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Sustentabilidade Urbana na Beira Trilho

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Sustentabilidade urbana: um desafio na Beira Trilho 
 
Lorena Postal Waihrich 
Rosa Maria Locatelli Kalil 
Adriana Gelpi 
 Jussara Colet 
Gilnei José Oliveira da Silva 
 Marcos Antônio Leite Frandoloso 
Paulo César Carbonari 
 
Resumo 
 A garantia do direito humano a moradia adequada vem sendo negada ou 
negligenciada a uma parte da população formada pelo contingente de população excluída 
das cidades brasileiras. Um cenário composto por milhares de pessoas que vivem em 
condições precárias, perigosas, alojadas em casas erguidas em locais irregulares 
apresentando risco como a beira dos trilhos do trem e encostas de morro e os sem teto que 
resistem nos assentamentos urbanos provisórios sem condições de habitabilidade. O 
presente trabalho relata estudo de caso de assentamentos precários e ocupações de risco na 
cidade de Passo Fundo, em área urbana de 12 km ao longo da via férrea. Metodologia: O 
estudo foi realizado no período de 2004 a 2006, numa pesquisa transdisciplinar entre 
organizações não-governamentais, universidade e sociedade civil. Realizou-se 
levantamento de informações históricas e situacionais documentais, diagnóstico das 
situações existentes, opinião dos moradores e das autoridades públicas e privadas. Aborda 
os aspectos jurídicos, políticos, sociais e econômicos, especialmente as questões 
urbanísticas e habitacionais e de direitos humanos à moradia adequada. Resultados: Como 
resultados apresenta um diagnóstico significativo sobre a situação habitacional, apontando 
alternativas e possibilidades em nível local, estadual e federal. A difusão dos resultados foi 
publicada em relatório, vídeo, seminário e resultou na constituição de grupo de trabalho 
emergencial para viabilizar soluções mais adequadas de moradia para estas famílias. 
 
ABSTRACT 
 
CONTEXTUALIZAÇÃO 
 
Direito à moradia 
 
A moradia adequada é um direito humano preconizado pelos principais instrumentos 
internacionais dos direitos humanos, mas extrapola a questão jurídica, pois depende para 
sua execução da responsabilidade dos inúmeros agentes públicos e privados, cujo principal 
executor é o Estado. 
No Brasil, o valor humano da moradia foi acrescentado expressamente entre os direitos 
fundamentais sociais (educação, saúde, trabalho, lazer, segurança, previdência social, 
proteção à maternidade e infância, assistência aos desamparados) com a Emenda 
Constitucional nº 26, de 14 de fevereiro de 2000, que alterou a redação do art. 6º da 
Constituição Federal de 1988. Na mesma direção, o Estatuto da Cidade consolidou e 
ampliou a competência jurídica e ação dos entes públicos no que tange à formulação de 
diretrizes de planejamento urbano e a condução do processo de gestão das cidades, em 
específico por meio do Plano Diretor, além de estabelecer o direito à terra urbanizada com 
serviços essenciais de infra-estrutura e a segurança da posse. 
 
A gravidade da questão habitacional no Brasil é uma realidade historicamente inegável. A 
complexidade dos problemas habitacionais vem aumentando aos olhos de toda a sociedade, 
sem que medidas suficientemente amplas e eficazes sejam adotadas como prioridades pelos 
agentes governamentais que têm a principal e intransferível obrigação de garantir o direito 
à moradia. A inexistência de avanços concretos para a população que mais necessita de 
moradia adequada resulta da baixa (quando não quase ausente) responsabilidade integrada 
do poder público (os três entes federados) no sentido de usar de todos os esforços 
necessários para respeitar, proteger, promover e realizar, adequadamente, o direito humano 
à moradia. 
 
Moradias urbanas do beira-trilho 
 
As ocupações habitacionais formadas por populações de baixíssima renda nas áreas urbanas 
das ferrovias constituem um complexo problema social que atinge praticamente toda a 
malha ferroviária brasileira. Os casos mais emblemáticos são os assentamentos humanos 
urbanos fixados na faixa de domínio junto às áreas operacionais, considerados de alto risco, 
uma vez que as casas estão construídas numa faixa perigosamente próxima da via 
permanente dos trilhos. 
 
A estrada de ferro que cruza o perímetro urbano de Passo Fundo é parte integrante da linha 
Santa Maria-Marcelino Ramos, construída entre 1893 e 1898. Após exploração por agentes 
privadas, foi gerenciada pela Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima até a década de 
1990, quando pelo processo de desestatização, o modal ferroviário da região Sul foi 
transferido para a concessionária América Latina Logística, incluindo a cidade de Passo 
Fundo. 
 
Passo Fundo é município desde 1857, localizado na região da Produção, norte do Rio 
Grande do Sul. Tem área aproximada de 780 km
2
 e densidade demográfica de 221,8 
habitantes por km
2
 (2004). A população é estimada em 182.233 habitantes (IBGE, 2004). 
Deste total, cerca da 97,67% é população urbana e 2,33% população rural. Os indicadores 
sociais apontam taxa de analfabetismo (2000) de 5,64%; expectativa de vida ao nascer 
(2000) de 68,51 anos. Coeficiente de mortalidade infantil (2003) de 21,69; rendimento 
médio mensal nominal das pessoas com 10 anos ou mais (2000) de R$755,12; Produto 
Interno Bruto (PIB) (2002) de R$1.347.437..849; participação de 1,29% no PIB do RS e 
PIBB per capita (2002) de R$ 7.822,00. O Índice de Desenvolvimento Sócio-Econômico 
geral (IDESE/FEE, 2001) de Passo Fundo é de 0,7698; em educação é 0,8559; em 
saneamento é de 0,6501; em saúde é de 0,80228 e em renda é de 0,77097. (IBGE, 2005; 
FEE/RS, 2005). 
 
A linha férrea no município é utilizada no momento para transporte de carga, especialmente 
de produção agrícola, combustíveis, insumos e outros, com estação ferroviária e centros de 
armazenagem e logística de cargas em área próxima ao bairro Petrópolis. O município 
registra cerca de 176 matrículas de áreas urbanas e rurais, operacionais ou não, que a partir 
do processo de liquidação da RRFSA, passam a ser de propriedade do governo federal, e 
podem ser disponibilizados para programas habitacionais e de regularização fundiária para 
populações de baixa renda. 
 
A situação de Passo Fundo é, portanto, mais uma das muitas espalhadas por cidades de todo 
o país. Embora tenha sido desviada do centro da cidade na década de 1980, a linha férrea 
circunda a cidade, cortando áreas periféricas com inúmeros assentamentos regulares e 
irregulares. Por um conjunto de fatores de exclusão social, há mais de três décadas ocorre 
um intenso e continuado processo de ocupação habitacional das áreas muito próximas ao 
leito da rede ferroviária que cruza o perímetro urbano passofundense, nos bairros/vilas 
Valinhos, Vera Cruz, Victor Issler, Primeiro Centenário, Cruzeiro, São Luiz Gonzaga, Vila 
Nova e Av. Sete de Setembro. Nesses locais, embora existam assentamentos habitacionais 
irregulares construídos nos espaços não operacionais, pode-se constatar que a grande 
maioria das ocupações concentra-se nas áreas operacionais vinculadas à administração 
ferroviária da concessionária ALL e muito próximas dos trilhos. Esta extensa área, de 
mais de 12 km de extensão e de largura variável a partir de 10 m do leito da ferrovia, tem 
sido denominada pela população moradora e da cidade como sendo o beira trilho, ou seja, 
numa situação de domicílio ao mesmo tempo precária e de exclusão social e urbana. 
 
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ADOTADOS 
 
A temática da moradia adequada constitui um dos temas de atuação da Comissão de 
Direitos Humanos de Passo Fundo, desde a década de 1990. Nesse sentido, a entidade 
acompanha casos de moradores desalojados de áreas de risco, assessora cooperativas 
habitacionais autogestionárias, participa e orientamovimentos e organizações sociais, 
inclusive nas conferências municipais da cidade de Passo Fundo. A partir de 2003, 
elaborou publicações e apresentou relatórios relativos aos direitos humanos à moradia, 
incluindo para as Nações Unidas e outros organismos (CARBONARI e KUJAWA , 2004, 
KALIL, 2004). 
Aprofundando estudos no âmbito do direito à habitação, estabeleceu convênio de 
cooperação com a Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), com o objetivo específico 
de realizar o estudo de caso sobre o direito humano à moradia adequada como direito 
fundamental social nas ocupações habitacionais das áreas urbanas lindeiras aos trilhos da 
via férrea na cidade de Passo Fundo. 
 
A Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo, em conjunto com o Grupo de Estudo 
Transdisciplinar desenvolveu este estudo com a finalidade de: a) tornar visível o problema, 
abrindo espaços para desvelar a realidade e trazer à tona as situações de violação dos 
direitos humanos existentes no cotidiano das pessoas que ali moram; b) mobilizar diversos 
agentes sociais para se comprometerem com o encaminhamento de alternativas de solução 
para a problemática, e c) comprometer os entes públicos (município, estado e união) para 
enfrentar a situação à luz dos compromissos com direitos humanos. 
 
Para a realização do projeto implementou-se as seguintes estratégias de trabalho: a) 
formação de um grupo de estudo transdisciplinar, que envolveu instituições de ensino e 
pesquisa, poder público municipal, organizações não-governamentais e da sociedade civil, 
poder judiciário, associação de moradores e outros; b) elaboração e aplicação de 
questionários para moradores/as (por amostragem) das áreas de ocupação da beira-trilho, 
para agentes públicos e privados envolvidos no caso; c) avaliação das ações de reintegração 
ajuizadas contra as famílias ocupantes do beira trilho; d) consulta a instrumentos 
legislativos e documentos administrativos: e) revisão bibliográfica sobre a temática do 
estudo; f) realização de seminário para apresentação pública dos resultados e 
comprometimento dos agentes públicos e a sociedade para o enfrentamento do caso; g) 
produção de documento no formato de relatório e de vídeo. (COLET, SILVA, 
CARBONARI, 2005) 
 
Dinâmica de trabalho do grupo de estudo transdisciplinar 
 
O grupo de estudo, formado por representantes de diversas instituições e organizações da 
sociedade civil e dos moradores do beira trilho, coordenado pela Comissão de Direitos 
Humanos de Passo Fundo, participou da pesquisa entre novembro de 2004 a abril de 2005. 
Foi denominado de transdisciplinar por pretender analisar o caso numa dinâmica integrada 
de saberes capaz de transcender a centralidade científica, bem como de resgatar a 
legitimidade de saberes aquém e além da ciência e de reafirmar o valor de cada sujeito 
como portador e produtor legítimo do conhecimento. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O curso de Arquitetura 
e Urbanismo da 
Universidade de Passo 
Fundo (UPF) se fez 
representar no grupo de 
estudos, numa inserção 
na questão habitacional 
e urbana local. 
 
 
 
Houve uma sistemática de reuniões mensais ou quinzenais, em que a contribuição de 
representantes do poder público, judiciário e de financiamento enriqueceu os debates sobre 
a situação e suas perspectivas. Durante esse período foram elaborados e aplicados 
instrumentos de pesquisa de campo, cujos resultados receberam tratamento e análise 
conjunta, bem como encaminhamento de ações. Foram realizadas audiências com o 
Ministro das Cidades, e com os secretários municipais de Habitação e do Planejamento. 
Em Seminário de Apresentação a presença de grupos convidados representantes 
governamentais e da comunidade, foram apresentados os resultados e discutidos 
encaminhamentos para a situação. Além do relato oral, foi apresentado o documentário 
Trilhando Direitos Humanos produzido pela UPF. As autoridades e os participantes se 
posicionaram comprometendo-se para o encaminhamento de medidas para solucionar o 
problema, sendo que, tanto o governo estadual quanto o federal se colocaram à disposição 
para que o governo municipal tome a iniciativa a fim de dar seguimento às sugestões 
apresentadas pelo estudo. 
 
Diagnóstico da situação habitacional da beira-trilho 
Com base nas informações disponíveis e nas premissas, o grupo transdisciplinar elaborou e 
construiu questionários e roteiros para levantamento de dados junto aos moradores. Uma 
contagem rápida (metodologia do IBGE) apontou a existência de 1.086 domicílios erguidos 
nas áreas próximas ao leito da ferrovia que cruza o perímetro urbano da cidade, ocupadas 
sem que tenham sido erguidas as chamadas cercas da ferrovia para separar a faixa de 
domínio dos terrenos marginais, estradas e outras propriedades. Desse total, foram 
aplicados questionários em 100 domicílios, constituindo amostra de cerca de 10% do total. 
 
O questionário contou com 53 perguntas distribuídas nos seguintes indicadores: 
identificação; moradia (adensamento e acesso à infra-estrutura); saúde; aspecto social e 
aspecto socioeconômico. Os questionários foram aplicados diretamente aos moradores, 
com critérios de seleção, incluindo proximidade da moradia à via férrea, e dispersão nos 
diversos bairros e vilas. Ao mesmo tempo, foram realizados levantamentos fotográficos e 
registros em filmes de vídeo, bem como registros perceptivos escritos complementares às 
entrevistas. Os dados dos questionários foram transcritos, tabulados e analisados pelo grupo 
de estudos. 
 
Tempo de moradia 
Sobre o tempo de moradia, ao serem entrevistados, os moradores, considerando a 
amostragem, responderam o seguinte: 11% moram no local de 20 a mais de 30 anos; 25% 
de 10 a 20 anos; 19% de 5 a 10 anos. 11% de um a 5 anos e 20% a menos de um ano. Ao se 
perguntar se a família já morou em outra cidade além de Passo Fundo, 44% responderam 
que sim e 56% disseram não, o que praticamente metade dos moradores constituíram-se 
como cidadãos passofundenses no beira trilho e que a maioria absoluta deles (71%) são 
passofundenses de origem. 
 
Condições de moradia 
A fim de aferir as condições de moradia (adensamento) e condições dos domicílios, 
levantaram-se os seguintes dados. Sobre o grupo familiar, a pesquisa demonstra que 59% 
possuem de 3 a 6 pessoas morando juntas sob o mesmo teto; 23% tem até duas pessoas, 
18% tem de 7 a 10 pessoas. Segundo os entrevistados, 51% das pessoas residentes no 
domicílio são homens e 49% mulheres. Do universo de entrevistados, 90% disseram haver 
apenas uma família no domicílio, 9% disseram ter duas famílias e 1% três famílias. Todos 
os entrevistados disseram destinar o domicílio exclusivamente para moradias – mesmo que 
visualmente possam ser identificadas pequenas iniciativas de atividade comercial contíguas 
aos locais destinados à moradia. Perguntados sobre o número de cômodos/peças do 
domicílio para fins residenciais, os entrevistados dizem 30% ter mais de quatro; 26% três; 
20%, quatro; 18% dois e 6% um. Quando perguntados sobre o número de cômodos 
destinados a dormitório, 37% disseram ter um; 34% dois; 18% três; 6% quatro e 5% que 
não há cômodo específico. Segundo os entrevistados, a maioria utiliza material misto 
(alvenaria e madeira para a construção: 4% disseram utilizar compensado e 5% dizem ter 
piso de chão batido). Sobre o estado de conservação do domicílio, a avaliação dos 
moradores informa que, para 46% é regular; 20% é péssimo; 20% é bom e 14% precário. 
Segundo os entrevistados, 33% fizeram melhoria no domicílio e 67 % não. Dos moradores 
entrevistados, 60% consideram o domicílio como próprio; 10% cedido; 4% alugado e 26%em outra situação. Quanto à existência de banheiro, 71% mencionam ter e 29% não ter. 
 
Quanto aos aspectos sociais 
O levantamento mostra que a renda familiar dos entrevistados é baixa, já que 57% das 
famílias têm renda familiar de até R$420,00; 25% até R$260,00; 3% até R$100,00, 8% sem 
renda; 16% até 560,00; 9% até 720,00; 6% até R$1mil, 4% acima de R$1mil. Sobre a 
origem da renda familiar da pessoa responsável financeiramente pela família, 32% disseram 
vir de emprego formal. 15% de trabalho informal. 14% de aposentadoria; 12% de trabalho 
autônomo; 3% de seguro desemprego e 24% de outra fonte. Perguntada se recebe 
assistência: 41% dos entrevistados respondeu que sim e 59% que não. Sobre a participação 
da família em alguma organização de lazer, convivência ou religiosa: 34% respondeu que 
participa e 66% que não participa. Ao serem perguntados sobre se alguma pessoa da 
família participa de organizações específicas: 10% respondeu que participa da Associação 
de Moradores; 2% do Centro comunitário; e 46% de algum outro tipo de organização, 
sendo que 42% responderam não participar de qualquer tipo de reunião. Com interesse de 
saber se as famílias entrevistadas participam de alguma organização coletiva de 
reivindicação de moradores, 5% disse participar e 95% disse não participar. Dos 
entrevistados, 12% disseram haver cobrança de Imposto Predial e Territorial Urbano 
(IPTU) e 88% disseram não haver. 
 
Infra-estrutura urbana 
Percebe-se que a ocupação deu-se em razão da ausência de condições para viabilizar 
moradia adequada – o que pode ser completado pela falta de políticas e programas de 
atendimento das demandas deste tipo de população. Considerando-se que a ocupação 
ocorre de forma individual, não havendo registro de organização social ou política para tal, 
também não há registro de retirada forçada. O que se nota é uma conivência dos gestores 
públicos ao longo do tempo, já que as administrações públicas foram oferecendo serviços 
públicos, tais como água, energia elétrica e telefonia, embora um número significativo de 
famílias, que ocuparam a área mais recentemente, não estejam contempladas, atendidas, 
pela prestação desses serviços públicos. Ao serem perguntados sobre as condições de 
acesso a infra-estrutura e destino do lixo, constatou-se que, na amostragem entrevistada: 
88% possuem instalações de energia elétrica, 91% tem acesso à água encanada e em 80% o 
lixo doméstico é destinado para coleta do sistema público de recolhimento (muitos 
indicaram queimar e enterrar o lixo). Mas, há domicílios nos quais faltam quaisquer desses 
serviços, pois 6% dos entrevistados disseram estar carentes de redes de iluminação pública, 
água, coleta de lixo, além de outros serviços públicos. 
 
Violação dos direitos humanos 
Perguntados sobre a existência do direito à moradia adequada: 98% responderam 
positivamente e 2% negativamente, pronunciando-se livremente sobre as questões relativas 
ao direito e sua violação, mais como um sonho do que possibilidade real. Os moradores 
também manifestaram sua opinião sobre a obrigação dos órgãos públicos (governo 
municipal, estadual e federal) oferecer condições para que possam ter acesso à moradia 
adequada dizendo que sim em 93% das respostas e não em 7% delas. Respondendo aos 
motivos para tal, se pronunciaram indicando o dever dos governantes, mencionando a 
ineficiência das ações. Perguntados se estão registrados em algum cadastro da Secretaria 
Municipal de Habitação em Passo Fundo, 31% responderam que sim e 69% que não. 
Ademais, perguntados se sabem da existência de processo judicial que pede a saída das 
famílias do beira-trilho, 41% disseram que sim e 59% que não. 
Pode-se notar que os moradores têm plena consciência de que a moradia é um direito e que 
é dever do poder público garantir-lhe o acesso a tal direito. Não têm clara a consciência da 
situação de violação. Mas indiretamente, pela consciência do direito, indicam, pelo 
caminho da compreensão da necessidade, a possibilidade de enfrentamento da situação 
como uma questão de direitos humanos. 
 
Alternativas do ponto de vista dos moradores 
Segundo os moradores, caso o beira trilho seja urbanizado, a maioria diz dispor-se a 
permanecer no local por motivo de facilidade de acesso, apelo ao lugar, proximidade de 
família e vizinhança. Poucos moradores disseram não querer permanecer no local mesmo 
se a área fosse urbanizada, entendendo que a urbanização manteria os trilhos. 
Sobre a disposição em sair do local caso lhes seja oferecido outro local para morar, 57% 
disseram aceitar sair colocando algumas condições; 40% disseram não aceitar sair do local 
e 3% não responderam. 
 
Condições de habitabilidade na área e no entorno 
Percorrendo-se e observando-se as áreas próximas à via permanente da ferrovia, nota-se 
que muitas famílias foram avançando e erguendo inadequadamente suas casas. Num 
primeiro momento, tem-se a impressão de que para os moradores, em certa medida, não 
assusta mais o perigo representado pelo comboio de trem que passa muito próximo dos 
domicílios. Nem mesmo os estridentes ruídos dos vagões parecem incomodar e o sinal 
dado pelas locomotivas aproximando-se avisa as crianças que tranqüilamente estão entre os 
trilhos transitando e brincando da necessidade de deixar livre o leito da ferrovia. No 
entanto, a aparente tranqüilidade do local não esconde o perigo de vida dos moradores, 
visto que há iminente risco de gravíssimos acidentes. 
 
 
 
 
 
Os riscos de acidentes aumentam em razão do mau estado de manutenção da ferrovia. Em 
muitos trechos densamente povoados à beira da via férrea, a infra-estrutura ferroviária está 
em estado precário de conservação, já que parece não ter havido a devida reforma e 
manutenção. Ao longo do leito da ferrovia no perímetro urbano de Passo Fundo, constatou-
se precariedade e desleixo em muitos locais, notadamente, a falta ou podridão dos 
dormentes de madeira e a ausência de prego de linha ou de tirefão que fixam os trilhos nos 
dormentes de madeira, bem como a inexistência ou pouca quantidade de brita nos trilhos; 
além da vegetação grande e alta existente em muitas extensões das áreas operacionais e não 
operacionais. 
 
Análise da questão de demanda judicial 
Em estudo de documentos jurídicos, verificou-se que o problema habitacional da beira 
trilho tem pronunciamento do Poder Judiciário em primeira e segunda instância. Em 1993, 
a Rede Ferroviária Federal ajuizou uma ação de reintegração de posse contra quinhentas 
famílias ocupantes da faixa operacional da ferrovia entre os bairros Valinhos e Vera Cruz. 
Os moradores agiram em sua defesa mediante representação voluntária de advogados e 
políticos locais. O pedido foi julgado improcedente, num julgamento considerado de 
posição inovadora e progressista sob a ótica dos direitos humanos, considerando questões 
sociais e econômicas, buscando uma forma de resolver o caso por vias alternativas e 
complementares à judicial. Mesmo com recurso interposto, o julgamento do tribunal em 
2004, confirmou a improcedência do pedido de reintegração, visto que as famílias ocupam 
a área objeto de questão há décadas. Não obstante, até então, não houve qualquer 
encaminhamento legal que atendesse às recomendações contidas no processo, 
particularmente no sentido de promover políticas públicas capazes de resolver o problema, 
seja do ponto de vista social, habitacional ou urbanístico. 
 
Posição dos agentes envolvidos a respeito da situação. 
Para conhecer a posição dos agentes envolvidos e as possibilidades futuras foram 
elaborados questionários específicos para dirigentes da Caixa Econômica Federal, da 
Secretaria Municipal de Habitaçãoe da América Latina Logística. A finalidade foi de 
esclarecer aspectos sobre financiamentos habitacionais, situação da malha ferroviária em 
relação aos ocupantes das áreas de risco, políticas públicas municipais e sobre a 
possibilidade de projetos específicos de regularização fundiária e urbanização das áreas da 
beira trilho. 
 
CONTRIBUIÇÕES E ENCAMINHAMENTOS 
A metodologia de trabalho empregada privilegiou a construção coletiva e a presença de 
múltiplas vozes, tornando concreta a perspectiva transdisciplinar de abordagem, 
entendendo-a como a mais adequada para a compreensão do objetivo deste estudo. 
 
A situação jurídica e fundiária das áreas próximas à linha ferroviária ainda é bastante 
complexa, mesmo estando sob propriedade da União, que indica que podem ser utilizadas 
em projetos habitacionais e de regularização fundiária. 
 
A amostragem revelou que a maioria das famílias é de baixa renda, vivendo em condições 
inadequadas de moradia, pela má qualidade ou adensamento ou pela falta de infra-estrutura 
urbana e precariedade dos serviços básicos. Assim estão impossibilitadas de acessar 
qualquer programa de financiamento habitacional de caráter oneroso, e tampouco de 
receber recursos para melhorias, visto que a área é de ocupação irregular. 
 
O governo federal, por meio do Ministério das Cidades dispõe de programas e articulações 
que podem atender a questão especialmente o Programa de Regularização Fundiária das 
áreas da RFFSA, devendo atuar em conjunto com o município e o estado. O governo 
estadual através da Secretaria Estadual de Habitação e Desenvolvimento Urbano, 
manifesta-se interessado, com certos recursos, mas reitera que cabe ao município a 
iniciativa de organização de soluções. 
 
Ou seja, o enfrentamento do problema beira trilho depende da cooperação entre as esferas 
administrativas do poder público (federal, estadual e municipal), sendo que a iniciativa 
deve ser do poder público municipal. 
 
Embora o poder público municipal conte com Secretarias Municipais de Habitação e de 
Planejamento, Conselho e Fundo Municipal de Habitação e Bem-Estar Social, 
historicamente tem tratado a questão beira trilho com descaso, sem incorporar às 
prioridades de desenvolvimento urbano e política habitacional. Após a apresentação dos 
estudos houve a instituição de grupo de trabalho especial para dar encaminhamento às 
questões da moradia do beira trilho, incluindo cadastramento das famílias e levantamento 
dos domicílios nas áreas ocupadas. 
 
Dentre inúmeros encaminhamentos, o estudo sugere ainda na esfera municipal: 
 Conclusão do novo Plano Diretor da Cidade, com participação popular, levando em 
conta na sua elaboração a necessidade de definição sobre a manutenção ou retirada 
dos trilhos, visto que a questão interfere estruturalmente nas perspectivas 
estratégicas do desenvolvimento urbano de Passo Fundo. 
 Criação do Conselho Municipal da Cidade com caráter deliberativo e autonomia 
para propor fiscalizar e monitorar a articulação de todas as políticas públicas da 
cidade, incluindo política habitacional e urbana. 
 Manutenção de cadastros e bancos de dados atualizados sobre problemas e 
demandas habitacionais e de áreas públicas e privadas passíveis de uso para 
assentamento urbano, especialmente para população em situação de risco. 
 Elaboração de planejamento efetivo para os problemas de moradia, firmando 
parcerias institucionais e em articulação com as demais esferas governamentais. 
 Promoção de formação e desenvolvimento de ações de capacitação de agentes para 
o enfrentamento das questões de moradia e de direitos humanos. 
 Definição de fontes estáveis de recursos destinados à produção e melhoria de 
moradias, especialmente de populações me situação de maior vulnerabilidade 
social, como as das áreas de beira trilho. 
 
O problema do beira trilho é complexo e exige considerar diversas dimensões e 
possibilidades, entre outras, regularização, urbanização e produção de novas oportunidades 
habitacionais, sempre envolvendo ao máximo os moradores na construção das soluções 
necessárias e possíveis. 
 
 RESULTADOS OBTIDOS 
 
Os resultados da presente pesquisa tornam-se extremamente relevantes, em virtude de sua 
difusão imediata e simultânea aos grupos envolvidos, especialmente aos moradores, 
tornando público e comunitário um profundo diagnóstico sobre as condições de moradia de 
cerca de mil famílias de baixa renda no município de Passo Fundo. Este trabalho sintetiza 
os resultados contidos no relatório final, enfocando do ponto de vistas do grupo 
transdisciplinar, dos moradores, da esfera governamental e dos demais agentes envolvidos. 
(COLET, SILVA, CARBONARI, 2005) 
 
 
CONCLUSÃO 
 
O estudo mostra que há disposição coletiva para pensar e propor diversas alternativas para 
enfrentar o problema do assentamento irregular ao longo da ferrovia, contanto que haja 
participação direta dos moradores, exigindo-se, no entanto, estudo técnico e constituição de 
fóruns de debate sobre o tema que envolva o conjunto dos interessados na resolução do 
problema. Observe-se que o dilema da situação que historicamente opôs os extremos tirar 
os trilhos ou tirar os moradores revela-se a partir deste estudo muito mais complexo e 
diversificado. Qualquer destas alternativas ou qualquer alternativa que venha a ser 
implementada implicará tomar em conta os diversos sujeitos envolvidos na questão. 
Sobretudo, de modo especial, os moradores do beira trilho, além de exigir mais a inclusão 
de várias demandas e aspectos do que tirar esta ou aquela. 
 
Este esforço deverá ser tarefa a ser continuada através da consolidação de grupo de trabalho 
específico, já instituído pelo poder público municipal, com a participação das organizações 
que realizaram o estudo, representação dos moradores do beira trilho e técnicos da área 
urbana e habitacional. Este fórum poderá pactuar soluções concretas para enfrentar a 
situação de violação na qual se encontram os moradores, que estejam inseridas na 
perspectiva de realização dos direitos humanos, em especial o de moradia, e de 
desenvolvimento sustentável e solidário na cidade. 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
BRASIL. Estatuto da cidade: guia para implementação pelos municípios e cidadãos. Brasília: 
Câmara dos Deputados, 2002. 
CARBONARI, Paulo César; KUJAWA, Henrique Aniceto (Org.) Direitos humanos desde Passo 
Fundo. Passo Fundo: CDHPF, 2004. 
COLET, Jussara; SILVA, Gilnei José Oliveira da, CARBONARI, Paulo César (Coord.) Direito 
humano à moradia adequada: desvelando o Beira Trilho: situação e perspectivas. Passo Fundo: 
CDHPF/EdIFIBE, 2005. 
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo 2000. Disponível em: 
<www.ibge.org.br>. Acesso em 2005. 
KALIL, Rosa Maria Locatelli. Direitos humanos e moradia em Passo Fundo: uma experiência 
autogestionária. In: CARBONARI, Paulo César; KUJAWA, Henrique Aniceto (Org.) Direitos 
humanos desde Passo Fundo. Passo Fundo: CDHPF, 2004.

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