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Legitimidade, Direito e Consenso Social Para o pai do positivismo jurídico, Hans Kelsen, baseando-se num procedimento tecnicista, o princípio da legitimidade é aquele que a norma de uma ordem jurídica é válida até que a validade termine por um modo determinado pela própria ordem jurídica, isto é, até ser substituída pela validade de uma outra norma da mesma ordem jurídica. Com base no entendimento de Kelsen, tem sido predominante a ideia de que legitimidade é aquilo que é legal. Noutras palavras, que está de acordo com a lei. Hoje, porém, este entendimento passa por uma desconstrução conceitual. Cresce o consenso de que a legitimidade não se limita à legalidade. Ela também se relaciona à noção de validade e de adequação ao exercício do poder político. Isto significa que um ato, mesmo sendo legal (inserido na própria constituição), pode não ser legítimo, se não encarnar o princípio da validade e o da adequação ao exercício do poder político. Isso se dá a partir do momento que esse ato não tem consenso social. A norma constitucional precisa ter a vontade consensual da população ou então se torna ilegítima. Como exemplo, temos o exercício do governo legal nos países comunistas (China, Cuba, ex-URSS, Alemanha Nazista, Itália Fascista, Brasil na Ditatura Militar etc. Sabe-se que esses governos eram ilegítimos, embora se apresentassem juridicamente (legal) constituído. O conceito de legitimidade foi discutido por diversos autores, um deles foi Habermas. Segundo ele, a base de construção da legitimidade, fundamento último da legalidade, é a tradicionalização, que dá caráter legítimo a uma decisão legal. Habermas tenta elaborar um conceito diferente sobre a questão da legitimidade. Procura se livrar dos vícios e preconceitos positivistas que acabam limitando o alcance das interpretações sobre “legitimidade”. “Esta exige que distingamos entre normas, princípios e procedimentos justificatórios, procedimentos conforme o qual possa examinar se as normas, à luz dos princípios válidos, podem contar com o assentimento de todos” (Habermas). Outro sociólogo político, o jurista italiano Norberto Bobbio também procura distinguir o conceito de legalidade do de legitimidade. Segundo ele, “...costuma-se falar em legalidade quando se trata do exercício do poder e em legitimidade quando se trata de sua qualidade legal”. Ainda, para Bobbio, “(...) o poder legal é um poder que está sendo exercido de conformidade com as leis. O contrário de um poder legítimo é um poder de fato; o contrário de um poder legal é um poder arbitrário”. Bobbio também relata que o “Estado será mais ou menos legítimo na medida que tornar expressão concreta de um consenso livremente manifestado por uma comunidade de homens autônomos e conscientes” Monopólio da violência legal A violência sempre esteve ligada à experiência humana. Administrá-la tem sido um grande desafio desde a pré-história. Hoje, afora os crimes passionais, a violência está diretamente, relacionada às desigualdades sociais, que acabaram criando uma sociedade de apartheid. Na Bahia, preocupados com o crescimento espantoso da criminalidade urbana, o Ministério Público, Secretaria de Segurança Pública (Polícias Civil e Militar), e Universidade do Estado da Bahia (Uneb) promovem um Programa de Capacitação e Educação em Direitos Humanos (Procedh). O Procedh é um programa-piloto de capacitação para agentes do setor público responsáveis pelo controle da ordem pública, distribuição e administração da Justiça. O objetivo é o de contribuir para a melhoria da eficácia das instituições públicas, a redução da violência, por meio de geração de políticas públicas e de uma cultura social dos direitos humanos. O luxo extraordinário e a pobreza cruel disputam os espaços públicos. Dessa disputa, tem-se um confronto simbólico das classes sociais, que aguça as contradições. Essa observação é de Gey Espinheira, doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e professor da Universidade Federal da Bahia, participante do referido Programa. Em meio a este quadro de aguçamento das contradições de classe, cabe ao Estado, ente regulador e normativo, responsável por promover a coesão social, proteger cidadãos e patrimônio público, a busca da pacificação dos conflitos. Porém, segundo o sociólogo Mateus Soares, o Estado brasileiro não age, de forma eficaz, efetivação de suas responsabilidades constitucionais. Não normatiza as coisas públicas adequadamente; tem baixa efetividade social e, quase sempre, descumpre a lei. “É um Estado em desmanche e desmantelo devido a uma força econômica maior, que vitimiza os pobres, os que não têm consciência dos seus direitos”, afirma Mateus Soares. Por outro lado, com o poder legitimado, cabe ao Estado o monopólio da violência. Conforme observa Soares, como o Estado não consegue promover principalmente educação adequada, entre outras necessárias ações, ele se torna vulnerável e fortemente permeado pelo crime e pela violência. Como estratégia de manutenção, o Estado utiliza-se do monopólio da violência como instrumento de pacificação de conflitos. Porém, o emprego da violência, muitas vezes, ocorre num clima de discriminação racial, de gêneros e socioeconômica. Com isto, o Estado tem sido colocado sob suspeição quanto à legitimidade, ora pela omissão, ora por ações discricionárias. Hoje há muita preocupação dos gestores do Estado de evitar que a crise de legitimidade se instale e reine. Os confrontos, principalmente com o crime organizado, e o grau de respostas às demandas sociais têm sido instrumentos aferidores do nível de legitimidade do Estado. Referências CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Sociologia Jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 2006. GOHN, Maria da Glória. Conselhos Gestores e Participação Sociopolítica. São Paulo: Cortez, 2001. PÍPOLO, Maria Alcina. Com o poder legitimado, o Estado detém o monopólio da violência. http://mp-ba.jusbrasil.com.br/noticias/775939/com-o- poder-legitimado-o-estado-detem-o-monopolio-da- violencia.
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