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Capítulo 9 Efeitos somáticos das radiações ionizantes

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Radiobiolgia e Fotobiologia – Prof. Alvaro Leitão (IBCCF-UFRJ) 
 
CAPÍTULO IX 
 
EFEITOS SOMÁTICOS DAS RADIAÇÕES IONIZANTES 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
 No final do século passado, logo após as descobertas dos raios X e da radioatividade, surgiram 
os primeiros relatos de lesões radioinduzidas, observadas principalmente entre pesquisadores, técnicos 
e fabricantes de aparelhos. Poucos meses após a verificação experimental (Röntgen) da produção de 
raios X, uma radiodermite foi observada nas mãos de um técnico, tendo sido logo depois tentada a 
utilização destas radiações para o tratamento de um caso de câncer de mama. 
 Becquerel, o descobridor da radioatividade natural, após usar, no bolso do colete, durante várias 
semanas, uma amostra de mineral radioativo, percebeu o aparecimento de uma zona eritematosa na 
pele subjacente, fato semelhante tendo ocorrido com Pierre Curie, que apresentou uma radiodermite de 
difícil cicatrização. 
 O primeiro caso de câncer radioinduzido foi observado em 1902, na pele de um fabricante de 
tubos de raios X, que costumava testar o funcionamento dos aparelhos expondo sua própria mão. Nos 
anos seguintes, muitas descrições semelhantes apareceram na literatura médica, de tal forma que, em 
1922, cerca de 100 radiologistas eram considerados como tendo falecido em consequência de 
exposições a elevadas doses de radiação. Na Figura IX.1 está representada a primeira radiografia de 
parte do corpo humano. É a radiografia da mão do Dr. Von Kolliker, o mesmo médico que, a pedido do 
Dr. Röntgen, radiografou um marinheiro bêbado, localizando um pedaço de faca no seu corpo (foi o 
primeiro uso médico dos raios X, publicado na revista Lancet em 23 de janeiro de 1896). 
 
 
Figura IX-1 – Primeira radiografia de parte do corpo humano. 
 
Diversos grupos humanos foram expostos a doses relativamente elevadas de radiação e, por 
esta razão, têm sido exaustivamente estudados, apesar das dificuldades para uma correta avaliação das 
doses absorvidas. Entre tais grupos, podem ser apontados: 
 a) os quase 300.000 sobreviventes das explosões nucleares de Hiroshima e Nagasaki, assim 
como habitantes das ilhas Marshall e pescadores japoneses, atingidos pela precipitação de 
radionuclídeos gerados em uma explosão experimental de bomba de fusão, realizada em 1954, no atol 
de Bikini, no sul do oceano pacífico; 
 b) pacientes expostos a elevadas doses de radiação, para fins terapêuticos ou diagnósticos; 
 
 
IX-2 
 c) sobreviventes de acidentes ocorridos em reatores nucleares, bem como em instalações de 
processamento de material radioativo ou nas quais eram empregadas potentes fontes de radiação; 
 d) cerca de 2.000 pinceladores de painéis luminosos que na década de 1920, utilizavam tintas 
contendo 
226
Ra para a pintura de mostradores de relógios e de ponteiros luminescentes, ingerindo 
grandes quantidades de material radioativo; 
 e) pessoal técnico-científico exposto profissionalmente, como, radiologistas, radioterapeutas, 
especialistas em Medicina Nuclear, engenheiros e físicos nucleares, técnicos de raios X, etc.; 
 f) mineiros e profissionais ligados à extração e à purificação de minerais radioativos; 
 g) habitantes de zonas de altos níveis de radioatividade natural, tais como os que vivem em 
Guarapari, Araxá e Poços de Caldas no Brasil, ou nas regiões de Kerala e Madras, na Índia. 
 
 
RADIOSSENSIBILIDADE DE CÉLULAS DE MAMÍFEROS 
 
 De forma simplificada admite-se como válida a lei de Bergonié e Tribondeau, cujo enunciado é 
"são mais radiossensíveis as células que exibem maior atividade mitótica e (ou) menor grau de 
diferenciação", embora exceções a esta regra possam ser observadas. 
 Esquematicamente, é possível considerar a existência, em qualquer tecido, de células 
parenquimatosas, responsáveis pelas funções nele envolvidas, de células do tecido conjuntivo, 
encarregadas de suportar as primeiras, e de vasos sanguíneos, aos quais cabem a alimentação e a 
oxigenação tissular. Existem diferenças de radiossensibilidade entre os diversos tipos de células 
parenquimatosas no organismo, que podem ser mais sensíveis, ou não, que as células do tecido 
conjuntivo e os vasos sangüíneos: assim, em determinados órgãos, os efeitos das radiações são 
consequência de lesões provocadas nas estruturas responsáveis pelas funções, enquanto em outros são 
explicados pelos danos nos sistemas de suporte e (ou) de nutrição. 
 Entre as classificações de radiossensibilidade propostas para os diferentes tipos celulares, a que 
consta da Tabela IX.1 é a mais aceita. A título de simplificação, a capacidade mitótica, o nível de 
diferenciação e a radiossensibilidade estão apresentadas em forma de cruzes. 
 
TABELA IX.1 
 
Classificação das células de mamíferos quanto à radiossensibilidade 
 
=========================================================================
Grupo Características Capacidade Nível de Radiossensibilidade Exemplos 
 celulares de divisão diferenciação 
----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 
I Células que se dividem eritroblastos, células das 
 e se diferenciam ++++ + ++++ criptas intestinais, células 
 regularmente basais da epiderme 
 
II Células que se dividem mielócitos 
 regularmente e se ++++ ++ +++ espermatócitos 
 diferenciam entre as 
 mitoses 
 
III Células que se dividem ++ +++ ++ células do rim, fígado, 
 em condições especiais pâncreas e tireóide 
 
IV Células que não se - ++++ + neurônios, células 
 dividem musculares 
======================================================================== 
 
 
 
IX-3 
 As células do tecido conjuntivo e os vasos sanguíneos apresentam radiossensibilidades 
intermediárias entre os grupos II e III da classificação mostrada na tabela. Assim, os efeitos da 
irradiação da pele ou dos tecidos hematopoiéticos são consequência de lesões produzidas nas células 
parenquimatosas, enquanto no caso de fígado, rins ou cérebro, os danos observados podem ser 
explicados pelas alterações induzidas nas células de suporte e (ou) nos vasos sanguíneos. Na Figura 
IX.2 estão representadas as células pertencentes aos grupos acima, divididas em oito categorias de 
sensibilidade. 
 
Figura IX-2 – Radiossensibilidade das diferentes células de mamíferos. 
 
 Uma das mais significativas exceções à lei de Bergonié e Tribondeau é dada pelos linfócitos 
que, embora só se dividindo em condições excepcionais, são extremamente radiossensíveis. Entre os 
tumores, também são observadas várias exceções, tais como os melanomas, os sarcomas osteogênicos, 
diversos adenocarcinomas e o lipossarcoma indiferenciado que, apesar da elevada capacidade mitótica, 
são radiorresistentes; reciprocamente, diversos tumores com reduzida atividade mitótica são 
radiossensíveis, o que é exemplificadopor alguns tipos de linfosarcomas e de linfomas. 
 Outro aspecto a ser considerado é que, na Tabela IX.1, a radiossensibilidade está sendo 
avaliada em termos da inativação celular produzida e pode levar a interpretações errôneas. Assim, 
tipos celulares considerados radiorresistentes em termos de inativação podem mostrar-se sensíveis 
quando avaliadas alterações radioinduzidas no metabolismo ou nos potenciais elétricos da membrana. 
 
 
SISTEMATIZAÇÃO DOS EFEITOS DAS RADIAÇÕES IONIZANTES 
 
 Os efeitos das radiações sobre um organismo complexo dependem das lesões provocadas nas 
células que compõem o organismo, entretanto, sua expressão final pode ser modificada pelas 
interações existentes entre os diversos tecidos, órgãos, aparelhos e sistemas. 
 É importante, em Radiopatologia, procurar distinguir os efeitos de irradiações localizadas, nas 
quais somente uma determinada região do organismo é exposta, dos acarretados pelas irradiações de 
corpo inteiro. Na radioterapia antitumoral, por exemplo, é frequente a exposição de uma única região 
do corpo, embora, em certos casos, como ocorre em linfomas, possa ser necessário irradiar vários 
segmentos anatômicos. Por outro lado, em uma explosão nuclear ou em um acidente de reator, as 
pessoas atingidas receberão radiações no corpo inteiro. 
 
 
IX-4 
 Outro parâmetro importante para a classificação dos efeitos somáticos das radiações ionizantes 
fundamenta-se na cronologia de seu aparecimento, dividindo-os em imediatos e retardados e 
adotando, por convenção, o limite de 60 dias como fronteira entre estes dois tipos. 
 Nos seres humanos, a exposição do corpo inteiro a doses elevadas pode provocar a doença 
aguda de radiação, observável em tempos inferiores a 60 dias, sendo um efeito imediato; por outro 
lado, a carcinogênese radioinduzida aparece vários anos após a irradiação e constitui um exemplo de 
efeito retardado. Outras situações são de mais difícil classificação, como ocorre com as malformações 
congênitas, produzidas logo após a exposição, mas que só são observáveis semanas ou meses mais 
tarde, mediante o emprego de técnicas como ultrassonografia, ou que podem até só ser detectadas 
quando do nascimento. 
 
 
DOENÇA AGUDA DE RADIAÇÃO (DAR) 
 
 Aspectos gerais 
 
 O conjunto de sinais e sintomas observados após exposição a doses elevadas de radiação no 
corpo inteiro caracteriza a doença aguda de radiação (DAR), cujo primeiro relato data de 1897, logo 
após a descoberta dos raios X. 
 Esta é uma doença polimorfa, comportando diferentes quadros clínicos, caracterizados por 
sintomatologia, cronologia de evolução, gravidade e prognóstico nitidamente dependentes da dose 
absorvida pelo organismo. Cada uma das formas de expressão da DAR constitui uma síndrome 
específica, mas os sinais e sintomas nela observados são também encontrados em diversas patologias; 
assim, somente a forma de associação destes atribui unidade clínica à doença e a caracteriza. 
 Os conhecimentos já adquiridos sobre a DAR, foram obtidos graças à experimentação com 
animais, complementada por observações em pessoas expostas a elevadas doses de radiação. 
 
 Conceito de DL50(30) 
 
 Uma forma de avaliar a letalidade produzida pela radiação em uma população consiste na 
utilização da DL50(30), que corresponde à dose letal, para 50% dos animais, ao final de 30 dias. 
 Na Figura IX.3 pode ser vista a determinação gráfica da DL50(30), a curva obtida representa a 
letalidade observada em função da dose absorvida. Frequentemente, também são utilizados dois outros 
indicadores, igualmente mostrados na figura, quais sejam a DL0(30), correspondendo à maior dose que 
não produz nenhuma inativação e a DL100(30), que é a menor dose capaz de inativar 100% dos 
animais. Qualquer dose igual ou inferior à DL0(30) é dita sub-letal, enquanto as iguais ou superiores à 
DL100(30) são supra-letais. 
 
 
Figura IX.1 - Determinação gráfica da DL50(30). 
 
 
IX-5 
 Na Tabela IX.2 podem ser vistos os valores da DL50(30) para diferentes espécies animais. 
Para o Homem, dadas as imprecisões de dosimetria nos casos já estudados e as dimensões reduzidas 
das amostras analisadas, é empregada uma faixa de doses em vez de um único valor. 
 
TABELA IX.2 
 
Valores da DL50(30) para diferentes espécies animais 
 
========================================================================= 
Organismo DL50(30) (Gy) 
----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 
Cão 3,5 
Porco da Índia 4 
Homem 2,5-4,5 
Camundongo 5,5 
Macaco 6 
Sapo 7 
Rato 7,5 
Coelho 8 
Galinha 8 
Tartaruga 15 
Lagarto 30 
Cobra 100 
Insetos* 500 
========================================================================= 
* A radiorresistência de algumas espécies é bem maior, como ocorre, por exemplo, com os insetos, cuja DL50 
(agora não mais ao fim de 30 dias ) é de várias centenas de grays. 
 
Formas clínicas da doença aguda de radiação 
 
 O fator mais importante para a definição do quadro clínico apresentado por um mamífero 
irradiado é a dose de radiação absorvida. Em uma mesma espécie, é possível correlacionar o tempo 
médio de sobrevivência (TMS) com a dose absorvida, como mostrado na Figura IX.4. Neste gráfico 
podem ser vistas indicações das causas de morte, cada uma delas correspondendo a uma das síndromes 
da DAR. 
 
 
Figura IX.4 - Representação esquemática da relação entre o tempo médio de sobrevivência (TMS) e a 
dose de radiação absorvida, para uma dada espécie animal. 
 
 
IX-6 
O tempo transcorrido entre a irradiação e a morte pode ser bastante reduzido, situação na qual 
torna-se impossível caracterizar a evolução clínica da DAR. Em outras situações, entretanto, a 
evolução pode ocorrer em alguns dias, ou até em semanas e, nestas condições, é possível distinguir 
uma fase prodrômica da DAR, observável minutos ou horas após a irradiação e cuja gravidade serve 
como indicadora da posterior evolução da doença e como parâmetro para o prognóstico. 
 Em seres humanos que absorvam algumas centenas de Gy, o óbito ocorre em poucos minutos, 
por destruição de macromoléculas e de estruturas celulares indispensáveis à manutenção dos processos 
vitais; este quadro é designado como morte por inativação molecular. 
 Para doses da ordem de grandeza de 100 Gy, a morte ocorre em algumas horas, no máximo em 
1 ou 2 dias, sendo os principais sinais e sintomas observados decorrentes da falência do sistema 
nervoso central, incluindo desorientação espaço-temporal, perda da coordenação motora, distúrbios 
respiratórios e convulsões, o quadro rapidamente evoluindo para o estado de coma e para a morte. 
Dada a rapidez da ocorrência desta, as lesões provocadas em outros sistemas, como o gastrointestinal, 
não têm tempo suficiente para uma total expressão, embora náuseas, vômitos e diarréias acompanhem 
esta síndrome, conhecida como síndrome do sistema nervoso central. 
 Quando a energia absorvida em uma exposição de corpo inteiro é da ordem de dezenas de Gy 
expressa-se a síndrome gastrointestinal, que geralmente acarreta a morte em alguns dias, como pode 
ser visto na Figura IX.4. Os sintomas iniciais são náuseas, vômitos, anorexia, intensa diarréia e 
apatia, seguindo-se desidratação, perda de peso e a morte do paciente. Uma lesão muito importante na 
patogenia desta síndrome é a inativação de células epiteliais das vilosidades intestinais que são dotadas 
de elevada capacidade mitótica e, desta forma, constituem ascélulas responsáveis pela permanente 
renovação das criptas, diferenciando-se e, progressivamente, tornando-se funcionais. A absorção de 
energia leva à impossibilidade de regeneração contínua do epitélio e, alguns dias após a exposição às 
radiações, já são detectadas significativas alterações morfológicas e fisiológicas das vilosidades; estas 
alterações podem justificar o quadro clinico observado, inclusive a possibilidade de infecções bastante 
graves, capazes de acarretar bacteremia e, eventualmente, septicemias; diversos microorganismos 
responsáveis por este quadro clínico fazem parte da flora intestinal normal e têm acesso à corrente 
sanguínea através das lesões provocadas no epitélio intestinal. 
 Animais que tenham absorvido doses de radiação capazes de produzir a síndrome 
gastrointestinal devem também evidenciar os sinais e sintomas característicos da síndrome 
hematopoiética, mas, como o tempo necessário para a expressão desta é maior, a morte ocorre, quase 
sempre, antes que alterações hematológicas mais significativas possam ser detectadas. 
 Doses da ordem de grandeza de alguns Gy resultam no aparecimento da síndrome 
hematopoiética, cuja etiologia está intimamente vinculada à inativação de elementos figurados do 
sangue (hemácias, leucócitos, plaquetas) e, principalmente, à ação da radiação sobre os tecidos 
hematopoiéticos, ou seja, sobre as células da medula óssea e do baço. Como diversos tipos de células 
sanguíneas têm meia-vida biológica relativamente longa, algumas das consequências do bloqueio dos 
processos de neoformação só se tornam significativas após transcorrido algum tempo desde a 
irradiação; por esta razão, é frequentemente adotada, no estudo da síndrome hematopoiética, em 
substituição à DL50(30), a DL50(60). Logo após a exposição à radiação, é possível detectar 
significativa redução do número de linfócitos circulantes, explicada pela radiossensibilidade destas 
células; a amplitude da linfopenia produzida serve de indicadora da dose de radiação absorvida. As 
alterações radioinduzidas no número dos diferentes elementos figurados do sangue traduzem-se por 
múltiplas consequências no organismo. Assim, a trombocitopenia constitui uma das causas das 
hemorragias observadas pós-irradiação, da mesma forma que a redução da resposta imunitária pode ser 
explicada pela leucopenia radioinduzida. Esta última justifica a frequência da ocorrência de graves 
infecções em animais de laboratório ou em seres humanos irradiados, infecções estas que, muitas 
vezes, são a causa da morte em pacientes acometidos de DAR; a diminuição da resposta imunitária 
após a irradiação (ou após tratamento com diversos agentes químicos) tem sido utilizada para diminuir 
as possibilidades de rejeição de órgãos transplantados. 
 
 
IX-7 
 Na Figura IX.5 pode ser visto, em representação esquemática, um quadro geral descrevendo as 
diferentes respostas do organismo à irradiação e na Tabela IX.3 estão mostrados os principais 
sintomas da síndrome aguda de radiação, quadros estes que resumem o que acaba de ser discutido, 
além de complementarem a evolução da radiolesão. 
 
 
Figura IX.5 - Representação esquemática das diferentes respostas do organismo à irradiação, estando 
mostradas algumas da formas de interação destas respostas. 
 
TABELA IX.3 
 
Principais sintomas da síndrome aguda de radiação 
 
========================================================================= 
Tempo após 1 a 2,5 Gy 2,5 a 4,5 Gy 6,5 Gy ou mais 
a exposição dose sub-letal dose letal dose supra-letal 
----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 
1a semana náuseas e vômitos náuseas, vômitos, náuseas, vômitos, 
 durante horas palidez durante horas palidez durante horas 
 
 período latente choque, inconsciência, 
 diarréia, câimbras e dores 
 abdominais, hipotensão arterial, 
 febre, eritema severo, bolhas ou 
 queimaduras, insônia 
 
2a semana perda de peso, morte dentro de algumas horas 
 mal estar geral, fadiga ou dias dependendo da dose 
 estomatite, bacteremia, 
 febre, anorexia, dores 
 abdominais, eritema 
 
3a semana mal estar geral, epilação, hemorragia 
 anorexia, eritema interna, petequias 
 diarréia, fadiga, 
 epilação 
 
4a semana e recuperação irregularidades 
seguintes provável menstruais 
 50% de chances de vida 
========================================================================= 
 
 
IX-8 
Alguns acidentes servem para ilustrar a classificação e os sintomas acima descritos: 
A síndrome hematopoiética (200 a 600 cGy), cujo alvo são as células da medula óssea, é 
caracterizada pela diminuição das células sanguíneas circulantes. Pode haver recuperação das células 
que não morreram que começam a se dividir, mas por serem anormais logo morrem. 
Em 1945 em Los Alamos um indivíduo recebeu 590 cGy (γ e nêutrons) no corpo inteiro e 
5.000 e 40.000 localizados na mão. O óbito ocorreu no 24º dia, com queimaduras, destruição 
generalizadas dos tecidos epiteliais, aumento da temperatura. 
A síndrome gastrointestinal (600 a 5.000 cGy), caracterizada pelas lesões no epitélio 
intestinal e eliminação da atividade das células das criptas intestinais. Na fase de recuperação (5-10 
dias) as células das visosidades ficam achatadas e a morte ocorre por infecção. 
Em Los Alamos em 1946 um indivíduo recebeu 114 cGy de γ , 1.000 cGy de nêutrons no 
corpo inteiro e 30.000 cGy localizados. O óbito ocorreu no 9º dia, com destruição do epitélio 
duodenal, hemorragia espontânea e muitos depósitos de Escherichia coli. 
A síndrome do sistema nervoso central (acima de 5.000 cGy) é caracterizada pela falência do 
sistema nervoso central associada à gastrointestinal e à hematopoiética (medula óssea), com a morte 
ocorrendo em dois dias. 
Em Rhode Island, em 1964, um indivíduo recebeu 2.200 cGy de nêutrons e 6.600 cGy de γ no 
corpo inteiro, deu um reator de 
235
U. O óbito ocorreu 49 horas após o acidente, com desorientação, 
pressão sanguínea alterada e choque cardiovascular. 
 
Prognóstico e terapêutica da DAR 
 
 A gravidade da DAR é dependente da dose de radiação absorvida e, assim, seu prognóstico será 
marcadamente influenciado por aquela. Para pacientes que tenham absorvido 10 Gy oumais, quase 
nada é possível fazer; a terapêutica é essencialmente paliativa e sintomática. 
 Nas faixas de dose inferiores a 10 Gy diversas medidas terapêuticas têm sido propostas. O 
primeiro problema crítico é a correta estimativa da dose absorvida. Alguns indicadores biológicos têm 
sido propostos, tais como a excreção urinária de ácido betaaminoisobutírico, um produto do 
catabolismo celular, ou de desoxicitidina para fins de avaliação da dose. 
 A primeira recomendação importante é a imediata internação do paciente em uma Unidade de 
Terapia Intensiva, dada a gravidade do quadro que certamente desenvolverá. Em alguns casos, 
conforme a natureza do acidente poderão ser necessárias providências para a "descontaminação" da 
pele (remoção de nucleotídeos nela depositados) e, eventualmente, a monitoração de radionuclídeos 
produzidos nos tecidos pelo bombardeio com nêutrons. 
 Embora alguns especialistas ainda adotem uma conduta essencialmente conservativa, 
medicamentos só sendo administrados após a expressão clínica de sinais e sintomas que indiquem o 
aparecimento de uma síndrome radioinduzida, a maioria adota alguns procedimentos de rotina, abaixo 
descritos. 
 a) Medidas anti-infecciosas - um dos efeitos da radiação é a diminuição da resposta imune, 
agravada pela destruição do epitélio das criptas intestinais, criando entradas para germes patogênicos. 
Logo, a manutenção do paciente em um ambiente estéril é altamente recomendável. Antibióticoterapia 
também é recomendada, especialmente se precedida da identificação dos agentes patogênicos e de 
testes de sensibilidade a antibióticos. O emprego de gama-globulina e a transfusão de leucócitos têm 
sido sugeridos como medidas relativamente eficientes na tentativa de conter a instalação de quadros 
infecciosos, inclusive septicêmicos. 
 b) Medidas anti-hemorrágicas, entre as quais a mais eficiente é a transfusão de plaquetas, 
capazes de provocar, ao menos temporariamente, redução das perdas sanguíneas. 
 c) Enxertos de medula óssea - esta é, provavelmente, a mais controvertida dentre as medidas 
terapêuticas, mas tem se mostrado de alguma utilidade, embora as dificuldades para obter um doador 
adequado sejam grandes. Uma vez que o quadro clínico da síndrome hematopoiética decorre do 
bloqueio da formação dos elementos figurados do sangue, admite-se que estes enxertos possam ser de 
 
 
IX-9 
utilidade; mas, em muitos casos, eles são rapidamente rejeitados e, às vezes, a rejeição provoca graves 
distúrbios no organismo. As primeiras evidências sobre a importância da existência de tecidos 
hematopoiéticos não lesados, após irradiação do corpo inteiro, foram obtidas em experimentos nos 
quais animais foram irradiados, após exteriorização e proteção do baço, nestas condições, enquanto a 
sobrevivência da população controle era nula, nos animais com baço funcionante ela podia ultrapassar 
90%; resultados análogos foram obtidos mediante proteção da medula óssea durante a irradiação. 
Assim, mesmo nas situações nas quais o enxerto de medula seja rejeitado, talvez ele possa funcionar 
durante algum tempo, exatamente no período mais crítico da DAR. É ainda importante lembrar que a 
exposição a doses elevadas, reduzindo drasticamente a resposta imune, diminui as possibilidades de 
rejeição. 
 d) Reposição de fluidos e eletrólitos - como foi visto, a DAR acarreta, frequentemente, 
substancial perda de fluidos e de eletrólitos, cuja correta reposição constitui requisito essencial ao 
tratamento do paciente. 
 
 
EFEITOS TARDIOS DAS RADIAÇÕES 
 
 Aspectos gerais 
 
 Muitas vezes torna-se difícil distinguir um efeito tardio das radiações ionizantes das múltiplas 
entidades patológicas que acompanham o envelhecimento. Exemplo significativo desta dificuldade é 
dado pela carcinogênese, visto ser impossível, mesmo após exposição a doses elevadas de radiação, 
assegurar que o tumor tenha sido realmente radioinduzido; a análise estatística de populações 
irradiadas e de populações-controle poderia permitir esclarecer este ponto, mas, as reduzidas 
dimensões das primeiras, aumenta as dificuldades para a obtenção de resultados com significância 
estatística, ao menos na espécie humana. Cabe ainda lembrar que muitos efeitos somáticos só são 
observáveis longo tempo após a exposição, o que representa dificuldade adicional para realização 
destes estudos. 
 Por estas razões, a identificação da radiação como agente causal de determinado efeito só pode 
ser feita, em algumas situações. Mas a experimentação com animais permite, com margem reduzida 
de incerteza, descrever pelo menos alguns efeitos tardios da radiação, quais sejam: 
 a) a radiocarcinogênese; 
 b) as modificações na duração da vida média; 
 c) as alterações no crescimento e no desenvolvimento, especialmente na embriogênese; 
 
 Radiocarcinogênese 
 
 Inúmeras evidências foram acumuladas, desde o início do uso das radiações, sobre o risco 
cancerígeno destas; mas as dúvidas até hoje existentes sobre os mecanismos da transformação 
neoplásica ainda inviabilizam a formulação de modelos capazes de explicar a radiocarcinogênese ao 
nível molecular. 
 O primeiro problema crítico no estudo da cancerização radioinduzida é relativo ao formato da 
curva dose-efeito, ou seja, da curva que relaciona o excesso de neoplasias observadas com as doses de 
radiação absorvidas. Teoricamente, diversos modelos poderiam ser aceitos para esta relação, três dos 
quais mostrados na Figura IX.6; o primeiro consiste em supor a existência de uma relação linear, o 
segundo de uma relação quadrática e o terceiro admite um limiar, isto é, uma dose abaixo da qual não 
ocorreria efeito. Este último modelo é bastante improvável, como indicam os numerosos experimentos 
com animais; como a adoção da relação linear, além de coerente com muitos resultados obtidos, cria 
uma espécie de "margem de segurança" para doses relativamente reduzidas, pois redunda na estimativa 
de riscos superiores aos previstos pelo modelo quadrático, tornou-se frequente admitir que o risco da 
radiocarcinogênese seja diretamente proporcional à dose absorvida. 
 
 
IX-10 
 O risco de radiocarcinogênese, à semelhança do que ocorre em muitas outras situações é 
expresso pelo excesso de casos devido à irradiação, ou seja, pela diferença de casos encontrados em 
uma população irradiada e na população controle. Admitida a existência de uma relação linear, é 
possível expressar este risco, para um determinado intervalo de tempo (5 anos, por exemplo) para a 
unidade de dose de radiação absorvida (Gy ou Sv), para uma população de determinado tamanho (1 
milhão de pessoas, por exemplo). Em certas circunstâncias, é usual empregar o risco total, que 
corresponde ao número de casos observados ao longo de certo tempo (20 anos, frequentemente), para 
uma população de 1 milhão de pessoas, para cada unidade de dose absorvida. 
 Outro conceito bastante importante é o período de latência, ou extrapolando para as doenças 
degenerativas um parâmetro empregado na epidemiologia das doenças infecciosas, o tempo de 
incubação. Um tumor radioinduzido exige apreciável tempo para sua expressão, por razões ainda 
controvertidas. No caso da leucemia, por exemplo, com base nas análises realizadas em sobreviventes 
de Hiroshima e Nagasaki, o período latente parece ser de 5 anos, crescendo a incidência a partir de 
então, o máximo sendo encontrado após cerca de 14 anos, e decrescendo a seguir, de tal forma que 20 
anos depois da exposição, o risco de aparecimento de novos casos parece ser igual ao observado em 
uma população não irradiada; já para tumores sólidos, como os desenvolvidos nos pulmões ou na 
tireóide, o período de latência é bem maior.Figura IX.6 - Modelos para relação entre a incidência de tumores neoplásicos radioinduzidos e a dose de 
radiação absorvida. A - modelo linear; B - modelo quadrático; C - modelo admitindo existência de um 
limiar. 
 
 A leucemia constitui uma das formas de câncer mais estudadas na atualidade, comportando 
duas formas clínicas, quais sejam a mielóide e a linfocítica, ambas podendo apresentar-se nas 
modalidades aguda ou crônica. As análises realizadas entre os sobreviventes de Hiroshima e Nagasaki 
indicaram substancial aumento da incidência destas formas de leucemia, salvo a lifocítica crônica; na 
Figura IX.7 pode ser vista uma representação do aparecimento de leucemia em sobreviventes de 
Hiroshima. 
 Outras populações também têm sido analisadas para a determinação do risco de produção de 
leucemias por irradiação, tais como os quase 15.000 pacientes tratados, na Inglaterra, de espondilite 
ancilosante, no período compreendido entre 1935 e 1944, entre os quais foram observados 60 casos, 
quando seriam esperados somente 5; infelizmente, o controle não é adequado, pois não parece correto 
compará-los com a população inglesa de forma global, pois assim são desprezados outros fatores que 
podem interferir, como o eventual risco carcinogênico de drogas empregadas nestes pacientes. 
 Em pessoas expostas ocupacionalmente, o risco de leucemia era bastante aumentado, antes do 
rigoroso cumprimento das normas de radioproteção, mas o problema parece já estar sanado. A título 
de ilustração, basta lembrar que um radiologista na década de 30 talvez recebesse cerca de 1 Gy por 
 
 
IX-11 
ano, enquanto ao final da década de 50, nos centros mais adiantados, a dose não ultrapassava 1 cGy 
anual. 
 
 
Figura IX.7 - Incidência de leucemia em sobreviventes de Hiroshima. 
 
A glândula tireóide também é bastante sensível ao câncer radioinduzido, como verificado entre 
sobreviventes de explosões nucleares ou entre crianças submetidas a radioterapia para redução da 
hipertrofia do timo. Aumento de incidência de câncer, entretanto, não foi detectado em pacientes 
submetidos a doses terapêuticas de 
131
I para tratamento de hipertireoidismo, o que talvez possa ser 
explicado pelo fato destas doses serem bastante elevadas e, assim, os efeitos letais "mascararem" as 
transformações neoplásicas. O câncer de tireóide aparece também precocemente (cerca de 10 anos após 
a irradiação, como pode ser v isto na Figura IX.8, onde estão representados os diferentes tempos de 
aparecimento dos cânceres após a explosão de Hisoshima. 
 
 
Figura IX.8 – Detecção do aumento de diversos tipos câncer após a explosão de Hiroshima. 
 
O câncer de mama também pode ser radioinduzido, tanto em animais como em seres humanos, 
como pode ser visto na Figura IX.9; resultados análogos foram obtidos entre sobreviventes de 
Hiroshima e Nagasaki. 
O câncer ósseo pode ser provocado pelas radiações, como verificado em pacientes irradiados 
para tratamento da espondilite ancilosante ou em pinceladores de painéis luminosos. 
 
 
IX-12 
 O câncer de pele foi o primeiro tipo de neoplasia descrito como radioinduzido, mas aparenta ser 
raro quando as doses absorvidas são relativamente baixas, como indica sua reduzida incidência entre os 
sobreviventes de Hiroshima e Nagasaki. O câncer de pulmão é observado, com frequência, entre 
mineiros que inspiram quantidades relativamente elevadas de produtos gasosos contendo 
radionuclídeos. 
 
Figura IX.9 - Incidência de câncer de mama em função da dose de radiação. 
A - resultados experimentais com animais; B - incidência de câncer de mama em pacientes de um 
sanatório para tratamento de tuberculose, em função do número de exames radioscópicos realizados; é 
estimado que cada exame corresponda a uma dose entre 0,04 e 0,2 Gy. 
 
Modificações da vida média 
 
 A exposição às radiações parece ser capaz de acarretar diminuição da vida média, mesmo 
excluídas as mortes causadas por motivos como a DAR, a carcinogênese, as lesões localizadas, etc. 
Como mostrado na Figura IX.10, existe uma relação linear entre a dose absorvida e o encurtamento da 
vida em animais. Assim, a radiação parece acelerar os processos de envelhecimento, por mecanismos 
ainda mal conhecidos, mas talvez relacionados com o acúmulo de lesões e (ou) a ativação de vias 
incorretas de reparação. 
 Este fenômeno, entretanto, ainda não foi confirmado na espécie humana, como atestam alguns 
exemplos: (i) a vida média dos radiologistas ingleses, entre 1897 e 1957, mostrou-se equivalente à de 
médicos exercendo outras especialidades, o que fez surgir várias dúvidas quanto à validade de pesquisa 
análoga, realizada nos Estado Unidos e que indicou morte prematura de radiologistas; (ii) da mesma 
forma, excluídas causas específicas (como a carcinogênese), a vida média dos sobreviventes de 
Hiroshima e Nagasaki é comparável à de pessoas não expostas. 
 
 
 
Figura IX.10 - Representação esquemática do encurtamento de vida em camundongos irradiados em 
função da dose absorvida. 
 
 
IX-13 
Efeitos no desenvolvimento embrionário e fetal 
 
 As radiações, à semelhança do que ocorre com diversos agentes químicos, são capazes de 
produzir significativas alterações no desenvolvimento de mamíferos, enquanto ainda situados no útero, 
ou seja, são dotadas de atividade teratogênica. 
 Nos mamíferos, um organismo forma-se a partir de uma célula-ovo (ou seja, um óvulo 
fecundado por um espermatozóide) que, após sofrer clivagem, fixa-se à parede uterina, o qual constitui 
a implantação ou nidação. Depois do aparecimento da placenta, ocorre intensa divisão celular e 
diferenciação, etapas que caracterizam o período embrionário, cujo término marca o início do período 
fetal, este estendendo-se até o nascimento. 
 As etapas do desenvolvimento apresentam várias analogias nas diferentes espécies de 
mamíferos e, uma vez que ainda não existe integral concordância quanto à nomenclatura adotada, 
torna-se importante estabelecer alguns conceitos básicos. Na espécie humana, o ovo é encontrado nas 
duas primeiras semanas, o embrião a partir de então e até a 8
a
 semana, ficando o nome feto reservado 
para o concepto depois da 8
a
 semana. O aborto consiste na expulsão do concepto pesando menos de 
500 g, o que corresponde a menos de 20 ou 22 semanas. São considerados prematuros os nascituros 
com menos de 1 kg; quando a criança não chega a respirar, trata-se de um natimorto e, se o óbito 
ocorre nas primeiras semanas, ela é dita perinatal ou neonatal. 
 Irradiações realizadas antes da implantação traduzem-se, em regra, pela morte pré-natal, como 
mostrado na Figura IX.11. Já no período de organogênese, a irradiação tem grandes probabilidades de 
gerar malformações, cujas características são bastante variáveis, mas guardam, em geral, algum tipo de 
correlação com o órgão que esteja sendo formado no momento em que ela ocorra; assim, em 
camundongos, por exemplo, a exposição no 9o dia após a fecundação costuma produzir defeitos nas 
orelhas ou no nariz, enquanto as realizadas no 11o dia conduzem, preferencialmente, à microcefalia. 
Irrradiações realizadas neste período também têm significativas probabilidades de provocar o 
aparecimento de natimortos, uma vez que diversas malformações são incompatíveis com a viabilidade 
do concepto. No período fetal, a exposição às radiações praticamente não mais provoca malformações 
ou morte, embora possa ter outras consequências, tais como redução ponderal, retardo mental, etc. Na 
Figura IX.12 são mostradas malformações produzidas em uma prole de camundongos irradiados in 
útero, notando-sediferentes malformações. 
 
 
 
Figura IX.11 - Incidência de malformações congênitas, de morte pré-natal e de natimortos em função do 
período no qual seja processada a irradiação. 
 Os dados apresentados correspondem a uma representação esquemática de resultados experimentais 
obtidos com camundongos. A titulo de comparação está também mostrada a escala temporal de 
desenvolvimento embrionário e fetal na espécie humana. 
 
 
IX-14 
 
 
Figura IX.12 – Malformações oriundas da irradiação in útero (exoencefalia, evisceração, anencefalia, 
retardo no crescimento). 
 
 Na espécie humana, algumas informações preliminares sobre a incidência de malformações 
radioinduzidas foram obtidas mediante o estudo de mulheres grávidas submetidas à terapêutica 
antineoplásica ou a procedimentos diagnósticos com radiações, assim como pela análise de 
sobreviventes de Hiroshima e Nagasaki. Nestes casos, a incidência de microcefalia e de retardamento 
mental foi significativamente elevada (Figura IX.13 e Figura IX.14). 
 
Figura IX.13 – Retardo mental em criação irradiadas in útero em Hiroshima e Nagasaki. 
 
Figura IX.14 – Criança irradiada in útero (direita – 15 anos) 1,2 km do epicentro (Nagasaki). 
 
 
IX-15 
Outros exemplos foram obtidos em crianças irradiadas in útero, em Chernobyl em 1986.Malformações 
oservadas neste caso podem ser vistas, como exemplo, nas Figuras IX.15 e IX.16. 
 
 
Figura IX.15 – Malformações em crianças irradiadas in útero (Chernobyl) 
 
Figura IX.16 – Irradiação in útero (Chernobyl, 1986). 
 
 Efeitos de baixas doses 
 
 Com base em alguns resultados experimentais, alguns autores admitem que exposições a baixas 
doses de radiação poderiam ter efeitos benéficos, sendo capazes de reduzir a ocorrência de casos de 
câncer ou de aumentar a duração da vida média. 
 Fatos análogos foram descritos para outros agentes físicos ou químicos, que, em baixas doses, 
seriam capazes de estimular funções biológicas, ou até gerar efeitos benéficos, enquanto em doses mais 
elevadas seriam tóxicos. 
 Pelo menos três efeitos benéficos foram descritos para baixas doses: o aumento da duração de 
vida, a elevação das taxas de fertilidade e de crescimento e a redução da incidência de câncer. Assim, 
estudos epidemiológicos realizados em zonas de alta radioatividade natural, na Índia, mostraram uma 
incidência de câncer mais reduzida que nas populações controle; analogamente, as taxas de 
mortalidade de radiologistas americanos, nos 10 primeiros anos de atividade profissional, foram 
descritas como sendo menores que entre médicos de outras especialidades. 
 Foi também descrito um aumento da taxa de divisão celular em culturas de Paramecium 
expostas a maiores taxas de dose de radiação cósmica, como ocorre em módulos espaciais ou balões 
estratosféricos. Adicionalmente, culturas análogas multiplicavam-se em escala reduzida, quando a 
taxa de radiação era menor, como ocorre em grutas ou túneis. 
 Resultados desta natureza ainda são rejeitados pela maioria dos radiobiologistas e, assim, 
devem ser encarados com muita precaução. 
 
 
 
 
 
 
IX-16 
EFEITOS LOCALIZADOS 
 
 Embora as alterações estruturais e funcionais dos tecidos irradiados variem acentuadamente 
com a natureza dos mesmos, alguns aspectos gerais podem ser apontados, tais como a inibição de 
mitoses e o aparecimento de aberrações cromossômicas. Processos hemorrágicos e edemaciação, 
relativamente frequentes, traduzem modificações no sistema vascular e (ou) na permeabilidade, 
enquanto a remoção dos restos celulares é explicada pela intensa fagocitose local. 
 Efeitos localizados podem ocorrer quando somente um determinado segmento anatômico é 
exposto às radiações, como em certos tipos de acidentes ou em pacientes submetidos à radioterapia. 
Mas, no caso da irradiação de corpo inteiro, podem ser observados, nos diferentes órgãos e aparelhos, 
efeitos semelhantes aos que serão descritos a seguir. 
 Na pele, o primeiro sinal observado é o eritema, análogo ao produzido pelo UV. Seguem-se a 
epilação (alopecia), a formação de flictemas (elevações circunscritas de epiderme, contendo fluidos ou 
sangue) e a necrose do epitélio, muitas vezes acompanhada de ulceração, uma via adicional de 
penetração de agentes patogênicos. A epilação resulta de lesões nos folículos pilosos e, na 
dependência da dose de radiação absorvida, pode ser temporária ou definitiva. 
 Na Figura IX.17 podem ser vistos exemplos de queimaduras provocadas pela radiação. 
 
 
 
Figura IX.17 – Quimaduras produzidas na mama ao final da radioterapia de câncer, e no pescoço em 
cobaltoterapia onde foi ministrada dosse errada (0,3 min = 18 s ou 30 s). 
 
No aparelho cardiovascular, as radiações provocam lesões no coração, tais como pericardite 
fibrosa e fibrose difusa intersticial do miocárdio, como observado em pacientes submetidos à 
radioterapia para tratamento de certos linfomas. Os vasos de pequeno e médio calibre também 
costumam ser lesados, neles ocorrendo vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular e 
desenvolvimento de processos trombóticos. 
 A irradiação dos pulmões produz edemaciação intersticial e intra-alveolar, com posterior 
hialinização e fibrose, das quais pode resultar diminuição da capacidade ventilatória. 
 No aparelho gastrointestinal, além das lesões nas vilosidades intestinais, são frequentes danos 
nos epitélios da boca e nas partes superiores do tubo digestivo, com eventuais ulcerações e estenoses. 
 O rim é relativamente radiossensível, provavelmente em consequência das lesões provocadas 
em arteríolas e capilares, sendo frequente o desenvolvimento de nefroesclerose. Também a bexiga é 
sensível, especialmente por causa das lesões provocadas em sua mucosa de revestimento, do que 
resultam ulcerações e eventuais infecções. 
 As gônadas são bastante radiossensíveis e, assim, esterilidade temporária ou definitiva pode ser 
provocada pelas radiações. Nos testículos, as espermatogônias são mais sensíveis que os 
espermatócitos e as espermátides. 
 
 
IX-17 
 Necrose no sistema nervoso central só ocorre após absorção de doses elevadas sendo, 
aparentemente, devida a lesões das células gliais e a alterações da permeabilidade e da circulação. 
Doses menores, entretanto, provocam alterações funcionais, observáveis, por exemplo, no 
eletroencefalograma. 
 A irradiação do globo ocular leva, frequentemente, a opacificação do cristalino, ou seja, à 
formação de cataratas, que podem aparecer alguns meses ou até vários anos após a exposição, sendo o 
período latente mais reduzido para elevadas doses. Na Figura IX.18 está mostrada foto de olho de 
sobrevivente de Hiroshima irradiado aos 12 anos a 950 m do epicentro com 330 rad. Nota-se catarata 
progressiva. 
 
 
 
Figura IX.18 – Catarata em sobrevivente de Hiroshima aos 33 anos e aos 44 anos.

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