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1 Universidade Federal do Ceará Universidade Estadual do Ceará Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária Conselho Nacional de Pesquisa Científica e Tecnológica BIORREMEDIAÇÃO VEGETAL DO ESGOTO DOMICILIAR EM COMUNIDADE RURAIS DO SEMIÁRIDO: “ÁGUA LIMPA, SAÚDE E TERRA FÉRTIL” Coordenador: Prof. Dr. José Carlos de Araújo (Deptº de Engenharia Agrícola, UFC) O PROJETO A pesquisa intitulada “Biorremediação vegetal do esgoto domiciliar em comunidades rurais do semiárido: água limpa, saúde e terra fértil”, realizada com o apoio do CNPq (processo 577048/2008-2), nasce da necessidade de encontrar alternativas ecologicamente sustentáveis para enfrentar a problemática da destinação adequada do esgoto domiciliar em áreas rurais, onde a ausência de saneamento ambiental traz várias consequências para a saúde pública. Ao lado de uma política pública para equacionar tão grave problema, é necessário o desenvolvimento de pesquisas voltadas para encontrar soluções adequadas à realidade da população e dos assentamentos rurais, que contemplem a particularidade do campo e que estabeleçam a ética como valor fundamental na definição da relação homem-natureza, preservando o ambiente e, portanto, a vida. A presente pesquisa está sendo conduzida no Assentamento Rural 25 de Maio (A25M), Madalena- CE. O mesmo é formado por treze comunidades, onde habitam 586 famílias que possuem como principal fonte de água doze açudes, com capacidade de armazenamento variando de 60 mil a 18 milhões de m³. A área situa-se na sub-bacia do rio Banabuiú, bacia do rio Jaguaribe. O assentamento situa-se sobre embasamento cristalino, região de solos rasos. A 2 cobertura vegetal é de Caatinga arbustiva densa e floresta caducifólia espinhosa, vegetação típica da região, com presença de muitas espécies de marmeleiro. Aí predomina o clima quente semiárido, as temperaturas são altas durante todo o ano, com média anual entre 26 a 28 o C e grandes amplitudes térmicas diárias e anuais. O período chuvoso concentra-se de janeiro a maio, com pluviosidade média de 692 mm anuais e evapotranspiração potencial superior a 2000 mm anuais (e.g. ARAÚJO et al. 2006). O projeto se organiza em três vetores, que dialogam entre si constantemente. Trata-se das vertentes tecnológica, social e de saúde. A vertente tecnológica é responsável, entre outros, pelo diagnóstico do sistema de saneamento do A25M; pela avaliação da qualidade da água nas principais fontes hídricas; pela construção dos módulos de fossa verde e elaboração da proposta de modelo de saneamento – no que diz respeito aos aspectos tecnológicos. A vertente epidemiológica avalia a saúde comunitária dos assentados antes e depois da implantação do sistema. A vertente social analisa aspectos de organização e de educação ambiental dos assentados de modo que o planejamento e a intervenção sejam efetivamente participativos e que a comunidade possa gerir o sistema, de modo autônomo. É relevante mencionar que a coordenação deste projeto submeteu e aprovou, junto ao Conselho de Ética da Universidade Federal do Ceará, autorização para execução da pesquisa. Por se tratar de um projeto com método participativo, grande parte das ações foi realizada em conjunto com os próprios beneficiários, isto é, com assentados do A25M. Figura 1 – Localização do Assentamento 25 de Maio, com as 13 comunidades integrantes. Fonte: Arquivos HIDROSED. O SISTEMA FOSSA VERDE A fossa verde, também chamada de canteiro biosséptico, consiste na construção de uma vala de alvenaria impermeabilizada com dimensões variáveis, apresentando uma estrutura 3 interna em forma de câmara onde os furos dos tijolos ficam inclinados em um ângulo de aproximadamente 30º. O esgoto é direcionado para dentro da câmara e em seguida passa a escoar para a parte externa dessa estrutura, preenchida por materiais porosos que servem como filtro, tais como entulho, casca de coco e material terroso, onde são cultivadas as plantas (GALBIATI, 2009; ver também Figuras 2 e 3). Este processo enquadra-se na categoria de biorremediação vegetal 1 e surge como uma alternativa de tratamento de efluente domiciliar, no qual as águas e os compostos nutricionais provindos do esgoto são reaproveitados pelas plantas. A digestão anaeróbica, associada ao tanque séptico, consome a matéria orgânica proveniente do dejeto domiciliar em conjunto com a ação de microrganismos aeróbicos na zona de raízes das plantas. A água é evapotranspirada e usada de modo consuntivo pela vegetação. A principal vantagem desse sistema alternativo é a destinação adequada do efluente doméstico, que muitas vezes é depositado a céu aberto, proliferando insetos e disseminando vetores patogênicos, portanto, prejudiciais ao meio ambiente e à saúde da população. As fossas verdes construídas no A25M constituem um projeto-piloto para o semiárido nordestino. Entretanto, esta técnica de biorremediação de esgoto doméstico não é novidade no Ceará. Trata-se de uma alternativa de esgotamento sanitário implantada nas comunidades pesqueiras de Icapuí em 2008, por meio do Projeto “De Olho na Água” contemplando 200 famílias (SOARES, 2009). A estimativa inicial de custo da fossa verde foi de R$ 700,00 (setecentos reais) por módulo, tendo sido planejada a construção de cinquenta módulos no A25M. No entanto, dado o modo participativo de construção e a busca contínua de economia dos recursos públicos do projeto, foi possível construir – até o momento – 64 (sessenta e quatro) módulos. O valor médio gasto por construção de cada módulo Fossa Verde no A25M é de R$ 450,00 (incluindo materiais e serviço de mão de obra). Este preço varia de acordo com o tamanho da estrutura, e a distância da fossa em relação ao domicílio (WIEGAND et. al., 2011). 1 Biorremediação é o processo no qual organismos vivos (plantas e/ou microorganimos) são utilizados tecnologicamente para remover ou remediar poluentes no ambiente (ver também GAYLARDE; BELINASO; MANFIO; 2005). Figura 2 – Desenho esquemático da estrutura Fossa Verde. Fonte: Arquivo Hidrosed. 4 Durante a etapa de construção, foram realizadas várias reuniões com as comunidades do A25M (Figura 4) a fim de envolvê-las no processo participativo, viabilizando a disseminação dessa tecnologia alternativa e capacitando a população na construção e manejo adequado do sistema (ver também PINHEIRO, COELHO, ARAÚJO, 2011). Também houve trabalho de sensibilização dos assentados através da rádio comunitária, além de um curso de Educação Ambiental direcionado aos jovens do A25M (ARAÚJO; ALMEIDA; FREITAS, 2011). A seleção dos locais para instalação dos canteiros biossépticos priorizou residências situadas mais próximas aos açudes que as abastece, além de escolas e posto de saúde. Figura 4 – Reuniões com representantes das comunidades do Assentamento 25 de Maio. Fotos: Arquivos HIDROSED. Agosto/ 2009. Figura 3 - Construção participativa dos módulos de fossa verde no Posto de Saúde da comunidade Paus Branco, A25M passo a passo. Fotos: Arquivos HIDROSED. Fevereiro/2010. 5 Ressalta-se que a técnica de biorremediação de esgoto representada pela fossa verde contempla as considerações da Agenda 21 Brasileira e a Legislação de Saneamento Básico Nacional. O diagnóstico do saneamento rural do Assentamento 25 de Maio apontaque as comunidades locais não dispõem de rede coletora de esgoto e em 70% dos casos, o efluente tem como destino final a fossa negra (PINHEIRO, 2011), com posterior infiltração no solo. Somados a este fato, os estudos da qualidade da água dos açudes situados na região apontam níveis tróficos avançados (FEITOSA, 2011), possivelmente resultantes da entrada artificial dos nutrientes provindos, entre outras, de águas residuárias. Neste cenário, o tratamento de esgotos através da fossa verde surge como uma solução factível ao semiárido nordestino, contribuindo para a melhoria das condições de vida da população beneficiária e promovendo o desenvolvimento local. Os cultivos produzidos nas fossas verdes (banana, tomate, pimenta, etc.) foram submetidos à análise microbiológica e os resultados indicam que os mesmos estão com qualidade sanitária satisfatória, portanto, plenamente aptos para consumo humano. Alguns registros fotográficos obtidos durante atividades de campo para acompanhamento encontram-se anexadas ao fim deste documento. Os resultados das atividades desenvolvidas por meio do projeto “Biorremediação vegetal do esgoto domiciliar em comunidades rurais: Água limpa, saúde e terra fértil” apontam a viabilidade do tratamento alternativo das águas residuárias domiciliares, considerando o seu reuso em quintais produtivos e a proteção dos recursos naturais. Além de contribuir significativamente para o desenvolvimento rural, a implementação dos módulos fossa verde fortalece a equidade social e a cidadania através do diálogo entre diferentes saberes (acadêmicos e populares). AGRADECIMENTOS Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo financiamento da pesquisa, ao INCRA, ao MST e às famílias do Assentamento 25 de Maio pela parceria e colaboração na execução das atividades previstas pelo projeto. 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARAÚJO, J. C., GÜNTNER, A., BRONSTERT, A. Loss of reservoir volume by sediment deposition and its impact on water availability in semiarid Brazil. Hydrological Sciences Journal, 51(1), 157-170, 2006. DOI 10.1623/hysj.51.1.157. ARAÚJO, L. B. C., ALMEIDA, C. A. S., FREITAS, L. F. Participação social e saneamento rural: o caso da bacia semiárida de Madalena, Brasil. In: Anais de La II Convención Internacional de Geografía, Medio ambiente y Ordenamiento Territorial, Havana: Universidad de La Habana, 2011. v. único. p. 34 - 42. FEITOSA, L. S. Aspectos limnológicos da pequena açudagem no semiárido: Estudo de caso dos açudes do Assentamento 25 de Maio, Madalena (CE). Dissertação de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza- CE, 2011. 206p. GALBIATI, A. F. Tratamento domiciliar de águas negras através de tanque de evapotranspiração. Dissertação de Mestrado em Tecnologias Ambientais. Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Campo Grande - MS, 2009. GAYLARD, C. C.; BELLINASO, M. D. L.; MANFIO, G. P. Biorremediação – Aspectos biológicos e técnicos da biorremediação de xenobióticos. Revista Biotecnologia, Ciência e Desenvolvimento, n. 34, jan/ jun 2005. PINHEIRO, L. S., COELHO, C. F.; ARAÚJO, J. C. Proposta de modelo de saneamento rural para a região semiárida. In: Anais de La II Convención Internacional de Geografía, Medio ambiente y Ordenamiento Territorial, Havana: Universidad de La Habana, 2011. v. único. p. 1466-1477. PINHEIRO L. S. Proposta de índice de priorização de áreas para saneamento rural: Estudo de caso Assentamento 25 de Maio, Ceará. Dissertação de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA, Universidade Federal do Ceará. Fortaleza- CE, 2011. 110p. SOARES, A. L. J. Tecnologias de baixo impacto - A práxis da sustentabilidade. In: CARBOGIM, J. B. P. (Org.). Projeto de Olho na Água: Estratégia para a sustentabilidade. Fortaleza, CE: Editora Fundação Brasil Cidadão, pp. 48-53, 2009. WIEGAND, M. C. et al. Irrigação de micro-áreas com reúso de esgoto domiciliar utilizando tecnologia Fossa Verde em região semiárida. In: II Reunião Sulamericana para Manejo e Sustentabilidade da Irrigação em Regiões Áridas e Semiáridas, 2011, Cruz das Almas- BA. Anais da II Reunião Sulamericana para Manejo e Sustentabilidade da Irrigação em Regiões Áridas e Semiáridas, 2011. v. 1. p. 149-152. 7 ANEXO Fossa A25M-048 (Comunidade MEL). Cultivos: pimentão, pimenta de cheiro, tomate e banana. Fonte: Arquivos HIDROSED, dez/ 2011. A25M-052 (Comunidade MEL). Cultivos: banana, papoula, babosa e mamão. Fonte: Arquivos HIDROSED, dez/ 2011. 8 A25M-049 (Comunidade MEL). Cultivos: banana, pépino, capim-santo e malvarisco (hortelã grande). Fonte: Arquivos HIDROSED, dez/2011. A25M-046 (Comunidade MEL). Cultivos: banana e babosa. Fonte: Arquivos HIDROSED, dez/2011.
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