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Apostila Completa História da América 2

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HISTÓRIA DA AMÉRICA II12
UNIMES VIRTUAL
Aula: 01
Temática: A sociedade colonial inglesa 
 na América do Norte
 
 Um dos fatos mais intrigantes para todos aqueles que se 
debruçam sobre a história da América é a constatação das 
diferenças que marcam os processos de colonização, bem 
como as diferenças entre os Estados formados após a independência e, 
principalmente, a imensa diferença entre o desenvolvimento político e eco-
nômico das ex-colônias inglesas da América do Norte e os demais países 
do chamado Novo Mundo.
Para que se possa compreender tais diferenças é necessá-
rio considerar o processo de colonização dos atuais Esta-
dos Unidos e parte do Canadá. Já se tornou senso comum 
apontar para esse processo de colonização como sendo um processo de 
povoamento e não de exploração, diferente, portanto, do que aconteceu 
nas outras regiões da América, compreendendo desde a região do Méxi-
co, passando pelo Caribe e a América do Sul. 
As formas de colonização explicam parte das diferenças. Antes de mais 
nada, é preciso deixar de lado a idéia de que a colonização inglesa tinha 
como característica inerente uma maior tolerância em relação às suas co-
lônias. Se considerarmos a colonização inglesa em regiões do Caribe e em 
regiões da África e da Ásia ou, da mesma forma, a colonização realizada 
pelos holandeses, é possível observar o empreendimento colonial basea-
do na extração e na agricultura voltado para a exportação, com base em 
grandes propriedades monocultoras e com utilização de trabalho compul-
sório, tal como se estabeleceu nas regiões colonizadas pelos ibéricos.
Outro ponto importante a ser considerado é que nem toda a região das 
Treze Colônias inglesas da América do Norte estava destinada especifi-
camente ao povoamento, tal como se pode constatar pela existência do 
sistema de plantation nas colônias da região sul do que hoje são os Es-
tados Unidos.
Entretanto, muito embora se possa falar do caráter mercan-
tilista da colonização inglesa, as diferenças da metrópole 
colonizadora em relação às metrópoles ibéricas são bastan-
te relevantes e explicam parte das causas da emancipação das treze colô-
nias - New Hampshire, Massassuchetts, Connecticut, Rhode Island, Nova 
York, Pensilvânia, New Jersey, Delaware, Maryland, Virginia, Carolina do 
HISTÓRIA DA AMÉRICA II 13
UNIMES VIRTUAL
Norte, Carolina do Sul, Geórgia. Explica, sobretudo, que o Estado surgido 
desse processo tenha assumido características tão diferentes dos outros 
que surgiriam no continente. 
A maior parte dos colonizadores da região pertenciam a minorias religiosas, 
perseguidas desde o início da reforma religiosa inglesa, ainda no século XVI, 
mas principalmente, no período que se seguiu à morte de Elizabeth I, em 
1603. Embora fossem maioria, os colonos não vieram apenas da Inglaterra, 
mas também de outras regiões da Europa. Mesmo perseguidos na metrópo-
le, tais colonos não deixaram de levar para as novas terras parte da tradição 
política inglesa, o que implicou no estabelecimento do auto-governo e ainda 
a consideração da necessidade de limites ao poder do rei. 
O absolutismo inglês desenvolveu-se de modo muito di-
ferente do que pode ser observado na área continental da 
Europa. A tradição de um parlamento — se não comple-
tamente independente, mas atuante — e traços de igualdade jurídica já 
presentes na Inglaterra desde a Idade Média, influenciariam sobremaneira 
a organização dos colonos no Novo Mundo, bem como as idéias que leva-
ram à independência e aos fundamentos do novo Estado. Para ilustrar essa 
diferença do absolutismo inglês com relação aos demais, observemos o 
que coloca Perry Anderson a respeito da justiça:
Ao passo que no continente o sistema de justiça se 
achava geralmente dividido entre a jurisdição real 
segregada e as jurisdições senhoriais, em Inglaterra 
a sobrevivência dos tribunais populares pré-feudais 
proporcionara uma espécie de terreno comum em 
que podia conseguir-se uma mistura de ambas, pois 
os xerifes que presidiam aos tribunais dos condados 
eram de nomeação régia não-hereditária, e no en-
tanto selecionados de entre a fidalguia local, não de 
entre uma burocracia central; e os próprios tribunais 
retinham vestígios de seu carácter original como as-
sembléias jurídicas populares, nas quais os homens 
livres da comunidade rural se apresentavam perante 
seus iguais. (ANDERSON, 1984, p.131.)
Note-se na passagem acima o peso do local — da comunidade — na tra-
dição judiciária inglesa e, ainda, do princípio de igualdade que, se não era 
suficiente para eliminar todos os privilégios conferidos às classes nobres, 
ao menos reconhecia a todos os homens livres, a possibilidade de se fazer 
representar. Como veremos mais adiante, a valorização do local, da co-
munidade, bem como o direito de representação estendido a todos, eram 
parte do ideário dos colonos que promoveram a independência.
HISTÓRIA DA AMÉRICA II14
UNIMES VIRTUAL
Há ainda que se considerar que, muito embora a confissão 
religiosa ocupasse um aspecto central na sociedade que se 
formou nas Treze Colônias, não houve nelas o peso ou a in-
fluência da religião que houve na América ibérica. Essa ausência pode ser 
explicada pela herança inglesa, uma vez que, a ruptura entre Henrique VIII 
e a autoridade papal, com a posterior criação de uma religião do Estado 
submetida à autoridade do rei, livrou a Inglaterra e suas colônias da influ-
ência e do poder da Igreja de Roma, permitindo o surgimento de estruturas 
políticas e sociais diferenciadas em relação às que se pode observar na 
América ibérica.
Ainda a respeito da religião, boa parte dos colonos das terras inglesas da 
América do Norte era protestante. Max Weber, em sua análise sobre o 
desenvolvimento do capitalismo no Ocidente e sua relação com o ethos 
protestante, fez a seguinte colocação: 
Ainda mais notável, […], é a relação entre uma 
filosofia da vida religiosa e o mais intenso de-
senvolvimento da perspicácia comercial entre 
as seitas cujo alheamento da vida se tornou tão 
proverbial quanto a sua riqueza, principalmente 
entre os quakers e os menonitas. O papel que os 
primeiros tiveram na Inglaterra e na América do 
Norte coube aos segundos na Holanda e na Ale-
manha. (WEBER, 2001, p.23.) 
Como se pode notar pelo trecho acima e, como veremos mais adiante, a 
influência do ethos (do grego Ethos – lugar, modo de discurso) protestante, 
com todos os seu elementos de ascese, valorização do trabalho, da pou-
pança, da disciplina do corpo e da mente permaneceram na configuração 
do Estado que surgiu depois da independência. 
Ainda sobre o protestantismo e suas concepções de mundo é importante 
atentar para o este outro trecho em Weber:
À organização social-orgânica, do tipo fiscal. monopo-
lista adotada pelo anglicanismo sob os Stuarts, […], 
a essa ligação do Estado e da Igreja com os monopo-
listas, fundamentada numa ética social cristã – opu-
nha o calvinismo, […], os motivos individualistas da 
aquisição racional e legal através da habilidade e da 
inciativa de cada um, que – […] – teve uma parte 
ponderável e decisiva no desenvolvimento industrial 
que se deu apesar da, e contra a, autoridade do Esta-
do. (Id. Ibid, p.98.) 
HISTÓRIA DA AMÉRICA II 15
UNIMES VIRTUAL
O trecho acima diz respeito à oposição dos calvinistas na Inglaterra à di-
reção dada pelos Stuarts à economia, e revela a mesma disposição moral 
entre a maior parte dos colonos na América. 
Para além das questões políticas, ideológicas e culturais, mas relaciona-
da a todas elas, existe uma outra questão fundamental,que diz respeito à 
economia desenvolvida nas Treze Colônias ou em parte delas. Como já se 
colocou, as colônias do Sul, Maryland, Virgínia, Carolina do Norte, Carolina 
do Sul e Geórgia, desenvolveram, principalmente, uma economia voltada 
para o mercado externo,nos moldes do pacto colonial, tal como se pôde 
observar em outras áreas da América — nas colônias ibéricas, ou mesmo 
nas áreas de colonização francesa, inglesa e holandesa nas Antilhas, por 
exemplo. No entanto, nas colônias do Norte e do Centro,a economia se 
desenvolveu de outro modo.
No Norte e no Centro as condições climáticas e geográficas 
muito semelhantes às da Europa impediram o desenvolvi-
mento de uma agricultura ou de atividades extrativistas de 
produtos tropicais que interessassem ao mercado europeu. Dessa manei-
ra, não foi imposto às tais colônias o modelo de administração típico das 
áreas coloniais da América, baseado num estrito controle das metrópoles. 
Floresceu, então, nessas regiões a atividade mercantil voltada para o mer-
cado interno e para o mercado externo, livre das amarras da fiscalização 
metropolitana. O mesmo se deu com a atividade manufatureira. 
Empurrados por necessidades de expansão — já que ocupavam uma es-
treita faixa de terra — pelo dinamismo da economia e pelo crescimento 
da população, os colonos iniciaram um movimento de ocupação de terras 
mais ao Norte, na direção do Canadá. O conflito entre os colonos ingleses 
e a França que dominava a região contribuiu para a Guerra dos Sete Anos 
(1756-1763) entre esse país e a Inglaterra. A guerra, que se desenrolou 
também na Europa e na Ásia, envolvendo aliados dos dois principais impé-
rios, contou com uma intensa participação dos colonos. Entretanto, apesar 
da vitória inglesa, o rei Jorge III proibiu o acesso dos colonos americanos 
às terras do vale do Ohio. Além disso, as despesas com a conflito impli-
caram na elevação da carga tributária para os colonos, o que aumentou a 
revolta entre eles. 
Ademais, em função das despesas do Estado e dos novos ventos que so-
pravam na economia inglesa, com o franco desenvolvimento da Revolução 
Industrial, a disposição da metrópole mudou em relação às suas colônias, 
aumentando a fiscalização sobre elas para evitar o contrabando e garantir 
mercado para os produtos industrializados e o fornecimento de matéria 
prima. O súbito recrudescimento do pacto colonial e a negativa inglesa de 
assegurar às colônias a participação de seus representantes nos proces-
HISTÓRIA DA AMÉRICA II16
UNIMES VIRTUAL
sos decisórios metropolitanos que lhe diziam respeito lançaram as bases 
para a independência. 
Nesta aula pudemos ver como algumas das características ide-
ológicas e culturais presentes nas colônias inglesas da Amé-
rica do Norte foram importantes para o estabelecimento das 
diferenças sociais, políticas e econômicas em relação à América Ibérica.
A esse respeito reflita: Qual é o lugar das questões ideológi-
cas e culturais na determinação dos processos históricos? 
Tais questões são sempre determinadas pelos aspectos 
econômicos? 
HISTÓRIA DA AMÉRICA II 17
UNIMES VIRTUAL
Aula: 02
Temática: A independência das Treze Colônias 
 e a formação do Estado
 
Tal como visto na aula anterior, questões objetivas como 
o recrudescimento do pacto colonial da metrópole inglesa 
com relação às suas colônias na América do Norte, empur-
rou-as para o processo de independência. É importante lembrar que nesse 
primeiro momento o I Congresso da Filadélfia que foi realizado em 1774 
estabeleceu como objetivo a participação dos colonos nas decisões da 
metrópole, no que dissesse respeito a eles e seus negócios. Este mesmo 
processo será visto em boa parte da América Ibérica no processo das 
independências, ou seja, o objetivo inicial muitas vezes não era a emanci-
pação, e sim, alcançar um outro status de mais liberdade e participação 
junto à metrópole. A esse respeito coloca Arendt,
Em outras palavras, devemos nos voltar para as Re-
voluções Francesa e Americana, e devemos levar em 
conta que ambas foram protagonizadas, em seus es-
tágios iniciais, por homens que estavam firmemente 
convencidos de que não fariam outra coisa senão res-
taurar uma antiga ordem de coisas que fora perturba-
da e violada pelo despotismo de monarcas absolutos 
ou por abusos do governo colonial. Eles alegavam, 
com toda sinceridade, que desejavam o retorno dos 
velhos tempos em que as coisas eram como deviam 
ser. (ARENDT, 1988, p. 35.)
Vimos que a influência de outros fatores de natureza ideológica que defi-
niram o meio social da colônia e continuaram exercendo influência sobre 
o Estado constituído na região. Entretanto, é importante ressaltar que, no 
contexto do processo que levou à independência, a influência das idéias 
do Iluminismo foi fundamental. No conjunto dos movimentos políticos con-
siderados revolucionários, tais como a Guerra de libertação das Treze Colô-
nias a Revolução Francesa e, até mesmo, movimentos de menor alcance 
e importância como a Inconfidência Mineira de 1789, é possível perceber 
a sua influência do movimento das Luzes.
Ideais como liberdade, e igualdade, no que diz respeito aos direitos; o 
anticolonialismo e, no caso da Independência dos Estados Unidos, o anti-
despotismo podem ser observados. A esse respeito vejamos,
 
O horror ao despotismo foi o traço de união de todos 
HISTÓRIA DA AMÉRICA II18
UNIMES VIRTUAL
os filósofos da Ilustração. Voltaire combateu a tirania 
religiosa e a exercida pelo aparelho judicial arcaico 
dos parlamentos: Montesquieu pregou o princípio 
da divisão dos poderes com a finalidade principal de 
evitar a tirania que resultaria da supremacia de um 
dos poderes, e foi o mais veemente crítico, em geral, 
do despotismo, forma de governo cujo princípio é o 
medo, em contraste com a república, cujo princípio é 
a virtude, e a aristocracia, cujo princípio é a honra.( 
ROUANET In: NOVAES, 1992, p. 336.)
Ora, se considerarmos as causas objetivas da independên-
cia, bem como o fato de que nos seus primeiros momentos 
o que desejavam os colonos não era independência, mas 
a “não taxação sem representação”. Veremos que o que de fato animou 
a luta por uma maior participação nas decisões e, em seguida pela inde-
pendência, foi o horror ao despotismo e à tirania inspirado pelas idéias 
iluministas. 
Em 1775, no II Congresso da Filadélfia, sem o atendimento das reivindi-
cações dos colonos pela metrópole, a idéia de separação começa a ser 
gestada. Em 1776 é publicada a Declaração de Independência, da qual se 
reproduz um trecho a seguir.
Quando, no curso dos acontecimentos humanos, se 
torna necessário um povo dissolver laços políticos 
que o ligavam a outro, e assumir, entre os poderes 
da Terra, posição igual e separada, a que lhe dão di-
reito as leis da natureza e as do Deus da natureza, o 
respeito digno às opiniões dos homens exige que se 
declarem as causas que os levam a essa separação.
Consideramos estas verdades como evidentes por si 
mesmas, que todos os homens foram criados iguais, 
foram dotados pelo Criador de certos direitos inalie-
náveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a 
busca da felicidade.
Que a fim de assegurar esses direitos, governos são 
instituídos entre os homens, derivando seus justos 
poderes do consentimento dos governados; que, 
sempre que qualquer forma de governo se torne des-
trutiva de tais fins, cabe ao povo o direito de alterá-la 
ou aboli-la e instituir novo governo, baseando-o em 
tais princípios e organizando-lhe os poderes pela for-
ma que lhe pareça mais conveniente para realizar-lhe 
a segurança e a felicidade. Na realidade, a prudência 
recomenda que não se mudem os governos instituí-
dos há muito tempo por motivos leves e passageiros; 
e, assim sendo, toda experiência tem mostrado que 
HISTÓRIA DA AMÉRICA II 19
UNIMES VIRTUAL
os homens estão mais dispostos a sofrer, enquanto os 
males são suportáveis, do que a se desagravar, abo-
lindo as formas a que se acostumaram. Mas quando 
uma longa série de abusos e usurpações, perseguin-
do invariavelmente o mesmo objeto, indica o desígniode reduzi-los ao despotismo absoluto, assistem-lhes 
o direito, bem como o dever, de abolir tais governos 
e instituir novos-Guardas para sua futura segurança. 
Tal tem sido o sofrimento paciente destas colônias 
e tal agora a necessidade que as força a alterar os 
sistemas anteriores de governo. A história do atual 
Rei da Grã-Bretanha compõe-se de repetidos danos 
e usurpações, tendo todos por objetivo direto o esta-
belecimento da tirania absoluta sobre estes Estados. 
Para prová-lo, permitam-nos submeter os fatos a um 
cândido mundo. (DECLARAÇÃO de independência, 
1776, online)1
É possível, a partir desse trecho da declaração redigida por Thomas Jeffer-
son, verificar claramente algumas das idéias colocadas acima a respeito 
das condições objetivas e subjetivas que conduziram à independência dos 
Estados Unidos.
A partir da ruptura então declarada, têm início a Guerra de Independência, 
de 1776 a 1783. O comando do exército libertador foi entregue a George 
Washington. A partir de 1778 foi estabelecida uma aliança entre o Estados 
Unidos e a França. Esta última via na guerra e no apoio aos revolucionários 
a possibilidade de enfraquecer a hegemonia da Inglaterra. Em 1783, der-
rotada, a Inglaterra reconhece a independência dos Estados Unidos. 
Tal Independência, para alguns, surge como sendo a principal fonte de 
inspiração para os movimentos de libertação que surgiriam na América 
depois. Outros consideram que foi um movimento que influenciou a Revo-
lução Francesa. No entanto, com relação aos movimentos de libertação da 
América, à exceção talvez da Inconfidência Mineira, em 1789, movimento 
como já se disse de alcance e importância reduzidos,2 todos os outros 
movimentos parecem ter sido muito mais influenciados pela Revolução 
Francesa, além dos fatores relacionados às guerras napoleônicas do sécu-
lo XIX, do que pelo movimento dos Estados Unidos. A respeito do alcance 
da Revolução Americana, vejamos o que coloca Arendt:
1 Para consulta à Declaração da Independência dos Estados Unidos de 1776 na íntegra, 
acesse o endereço no site da Embaixada Americana,
http://www.embaixada-americana.org.br/index.php?action=materia&id=645&s 
2 A este respeito afirma Rouanet: “Com exceção do semiproletário Joaquim José da 
Silva Xavier e do filho de artesão que foi José Joaquim Maia, os inconfidentes foram em 
geral proprietários e exprimiram interesses e preocupações de proprietários: Para alguns 
a Inconfidência teria sido exatamente isso: uma conjuração em favor da propriedade.” 
(ROUANET, in: NOVAES , 1992, p. 342.) 
HISTÓRIA DA AMÉRICA II20
UNIMES VIRTUAL
Foi a Revolução Francesa e não a Americana, que 
ateou fogo ao mundo, e foi, conseqüentemente, do 
curso da Revolução Francesa, e não do desenrolar 
dos acontecimentos na América, ou dos atos dos 
“Pais Fundadores” que o atual uso da palavra revolu-
ção recebeu suas conotações e matizes em todos os 
lugares, inclusive nos Estados Unidos. A colonização 
da América do Norte e o governo republicano dos Es-
tados Unidos constituem talvez o maior e, certamente, 
o mais audacioso empreendimento do povo europeu; 
contudo, os Estados Unidos tiveram efetivamente a 
iniciativa de sua própria história por pouco mais de 
cem anos, em esplêndido, ou não tão esplêndido, iso-
lamento do continente-mãe. […] A triste verdade da 
questão é que a Revolução Francesa que redundou 
em desastre, tenha feito história no mundo, ao pas-
so que a Revolução Americana, tão triunfantemente 
vitoriosa, tenha permanecido um acontecimento de 
importância quase que apenas local. (ARENDT, 1988, 
p. 44-45.)
A independência não alterou significativamente a estrutura social e econô-
mica que já havia no período colonial. Os estados do Sul mantiveram a eco-
nomia de base escravista, enquanto o Norte prosseguiu com as mesmas 
características de sociedade baseada nas médias e pequenas propriedades, 
com as atividade voltadas também para o mercado interno e com signifi-
cativa produção manufatureira. A independência não alterou as condições 
sociais porque elas não faziam parte do movimento revolucionário. Estas 
questões, na sua forma mais política e econômica do que social, só surgi-
riam de fato como causas na Guerra de Secessão de 1860 a 1865.
Socialmente vimos, então, que nada, ou muito pouco se al-
terou. O que nos permite, então, falar da Revolução Ameri-
cana? Na verdade a grande e maior novidade está na forma 
e nos princípios fundadores do Estado. A experiência absolutamente nova 
da fundação de uma república, tal como a que surgiu na América do Norte, 
provocou a curiosidade e o fascínio de estudiosos da época. Atualmente 
ainda pode ser visto como um feito sem precedentes. Para que se possa 
compreender algumas das características essenciais desse Estado que 
surge e seus princípios fundadores é interessante considerar alguns dos 
princípios estabelecidos pela Constituição promulgada em 1787, que im-
plementou como forma de governo a república federativa, a divisão dos 
poderes, o mandato de quatro anos para o presidente da nação, dentre 
outros princípios fundamentais fortemente influenciados pelo ideário ilumi-
nista e que, até então, não existiam.,. Os Estados Unidos transformara-se, 
portanto, em uma república única e sem precedentes na história, do ponto 
de vista dos seus fundamentos. 
HISTÓRIA DA AMÉRICA II 21
UNIMES VIRTUAL
Em 1789, um outro documento, a Carta de Direitos composta pelas dez pri-
meiras emendas à Constituição foi redigida, sendo ratificada pelos estados 
em 17913.Tal documento, dentre outros direitos, estabeleceu o direito à 
liberdade de culto, o direito de possuir armas, o direito a julgamento rápido 
e público entre outros. Essencialmente a Carta de Direitos estabelece os 
direitos individuais, impondo limites à ação do Estado, assegurando aos 
cidadãos a defesa contra o poder do Estado. A luta contra a tirania deveria 
continuar no Estado independente e sem monarca. Defender-se dela é a 
tarefa dos cidadãos que devem zelar e lutar por seus direitos.
Vimos nesta aula as características essenciais do proces-
so de independência das chamadas Treze Colônias inglesas 
que deu origem á República dos Estados Unidos da Amé-
rica. Como foi demonstrado, grande foi a influência do ideário Iluminista 
nesse processo.
Para trabalhar um pouco mais a questão do ideário por trás 
do movimento de libertação dos Estados Unidos, identifique 
no trecho da Declaração de Independência destacado nessa 
aula as evidências mais fortes de tal influência.
3 Para consulta ao texto integral da Constituição dos Estados Unidos e da Carta de Direi-
tos acesse o site da Embaixada dos Estados Unidos em Brasília, http://www.embaixada-
americana.org.br
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Tocqueville: a Realidade 
da Democracia e 
a Liberdade Ideal 
 
 
Célia Quirino dos Santos 
 
Texto disponível em www.iea.usp.br/artigos 
As opiniões aqui expressas são de inteira responsabilidade do autor, não refletindo necessariamente as posições do IEA/USP. 
 1
Tocqueville: a Realidade 
da Democracia e a Liberdade Ideal 
 
Célia Nunes Galvão Quirino dos Santos 
 
Um dos aspectos mais interessantes do pensamento político de Alexis de 
Tocqueville é sua constante tentativa de ajustar o seu ideal de Liberdade à realidade sócio-
política de seu tempo. Suas análises da democracia americana e da revolução francesa, 
seus discursos e toda sua atividade política como deputado e durante a revolução de 1848 
denotam essa constante preocupação. Aparentemente, sua missão parecia ser uma só: como 
seria possível adequar o que considerava fundamental para a existência de qualquer ser 
humano, a liberdade de cada um, tanto como indivíduo quanto como cidadão, à realidade 
sócio-política existente? 
No processo de defesa de seu ideal,obrigatoriamente, o primeiro passo deveria ser 
o de desvendar o que seria essa realidade. Era preciso, inicialmente, conhecer o terreno, tal 
como se apresentava, onde deveria florescer a liberdade. Em segundo lugar, considerando-
se a realidade em questão, investigar quais deveriam ser as ações políticas adequadas para 
a construção de uma situação que permitisse o nascimento e a permanência da liberdade. 
Em terceiro lugar, como num manifesto especialmente, dirigido aos franceses, mostrar 
como a atividade mais importante de qualquer ser humano é a atividade da política, na sua 
conotação do público e universal, ou seja, aquela atividade que se exerce no espaço público 
da palavra e da ação, lembrando a linguagem e muito próximo dos atuais ensinamentos de 
Hannah Arendt. 
Mas era preciso também desvendar por que em determinadas situações concretas os 
indivíduos, ou melhor, os indivíduos-cidadãos, poderiam encontrar maiores possibilidades 
de usufruir da realização do seu ideal de liberdade. É, entretanto, a partir da realidade tal 
como ela se apresenta que, pela ação dos homens, o seu ideal de liberdade vai encontrar 
uma forma de existência ao construir uma nova realidade. Embora, as reais condições de 
vida, a econômica, a social e a política de indivíduos, de classes sociais, de um povo, de 
uma nação e mesmo de um Estado, para Tocqueville, sejam fatores determinantes e 
condicionantes da atividade pública, os homens não poderiam abandonar a busca pela 
concretização de um ideal. Assim, ele não descarta o fato de uma realidade ser 
condicionadora da concretização, ou não, do ideal libertador e liberal. No entanto, ela não 
pode ser considerada como um fator impeditivo da realização desse ideal. Essa contradição 
 2
lógica e histórica parece ter atormentado toda sua trajetória intelectual e está presente em 
toda sua obra e vida pública. 
Diferentemente da filosofia política que o antecede e apesar da clara influência nos 
seus trabalhos da obra de Montesquieu e por vezes faça citações e demonstre certas 
preferências ou antipatias, por determinados autores como Maquiavel, Rousseau, Burke e 
mesmo Hegel, as leituras de Tocqueville demonstram muito mais seu interesse pelos 
historiadores, sobretudo franceses e contemporâneos. Admirava os ensinamentos de 
Maquiavel e por vezes os aplicava, mas sua conhecida crítica moralista sempre estava 
presente. Sua oposição mais evidente e mais constante parece ter sido a Rousseau. Talvez o 
drama teórico tocquevilliano estivesse inteiramente ancorado na proposição rousseauniana 
sobre a questão da liberdade e da igualdade. Burke poderia ter sido uma inspiração maior, 
sobretudo nos assuntos relativos à tirania da maioria e da sociedade de massa, mas em suas 
críticas aos ensinamentos de Burke, nas suas reflexões sobre a revolução francesa, 
considerava-os válidos apenas para a Inglaterra, pois lá as transformações democráticas 
poderiam ter-se passado das revoluções. Não era o caso da França, onde as revoluções 
pareciam ter sido necessárias. Em carta da Alemanha a seu amigo Corcelle, em 1854, 
portanto depois do golpe de Luis Bonaparte, quando se afastou completamente da política, 
Tocqueville critica a filosofia de Hegel. Segundo alguns de seus comentadores, 
dificilmente Tocqueville teria tido acesso direto às obras de Hegel. Além disso, suas 
críticas a Hegel parecem ter saído de idéias e comentários mais comuns e correntes nesse 
período, na Alemanha. Sobretudo porque, nos advertem em notas os organizadores dessa 
correspondência entre os dois amigos, essas manifestações de Tocqueville sobre Hegel são 
confusas e endossam os argumentos, tanto os da direita quanto os da esquerda, contra esse 
filósofo. 
Em suas obras, Tocqueville, não parece querer mostrar o que poderia ou deveria ser 
uma nova organização política, um novo sistema de organização de poderes ou uma nova 
filosofia explicativa do nascimento e do desenvolvimento da dominação e do poder 
político no mundo. Tampouco busca indicar como devem se comportar os homens para 
adquirir poder. Talvez por isso não apareça para a maioria dos seus comentadores como 
um filósofo político. Suas investigações estão sempre voltadas para poder compreender e 
explicar uma dada realidade sócio-política. E, apesar de arriscar-se a apresentar cada uma 
como parte de um processo mais geral, não é particularmente favorável à construção de 
grandes teorias explicativas sobre o desenvolvimento da humanidade. Além disso, é a 
defesa de um ideal, enquanto realização de uma idéia, como valor principal que pudesse se 
 3
concretizar, que o move enquanto analista e homem público. Sem dúvida, seus primeiros 
trabalhos e análises de realidades, ainda quando muito jovem, nada mais são do que 
comentários de um estudioso da história e dos costumes de alguns povos. Assim, aos 21 
anos, ao escrever sobre sua viagem à Sicília, já desenvolve uma longa argumentação sobre 
as condições sócio-econômicas do país. Procura explicar a pobreza da região estabelecendo 
uma correlação entre o tamanho do país, muito pequeno, em contraposição à existência de 
grandes propriedades e logo generaliza esse raciocínio. Aproximando-se muito das análises 
de Montesquieu sobre a possibilidade da democracia vir a se desenvolver melhor em países 
de menor extensão territorial, Tocqueville argumenta que, pequenos países não podem 
prosperar se apenas alguns poucos possuírem grandes propriedades. Ao contrário, a grande 
propriedade só seria compatível e possível de criar riquezas em países de grandes 
extensões de terra. Discussões deste tipo são uma constante em suas obras, procurando 
sempre estabelecer correlações entre as questões econômicas e a situação social e política 
de um povo. A maneira pela qual se dá a produção de riquezas no antigo regime ou no 
moderno sistema capitalista não é, para ele, nem o objeto central de seus estudos, nem o 
cerne da questão que pretendia elucidar. Na verdade, não há em Tocqueville uma 
preocupação maior em relacionar a democracia com fatores essencialmente econômicos. 
Apesar de, se apresentar como um crítico da industrialização, pelos males sociais e 
culturais que produzia ou que poderia vir a produzir, também, como bom herdeiro do 
iluminismo, era capaz de levar em consideração as benesses que as velhas e novas formas 
de produção de riqueza eram capazes de criar. No entanto, para ele, essa análise não 
aparecia como o ponto de partida, fundamentalmente necessário para explicar a sociedade 
que lhe era contemporânea ou mesmo o fenômeno da democracia. Sem dúvida, a questão 
da produção industrial, nos Estados Unidos, na Inglaterra e na França, foi, por ele, 
analisada como fator importante para o crescimento da nação e de suas riquezas. Mas, era 
também um grande perigo ameaçador para o futuro do desenvolvimento dos homens, pela 
sua massificação, pelo seu embrutecimento e conseqüente impossibilidade de virem a ser 
cidadãos livres no pensar e agir. A produção industrial era um fato dado irreversível. Era a 
responsável pela criação de uma nova forma de desigualdade social, a seu ver, das piores. 
Mas o processo de democratização também, apesar de claudicante, era irreversível. 
Sua fama advém, sobretudo, de seus escritos, de suas análises sobre situações 
concretas e de regiões bem definidas: a democracia na América, o antigo regime e a 
revolução na França, a colonização da Argélia, o estado social e político das classes 
trabalhadoras em Birmingham e em Manchester ou simplesmente notas, idéias e 
 4
observações sobre a Inglaterra, o colonialismo inglês na Índia, etc.. Mas Tocqueville 
parece realizar todos esses estudos com um único fito, pelo qual parece estar sempre 
conclamando a todos para que lutem porele da única forma possível, isto é, agindo 
politicamente. É de uma práxis política que ele reclama. No entanto, é apenas sua obra 
escrita que parece ter alguma importância e por isso é ainda hoje lembrado. E embora 
houvesse tido uma ativa vida política e enquanto deputado fosse sempre reeleito, pelo 
menos até o golpe de Luis Napoleão, mesmo para seus contemporâneos sua atividade 
política não aparece como a de alguém que quisesse ou pudesse mudar o rumo da história. 
Sozinho, ou com poucos adeptos, nunca chegou a encontrar um partido político, no qual 
pudesse se sentir confortável com suas idéias, apesar de quase todas as tendências terem 
tentado cooptá-lo. Afinal, sua família era da antiga nobreza, aliada dos Bourbons e, sem 
dúvida, esses o viam como se fosse membro nato dos Legitimistas. Por não ser um adepto 
da revolução, o partido da Ordem e os Orleanistas pensavam em atraí-lo e mesmo liberais 
mais independentes, como Lamartine ou seu amigo Beaumont, o viam como parte de seu 
grupo. Desde sua primeira eleição como deputado preferia se colocar solitariamente nos 
assentos que eram definidos, na Câmara, como centro-esquerda. Aliás, depois do golpe de 
Luis Napoleão, ele próprio reconheceu que havia se saído muito melhor na sua produção 
escrita, sobretudo no que se referia à elaboração de análises de realidades, do que em seus 
discursos e atividade política. Enfim, havia sido melhor intelectual, sociólogo, historiador e 
analista político, do que homem político. 
Sem dúvida, para Tocqueville o ideal, como importância e constância, vinha em 
primeiro lugar e, por isso mesmo, deveria ser a meta final. Uma vez que o processo 
igualitário, a democracia, é a categoria definidora e providencial da realidade do 
desenvolvimento da história das nações, a única e verdadeira luta que é preciso ser vivida e 
que diz respeito a toda humanidade é aquela que os homens realizam para ser e se manter 
livres. Essa liberdade, embora pudesse aparecer como genérica e vaga, era 
fundamentalmente a liberdade política, porque é esta que permite aos homens manter sua 
liberdade. Isto é, poderem ser livres para se manifestar social e politicamente, livres para se 
realizar como cidadãos de uma nação também livre e independente. No cerne da questão 
pode-se encontrar o problema clássico de Rousseau. Não a Vontade Geral obrigando os 
homens a ser livres, mas em Tocqueville o apelo é feito a cada um e a todos para que 
exerçam uma ação política organizada, adequada a cada realidade, de tal forma que o agir 
na esfera pública seja o ato mais importante de cada cidadão. Sobretudo, sem jamais ser 
 5
indiferente à atuação na vida pública. Os negócios públicos, os negócios do Estado, são 
também da responsabilidade de todos os cidadãos. 
Porém não é possível imaginar essa atividade se realizando sem um conhecimento 
anterior e necessário da realidade em que se quer atuar. Ou seja, para Tocqueville, era 
necessário realizar pesquisas e análises sobre as relações econômicas, sociais e políticas 
entre as diferentes classes sociais, enquanto costumes, hábitos, instituições, leis, valores, 
crenças, atividades produtivas, sistema de governo, etc. Era ainda preciso investigar a 
história da nação, seu prestígio e poder e a própria situação dos nacionais, pois afinal uma 
nação que não é livre e independente não pode produzir cidadãos livres. 
Embora desde Maquiavel já se apelasse para a necessidade do conhecimento da 
história e das condições reais de um povo para o exercício da ação política adequada e 
embora Maquiavel salientasse como a "fortuna" poderia ser transformada sob a ação 
correta de um Príncipe "virtuoso", da mesma forma, em Tocqueville, a realidade aparece 
como determinante da existência e da situação sócio-política dos indivíduos e, também, 
pode e deve ser modificada pela ação dos homens. Em Tocqueville, no entanto, pelo 
menos em relação à política, essa ação é própria de todo cidadão e deve ser realizada como 
uma constante na sua vida social e política para atingir e manter o ideal de liberdade, para 
que a liberdade não se perca por acomodação ou abandono. É essa visão tocquevilliana do 
desenvolvimento do processo histórico-político que explica porque a atividade principal e 
mais importante de todo o cidadão deva ser a atividade da política, entendida enquanto 
esfera pública. Ao contrário de uma política de defesa de "laissez-faire”, como se 
apresentava ou se costuma ainda hoje pensar, a idéia liberal na economia, o liberalismo 
político em Tocqueville tem um caráter de ação, de intervenção na realidade, de atividade 
importante e absolutamente necessária para todos. Transformando-se pouco a famosa frase 
de Jefferson, aliás, citada por Tocqueville, se "o preço da liberdade é a eterna vigilância" 
esta não poderia ser passiva e requer um combate constante enquanto prática política por 
excelência. 
 
1. A ANÁLISE DO REAL, ENQUANTO MOMENTO DADO 
E ENQUANTO PROCESSO DEMOCRÁTICO INEVITÁVEL 
 
Aparentemente, duas questões se apresentam e são necessárias para se compreender 
o pensamento político de Tocqueville. A primeira refere-se ao real, àquilo que existe, à sua 
própria realidade, vivida a qual buscava conhecer e analisar. Essa apesar de se manter em 
constante movimento, pois que se desenvolve como um processo, inevitável e, por isso 
 6
mesmo, não depende da ação dos homens. A segunda diz respeito ao fator transformador e 
depende inteiramente da ação dos homens. 
Sua curiosidade em conhecer os meandros do mundo sócio-político não se 
restringiu ao que ocorria na França. A América do Norte atraia-o, sobretudo porque se 
apresentava, naquele momento, como sendo a mais nova experiência política realizada 
pelos homens em um determinado país. A democracia americana surgia como uma 
situação exemplar e, como tal, era percebida como o futuro da humanidade. Era lá também 
que a democracia parecia se realizar mais plenamente. Os Estados Unidos, por isso, seriam 
o locus privilegiado para o desenvolvimento de uma sociedade mais igualitária que a 
européia. Além disso, o povo americano havia conseguido se manter livre, ao construir 
essa democracia. Como seria possível conhecer essa realidade, onde a democracia se 
realizava? Quais seriam as condições sócio-políticas reais? Qual a relação dessa situação 
com a realidade francesa, naquele momento e em relação à sua história, uma vez que eram 
dois povos com história, costumes, instituições e situação bastante diferentes. A 
comparação surgia para Tocqueville como necessária para pensar seu próprio país, para 
analisar e compreender o que estava acontecendo e qual poderia ser o futuro da França. E, 
foi isso que ele se propôs fazer, para que os franceses pudessem saber como agir em 
relação ao futuro do seu povo e de seu país. Acabou fazendo mais. Ao criar uma teoria do 
processo democrático, ao analisar a realidade democrática americana e ao compará-la com 
o processo francês, criou um modelo, um "tipo ideal" de democracia. Também conseguiu 
anunciar aos franceses, através de seus estudos e de seus discursos políticos, o que lhes iria 
acontecer. Toda sua obra parecia um grande manifesto político. 
Desde o início de seus preparativos para realizar a pesquisa, já a considerava a 
grande obra de sua vida. Além de procurar se instruir, por meio de leituras de historiadores 
e de comentaristas de sua época, procurou se informar com pessoas que, por algum motivo, 
pudessem lhe fornecer conhecimentos mais precisos sobre a América. Sua pesquisa se 
desenvolveu com a sofisticação de uma enquete moderna. A indagação tocquevilliana 
sobre como conhecer a realidade sócio-política americana para poder compreender a 
democracia não parece ser explicitada teoricamente. Pouquíssimassão suas referências à 
maneira pela qual está se realizando seu aprendizado e não há nenhuma declaração formal 
de como deverá realizar o seu processo de conhecimento da realidade sócio-política 
americana. Talvez ele próprio não pensasse ser necessário explicar os seus métodos, uma 
vez que as longas entrevistas que realizou, os questionário que elaborou e mesmo os dados 
estatísticos que considerou mais importantes foram, na sua grande maioria, 
 7
cuidadosamente preservados em seus "cadernos", em suas anotações e até em sua 
correspondência íntima, ou são claramente apresentados nas suas obras. De uma certa 
forma, parece ter realizado um trabalho ao mesmo tempo de antropólogo, sociólogo e 
cientista político modernos. Apesar de não haver nenhuma explicitação de como teria 
ocorrido sua coleta de dados ou que tipo de metodologia teria usado, no entanto, ao 
construir os seus conceitos o faz a partir de um projeto bem elaborado, cuidadoso e 
utilizando-se de todo tipo de investigação a que pudesse ter acesso e que considerasse 
necessário para atingir seu objetivo, assim como um excelente cientista social moderno 
analisa e critica as realidades estudadas com rigor e adequação. Em sua correspondência 
com amigos e parentes, especialmente com Gustave de Beaumont, com quem parte em 
viagem, para os Estados Unidos, para realizar a grande obra, e com quem já vinha 
discutindo os detalhes da futura pesquisa, procura mostrar como esta deveria ser 
desenvolvida para que pudessem conhecer como funcionam realmente as instituições 
americanas, das quais todo mundo fala e ninguém conhece e, ainda como este estudo 
deveria ser detalhado e científico o quanto possível. Mas, como um pensador político 
preocupado com o futuro do seu país e de seus compatriotas, evidentemente ancorado em 
seus claros valores, como advertência e recomendação, procura mostrar aos seus leitores, 
quais seriam as soluções possíveis, para determinadas e diferentes situações. Em outras 
palavras, conclama, através de sua análise-manifesto, à realização de atividades políticas 
adequadas para se atingir determinados fins, fundados no que considera o mais precioso 
valor humano universal, a preservação da liberdade de cada um, face à realidade de uma 
sociedade moderna, massificante e a um Estado centralizador. 
Em abril de 1831, Tocqueville parte para os Estados Unidos. Havia pouco mais de 
dois anos que Andrew Jackson havia sido eleito presidente. Ainda nesse período de 
expansão e formação da nação, Jackson ficou famoso como o mais populista dos 
presidentes americanos e como responsável pelo caráter mais democrático do governo. A 
ascensão de Jackson é sempre apresentada como o momento que marcou a profunda 
mudança que vinha ocorrendo na sociedade americana e a 
 
nítida ruptura com o passado representada pela eleição de 1828. 
Desaparecera o decoro federalista de Washington e John Adams e a 
democracia cortês virginiana de Jefferson.1 
 
 
1 Nye, R.B. e Morpurgo, J.E.. História dos Estados Unidos, ed. Ulisseia, Lisboa, 1955, vol.II, p. 52. 
 8
Sem qualquer formação política mais elaborada, se comparado aos Adams, Jefferson e 
Madison que o antecederam, os temas fundamentais de sua campanha e da democracia 
jacksoniana foram apenas um nacionalismo militante e um igualitarismo no acesso aos 
postos burocráticos. 
Segundo Hofstadter, 
 
a eleição de Jackson foi mais um resultado, que uma causa do 
desenvolvimento da democracia e a ‘revolução de 1828’ foi mais 
uma reviravolta de pessoal [nos postos públicos] do que de idéias 
ou programas.2 
 
Em relação às eleições de 1824, quando apenas 355.000 homens votaram, o número de 
eleitores, em 1828, havia crescido bastante, passando para 1.155.000. O período entre essas 
duas eleições parece ter sido de enorme aumento de interesse da população, não apenas 
pelas eleições, mas também pelas coisas da política em geral. É verdade que, desde 1812, 
 
as massas de não proprietários haviam começado, no início 
silenciosamente e quase sem nada obstruir, a entrar na política. 
Entre 1812 e 1821 seis estados do oeste haviam decidido se 
incorporar à União com a condição de que se estabelecesse o 
sufrágio universal para o homem branco. Entre 1810 e 1821, 
quatro dos estados mais antigos, consideravelmente deixaram cair a 
condição de proprietário para ser eleitor.3 
 
A qualidade do eleitor vinha pois mudando. Pode-se dizer que a democratização do voto 
parecia se desenvolver com a participação de novo tipo de eleitor, da entrada de novos 
estados na União e do aparecimento de novas profissões, nos velhos estados. 
Ainda, segundo Hofstadter, os Estados Unidos, no início dos anos 30, quando 
Tocqueville aí aporta, apesar de já possuir uma indústria nascente e mesmo que 
determinadas produções fossem bem desenvolvidas, como por exemplo, a naval, era ainda 
uma nação de fazendeiros e pequenas cidades. As indústrias, que já haviam se expandido 
em algumas áreas, não estavam ainda organizadas como num sistema fabril. A maior parte 
 
2 Hofstadter, Richard. The American Political Tradition, vintage books, N.Y., 1948. p. 55. 
3 Idem, Ib., p.50. 
 9
da produção era realizada em pequenas unidades nas quais o patrão era uma espécie de 
artesão supervisionando seus aprendizes. A possibilidade de passar de empregado a patrão 
parecia muito próxima. O desenvolvimento dos transportes e a possibilidade de se ampliar 
o comércio para fronteiras cada vez mais distantes possibilitava essa visão otimista do 
processo. 
 
O florescimento da manufatura no leste, o rápido povoamento do 
oeste preencheram largamente o espírito de empresa. O americano 
típico era um promissor capitalista, um duro trabalhador, uma 
pessoa ambiciosa para quem a empresa era uma espécie de religião 
e por toda parte ele encontrava estímulos para ampliar o seu 
negócio. Se algum ódio de classe existia era voltado contra os 
bancos e os banqueiros que dificultavam os empréstimos e 
tornavam a vida mais difícil e cara.4 
 
O momento era de total otimismo econômico, parecia que todos igualmente poderiam 
enriquecer e se tornariam capitalistas. A comparação que Hofstadter faz desse período com 
o do "New Deal" de Roosevelt é muito interessante. 
 
O movimento jacksoniano e o 'New Deal' foram ambos lutas de 
amplos setores da comunidade contra uma elite empresarial e seus 
aliados... Mas, os dois movimentos se diferenciavam num aspecto 
muito importante: O 'New Deal' foi intencionalmente baseado na 
premissa de que a expansão econômica tinha chegado a um fim e as 
oportunidades econômicas estavam desaparecendo. Essa política 
foi implementada numa tentativa de estabelecer uma ascendência 
do governo sobre os negócios particulares. O movimento 
Jacksoniano aumentou as oportunidades que já se expandiam e veio 
ao encontro do desejo comum de alargá-las ainda mais, removendo 
as restrições e os privilégios que tiveram suas origens em atos de 
governos anteriores. Com algumas qualificações era 
essencialmente um movimento de "laissez-faire", uma tentativa de 
divorciar o governo dos negócios. A era jacksoniana é comumente 
 
4 Idem, Ib., p.57. 
 10
reconhecida no folclore histórico americano como uma fase de 
expansão da democracia, mas é muito pouco lembrado que foi 
também uma fase na expansão do capitalismo liberado.5 
 
Em A Era Jacksoniana, Sellers, May e McMillen defendem a idéia de que 
 
com a posse de Andrew Jackson, as forças do igualitarismo 
assumiram o poder no governo federal [...]No dia da posse, 
Jackson abriu a Casa Branca a uma multidão turbulenta de bem 
nascidos e humildes chocando a sociedade oficial mais antiga, mas 
anunciando inconfundivelmente a convicção do novo regime de 
que o homem comum era tão bom como o aristocrata.6 
 
Essa posse é sempre descrita como o marco simbólico da ascensão de novas classes sociais 
e de sua novas posições na política americana. Ela é apresentada como uma invasão de 
bárbaros, como se 
 
a cidade de Washington tivesse sido inundada por gentes das terras 
do interior, rudes, turbulentas, vestidas de pano grosseiro, que 
percorriam as ruas embriagadas no meio de grande alarido [...] 
Jackson foi a pé e de cabeça descoberta através das ruas 
enlameadas até o Capitólio para prestar juramento [...] “o reinado 
da população parecia triunfante”.7 
 
É conhecida a maneira pela qual Jackson começou seu governo distribuindo cargos 
públicos aos que o haviam eleito sem nenhuma preocupação com suas capacidades. Para 
ele qualquer cidadão honesto poderia ocupar postos administrativos e muito bem servir o 
seu país. Os jacksonianos gostavam de afirmar que o poder político não podia ser usado 
para obter privilégios econômicos: "Direitos iguais para todos, privilégios especiais para 
ninguém". 
 
5 Idem, Ib., p.56. 
6 Sellers, May e Macmillen. Uma reavaliação da História dos Estados Unidos, Zahar ed., Rio de Janeiro, 
1985, p.138. 
7 Nye, R.B. e Mopurgo, J.E. op. cit., p.52. 
 11
Mas, embora Jackson defendesse a presença das novas classes emergentes na 
política como uma visão da importância da participação popular, o que poderia aparecer 
como uma posição favorável à descentralização, era um forte defensor da União Federal. 
Os jacksonianos pareciam manter uma posição ambivalente em relação ao federalismo. Por 
um lado, 
 
percebiam vagamente que a concentração de poder em Washington 
poderia trazer consigo a centralização, a estratificação e, 
possivelmente privilégios especiais e uma hierarquia; por outro, 
concordavam com a importância que deveria ter o governo federal 
enquanto salvaguarda da nação. Assim, mantinham tanto uma 
ligação profunda com o governo nacional, quanto uma enorme 
suspeita em relação ao Estado centralizado ou burocrático. Não que 
os jacksonianos temessem, realmente, o Estado; temiam, em vez 
disso, que o controle desse Estado pudesse um dia ficar na posse de 
um grupo minoritário com interesses especiais.8 
 
Essas modernas descrições da democracia americana do período jacksoniano são 
bastante próximas dos depoimentos e das análises de Tocqueville quando de sua viagem 
aos Estados Unidos. Sempre comparando com a situação das classes sociais na França, 
Tocqueville anota em seus cadernos, em novembro de 1831: 
 
A relação entre as diferentes posições na América é bastante difícil 
de compreender e os estrangeiros normalmente são capazes de 
cometer dois grandes erros: ou eles pensam que nos Estados 
Unidos não existe distinção entre pessoas, com exceção daquelas 
com méritos próprios ou, chocados com a importância que aqui se 
dá à riqueza, acreditam que em muitas monarquias européias, na 
França, por exemplo, usufrui-se de uma igualdade mais real e mais 
completa do que nas repúblicas americanas. Acredito que há um 
exagero nas duas maneiras de se enxergar o problema.9 
 
 
8 Idem, Ib., p.57. 
9 Tocqueville, Alexis. Voyages en Sicile et aux États Unis , Gallimard, Paris, 1957. p.278 a 280. 
 12
O olhar de Tocqueville, ao apresentar a democracia americana como uma sociedade 
de homens mais iguais, parece ter se fixado em três aspectos importantes e os ter eleitos 
como aqueles que são significativos para que se pudesse compreender o fenômeno 
democracia. O primeiro foi definido e classificado como o de "igualdade de condições". O 
segundo diz respeito à igualdade de oportunidades. O terceiro, não menos importante, é 
aquele que faz com que a sociedade americana não possua, ou pelo menos não aparente 
possuir, uma estratificação social rígida, nem permita haver qualquer impedimento social, 
legal ou político à ascensão social. Isto é, os americanos se encaram como iguais não 
apenas perante a lei, mas também ao exercer qualquer atividade social. 
 
De início é bom limitar bem o problema: Não é sobre a igualdade 
perante a lei que se está referindo, esta é completa na América; ela 
não é apenas um direito, mas é também um fato. Pode-se mesmo 
afirmar que, se a desigualdade existe em qualquer lugar nos 
Estados Unidos, há na esfera política uma ampla compensação em 
favor das classes médias e inferiores que, juntamente com os 
nomes tradicionais, preenchem quase todos os postos eletivos. Falo 
da igualdade nas relações sociais. Esta igualdade que faz com que 
certos indivíduos se reúnam nos mesmos lugares, compartilhem 
suas idéias e seu prazeres, unam suas famílias. É neste aspecto que 
é preciso distinguir entre a França e a América. As diferenças se 
tornam essenciais.10 
 
No entanto, reconhece Tocqueville que 
 
as pessoas que possuem as mesmas profissões, as mesmas idéias, a 
mesma educação escolhem-se e se reúnem por uma espécie de 
instinto. 
 
Mas, 
 
a diferença é que nenhuma regra arbitrária e inflexível preside esse 
arranjo. [...] Assim, na América, observa-se menos que em 
 
10 Idem, Ib., p.279. 
 13
qualquer outra parte esse desejo ardente de uma classe partilhar não 
apenas os direitos políticos mas também os prazeres das outras. 
Esta é a boa distinção da sociedade americana da nossa.11 
 
Apesar de Tocqueville considerar essa igualdade como típica das sociedades 
democráticas e apesar de apresentar as vantagens que essa igualdade pode representar no 
desenvolvimento dos povos democráticos, também pondera os malefícios que dela podem 
advir social e politicamente. 
Em primeiro lugar, ela pode criar o seu contrário. Pode desenvolver a pior das 
desigualdades, a conferida pela riqueza, tal como já se observa na sociedade americana. 
 
O dinheiro cria na sociedade uma verdadeira classe privilegiada 
que se mantém à parte e procura demonstrar às outras sua 
preeminência.12 
 
Sem dúvida, nesse caso, o acúmulo de riqueza poderia fazer nascer, por exemplo, 
uma classe de capitalistas mais abastada que viesse a se perpetuar como uma elite com 
modelos de vida, ambições e valores burgueses, onde o lucro seria o único bem. Porém, 
observa Tocqueville que, se por um lado, essa distinção poderia vir a criar uma nova elite, 
a qual traria conseqüências ainda piores para a existência da liberdade que aquelas 
desenvolvidas pela aristocracia européia, por outro, essa diferença, numa sociedade 
democrática, poderia ser menos funesta que os preconceitos de nascimento e de profissão, 
pois, as desigualdades de classe não são consideradas pelos americanos como definitivas 
ou permanentes. 
 
Em resumo, os homens, na América, como entre nós [na França], 
estão organizados de acordo com determinadas categorias no 
transcurso da vida social. Os hábitos comuns, a educação e, 
sobretudo a riqueza estabelecem essas classificações. Mas, essas 
regras não são nem absolutas, nem inflexíveis, nem permanentes. 
Elas estabelecem distinções passageiras e não formam classes 
propriamente ditas. Elas não concedem qualquer superioridade, 
 
11 Idem, Ib., pp. 279-280. 
12 Idem, Ib., p.280. 
 14
mesmo de opinião, de um homem sobre outro, de tal modo que, 
mesmo se dois indivíduosnão se vejam jamais nos mesmos salões, 
se eles se encontrarem em uma praça pública um olhará o outro 
sem orgulho e o outro sem inveja. No fundo eles se sentem iguais e 
o são.13 
 
Essa idéia de democracia como uma sociedade igualitária é muito bem definida por 
Tocqueville a partir, tanto da existência real de uma situação de igualdade de costumes, 
quanto da perspectiva de que a sociedade, como um todo, possuía dela própria. Assim, 
embora Tocqueville considerasse, como um dado importante, as diferenças de classe social 
que a riqueza confere, certamente, não seria na igualdade econômica que a democracia 
buscaria seus alicerces. Portanto, mesmo que a riqueza pudesse ser vista como um fator 
gerador de desigualdade, outros fatores e valores mais significativos, para o povo 
americano, podem impedir que essa desigualdade venha a afetar, no seu âmago, as 
igualitárias e determinantes relações sociais da sociedade democrática. Também seria 
preciso considerar que, nessa democracia jacksoniana, a riqueza é vista como algo que 
pode ser adquirido e, nesse momento pelo menos, não é a única forma de se obter poder. O 
exemplo do presidente do país, como um autêntico "self-made man" e de seus partidários é 
para ser observado e seguido. Tudo parece ser possível a qualquer um e a todos. 
É evidente que nada disso é válido para os escravos. Embora a escravidão ainda 
não tivesse aparecido como o grande problema que iria dividir a nação, Tocqueville já a 
aponta como a grande responsável pela futura e imensa tragédia americana. Esse tema é 
longamente desenvolvido por Tocqueville, pois afinal a escravidão existia também em 
colônias francesas. Suas manifestações antiescravistas mostram a preocupação em mostrar, 
na questão das diferenças, como os escravos negros continuariam a ser discriminados, 
mesmo numa sociedade democrática, após a libertação. 
Em segundo lugar, essa igualdade de condições e o desenvolvimento do processo 
igualitário, pontos centrais para se compreender o que é a democracia para Tocqueville, 
podem também ser responsáveis, pelo aparecimento de uma sociedade, por excelência, 
massificante e aborrecida, sem criatividade, sem pensadores, sem artistas. Era dessa forma 
que os europeus se referiam aos americanos e ao que ocorria nos Estados Unidos. 
 
 
13 Idem, Ib., p.280. 
 15
É bastante difundida a maneira pela qual Stendhal se refere, pela 
fala de seu personagem Lucien Leuwen sobre a América como “um 
país aborrecido”, povoada por homens justos, razoáveis, porém 
grosseiros e incapazes de produzir idéias finas.14 
 
Entretanto, a construção dessa desagradável democracia, como geradora de uma sociedade 
massificante, produtora de uma população sem outro interesse que o de acumular fortuna, 
indiferente às coisas públicas, poderia ser evitada e seus males já existentes corrigidos, 
pela própria ação dos homens na defesa da liberdade. 
Sem dúvida, ao passar da análise da realidade para uma proposta de ação como 
solução para os males que a sociedade democrática possa apresentar, Tocqueville procura 
discutir como e porque os homens seriam capazes de agir para modificar sua própria 
realidade. 
 
2. A LUTA PELO IDEAL DE LIBERDADE 
ENQUANTO REAL FATOR TRANSFORMADOR 
 
A segunda grande questão tocquevilliana parece ser sua tentativa para definir qual 
seria o real fator transformador da história das sociedades. Uma vez que a história e a 
própria democracia, são, para ele, um processo igualitário, que se realiza como um impulso 
natural da humanidade, como então interpretá-lo? Esse processo, visto como condutor do 
próprio desenvolvimento igualitário, poderia ser considerado como o "motor da história" e, 
como tal, transformador da própria história. Mas esse impulso dos homens ao igualitarismo 
também era, afirmava Tocqueville, um processo "providencial" que nenhum ser humano 
poderia impedir de se realizar. Este, porém, não era o único agente modificador. Pois, 
mesmo que esse agente transformador conduzisse os homens a sempre caminhar para uma 
situação mais igualitária, os homens não se encontravam numa situação totalmente 
determinada pela sua realidade sócio-política. Em suas próprias palavras: 
 
É verdade que a providência traça em torno de cada homem um 
círculo fatal, do qual ele não pode sair, mas nos seus vastos limites, 
o homem é poderoso e livre. Assim são também os povos.15 
 
 
14 Stendhal. Lucien Leuwen, coll. Folio, Gallimard, Paris, 1973, vol.I, p.138. 
15 Tocqueville, Alexis. De la Démocratie en Amérique, Gallimard, Paris, 1961, p.339. 
 16
Muito se tem discutido sobre o uso que faz Tocqueville da palavra "providência". A 
idéia de que ele estaria se referindo a vontade divina é das mais difundidas, sobretudo 
porque suas considerações sobre religião, muitas vezes, parecem demonstrar que ele 
permanecia com as crenças que lhe haviam incutido na infância. No entanto, é comum 
encontrar em sua correspondência e em diversos comentários e posições assumidas nos 
seus trabalhos de homem público, manifestações suas de como havia perdido sua fé 
religiosa na juventude, quando ainda no Liceu, em Metz. Sem dúvida, ao designar o 
processo igualitário como providencial, Tocqueville parecia querer mostrar a existência de 
um certo determinismo histórico, como se fosse uma fatalidade. Mas, como esse processo 
poderia ser transformado pela ação "virtuosa" dos homens, talvez, a comparação mais 
provável seria com a própria idéia de "fortuna" em Maquiavel. Mélonio sugere que ele 
apenas havia querido explicar, enfaticamente, aquilo que não seria geometricamente 
demonstrável.16 De qualquer forma, as longas discussões de Tocqueville com Stuart Mill 
sobre esse assunto parecem apresentar a grande preocupação que ambos possuíam em 
relação a uma idéia de "processo irresistível", em oposição à ação dos homens como 
transformadora.17 Isto é, a idéia de que a história e a própria democracia se cumpririam 
mesmo sem a vontade dos homens não o impedia de mostrar que, talvez, mais importante 
ainda que o próprio processo igualitário seria a transformação provocada pela ação política 
dos homens, movidos que fossem por um ideal, o ideal da liberdade. Seria então esse o 
verdadeiro motor da história. Por isso, para ele, a realização desse ideal só poderia se dar 
pela prática política adequada e necessária à própria existência dos cidadãos, da nação e do 
próprio Estado, enquanto livres e soberanos. 
Embora o real não seja imutável, pelo contrário, é mesmo capaz de por si se 
transformar, o caminho que percorre e que deverá percorrer, apesar de ser apenas um, 
apresenta duas faces, a da sociedade e a do Estado, que poderão se tornar ameaçadoras: de 
um lado, a sociedade, representada pela sua maioria, ao desenvolver cada vez mais sua 
situação de igualdade de condições, obriga os homens a se comportar igualmente. De outro 
lado, essa situação de igualitarismo extremo, pode fazer nascer um Estado todo poderoso 
que obrigará, cada vez mais, o maior número de cidadãos, a simplesmente e 
igualitariamente, obedecer às regras e leis criadas unicamente por ele próprio. O Estado, a 
sociedade, a maioria nesse caso, obrigaria os homens a serem iguais. 
 
16 Mélonio, Françoise. Tocqueville et les Français, Aubier, Paris, 1993. p.32. 
17 Sobre essa discussão ver Célia N. Galvão Quirino dos Santos. Liberdade e igualdade no pensamento 
político de Alexis de Tocqueville, tese apresentada ao D.C.S., USP, 1982. mímeo. p.193. 
 17
Essa sua teoria da tirania da maioria, mais especificamente de uma tirania de umasociedade de massa, emprestada em parte de Burke, mais do que qualquer outra das teorias 
tocquevillianas, é que permitiu a muitos de seus comentadores aproximarem-no de uma 
posição conservadora e anti-revolucionária. No entanto, não é com Burke que Tocqueville 
estava travando esse diálogo. Ele, na verdade, estava muito mais preocupado em enfrentar 
tanto a questão da Vontade Geral, tal como a havia colocado Rousseau, quanto a sombra 
do "Terror" que ainda apavorava os franceses e, é claro, ele próprio. No dizer de Françoise 
Melónio, 
 
Tocqueville em 1835 estava obcecado por Rousseau. Assustado 
com a onipotência da soberania popular, todo seu esforço será 
realizado no sentido de apresentar uma concepção anti-
rousseaniana, mostrando como essa soberania é compatível com a 
liberdade.18 
 
Por isso, seu liberalismo, oporá a um conceito de soberania "una e indivisível" e a um 
Estado todo poderoso, um poder estatal descentralizado, dividido, mas sobretudo 
organizado em vários grupos ou associações de cidadãos agindo cívica e politicamente, ou 
seja, preocupados com a esfera pública. 
É verdade que esse processo de desenvolvimento da democracia, como processo 
igualitário, como responsável pela formação de uma futura sociedade de massa, onde toda 
a produção seria apenas voltada à constante melhoria do bem estar material, para 
Tocqueville, também é uma realidade. É a concretização dessa perversa democracia, apesar 
de já ter sido percebida sua existência, que precisa ser evitada. Dessa forma, se a 
democracia pode criar essa situação que é real e que faz parte desse processo de 
igualização, mesmo sem que os indivíduos contribuam necessariamente para isso, a prática 
da idéia de liberdade, como e enquanto defesa do ideal, permite escapar a essas ameaças do 
futuro. Embora ambos os movimentos possam parecer contraditórios, na verdade, não 
apenas se completam, mas um depende da existência do outro para se realizar plenamente. 
Assim, a democracia sem liberdade pode se transformar em totalitarismo, em tirania. É 
verdade que também a liberdade sem democracia, portanto, apenas para alguns poucos, faz 
nascer uma nova aristocracia, uma nova elite. 
 
18 Mélonio, Françoise, op. cit., p. 37. 
 18
No seu momento histórico, nos dois mundos de Tocqueville, o europeu e o 
americano, essa nova elite só poderia surgir pelo enriquecimento, pela produção industrial 
etc., mais uma vez desenvolvendo-se a partir de valores materiais, impeditivos do 
crescimento da moral e da virtude pública. O reino da igualdade e da liberdade só será 
alcançado se o processo igualitário estiver acompanhado da prática da liberdade pela ação 
política dos indivíduos-cidadãos. 
Não ignorava Tocqueville que o processo de destruição do antigo regime e o 
desenvolvimento industrial na França eram parte do mesmo processo que havia feito 
nascer as terríveis desigualdades que tanto temia. Tocqueville reconhecia ainda que, na 
Inglaterra a manifesta desigualdade entre a situação de miséria da classe operária em 
relação à riqueza dos capitalistas era não só a contradição necessária que enriquecia uma 
determinada classe, mas também era a que possibilitava o enorme enriquecimento da nação 
e fazia aumentar o poder do Estado e do país internacionalmente. Porém, a existência de 
situações tão desiguais em dados momentos, eram percalços pelos quais passa o 
desenvolvimento democrático. Evidentemente, conforme suas realidades específicas, cada 
nação percorre seu próprio caminho. Contudo, apesar do desenvolvimento da igualdade ser 
inevitável, poderia no caminhar do processo além de produzir outros tipos de 
desigualdades, também vir a embrutecer os homens. Entretanto, todas essas tragédias 
poderiam ser evitadas. 
Tocqueville reconhece a contradição de sua teoria do desenvolvimento igualitário 
face à realidade que tem sob os olhos em 1835, em sua segunda viagem à Inglaterra. Ao 
visitar Manchester, depara-se com a pujança das fábricas que, no mesmo cenário, 
apresentavam a céu aberto à miséria da vida dos trabalhadores e a imensa riqueza dos 
proprietários industriais. Após descrever a situação de total penúria, sujeira e abandono do 
local em que viviam os trabalhadores classificando-a de novo inferno, que contrastava com 
"os imensos palácios da indústria", comenta: 
 
Estas vastas construções impedem o ar e a luz de penetrar nas 
habitações humanas que dominam; elas a envolvem em uma 
perpétua neblina; aqui o escravo, lá o senhor; lá as riquezas de 
alguns poucos; aqui, a miséria do maior número; lá, as forças 
organizadas de uma multidão produzem para o lucro de um só, isto 
que a sociedade não havia ainda sabido oferecer; aqui, a fraqueza 
individual se mostra mais débil e mais desprotegida ainda que no 
 19
meio dos desertos; aqui, os efeitos, lá as causas [...] Uma espessa e 
negra nuvem cobre a cidade. O sol aparece através da fumaça como 
um disco sem raios. É no meio deste dia incompleto que se movem 
sem cessar 300.000 criaturas humanas [...] É no meio desta cloaca 
infecta que o maior rio da indústria humana vai alimentar e 
fecundar o universo. Deste esgoto imundo jorra o ouro puro. É ali 
que o espírito humano se aperfeiçoa e se embrutece; que a 
civilização produz suas maravilhas e que o homem civilizado se 
torna quase selvagem. 
 
Considera ainda Tocqueville o que poderia ocorrer a esses operários que trabalham 69 
horas por semana: 
 
Que ser inteiramente "material" deve necessariamente se tornar um 
homem que faz a mesma coisa durante doze horas, quase todos os 
dias de sua vida, com exceção do domingo? 
 
E, no entanto, 
 
À testa das manufaturas, a ciência, a indústria, o amor do lucro. o 
capital inglês [...] é assim que se dá a reunião de um povo pobre e 
de um povo rico, de um povo esclarecido e de um povo ignorante, 
da civilização e da barbárie.19 
 
Desde sua primeira viagem à Inglaterra, Tocqueville havia se preocupado em 
analisar a situação sócio-política inglesa. Ele havia pensado que poderia encontrar nesse 
país a origem das instituições e costumes da democracia americana. O que pôde observar, 
no entanto, nessa segunda viagem, quando a primeira parte da Democracia já havia sido 
publicada, foi a grande diferença entre os processos, de desenvolvimento igualitário inglês 
e francês. Já em 1833, quando da sua primeira viagem àquele país, havia percebido a 
distância que separava a situação da aristocracia inglesa da francesa. Por exemplo, de que 
 
19 Tocqueville, Alexis. Voyage en Angleterre, Irlande, Suisse et Algérie, Gallimard, Paris, 1958, ps. 78-81-
82. 
 20
maneira aquela não havia perdido a dominação de valores e costumes ao se confundir com 
a burguesia enriquecida, ao contrário da francesa, que se havia aburguesado. 
É só nessa segunda viagem, que percebe o horror da condição do trabalhador 
industrial na Inglaterra, talvez não tão diferente da francesa mas, bem mais avassaladora, 
pelo simples fato do processo de industrialização francês não ser tão desenvolvido. 
Contudo, mesmo na Inglaterra, o processo democrático estaria se realizando, aliás, para 
Tocqueville, com mais sucesso que na França, pois lá não haveria mais necessidade de 
revoluções, enquanto que na França, o caminho da construção da democracia parecia 
precisar, necessariamente, passar ainda por outras revoluções. A revolução francesa não 
havia acabado e a França, muito mais centralizada que a Inglaterra, com instituições e 
costumes muito pouco liberais, poderia facilmente ainda vir a ter governos e Estado muito 
fortes, o que impediria a ação livre dosseus cidadãos na criação da boa democracia. 
 
CONCLUSÃO 
 
Ao fazer um estudo comparativo do que ocorria na França e na Inglaterra, 
Tocqueville está procurando apontar as diferenças de situação face ao desenvolvimento 
democrático de cada um desses povos. Está, sobretudo, querendo mostrar a enorme 
distância em que se encontram da democracia americana. Não são apenas realidades 
diferentes, são também situações diferentes do processo democrático. Tocqueville não 
procura negar aquilo que considera como realidades distintas de cada povo. Ele as 
reconhece como situações reais da existência de cada um deles, como fato dado. Porém, 
assim como as revoluções na França aproximaram e tornaram mais iguais nobres e 
burgueses, não vê como esse fenômeno poderia estacionar nesse ponto. Ao prognosticar, 
antes de 1848, que novas revoluções, como parte do processo igualitário francês, iriam 
acontecer ou que na Inglaterra esse caminhar se daria mais pacificamente, mostra, como 
essa marcha ininterrupta, embora trôpega por vezes, seria inevitável. 
Uma vez que a realidade é condicionante e limita a ação dos indivíduos e dos 
povos, é preciso conhecê-la para poder agir adequadamente dentro desses limites. O 
estudo, a pesquisa de países e de povos diferentes e as comparações que são possíveis de se 
estabelecer são passagens obrigatórias para que se possa agir corretamente. É isso que 
procura fazer e faz, nas suas obras maiores, como parte de sua atividade política. Mas isso 
não é nem suficiente, nem o ponto de partida para o que pretende seja sua advertência ou 
manifesto aos franceses. 
 21
Em primeiro lugar, para se adequar o ideal tocquevilliano de liberdade ao 
fenômeno da democracia, seria preciso mostrar a importância desse ideal como guia para a 
ação cívico-política dos homens. A atividade pública, para Tocqueville, para não ser 
atabalhoada, precisa ser conduzida por uma idéia, melhor dizendo, por aquele ideal de 
liberdade que é o único capaz de construir a boa democracia. Em segundo lugar, e só 
então, é que se pode, no interior do círculo condicionador de cada realidade, encontrar a 
ação adequada e transformadora do seu mundo real, pronta a edificar uma democracia na 
qual seus cidadãos sejam livres. 
Portanto, para Tocqueville, os homens precisariam agir no sentido de conciliar a 
liberdade, que é frágil e pela qual é preciso lutar, com a democracia que se move por um 
forte impulso e é fatal. Portanto, seria preciso adequar, em primeiro lugar, o ideal à 
realidade e, em segundo lugar a ação política inovadora que se encontra em constante 
defesa da liberdade ao processo igualitário que é real e incessante. Se a prática do ideal é 
conduzir a democracia, é preciso também que haja um modelo exemplar em direção ao 
qual a democracia deva ser levada. A realidade americana aparecia como a mais próxima 
desse ideal. Era onde a democracia se realizava. Era, também, onde a prática da liberdade 
havia encontrado o melhor terreno para florescer. Era preciso conhecê-la para construir o 
modelo. 
 
Minha finalidade, afirma Tocqueville, tem sido mostrar, pelo 
exemplo da América, que as leis e sobretudo os costumes podem 
permitir a um povo democrático permanecer livre.20 
 
 
 
 
20 Apud Mélonio. op.cit., p.35, nota 37. 
A Declaração de Independência dos EUA 
 
No Congresso, 4 de julho de 1776 
 
Declaração Unânime dos Treze Estados Unidos da América 
 
Quando, no curso dos acontecimentos humanos, se torna necessário um povo 
dissolver laços políticos que o ligavam a outro, e assumir, entre os poderes da Terra, 
posição igual e separada, a que lhe dão direito as leis da natureza e as do Deus da 
natureza, o respeito digno às opiniões dos homens exige que se declarem as causas 
que os levam a essa separação. 
Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os 
homens foram criados iguais, foram dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, 
que entre estes estão a vida, a liberdade e a busca da felicidade. 
Que a fim de assegurar esses direitos, governos são instituídos entre os homens, 
derivando seus justos poderes do consentimento dos governados; que, sempre que 
qualquer forma de governo se torne destrutiva de tais fins, cabe ao povo o direito de 
alterá-la ou aboli-la e instituir novo governo, baseando-o em tais princípios e 
organizando-lhe os poderes pela forma que lhe pareça mais conveniente para realizar-
lhe a segurança e a felicidade. Na realidade, a prudência recomenda que não se mudem 
os governos instituídos há muito tempo por motivos leves e passageiros; e, assim 
sendo, toda experiência tem mostrado que os homens estão mais dispostos a sofrer, 
enquanto os males são suportáveis, do que a se desagravar, abolindo as formas a que 
se acostumaram. Mas quando uma longa série de abusos e usurpações, perseguindo 
invariavelmente o mesmo objeto, indica o desígnio de reduzi-los ao despotismo 
absoluto, assistem-lhes o direito, bem como o dever, de abolir tais governos e instituir 
novos-Guardas para sua futura segurança. Tal tem sido o sofrimento paciente destas 
colônias e tal agora a necessidade que as força a alterar os sistemas anteriores de 
governo. A história do atual Rei da Grã-Bretanha compõe-se de repetidos danos e 
usurpações, tendo todos por objetivo direto o estabelecimento da tirania absoluta sobre 
estes Estados. Para prová-lo, permitam-nos submeter os fatos a um cândido mundo. 
Recusou assentimento a leis das mais salutares e necessárias ao bem público. 
Proibiu aos governadores a promulgação de leis de importância imediata e urgente, 
a menos que a aplicação fosse suspensa até que se obtivesse o seu assentimento, e, 
uma vez suspensas, deixou inteiramente de dispensar-lhes atenção. 
Recusou promulgar outras leis para o bem-estar de grande distritos de povo, a 
menos que abandonassem o direito à representação no Legislativo, direito inestimável 
para eles temível apenas para os tiranos, 
Convocou os corpos legislativos a lugares não usuais, ser conforto e distantes dos 
locais em que se encontram os arquivos públicos, com o único fito de arrancar-lhes, pela 
fadiga o assentimento às medidas que lhe conviessem. 
Dissolveu Casas de Representantes repetidamente porque: opunham com máscula 
firmeza às invasões dos direitos do povo. 
Recusou por muito tempo, depois de tais dissoluções, fazer com que outros fossem 
eleitos; em virtude do que os poderes legislativos incapazes de aniquilação voltaram ao 
povo em geral para que os exercesse; ficando nesse ínterim o Estado exposto a todos 
os perigos de invasão externa ou convulsão interna. 
Procurou impedir o povoamento destes estados, obstruindo para esse fim as leis de 
naturalização de estrangeiros, recusando promulgar outras que animassem as 
migrações para cá e complicando as condições para novas apropriações de terras. 
Dificultou a administração da justiça pela recusa de assentimento a leis que 
estabeleciam poderes judiciários. 
Tornou os juízes dependentes apenas da vontade dele para gozo do cargo e valor 
e pagamento dos respectivos salários. 
Criou uma multidão de novos cargos e para eles enviou enxames de funcionários 
para perseguir o povo e devorar-nos a substância. 
Manteve entre nós, em tempo de paz, exércitos permanentes sem o consentimento 
de nossos corpos legislativos. 
Tentou tornar o militar independente do poder civil e a ele superior. 
Combinou com outros sujeitar-nos a jurisdição estranha à nossa Constituição e não 
reconhecida por nossas leis, dando assentimento a seus atos de pretensa legislação: 
por aquartelar grandes corpos de tropas entre nós; 
por protegê-las por meio de julgamentos simulados, de punição por assassinatos 
que viessem a cometer contra os

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