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3 - Sócrates

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SÓCRATES
Vicente Keller
	
Sócrates, filho de Sofrônico, escultor, e Fenarete, parteira, nasceu em Atenas no ano 469 AC. Desde pequeno mostrou-se uma pessoa muito inteligente. Seu pai, escultor, queria a todo custo que ele também o fosse, e a ideia que mais apavorava a seus pais era que ele viesse a se tornar um filósofo, justamente pela situação reinante em Atenas, na época dos sofistas.
	Teve como professor, inicialmente, a Nicéforo, que deu-lhe as primeiras instruções. Depois, auxiliado por Críton, amigo de seu pai e posteriormente seu também, teve como professores a Arquelau e Anaxágoras, cujas escolas frequentou. O resto de seus conhecimentos adquiriu ouvindo os debates em praça pública, promovidos por outros filósofos e pelos sofistas. Assim, foi se aperfeiçoando. Era grande cumpridor de seus deveres para com a pátria e esteve em Potideia e Delium quando houve estas guerras, e inclusive, numa delas, mesmo sabendo o perigo que corria, carregou aos ombros o amigo Xenofonte, que veio a ser um grande historiador, que estava ferido. Fisicamente, Sócrates nada tinha de atraente - era estrábico, obeso, balofo, baixo, barba fechada - mas intelectualmente, foi proclamado pelo Oráculo de Delfos como o “mais sábio de todos os homens”. Ele é que foi o grande opositor dos sofistas e que começou a levar a filosofia grega ao seu ponto culminante com Aristóteles. Deixou os problemas da natureza e dedicou-se ao homem. O seu método de ensinar era original. Preferia morrer a renegar as convicções próprias. Gostava de conversar com todas as pessoas com quem se encontrava. Não dava valor aos bens materiais e, embora fisicamente feio, era um homem dotado de uma inteligência extraordinária, um domínio de si fora do comum, uma capacidade de trabalho e de resistência espantosas. Imperturbável, contentava-se estritamente com o necessário à sobrevivência. Nunca quis fundar uma escola para ensinar filosofia porque considerava que a sabedoria não se vende. Por isso, ensinava a filosofia em qualquer lugar em que estivesse. Passava sua vida na rua e nas praças, querendo inculcar a todos que não há nada mais importante do que “conhecer-se a si mesmo”. Costumava dizer: “Sei que nada sei”, que não deve ser confundido com ceticismo, mas como ponto de partida para um conhecimento. Não temia dizer a verdade, mesmo sabendo que por causa disto, poderia até ser morto. Em vista de seu caráter, conquistou muitos amigos, mas também inimigos que o acusaram de corromper a juventude e de ateísmo. Mesmo nesse momento, sabendo que sua vida estava em perigo, recusou o conselho dos amigos para fugir e também a sua defesa, e jamais renegou a verdade. Recusou-se a tornar-se cúmplice de um massacre e ainda o acusou em público. Jamais perdeu a calma e paz de espírito, mesmo após ouvir a sentença de condenação. E nesta ocasião, disse aos juízes:
 “Atenienses, eu vos venero e vos amo, mas devo obedecer a Deus e não a vós; enquanto estiver vivo e forças tiver, não cessarei de aplicar-me à filosofia, de dar-vos conselhos e de dizer a todos aqueles que encontrar: Ó meu amigo, como é que tu... vives tão cuidadoso de arranjar para ti a maior quantidade possível de dinheiro, de honraria e de reputação? Por que procuras tão pouco a sabedoria e a verdade?” (Apologia de Sócrates)
	Sócrates consagrara a vida a pregar a virtude, a honradez, os bons costumes e o amor à família. Toda a sua obra e a sua vida foi uma obra de conversão, de orientação da razão para a verdade. Dizia que esta era uma missão recebida do Alto, inspirada. Desta missão nada poderia desviá-lo pois, “não há nenhum mal para o homem de bem, nem durante a sua vida, nem após a sua morte”. A morte, ele a considerava como sendo “a passagem desta estada para outra”. E foi em virtude disto, que no ano 399 AC, acusado, julgado, condenado por uma diferença de trinta e três votos entre 599 jurados, bebeu tranquilamente a taça de veneno que o carrasco lhe oferecia. Mesmo neste momento, ainda filosofava e debatia com os amigos a imortalidade da alma. Então despediu-se de Críton, Platão e outros e deixou cair o braço. Sócrates não deixou obra escrita. Temos conhecimento de sua doutrina pelo que nos foi transmitido por Xenofonte em seu livro Memoráveis e principalmente por Platão, seu discípulo predileto, em Diálogos, Apologia de Sócrates e outros.
MÉTODO
Sócrates crê na razão, como a faculdade que pela dialética atinge a verdade. É preciso servir-se corretamente da razão, eliminar as suposições e os conceitos obscuros e duvidosos para se chegar à verdade. O erro provém sempre de nós, da nossa indolência em investigar a verdade, da nossa comodidade, falta de tempo, nunca, porém, da razão. O método próprio da razão para alcançar a verdade é a indução ou o diálogo. O objeto da ciência não é o sensível, o individual, o indivíduo que passa, mas é o inteligível, o conceito que se exprime pela definição. Este conceito consiste em comparar vários indivíduos da mesma espécie, eliminar-lhes as diferenças individuais, as qualidades mutáveis e reter-lhes o elemento comum, estável, permanente, a natureza, a essência da coisa. A definição, diz ele, expressa a essência da coisa definida. “A justiça, por exemplo, não consiste em não mentir, em não fazer escravos seus semelhantes (fatos particulares)... a justiça consiste em dar a cada um o que lhe pertence”. Praticamente, na exposição destas ideias, Sócrates adotava sempre o diálogo. Seu método consistia em fazer perguntas, de tal modo que levava o interlocutor à conclusão que ele queria.
	Quando se tratava de um adversário a refutar, assumia humildemente a atitude de quem aprende e ia multiplicando as perguntas até colher o adversário presunçoso em evidente contradição e constrangê-lo à confissão humilhante de sua ignorância. Esta é a chamada ironia socrática. Era irônico até consigo mesmo, pois costumava dizer: “sei que nada sei”. Por isso não queria ser mestre e não tinha discípulos, mas amigos.
	Quando se tratava de um discípulo a instruir (e muitas vezes era o adversário vencido), multiplicava ainda mais as perguntas, dirigindo-as, a fim de obter, por indução, dos casos concretos e particulares, um conceito, uma definição do objeto em questão. A este processo dava o nome de maiêutica - arte de dar à luz às ideias ou arte de partejar as ideias. Consiste em tirar a verdade presente em cada interlocutor, por meio de formulação de perguntas, levando-o à conclusão certa. Isto, porque Sócrates julga que em cada homem há ideias inatas e é preciso apenas despertá-las, tirar o véu que lhes encobre a luz da razão.
ANTROPOLOGIA
Sócrates tem um conceito otimista e elevado da natureza humana. O homem é dotado de razão, do dom da palavra e pode adquirir a ciência. Distingue no homem, o corpo e a alma - esta última é parte mais nobre, de natureza divina e invisível. Embora não se saiba com clareza em que sentido, o certo é que considerava a alma imortal. Não é claro, mas parece que considerava que o estado da alma na outra vida é destituído de vontade, no entanto vivendo num reino de justiça e de felicidade.
	Quanto ao conhecimento, sem desprezar o conhecimento sensitivo, que nos dá a conhecer as coisas concretas, particulares e corpóreas, dá ênfase especial ao conhecimento racional. O conhecimento sensível não nos leva à ciência, pois ele é mutável, inconstante e indiferente de indivíduo a indivíduo. Ele só pode nos levar à opinião. Os sofistas identificavam o conhecimento com a opinião, negando assim todo critério de verdade. Mas esta identificação não é justificável. Pois o conhecimento racional, partindo de casos e de afirmações particulares, prescinde de tudo o que os seres têm de contingente e abstraindo de suas particularidades, deixa só os elementos constantes, atingindo a sua essência. Assim, abstraindo, por exemplo, as características individuais que distinguem um homem dos outros, a razão só considera o que todos os homens têm em comum - a sua essência, isto é, aquilo que faz com que o homem seja homem. Assim se chega a definir o homem comosendo animal racional. Os conceitos universais e as definições essenciais não são variáveis de indivíduo a indivíduo, como as sensações (opinião), mas são universais e necessários.
Sócrates não sistematizou a lógica, mas abriu caminho para a sua posterior sistematização com a descoberta do conceito (ou o universal) e do raciocínio indutivo.
“Conhece-te a ti mesmo” - significa também, conhece o que há de universal em ti, e o que verdadeiramente faz de ti um homem. A partir do verdadeiro conhecimento de si, o homem pode sabiamente compreender a tarefa que deve cumprir na vida; o seu dever e a sua conduta decorrem deste conhecimento. Quem se conhece sabe o que é e o que deve fazer. A filosofia é reflexão sobre o homem. Sócrates quer que a filosofia ensine e faça com que o homem tome consciência de sua imensa dignidade, sem, é claro, deixar de reconhecer as suas misérias e a sua ignorância. Mas aquele que reconhece que é falível e ignorante, com isso mesmo prova a sua sabedoria. 
TEODICÉIA
Sócrates foi religioso, sempre se aplicou ao culto. Teve respeito e veneração pelos deuses de Atenas. Praticou o culto conforme os ritos da época. Até mesmo chegou a oferecer sacrifícios aos deuses.
	Manifesta a crença num só Deus e apresenta provas:
Teológica - Tudo o que é adaptado a um fim é efeito de uma inteligência (Deus). 
Causa eficiente - Se o homem é inteligente também inteligente deve ser a causa que o produziu. “É necessário crer então que a inteligência que está no todo disponha de cada coisa à sua vontade... e seja capaz de cuidar de todas as coisas juntas... Deus é tão grande e poderoso que pode, ao mesmo tempo, ver e ouvir tudo, estar presente em todas as partes e velar também por tudo” (Memoráveis, I, 4).
Moral - A lei natural supõe um ser superior ao homem, um legislador que a promulgou e sancionou. “Esse Deus que dirige e ordena o mundo... só é visível para nós nas obras imensas que realiza; porém permanece invisível em tudo o que estabelece em seu concerto interior” (Memoráveis, I, 3).
	Por isto, Deus não só existe mas também é Providência, governa o mundo com sabedoria e o homem pode oferecer-lhe sacrifícios e orações. Apesar desta doutrina, Sócrates tolera em muitos pontos os preconceitos da mitologia corrente, que aspira reformar.
ÉTICA
Podemos considerar Sócrates como o verdadeiro fundador da ciência moral. O problema moral, a conduta digna da vida humana são os principais objetivos de seu ensinamento. A conduta moral deve se regular no conhecimento objetivo (e não na opinião). Para Sócrates, virtude e ciência se identificam. É virtuoso quem é sábio. Pratica o bem quem o conhece. Virtude é saber - é o intelectualismo ou o racionalismo ético. Quem possui a sabedoria, possui todas as virtudes. A felicidade consiste na ciência do bem e no viver conforme a ciência, isto é, em última análise, segundo a reta razão. Quem conhece o bem não pode deixar de fazê-lo, pois quem é virtuoso é feliz. Ora, todos os homens aspiram à felicidade. Portanto, é impossível que alguém que conhece o bem - fonte de sua felicidade - faça o mal - fonte de infelicidade. Ninguém é mau voluntariamente. O homem que pratica o mal o faz por ignorância. A culpa e o vício são erros de juízo. O homem que faz o mal não quer o mal e sim o bem, mas calcula mal, buscando nos prazeres subjetivos e passageiros, ao invés de buscá-los na virtude. Para tornar o homem virtuoso basta ensinar-lhe o que é o bem. O aperfeiçoamento dos homens é uma questão de educação (ensino). Todas as virtudes pressupõem a sabedoria; todos os males são frutos da ignorância. 
	Xenofonte e Platão apresentam a moral de Sócrates como sendo bastante utilitarista. Isto quer dizer que Sócrates identificaria o bem com o útil. Mas é preciso entender bem o utilitarismo ético de Sócrates. O homem sábio, guiado pela razão, escolhe os bens melhores. A escolha de bens implica numa renúncia de bens inferiores. Para isso, é necessária uma sábia disciplina, a fim de conquistar o bem maior - a tranquilidade, a felicidade. A prática da virtude é a coisa mais útil, pois é o meio de adquirir o bem maior a assegurar a vida feliz. O homem deve procurar o seu bem e o seu proveito, mas o seu verdadeiro bem e o seu verdadeiro proveito só pode encontrá-los no bem objetivo e não no prazer e proveito individuais. Este bem objetivo é a virtude, que tem valor universal. Ela é boa, bela e útil. O bem, em última análise, é o proveito de todos. O homem, agindo pelo interesse comum, ganha também a própria felicidade, que reside na consciência de ter agido conforme a justiça, no domínio de si mesmo e dos seus caprichos e impulsos. O sábio (virtuoso) é um homem forte, senhor de si mesmo.
	A moral de Sócrates é chamada de eudemonismo ou moral da felicidade, pois repõe o fim último ou o bem do homem na felicidade, que consiste no bem e na virtude. A virtude é a lei da vida individual e social felizes. 
Consequências (do racionalismo ético) 
A virtude pode ser ensinada. Quem sabe o que é virtude, já é virtuoso. Se a virtude depende do conhecimento, não há pecado (culpa) - só há ignorância. Por isso ninguém deve ser castigado e sim ensinado. 
Determinismo - a vontade está necessariamente voltada para fazer o bem.
Negação do mal moral - ninguém peca voluntariamente.
	Sócrates reconhece, também acima das leis mutáveis e escritas, a existência de uma lei natural e independente da vontade do homem, universal; esta lei é uma vontade divina que se manifesta pela voz interna da consciência. 
A QUESTÃO SOCRÁTICA
Sócrates sabe de não saber porque sabe o que investiga e ainda não encontrou a resposta que satisfaça à pergunta. Ele descobre que a investigação é um diálogo interior, submetido às exigências de inteligibilidade que aparecem nas condições que a pergunta põe. Logo, para responder, é necessário investigar, examinar, submeter à prova as respostas hipotéticas. Nasce assim, contra o logos sofístico, o diálogo socrático; contra o falar para persuadir que se utiliza de técnicas retóricas, nasce o falar como dar uma resposta a uma pergunta precisa e exigente que, antecipando as condições de verdade da resposta, nasce a CONSCIÊNCIA INTERIOR como reduplicamento do eu que interroga e responde, confrontando com uma exigência de precisa verdade. O diálogo com o sofista é a tentativa socrática de impor não o seu método, mas a exigência inserida na pergunta. Método literário e método filosófico se encontram a nasce a arte dialógica platônica, que não ilude com a sofia das palavras, das figuras de palavras ou palavras ilusões, mas que investiga por meio da palavra verdade, ou da ironia que desmascara. Nasce igualmente uma concepção da ciência como exigência de verdade determinada e como processo auto-normativo de atos e conteúdos. Nesse contexto, filosofia é desejo de saber e aprender.

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