva... 
 
(Cada vez mais amedrontada.) 
 
 Ninguém devia ficar sozinho debaixo de um toldo numa noite de chuva. 
 
(Gritando.) 
 
 Por favor. Me tirem daqui. Eu preciso sair daqui... Alguém me ajude! 
 
(Vai se acalmando.) 
 
 Isso não vai adiantar de nada. Eu preciso me acalmar... 
 
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(Com a mão trêmula, massageia o peito.) 
 
Nunca tive medo de chuva. Gostava de ver a água chicoteando a 
vidraça, do cheiro do asfalto molhado, do barulho dos trovões... Até chegar 
àquela noite... Eu devia ter uns seis anos. Estava no banco traseiro de um carro 
e chovia muito lá fora. No banco da frente tinha um casal. Não lembro como 
eles eram. Nem o nome deles. Só sei que discutiam. Muito. Fiquei com muito 
medo e para me distrair desenhava figuras no vidro embaçado. De repente 
ouvi a mulher gritar: CUIDADO. O homem perdeu a direção tentando frear, 
fui lançada para frente, ouvi um forte estrondo e depois não lembro de mais 
nada... 
 
(Cai no chão quando fala da freada e se contorce de dor.) 
 
 Ai minha cabeça! Parece que vai explodir. Por que minha cabeça dói 
tanto? 
 
(Permanece assim por um tempo até se acalmar.) 
 
 Será que alguém vem me buscar?... Vou ficar aqui, quietinha, sem me 
mexer. Senão eles não me encontram. E aí não vou poder cear com eles. 
 
(Confidenciando.) 
 
Eu gosto tanto da ceia de Natal. Daquela mesa farta de comida. Peru 
com abacaxi, salpicão, farofa de frutas, bolo de nozes, rabanada, capeletti a 
romanesca, arroz de champanhe, lombo, pernil, tâmaras, damascos... Uma vez 
eu comi tanto, mas tanto, mas tanto até passar mal. 
 
(Sua fala é cortada pelo som irritante de uma sirene de policia que corta as ruas da 
cidade. Ela se apavora.) 
 
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 O que será que tá acontecendo? Acho melhor sair daqui senão eu posso 
ser assaltada! A chuva já não tá tão forte... Eu só preciso dar alguns passos... 
 
(Anda para a direita, depois para a esquerda e se perde.) 
 
 Mas qual é o caminho de volta? É para esse lado? Ou para esse? 
(Confusa.) Que raiva! Não consigo me lembrar. E olha que não estou velha... Já 
sei... Vou para esse lado. (Para a direita. Para. Pensa.) Não, acho que não é por 
aqui. Melhor ir pra essa direção. (Para a esquerda. Para. Pensa.) Não. Também 
acho que não deve ser por aqui... E agora? O que eu faço? (Decide.) Quer saber. 
Vou ficar aqui mesmo. Mais cedo ou mais tarde eles vão me encontrar... Vou 
cantar para passar o tempo. 
 
(Canta alguma música natalina e em seguida, queda-se reflexiva.) 
 
 Não sei o motivo, mas fico muito triste na noite de Natal. Engraçado,não é? Ficar triste no dia em que Jesus nasceu. É um dia de paz, de amor, de 
reflexão. Mas parece que as pessoas esqueceram o real significado dessa data. 
Acho que é isso que me entristece. 
 
(Ansiosa.) 
 
 Mas por que eles estão demorando tanto? Já deve ser quase meia-noite. 
Eu não quero passar o Natal sozinha. 
 
(A mulher olha para a parede onde está um cartaz com sua própria foto. Lê.) 
 
 Procura-se Maria de Lourdes Toledo. Desaparecida desde o dia 21 de 
dezembro de (Ano em que está.), trajando a roupa (Descreve seu figurino.) Sofre 
de problemas mentais. Entrar em contato pelo telefone... 
 
(Mulher fica intrigada.) 
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 Que coisa! Essa mulher não é estranha! Acho que conheço ela de algum 
lugar... (Suspirando.) Ai! Que triste. Se eu pudesse fazer alguma coisa para 
ajudar a família dessa pobre coitada. 
 
(Estremece com o frio.) 
 
 Tá esfriando... Acho que eles não vêm mais. Eu vou tentar voltar pra 
casa. Vou por aqui e se estiver errada eu volto por outro caminho... 
 
(Pausa.) 
 
Por que as ruas estão tão desertas? Hoje é dia de festa. Vamos 
comemorar... Mas para qualquer lugar que eu olhe estão a tristeza, o silêncio e 
o vazio... Vazio, vazio, vazio... 
 
(Perdida em seus delírios.) 
 
Medo. Angústia. Tristeza. Depressão. Vazio. O grande vazio. O Vazio 
do Mundo. A Morte do Planeta. O ódio corroendo a Humanidade. 
 
(Reflexiva) 
 
 Quanto tempo falta pro fim do mundo? 
 
(A mulher está atravessando a rua. Nisso ouve-se buzinas de um carro e uma freada 
brusca. mais nada. Luz cai rapidamente em resistência até o black-out. No escuro 
ouvimos a chuva caindo no asfalto. Entra a música “Perfect Day”, de Lou Reed. 
Lentamente luz vai subindo em resistência num foco recortado sobre o cartaz da 
desaparecida. Um relógio dá as doze badaladas. Ao longe ouvimos vozes festivas. Foco 
desce em resistência até o black-out. Música cresce.) 
 
FIM 
Dezembro/2009

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